É fantástico, um juiz que protegia apenas seus amigos

Há alguns dias, aqui mesmo no GGN, critiquei a postura de Sérgio Moro em relação à corrupção dos seus colegas no futuro governo https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/sergio-moro-o-juiz-que-perdoava-por-fabio-de-oliveira-ribeiro#.W-le0kvECqw.twitter. Volto ao assunto por causa da entrevista laudatória que ele deu ao G1.

Sérgio Moro: Eu acompanhei todo o processo eleitoral e eu nunca vi, da parte do senhor presidente eleito, uma proposta de cunho discriminatório em relação a essas minorias. Eu não imagino de qualquer forma que essas minorias estejam ameaçadas. O fato de a pessoa ser heterossexual, homossexual, branco, negro, asiático… Isso é absolutamente indiferente. Nada vai mudar. Eu tenho grandes amigos que são homossexuais. Algumas das melhores pessoas que conheço são homossexuais. E não existe nenhuma perspectiva de nada que seja discriminatório a essas minorias. O governo tem que ter uma postura rigorosa quanto a crises em geral, mas também em relação a crimes de ódio. Eu não poderia ingressar em qualquer governo se houvesse alguma sombra de suspeita que haveria alguma política dessa espécie. https://g1.globo.com/fantastico/noticia/2018/11/11/moro-eu-nao-assumiria-um-papel-de-ministro-da-justica-com-risco-de-comprometer-a-minha-biografia.ghtml

É fato público e notório que Jair Bolsonaro odeia os homossexuais e as políticas públicas voltadas para LGBT. Ele chegou a provocar um escândalo na Câmara dos Deputados para poder dizer aos jornalistas que “homofobia é queimar a rosca todo dia” https://www.youtube.com/watch?v=SGCknhGPQYE. Na entrevista que deu a Rede Globo, Bolsonaro criticou o “kit gay” https://www.youtube.com/watch?v=5xgKe_-hxWM. A campanha dele se resumiu a ataques ao adversário Fernando Haddad por causa desse suposto kit. Certa feita, o candidato do PSL disse que os pais devem agredir seus filhos para impedi-los de virarem homossexuais https://www.youtube.com/watch?v=QJNy08VoLZs. Bolsonaro também defendeu que seria preciso separar o sangue dos gay do sangue dos heterossexuais quando das transfusões https://www.youtube.com/watch?v=Z1oGuNkGV2g. Ele apoia o controvertido projeto da cura gay https://www.youtube.com/watch?v=2YVnW3YO88w.

Acegueira de Sérgio Moro é realmente fantástica. A ambição de ocupar o Ministério da Justiça o impediu de ver o que dezenas de milhões de brasileiros viram, inclusive na TV aberta.

A Constituição Cidadã proíbe qualquer tipo de discriminação por motivação ideológica, sexual, religiosa, racial, filosófica, etc… (art. 5º, da CF/88). A atuação concreta desta norma independe das relações de amizade entre o futuro Ministro da Justiça. Todavia, como no caso da corrupção do seu futuro colega de governo, Sérgio Moro parece inclinado a personalizar a aplicação da Lei. Além de preferir não ver o ódio de Bolsonaro pelos gays ele se limitou a garantir a integridade dos direitos dos amigos homossexuais dele como se a atuação concreta da norma pudesse ser seletiva.

O inciso VIII, do art. 5º, da CF/88 é enfático “ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.” Há alguns anos Jair Bolsonaro defendeu a tortura e disse que mandaria matar 30 mil comunistas https://www.youtube.com/watch?v=PGTtIGmOY24. Recentemente o filho dele afirmou que pretende proibir o comunismo e que não vê nada demais em mandar prender 100.000 comunistas https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,se-for-necessario-prender-100-mil-qual-o-problema-diz-eduardo-bolsonaro,70002603840. Sérgio Moro certamente não tem amigos comunistas. Portanto, quando essa minoria for estraçalhada por uma Lei inconstitucional o futuro Ministro da Justiça não terá que defender ninguém.

O mesmo pode ser dito dos quilombolas e dos índios? É cediço que Bolsonaro prometeu cassar os direitos dos quilombolas e dos índios assim que assumir a presidência. Ele não poderá fazer isso sem o protagonismo do Ministério da Justiça. Nos últimos anos vi dezenas de fotos de Sérgio Moro ao lado de políticos tucanos, mas nunca vi uma só imagem dele num Quilombo ou numa Reserva Indígena defendendo os direitos dessas minorias. Quem não for um “amigo gay” dele não terá qualquer direito?

Desde que foi apresentado ao respeitável público como o paladino do combate a corrupção Sérgio Moro se esforçou bastante para corromper os princípios constitucionais do Direito Penal para poder perseguir lideranças petistas e proteger políticos do PSDB. Os abusos cometidos por ele levaram a Comitê de Direitos Humanos da ONU a proferir uma decisão contra o Brasil em favor de Lula. Dezenas de juristas brasileiros e europeus, dentre eles os mais destacados penalistas da atualidade, criticaram a atuação seletiva de Moro à frente da Lava Jato. A operação foi claramente utilizada para impedir Lula de disputar a eleição e garantiu um Ministério ao juiz que atuou como se fosse inimigo mortal do PT.

O que Sérgio Moro fará quando assumir um poder maior do que aquele que jamais teve? Ele aplicará a Constituição Cidadã de maneira serena e impessoal ou aproveitará a oportunidade para expandir a barbárie corrompendo ainda mais o sistema republicano brasileiro? Ninguém deveria confiar num juiz parcial. Porque devemos depositar confiança num Ministro da Justiça perdoa seus amigos corruptos e garante apenas a segurança dos gays que são amigos dele?