Magistrados questionam limite de patrocínio a eventos

Do Valor

Associações de juízes vão contestar norma do CNJ

As associações dos Juízes Federais (Ajufe) e dos Magistrados Brasileiros (AMB) vão ingressar com ação conjunta no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que limitou o valor de patrocínios a eventos de magistrados. Para as entidades, a Resolução nº 170, que reduziu o patrocínio de empresas a eventos em, no máximo, 30% dos custos totais, tem o objetivo de esvaziar as associações da magistratura e fere o direito de liberdade de reunião.

“Diga-se, sem rodeios, que prestigiar a tese de que magistrados poderiam trocar sua consciência e convencimento em processos submetidos à sua jurisdição por jantares ou diárias em eventos ou congressos constitui um disparate tão grande que revolta e choca todos os juízes do Brasil”, diz a minuta da ação a que o Valor teve acesso. O texto foi encaminhado à cúpula da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) para que ela decida se também pretende assinar a ação. A expectativa é a de que a Ajufe e a AMB entrem no STF ainda hoje. Caso a Anamatra também queria assinar a petição, a ação deverá ser proposta amanhã.

A ação deve ser assinada pelo advogado Sérgio Bermudes, que tem contrato com a Ajufe para atuar em processos da entidade no STF. Com isso, o ministro Luiz Fux deve se declarar impedido de votar a questão, pois a sua filha trabalha no escritório de Bermudes. Fux tem por regra não participar dos julgamentos de causas patrocinadas pelo escritório, alegando motivo de foro íntimo.

A ação será mais um capítulo na disputa que as entidades de juízes travam com o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa. Há duas semanas, ele discutiu com representantes da Ajufe, da AMB e da Anamatra por causa da aprovação, pelo Congresso, de quatro novos Tribunais Regionais Federais (TRFs). Barbosa é contrário aos eventos de juízes patrocinados por empresas privadas por entender que a prática pode comprometer a magistratura. Como presidente do CNJ, foi o ministro quem colocou a resolução em votação. “É uma primeira tentativa de segregar o Judiciário de relações duvidosas, senão promíscuas com o empreendimento privado”, afirmou o ministro, em fevereiro, após a aprovação da resolução.

Mas, para a Ajufe e a AMB, a resolução do CNJ representa uma interferência estatal indevida na liberdade das associações. “O Estado está constitucionalmente proibido a determinar a forma como serão custeados os eventos científicos, culturais ou de qualquer outra natureza promovidos por associações de classe”, diz a minuta da ação. “É evidente que, se abusos forem apurados, tanto o CNJ como as corregedorias de Justiça têm o dever legal de aplicar as sanções cabíveis. Entretanto, não é possível limitar a tal ponto a liberdade das associações e dos próprios magistrados em promover eventos com fins lícitos e patrocinados por entes legalmente constituídos.”

As entidades de juízes dizem ainda que a resolução impede a realização de “eventos financeiramente equilibrados” e viola “a plena liberdade de associação e a garantia de funcionamento das associações de classe, sem interferência estatal”. “O patrocínio é captado e direcionado às associações, sem qualquer participação dos magistrados participantes do evento”, diz a minuta da ação. Segundo as entidades, os juízes que frequentam os eventos não mantêm “qualquer contato ou vínculo com o patrocinador”. “O objetivo do patrocinador não é cooptar, por meio de custeio de despesas, magistrados que possam decidir favoravelmente suas demandas judiciais, mas, sim, promover o debate e o esclarecimento de ideias, em alto nível intelectual e cultural”, diz a petição.

A ação é dirigida ao presidente do STF contra ato do presidente do CNJ. Barbosa ocupa os dois cargos. Caberá ao ministro encaminhar o caso para distribuição processual no STF, onde será escolhido um relator. O STF já recebeu uma ação contra a resolução dos patrocínios, que foi proposta em março pela Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages). Essa ação tem como relator o ministro Celso de Mello e, como se trata do mesmo tema, o caso da Ajufe e da AMB também pode ser encaminhado a ele. Na ação, a Anamages alega que a resolução foi aprovada de maneira irregular, pois as entidades de magistrados não foram ouvidas previamente.

Luis Nassif

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