Para Barroso, magistrado tem o dever de ser contramajoritário

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Jornal GGN – Um dos pontos mais discutidos na história do Supremo Tribunal Federal foi a exposição de mídia no julgamento da AP 470, o dito mensalão. Questões como judicialização da política e midiatização da justiça foram pontos que nortearam as críticas.  O que mais se comentou foi a parcialidade de alguns ministros, alinhando-se com a grande mídia, um trabalho casado de condenação por suposição ou denúncias por conveniência. Pode-se discordar. Mas o que não se pode deixar de analisar é a superexposição dos ministros, que foram endeusados ou massacrados conforme a conveniência do veículo expositor. O tema não se esgotou, ao contrário, posicionamentos devem ser lidos, entendidos, discutidos e, por fim, servir de norte para uma retomada da função da Justiça, principalmente no Supremo Tribunal Federal, que permita um julgamento isento, sem pressões nas questões políticas ou de interesse econômico.

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, deu aula pública na Faculdade de Direito São Francisco, em São Paulo, abordando o tema com a questão do mensalão. Barroso afirmou que o papel de um magistrado constitucional ‘em situações politizadas’ é ‘fazer o que precisa ser feito’. Acompanhe a matéria da Rede Brasil Atual.

Enviado por Assis Ribeiro

da Rede Brasil Atual

Barroso lembra ‘mensalão’ e reafirma: juiz não deve se submeter à multidão

Ministro do STF, que votou pela aceitação dos embargos infringentes dos réus do mensalão, diz que o papel de um magistrado constitucional ‘em situações politizadas’ é ‘fazer o que precisa ser feito’

Em aula pública sobre judicialização da política na sexta-feira (8), na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), comentou o julgamento da Ação Penal 470, o chamado “mensalão”. Embora sem citar nomes de colegas do tribunal ou de qualquer um dos réus, ele fez referências sobre a dificuldade de um ministro diante de uma decisão que envolve “situações politizadas” e seu dever de “fazer o que precisa ser feito”.

Segundo ele, em muitos casos, um magistrado “não só pode como tem o dever de ser contramajoritário” no sentido de garantir direitos de minorias. “Ou declarando uma lei inconstitucional, assegurando à minoria o direito de constituir uma CPI, um instituto que existe para que as minorias possam exercer seu direito, ou eventualmente votando contra a multidão, se sua convicção é a de que cabem embargos infringentes e que o papel de um juiz constitucional é fazer o que ele considera correto”.

Barroso disse que o dever de agir corretamente é necessário “sobretudo em situações politizadas, quando as multidões estão apaixonadas, quando exista ódio em relação a duas ou três pessoas, é nessa hora que é preciso um juiz independente e corajoso para fazer o que precisa ser feito”.

O julgamento sobre uma questão processual, se o STF deveria ou não aceitar os embargos infringentes interpostos pelos condenados na AP 470, foi um dos momentos mais tensos e polêmicos de todo o processo. Ao final, com voto do ministro Celso de Mello, o tribunal aceitou o recurso como válido, o que possibilitou a apreciação dos embargos pela defesa dos réus. Em fevereiro deste ano, ao julgar os recursos, o STF absolveu José Genoino, José Dirceu e outros réus da acusação de formação de quadrilha. Se tivessem perdido, suas penas teriam sido agravadas. Genoino foi condenado a 4 anos e 8 meses, e José Dirceu, a 7 anos e 11 meses.

Ainda sem menção a nomes ou mesmo sem se referir diretamente ao processo, o ministro falou de sua relação pessoal com aquele momento. Ele contou que votou “sem hesitação em nenhum momento”, ao contrário de processos em que tem dúvidas. “Mas nesse, um caso fácil, cabia (embargos infringentes), nessa hora a gente tem que fazer o que deve ser feito. Só a verdade ofende. A vantagem de fazer o bem, o que a gente acredita, é que esse é um poder que ninguém pode afetar. Quando a gente está satisfazendo os outros, querendo agradar alguém, alguém pode puxar o tapete. Quando é verdadeiramente autêntico, não há risco”.

Em sua opinião, passado o momento de tensão e paixões políticas, a razão acaba prevalecendo. “Quando debeladas as paixões, alguém dirá: ainda bem que se permitiu que um julgamento emblemático fosse decidido de acordo com as regras do jogo e não se transformasse em uma vingança política.”

No julgamento sobre se os embargos deveriam ou não ser aceitos, em setembro, Barroso, durante seu voto, fez um comentário mal recebido por seus pares. “A multidão quer o fim deste julgamento. E devo dizer que eu também. Mas nós não julgamos para a multidão”, declarou. O ministro Marco Aurélio reagiu. “Vejo que é um novato: parte para a crítica ao próprio colegiado”, rebateu.

Televisão

Um dos aspectos mais criticados por alguns juristas no julgamento do mensalão foi a participação da televisão com transmissões ao vivo, consideradas por eles prejudiciais à isenção. Para Barroso, a participação da TV tem aspectos positivos e negativos. “Ela trouxe uma primeira e imediata consequência: a primeira, negativa, foi que os votos aumentaram em 50%. É uma tragédia, porque a pauta é enorme. O mundo, não do STF, mas do direito, é feito de pessoas que têm uma paixão, ou ostensiva ou oculta, por ouvir a própria voz”, ironizou. “E portanto as pessoas falam demais.”

Mas, segundo o ministro, a TV Justiça prestou um serviço “imenso” à comunidade jurídica: “qualquer pessoa, onde quer que esteja, pode assistir a um debate jurídico, em tese pelo menos, de qualidade.”

Outro dado relevante é que, diante das câmeras, alguns magistrados que poderiam votar contra direitos fundamentais se sentiram pressionados pela exposição. “O Judiciário era excessivamente conservador. A exposição pública faz as pessoas progredirem um pouco. A união homoafetiva passou no Supremo por unanimidade. É verdade é que havia uns três casos (ministros) em que a linguagem corporal não correspondia às palavras, as pessoas estavam muito desconfortáveis”, contou. “Ninguém gosta de passar por troglodita. A história estava passando e não fazer aquilo (votar pela união homoafetiva) era paralisar a história.”

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

18 Comentários

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  1. O stf é um anexo do PiG!

    O stf não presta respeito à Constituição brasileira. O stf obedece a globo!

    A “justiça” no Brasil funciona para garantir e perpetuar os privilégios indecentes da casa-grande… e para ferrar o povo pobre e trabalhador.

     

     

  2. O dever não é de ser

    O dever não é de ser contramajoritário, mas de não se submeter à pressão pública.

    Isso, claro, inclui ser contramajoritário quando a opinião majoritária conflita com os direitos e garantias consagrados na Constituição Federal.

    Concordo com o Ministro Barroso. Corretíssimo.

      1. Achei que só eu tinha percebido, rs…

        O título não corresponde à declaração do Ministro. Não querendo defendê-lo e muito menos deturppar (ou misturar) a tendência do blog.  Erraram feio. 

        Uma coisa é dizer que é NECESSÁRIO julgar contramajoritariamente, outra coisa é dizer que é DEVER SEMPRE julgar contramajoritariamente. Não se confundem as condutas. Passou batido isso, Nassif. Ou você sacaneou a gente, rs.

    1. Isso sem falar na pressão dos pares…

      Os ministros conversam entre si, trocam ideias, formam grupos por afinidade. Então, em um caso de maior repercussão, a opinião dos colegas acaba influenciando, não há dúvida. Uns são mais suscetíveis (digamos assim), outros menos. Mas a pressão existe sim. E o lobby também. Difícil é conseguir julgar com isenção (quer dizer, com base apenas na própria convicção) quando se ocupa uma cadeira em um tribunal superior.

      Por isso, achei muito importante a fala do Min. Barroso, expondo questões tão pouco abordadas no meio jurídico, ajudando a quebrar certos tabus. 

  3. Nassif
    Espero que o “novato”

    Nassif

    Espero que o “novato” realmente pratique a justiça propalada em seu discurso, pois o stf nos deve muito…..

    Quantas causas no qual os beneficiados são o povo estão na gaveta?

    Por enquanto,  ele esta indo muito bem…

    Abração

  4. O problema é o uso que se faz do termo “contramajoritário”

    O termo “contramajoritário” não significa muita coisa quanto ao acerto da decisão. Significa apenas que se está votando contra o que quer a maioria, o que quer a posição majoritária.

    O que o Barroso fala é o óbvio: o juiz deve proferir a sua decisão segundo aquilo que ele acredita ser o certo, independentemente do que pense a maioria. Se a maioria estiver errada, deve-se ser contra a maioria, ou seja, contramajoritário.

    Não significa que o juiz deva ser sempre contramajoritário, pois a maioria pode estar certa em muitas e muitas situações, obviamente.

    Aliás, o título do post, dialeticamente, leva a uma contradição: se o juiz deve ser sempre contramajoritário (“tem o dever de ser”, diz o título), o que seria contramajoritário num momento passará a ser majoritário, pois todos os juízes passarão a defender a posição inicialmente contramajoritária. Nisso, se cria um estado de indecisão.

    Obviamente, aderir ou não ao campo contramajoritário depende, de acordo com a interpretação do juiz, do acerto da posição majoritária em relação ao que diz a lei e a Constituição Federal. Portanto, o juiz tem o dever de ser contramajoritário sempre que entender que esta é a melhor interpretação do ordenamento jurídico-constitucional. No fundo, a questão se resume a isso, a votar de acordo com a sua interpretação da lei e sem sofrer a pressão de encontrar-se entre a minoria.

    1. Alessandre, entendi o ” dever

      Alessandre, entendi o ” dever de ser contramajoritário”, no sentido de reforçar a ideia que de posições devem ser tomadas, independemente da percepção da maioria e não uma afirmação de que o magistrado deva ser contamajoritário, sempre. Pode ser mesmo que o Ministro Barroso tenha dito o óbvio mas o fato é que, durante dois anos essa obviedade foi tratada como covardia de magistrado que não tinha coragem para enfrentar poderosos interesses ou alinhamento ideológico.

      O post, está apenas ensinando como deve agir um magistrado em situações em que a pressão popular ( mesmo que forjada ) atue sobre ele de forma absurda, como aconteceu na AP 470 em o título é bom na medida em que já define a questão, antes do início da leitura. O dever de ser contramajorotário qdo a situação assim exigir, é indiscutível. Parece óbvio mas não foi o que aconteceu; tanto assim que essa palestra do Ministro Barroso foi dada numa faculdade de Direito; isso faz sentido? Uma coisa, somos nós, comentaristas de blog e internautas não sabermos que um magistrado não está vinculado à opinião pública mas ter que explicar isso numa faculdade de Direito é preocupante.

       

  5. Claro está

    Numa interpretação elementar, o que o ministro diz é que é um dever ser contramajoritário sempre que necessário.

    (“fazer o que precisa ser feito”).

    E é mesmo!

    Juiz é pra julgar de acordo com a lei e com a Justiça, não para agradar ou fazer política.

  6. Caro Nassif e demais
    Mas eles

    Caro Nassif e demais

    Mas eles não são majoritários, só se for os que tem mais dinheiro. Ai sim, eles defendem esse tipo de majoritário.

    Saudações

  7. Áqueles que julgaram a AP

    Áqueles que julgaram a AP 470, uma singela contribuição:

    “CONTA-SE QUE O JOVEM TZU-CHANG DIRIGIU-SE UM DIA AO GRANDE CONFÚCIO E PERGUNTOU-LHE:

    – Quantas vezes, ó esclarecido filósofo, deve um juiz refletir antes de sentenciar ?

    Respondeu Confúcio:

    – Uma vez hoje; dez vezes amanhã.

      Assombrou-se o príncipe Tzu-Chang ao ouvir as palavras do sábio. O conceito era obscuro e enigmático.

    – Uma vez será suficiente – elucidou com paciência o Mestre – quando o juiz, pelo exame da causa, concluir pelo perdão. Dez vezes, porém, deverá o magistrado pensar, sempre que se sentir inclinado a lavrar a sentença condenatória.

    E concluiu, com sua incomparável sabedoria:

    – Erra, por certo, gravemente, aquele que hesita em perdoar; erra, entretanto, muito mais ainda aos olhos de Deus, aquele que condena sem hesitar “

    Do Livro O Homem que Calculava – Malba Tahan

  8. embora lamente que o stf

    embora lamente que o stf talvez não revise o tal do mensalão – por usar notórias aberrações como a ideia do domínio do fato – há que se reconhecer que com a saída de barbosa e a entrada de barroso  e o exercício da presidencia do ministro lewandowski o clima melhorou um pouco…

    espero que continue melhorando.

    1. A retirada do segredo de

      A retirada do segredo de justiça acerca do Inquérito 2474 e a leitura/debate do seu conteúdo pelo plenário do STF, é uma possibilidade que se pode aventar?  

    2. Vão revisar, sim. Na verdade,

      Vão revisar, sim. Na verdade, de uma certa forma, já começaram a fazer isso. É, claro que não vai dar para eles fazerem o que JB fez; detonar o ordenamento na base do grito e da canetada… Vão precisar de tempo, afinal, é a imagem da mais alta corte de justiça do país que está em jogo. Não dá para mandar um ” foi mal” e rever tudo. Caberá a defesa dos réus, ir provocando a Corte para conseguir que as condenações sejam revistas. Além disso, tem um outro problema, as gestões anteriores ficaram marcadas por algum tipo de política que beneficiasse o Judiciário; a de Ayres Britto e JB, foram marcadas por absolutamente nada além de estragos na imagem do STF; o desafio do novo presidente é implementar seu projeto e ao mesmo tempo, desfazer os estragos das duas anteriores. Não acho justo. Todos os presidentes tiveram dois anos para executar seus projetos para a melhoria do Judiciário e o atual, pode ter o seu projeto comprometido em função do tempo e energia que deverá ser gasto, limpando a sujeira dos anteriores. Minimamente,o mandato que começa agora, deveria ser um tipo mandato tampão, durando até novembro ( data em que o anterior, deveria ter saído ) e, só a partir de novembro o prazo de dois anos começaria a ser contado. Ora, ninguém duvida que o Ministro Ricardo Lewandowski tenha um projeto para marcar a sua gestão e, ao que tudo indica ( criação da força-tarefa e limites nos gastos com viagens ), será uma gestão competente e séria. Ocorre que, toda a cobrança pela Aberração Penal 470, recairá sobre a sua gestão, tb; ironia do destino, mesmo. O único ministro que fez de tudo para que a imagem da Corte não ficasse comprometida é o que vai ter que dar conta da recuperação de sua imagem. O que não vale é ter sua gestão marcada pela limpeza das sujeiras dos outros; até pq vários dos que estão ali contribuíram de maneira definitiva para sujar a imagem do STF. O correto, portanto, é se virarem para, o mais rápido possível, livrar a Corte do vexame da AP 470.

  9. Dever.

    Um juiz tem o dever de cumprir a lei mesmo que essa não esteja de acordo com a opinião pública, senão iremos novamente condenar Jesus Cristo e absorver Barrabas.

  10. Um jogo de palavras perigoso

    Barroso afirma que o constituinte, ao impor um procedimento mais árduo para mudar a Constituição, haveria retirado os temas constitucionalizados da política majoritária, do procedimento ordinário de alteração das leis infraconstitucionais.

    Isso é algo que parece ser certo.

    Problemático é, porém,  quando o agora Ministro do STF vai além e interpreta que tal retirada dos temas constitucionalizados (e aqui a forma é o que importa) implicaria na disposição do Supremo sobre essas matérias.

    Nada mais equiocado, a meu ver.

    O legislador constituinte quis, na verdade, que certos temas sejam objeto de debates e acordos mais amplos para que sejam alterados PELOS REPRESENTANTES LEGITIMADOS PELO VOTO POPULAR, e não por algum juiz constitucional, se nenhum voto popular.

    EU NUNCA VOTEI EM NENHUM JUIZ!

    1. no  caso dos infrigentes o

      no  caso dos infrigentes o votado foi que havendo motivação de cunho polítco não há crime de quaddrilnha. Isso é a nova lei e parte da jurisprudência. Se os congressistas  qusererm podem fazer projeto no contrário, mas para isso, repito, é dispensável,  já  é lei.

  11. Errado, juiz tem que seguir a lei.

    O problema do mensalão é que não seguiram a lei, esconderam provas e queriam mostrar que o PT tinha cometido um crime. O erro não foi de majoritários ou minoritearios. Barroso votou pelos infringentes por que são a lei.

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