EUA x Coréia do Norte: um conflito de anões, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Por Fábio de Oliveira Ribeiro

No centro da mais recente disputa entre EUA e Coréia do Norte está o filme “A Entrevista”. Já me referi ao mesmo aqui no GGN https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/a-entrevista-guerra-e-cinema-juntos-misturados . Volto ao tema porque esta semana Barack Obama assinou um decreto impondo sanções econômicas contra a Coréia do Norte por causa da suposta invasão dos computadores da Sony Pictures a mando do regime de Pyongyang.

O crescimento da tensão entre os dois países despertou minha curiosidade. Então resolvi ver o filme “A Entrevista”. Há diversas cópias do mesmo circulando ilegalmente pela internet. Acessei uma cópia com legendas que presumo terem sido feitas em Portugal por causa do vocabulário e da forma como as frases foram construídas.

Um dos temas do filme é a importância, irreverência e irrelevância da imprensa norte-americana. O outro é obviamente a natureza intrinsecamente perversa do líder e do regime norte-coreano. Algumas piadas são interessantes, outras são exageradamente anais. Um dos melhores momentos do filme é a briga entre o produtor norte-americano e seu “colega” norte-coreano na sala de edição da entrevista.

A desconstrução do líder norte-coreano durante a transmissão da entrevista pode ser comparada a desconstrução de Nixon por Frost (episódio citado algumas vezes no filme). Ridicularizado porque a entrevistador revela que ele gosta de Katy Parry, tem anus e acredita que Margeritas é uma bebida de gays, Kim Jong Un mata o jornalista ao vivo com um tiro no peito. A comédia é deixada de lado, porém, quando os protagonistas explodem Kim Jong Un com um disparo de tanque T-54 durante a fuga.

“Team America: World Police”, filme produzido em 2004 para ridicularizar o pai de Kim Jong Un, é bem melhor do que “A Entrevista”. O inesquecível tema musical cantado pelo personagem que mimetiza Kim Jong-il  é um dos melhores momentos do cinema norte-americano dos últimos tempos: https://www.youtube.com/watch?v=UEaKX9YYHiQ .

Segundo informações que obtive a Sony não teve prejuízo com “A Entrevista”. O custo do filme já foi parcialmente coberto pela sua distribuição regular na internet. Ele já está sendo projetado em centenas de salas de cinema nos EUA e provavelmente será exibido em milhares de outras ao redor do mundo. A Sony provavelmente recuperará o que investiu e terá algum lucro. O principal fundamento das sanções impostas à Coréia do Norte por Obama (o prejuízo da companhia invadida) deixará de existir em breve. Em razão disto, devemos suspeitar que a tensão entre os dois países é mais profunda do que aparenta ser na superfície.

A tensão entre os dois universos simbólicos inimigos fica mais evidente em obras  como “Invasão da Casa Branca” (2013), filme em que  terroristas norte-coreanos matam civis de maneira indiscriminada para poder dominar o centro do poder norte-americano com o objetivo de destruir o mundo usando o arsenal nuclear dos EUA. Este filme foi concebido especificamente para levar o espectador a odiar os norte-coreanos e a ter piedade dos pobres norte-americanos. A inversão operada pelo filme é evidente. Quem realmente tem tradição de matar civis inocentes não é a Coreia do Norte e sim os EUA e desde a II Guerra Mundial (quando os norte-americanos bombardearam e incendiaram dezenas de cidades históricas alemãs que não tinham qualquer importância militar e jogaram bombas atômicas em duas cidades japonesas reduzindo-as a cinzas junto com seus habitantes inofensivos). Os massacres de civis por tropas norte-americanas durante a Guerra da Coréia e a Guerra do Vietnan são fatos bem documentados.

Por mais que seja militarizada, a Coréia do Norte não tem e nunca terá o mesmo poder militar que os EUA. Além disto, o repugnante regime de Pyongyang não tem usado seus militares com tanta frequência quanto Washington. Os EUA foram o único país que, em pleno século XXI, atacaram quase ao mesmo tempo dois países (Afeganistão e Iraque) enquanto ameaçavam militarmente outras nações (inclusive a Coréia do Norte). As emoções despertadas pelo filme “Invasão da Casa Branca” não correspondem aos fatos e mesmo assim preparam o publico mundial para a guerra que os EUA parecem querer retomar contra os norte-coreanos.

Os norte-americanos foram derrotados no Vietnam, mas voltaram a manter relações com aquele país. A Guerra da Coréia é a único conflito militar dos EUA que não acabou. As cicatrizes deixadas nos dois lados são imensas.

Quando derrotaram o avô de Kim Jong Un, obrigando-o a correr para o norte da península, as tropas sul-coreanas e norte-americanas massacraram milhares de parentes de norte-coreanos suspeitos de serem comunistas. Ao chegarem ao Yalu na fronteira da Coréia do Norte com a China, as tropas da ONU comandadas por Douglas MacArthur foram envolvidas pelos exércitos chineses comandados por Peng Dehuai. Durante a ofensiva chinesa, os norte-americanos colheram derrotas humilhantes sendo obrigados a abandonar seu equipamento pesado e a correr com o rabo entre as pernas para a segurança de Pusan.

Na época em que Matthew B. Ridgway substituiu Walton H. Walker no comando do VIII Exército dos EUA na Coréia ele “… percebeu em todos os homens com os quais conversava a total ausência de autoconfiança. Um exército atordoado, inseguro de si, dos seus comandantes e da própria presença, ansiava pelo apito dos navios que levariam todos para casa.” (Yalu, Jörg Friedrich, Record, 2011, p. 337). As tropas dos EUA recuperaram seu moral e algum terreno, tomaram Seul de Peng Dehuai empurrando o exército chinês de volta para o paralelo 38. Mas àquela altura já havia ficado claro para Truman que os EUA não conseguiriam aniquilar os exércitos chineses na Coréia do Norte, nem realizar o sonho insano de MacArthur obter uma vitória esmagadora similar à da II Guerra Mundial.

As feridas da Guerra da Coréia ainda estão abertas nos EUA? A julgar por filmes como “A Entrevista”, “Team America: World Police” e “Invasão da Casa Branca”   a resposta só pode ser uma: sim. Que outro motivo os norte-americanos teriam para ficarem tão obsecados com um país minusculo e subdesenvolvido cujo governo conseguiu recentemente desagradar até a China (país cujas tropas sangraram para que ele seguisse existindo)?

E já que estamos falando de história e de filmes, vou sugerir aos leitores uma pergunta. O líder dos anões de “O Hobbit 3” é vingativo, obsessivo, ingrato, belicoso, desconfiado, mesquinho e não honra sua palavra acarretando a guerra entre anões e homens/elfos. Em relação à disputa diplomática em curso com qual dos dois inimigos Thorin mais se parece: EUA ou Coréia do Norte?

Fábio de Oliveira Ribeiro

16 Comentários

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  1. “EUA x Coréia do Norte: um

    EUA x Coréia do Norte: um conflito de anões, por Fábio de Oliveira Ribeiro

    … e se depois o GGN-NASSIF receber na cabeça de planilha politicamente incorreta um processo criminal no bolso precioso – por calúnia difamação discriminação de tamanho – da Associação Nacional dos Anões Altivos, seu Nassif ficará de praça em praça de boteco em sarau só nos choros e lamentos para bandolim atravessado e preju no bolso fechado…

     

    1. Thorin, o personagem de
      Thorin, o personagem de Tolkien, não era um anão? Ameaças, meu caro, indicam apenas duas coisas: nanismo intelectual e ego-gigantismo.

  2. Governo Mundial

    Os povos, línguas e costumes díspares, as tensões, focos de revolta e ameaças no limes eram frequentes. Tornava-se necessário, estabelecer e manter condições de tranquilidade e paz, para além de segurança e ordem pública. Para isso, o Império servir-se-ia do seu exército, cada vez mais profissional e formado a partir de recrutamentos um pouco por todo o território, regido por códigos e normas extremamente rígidos e dotado de uma organização, armamento e disciplina táctica nunca antes vistos, resultantes das influências dos povos submetidos.

    A instituição militar vê-se assim orientada para vários objectivos: para além da defesa fronteiriça contra incursões e pilhagens dos bárbaros, da fortificação de pontos estratégicos, construção de estradas e segurança pessoal das mais altas magistraturas imperiais, a manutenção da paz e da estabilidade no mundo cabiam-lhe como tarefa primordial e de grande importância em termos civilizacionais.

    Desde que o homem começlou a se organizar em grupamentos e estabelecer cidades, tornou-se imperativo conter a invasão daqueles que não conseguiam, estabelecer por conta propria a mesma prosperidade.

    Ingenuidade esperar que a insanidade seja controlada atraves de admoestações e conselhos, se assim fosse não necessitariam os anjos do punho forte dos reis, considerados enviados divinos, no compromisso de governança em um mundo primitivo, dominado pela crueldade, ignorancia e violencia.

    1. Fale-me mais sobre o ódio

      Fale-me mais sobre o ódio secular que os romanos inspiraram nos bárbaros e que os levou, no período de decadência de Roma, a invadir e saquer impiedosamente a cidade, destruindo aquedutos, queimando o conteúdo de bibliotecas, matando e mutilando aqueles que não conseguiram fugir. O militarismo, meu caro, não instrumentaliza a paz. Ele apenas antecipa uma dolorosa derrota futura. Os que hoje são contidos pela força, abatidos como bichos e humilhados como se não fossem seres humanos, amanhã darão o troco sem qualquer consideração de humanidade para com os seus desumanos conquistadores. Quando conquistadores brutais caem, pequena perda eu digo.

      1. Alternacia do poder

        O interessante das invasoões barbaras é que em vez de destruirem com a cultura romana, fizeram exatamente o contrario, foram eles que assimilaram a cultura romana e a espalhou para o resto do mundo.

        Não é objetivo do militarismo instrumentalizar a paz, seu objetivo é subjugar a insanidade daqueles que procuram impedir a roda da historia.

        Quem defende alguma tese de que os radicais fanaticos no oriente médio deixaria de praticar as barbaridades, as atrocidades em nome de alguma conciliação em prol do desenvolvimento.Diante do primitivismo dos instintos humanos, somente a força disciplinar consegue algum resultado.

        Nenhum poder humano é eterno, por outro lado aqueles que almejam derrubar os imperailistas de platão, são os mesmos que lhes sucederão nos metodos de dominação.

        É a historia que nos ensina isto, e contra os fatos não existe argumento. Pra mim tanto faz quem esteja no poder, sou brasileiro e aprendi a me virar pra sobreviver.

         

        1. O principal insumo da
          O principal insumo da civilização ocidental neste momento é o petróleo, matéria prima da indústria química, farmacêutica, plástica e dos combustíveis que movem carros, caminhões, barcos e aviões, possibilitando o comercio, a guerra e o turismo globais. Não me parece que os habitantes do Oriente Médio precisem invadir os EUA por causa do petróleo. O contrário é verdadeiro?

  3. QUEM DEVERIA APLICAR SANÇÕES EM QUEM NESTE TRIANGULO PICARETA

    O mais ridículo disso tudo é que o EUA, espionou até a presidentes do Brasil, Alemanha,Ingalaterra sabe – se lá mais quem e não houve sações nenhuma, nada mais patético do esse filme da SONY. OS EUA viraram uma especie terroristas camuflados, destroem o mundo com tantas guerras e os tolos de plantão aplaudem quando eles acham um zé mané que provalvelmente vão lhes superararem na picaretagem, ai aparecem mais uns zé manés dando importância a coisas tão tolas quanto a isso…

  4. O filme é um lixo.
    Com muita

    O filme é um lixo.

    Com muita insistência e pouco juízo consegui assistir 15 minutos e o remeti diretamente para a lixeira.

    Padrão “Zorra Total”.

    Nem percam tempo com isso.

    A humanidade deveria agradecer aos hackers que tentaram impedir o lançamento dessa coisa.

     

  5. Oh não! Agora que não vou assistir esse filme mesmo…

    Mais um daqueles filmes “polêmicos”, que criam “polêmica” para ver se alguém assiste.

    Não vou assistir, nem comentar. Tô fora…

  6. Seu conceito de cinema é um lixo!!

    O inesquecível tema musical cantado pelo personagem que mimetiza Kim Jong-il  é um dos melhores momentos do cinema norte-americano dos últimos tempos: https://www.youtube.com/watch?v=UEaKX9YYHiQ .

    Falar que essa coisa ridícula é inesquecível??? Tenha paciência… Não consegui assistir nem 15 segundos!!! M>>>>>>>

    1. Você tem todo direito de

      Considero a referida cena muito boa por três motivos: a música composta para o fragmento é muito bela; há ironia na letra e na atitude do personagem que reconhece e celebra sua solidão; a sincronia entre música, letra e movimentos dados ao boneco é perfeita. 

      Você tem todo direito de gostar ou de não gostar da cena que mencionei e da avaliação que fiz dela. Teria, entretanto, que explicar quais foram os motivos que o levaram a dizer o que disse. Caso contrário, meu caro, seu comentário será irrelevante.

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