Quando a Justiça é feita, por Lula Marques

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Quando a Justiça é feita

por Lula Marques

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Quando falamos em perseguição política em um Estado Democrático de Direito parece piegas. Faço cobertura política fotográfica em Brasília desde a volta da Democracia em 85, depois do fim da ditadura militar de 1964. Mesmo com a eleição, pelo colegio eleitoral, do presidente Tancredo Neves, que veio a falecer e, a posse de seu vice, José Sarney, foi preciso continuar a luta. Foram anos de briga pela volta definitiva da liberdade e Democracia. A arrogância e a brutalidade de certos agentes do Estado não aceitavam o fim do regime militar e tentavam intimidar a imprensa. Foi um período em que foi preciso encarar literalmente os golpistas, mesmo com a redemocratização. Veio então a Constituinte de 1988, que colocou o Brasil no rumo de um país livre.

Como fotógrafo, atuei na cobertura de vários governos, comecei no do ex-presidente Figueiredo e continuo até o golpe atual, 37 anos da minha vida foram dentro de uma redação de jornal. Primeiros 11 anos no correio Braziliense e depois 26 anos na Folha de são Paulo. Quando saí da Folha de S Paulo, em 2013, abri minha empresa, Lula Marques Imagens e, nos últimos três anos trabalhei para Agência PT. O fotojornalismo para mim sempre foi e sempre será uma das melhores formas para tornar a Democracia mais transparente. Nós fotógrafos somos chamados de “olhos do leitor”. Representamos os milhões de leitores e internautas nas cerimônias e coberturas políticas. Temos que ser éticos e sempre mostrar a verdade. Tenho 56 anos e 42 anos da minha vida sempre foi ouvindo política, fotografando política e convivendo com políticos. Fui paparicado por alguns políticos para fazer parte de grupos nada republicanos. Respeito quem não teve personalidade e aceitou ser capataz dos senhores da casa grande.

Quando começou o processo que golpeou a ex-presidenta eleita com 54 milhões de votos, Dilma Rousseff, e vi quem estava por trás do golpe, só tinha um caminho a tomar como jornalista: ficar contra os golpistas, contra o golpe e todos que ajudaram a levar o país ao retrocesso. Fiz simplesmente o que todo fotojornalista tem que fazer. Mostrar a verdade sem compromisso com os poderosos no poder. Sei que agradei e desagradei muitos políticos com as minhas imagens. Tenho orgulho de ter sempre mostrado a realidade. Fui questionado por algumas imagens que fiz, mas nunca processado. A realidade das minhas fotos sempre foram indiscutivelmente reais. Em 2015, passei a colaborar com a imprensa progressista de todo país para mostra o contraponto à mídia comercial nas coberturas do processo de votação do impeachment/golpe. Enquanto os golpistas eram endeusados pela velha mídia, eu mostrei a realidade. Os golpistas sempre tiveram no meu foco, já que a imprensa tradicional só queria saber de acabar com Dilma, Lula e o PT.

Em dezembro de 2016, recebi um convite para trabalhar no governo atual, mas deixei claro que não concordava com o golpe e que nas redes sociais diariamente batia nos usurpadores do poder. Em 2015, fui preso, agredido e arrastado para fora do plenário do Senado, mas o caso já havia sido arquivado a pedido do MPF. No começo desse ano, fui procurado por um oficial de Justiça e descobri que o processo foi reaberto a pedido de um procurador que pedia minha condenação por desacato à autoridade, desacato a funcionário público e resistência à prisão. Achei muita coincidência, mas em função das minhas posições políticas tudo pode acontecer no Brasil que vivemos hoje. Hoje, recebi a boa notícia que o processo foi mais uma vez arquivado.

Meu currículo ficou mais bonito com esse processo e o arquivamento. Espero que os seguranças do Senado aprendam a tratar a imprensa e principalmente os manifestantes que frequentam o Congresso, que deveria ser a Casa do Povo mas não é. Os seguranças que me arrastaram e me prenderam são jovens, arrogantes e autoritários. Não conhecem a história do país e acham que são melhores do que os outros por ter o status de Polícia Legislativa. Fazem o papel de capataz dos donos do poder. Sei o que essa elite do atraso faz para intimidar a oposição, mas fiquem sabendo, que, quem não deve não teme. Vocês estão mexendo com várias jararacas que amam a Democracia e não nós calarão. Para o advogado, Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay e sua equipe, agradeço pela minha defesa. Desta vez, a Justiça foi feita. O próprio MP tinha chamado o fato de “atípico a conduta”. O Estado de Direito e a Democracia agradecem.

Confiram o vídeo da minha prisão no Senado.

Recordando os motivos da prisão em 2015…

Minha prisão no Senado

Entrei na Casa Branca, em Washington, umas cinco vezes. Palácio do Eliseu, em Paris, outras três. Palácio Imperial, em Tóquio, uma. Além de cúpulas internacionais e Assembleias da ONU. Importantes coberturas no mundo. Conto isso pra deixar claro que usar a credencial de imprensa é um hábito, uma rotina no mundo e aqui no Brasil também. Ela tem que estar bem visível na minha profissão…

Passo meus dias entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional. Sempre que atravesso a rua que separa os dois prédios, troco a credencial para dar visibilidade à do órgão que vou entrar. Isso facilita a correria do dia a dia atrás da notícia.

Uma coisa é certa, nossos seguranças são desqualificados para lidar com o público, imagina com a imprensa… Não sabem ser simpáticos e ver que estamos ali trabalhando como eles. Não custa olhar nos olhos, dar um sorriso, ser gentil, dar um bom dia. Por isso, sempre que posso levanto a minha credencial.

Fui acusado de entrar nas galerias do Senado sem credencial. Naquela tarde tensa, estávamos ansiosos para entrar no plenário – o dia entraria para a história. Foi o dia em que a Casa autorizou a permanência de um de seus pares na cadeia. Fomos barrados por duas terceirizadas com “poder” de decidir quem iria entra na galeria. Pouco antes, estávamos no Salão Azul do Senado esperando o presidente Renan chegar para iniciar a sessão quando fomos avisados que ele já estava no plenário. Corremos todos, fotógrafos, cinegrafistas e alguns repórteres.

Arrogantes e mal informadas, duas funcionárias terceirizadas nos seguraram por quase cinco minutos. Todos sabiam que a sessão seria às 17 horas. Foi anunciado mais cedo pelo vice-presidente da Casa. Só as duas pareciam não saber o que estava acontecendo ali. Chegaram a dizer que não havia sessão. Detalhe, sempre entramos no plenário mesmo quando não há sessão.

Pedi a uma delas para entrar em contato com seu superior. Estávamos perdendo imagens importantes por culpa de uma pessoa que não deveria estar ali, quanto mais tratar com os profissionais de imprensa. É o que acontece quando pessoas despreparadas têm algum poder. Depois de um tempo dependendo da boa vontade da funcionária, fomos liberados para entrar mediante a apresentação da credencial. Todos estavam com ela no peito. Naquela confusão, fui o único que levantei a credencial com a mão, como você pode ver no vídeo abaixo. Ela pareceu não gostar do que fiz e avisou que chamaria a polícia. Levou uma vaia de todos e eu fui o escolhido. Já na galeria, enquanto fotografava, veio pedir meu nome.

Deixei claro que estava extrapolando suas funções. Como eu estava trabalhando falei pra ela fazer o mesmo. Minutos depois chegou um segurança, agora chamado de polícia do Senado, que com “poder” me deu voz de prisão:

– Quero saber porque!, reclamei.

– Me acompanhe, o senhor está preso, disse ele.

– Conheço o regimento, sei onde posso fotografar, sempre respeitei as regras nesses 36 anos credenciado no Congresso.

Mostrei minha credencial e falei que estava trabalhando e só iria se soubesse o motivo da minha prisão. Recebi como resposta que estava preso e teria que acompanha-lo. Bom, falei, sem motivo só à força.

A truculência da segurança no Congresso tem sido uma constante nos últimos anos. Ninguém escapa, imprensa, servidores, transeuntes, sem falar nos manifestantes, sempre tratados como bandidos. Não sabem a importância que têm a imprensa, a democracia e o direito de ir e vir.

Resisti, sempre resistirei e sei que quando estamos certos devemos brigar até o ultimo momento. Não me envergonho do que fiz. Resisti à prisão para criar um fato e defender a nossa liberdade de trabalhar e espero que alguma coisa aconteça, que aprendam a nos respeitar. Aos hipócritas que me criticaram sem estar lá, está aqui o vídeo que fala por si só. Perdi a cobertura de um acontecimento inédito. Perdi e minha empresa perdeu. Fiquei preso por mais de quatro horas.

Agradeço a solidariedade dos amigos e do deputado Paulo Pimenta (PT-RS), da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, único parlamentar solidário com a minha prisão e agressão. Sei que o que aconteceu comigo ocorre com funcionários e manifestantes que vão defender seus direitos e sempre acabam presos espancados … (essa semana um rapaz foi desacordado pela segurança da Câmara).

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

4 Comentários

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  1. A ditadura midiático penal

    A ditadura midiático penal mandando ver….e isso é só o começo: a novidade é que o uso da delação sem provas como forma de castigar dissidentes polliticos ou religiosos está se tornando comum….dois casos pelo menos que foram noticiados, isso porque se revelaram o que era: delação caluniosa…e quantos brasileiros e brasileiras se encontram no momento presos ao mesmo tempo em que são inocentes: Lula está na fila…qualquer um de nós poderá ser o próximo…

    A onda lavajateira está levando a delação caluniosa aos grotões…e pensaram que pegava só o Lula e seu partido… https://jornalggn.com.br/noticia/revelacao-divina-de-delegado-substituto-leva-inocente-ao-inferno

     

  2. golpe

    “Fui paparicado por alguns políticos para fazer parte de grupos nada republicanos.”

    Nesse pais do golpe não tenho o direito de pedir que o sr. decline o nome desses grupos.

    Mas que eu desconfio quais sejam, isso é verdade.

    1. REPUBLICANOS

      o mbl te convidou?

      o antagonista te convidou ?

      a folha política te convidou?

      ou foi algum ministro do boca muxa?

      ou foi turma do paraná que te convidou?

      foi algum grupo ainda não conhecido e clandestino?

      afinal, só tenho perguntas.

  3. cartaz

    “Uma coisa é certa, nossos seguranças são desqualificados para lidar com o público”

    Esse problema seria facilmente resolvido,

    É só colocar na porta um cartaz:

    Cuidado com os cães!

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