Morre o poeta Manoel de Barros

Jornal GGN – O Poeta Manoel de Barros morreu hoje (13), aos 97 anos. Há duas semanas ele estava internado no Proncor de Campo Grande. No dia 24 de outubro, ele chegou a ser operado para retirar uma obstrução no intestino. Em 1966 ele ganhou o prêmio nacional de poesias com “Gramática Expositiva do Chão”. Em 1998, recebeu o Prêmio Nacional de Literatura do Ministério da Cultura pelo conjunto da obra. Ele ganhou duas vezes o prêmio Jabuti e já foi premiado pela Academia Brasileira de Letras. O funeral, aberto ao público, começou hoje, às 14h, no cemitério Parque das Primaveras, em Parati, Campo Grande.

Morre, aos 97 anos, o poeta Manoel de Barros em Campo Grande

Do G1

Poeta estava internado havia duas semanas no Proncor da cidade.
Manoel de Barros teve falência de múltiplos órgãos, diz hospital.

O poeta Manoel de Barros morreu nesta quinta-feira (13), aos 97 anos, no Proncor de Campo Grande. Ele estava internado havia duas semanas e, durante esse período, passou por uma cirurgia no intestino. Conforme boletim médico assinado pela médica Carmelita Vilela, o falecimento ocorreu às 8h05 (de MS).

Segundo o hospital, o poeta teve falência de múltiplos órgãos. O diretor-executivo do Proncor, Paulo Alves, informou que Manoel de Barros deu entrada na unidade no dia 24 de outubro e fez cirurgia de desobstrução intestinal. O poeta foi para o quarto no dia 25 de outubro e, no dia 4 de novembro, teve piora e voltou para o Centro de Terapia Intensiva (CTI).

Manoel Wenceslau Leite de Barros era advogado, fazendeiro e poeta. Nasceu em Cuiabá, no Beco da Marinha, às margens do rio Cuiabá, em 19 de dezembro de 1916.

Filho de João Venceslau Barros, capataz na região, Manoel se mudou para Corumbá, no Pantanal sul-mato-grossense, onde passou a infância. Nos últimos anos, o poeta morou em Campo Grande e levou uma vida reclusa ao lado da esposa.

Velório
Segundo a família, o velório do poeta está previsto para começar às 14h, na capela do cemitério Parque das Primaveras, localizado na avenida Senador Filinto Müller, 2211, no bairro Parati, em Campo Grande. O funeral será aberto ao público, de acordo com a família. O sepultamento está marcado para as 17h.

Luto
Mato Grosso do Sul terá três dias de luto oficial pela morte do poeta Manoel de Barros, segundo nota publicada no site do governo do estado, nesta quinta-feira (13). O decreto do governador André Puccinelli será publicado na edição de sexta-feira (14) do Diário Oficial do Estado.

Assembleia Legislativa
A sessão ordinária desta quinta-feira na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul foi suspensa por causa do falecimento do poeta Manoel de Barros. Para o deputado Pedro Kemp (PT), segundo secretário da Assembleia, o poeta projetava o estado de Mato Grosso do Sul no Brasil e no Mundo. “Ele deixa uma marca que nos orgulha tanto que vai se eternizar na memória de todos nós”, disse Kemp.

O deputado Junior Mochi (PMDB), líder do governo, disse que o poeta era o ícone da cultura do estado. “Não há uma pessoa que melhor retrata a alma sul-mato-grossense como Manoel de Barros. É a referência e a identidade principalmente do povo pantaneiro”, disse.

Câmara dos Vereadores
Os vereadores da Câmara Municipal de Campo Grande suspenderam, também, a sessão desta quinta-feira.  Para o presidente da Casa, vereador Mario Cesar (PMDB), Manoel de Barros era uma referência do estado para o mundo. “Apesar da chama ter se apagado, sua poesia será eterna”

Obras
Manoel de Barros publicou seu primeiro livro, “Poemas concebidos sem pecado”, em 1937. Seu último volume, “Escritos em verbal de ave”, saiu em 2011.

Em novembro do ano passado a editora Leya lançou a obra completa do  poeta, com título de “A biblioteca de Manoel de Barros”. São, ao todo, 18 volumes. A edição especial incluiu um poema até então inédito, “A turma” (2013), o último escrito pelo autor. A coleção também trazia os cinco livros infantis feitos pelo poeta.

No início de novembro, o site Publish News, que cobre o mercado editorial brasileiro, informou que a obra de Manoel de Barros foi contratada pela Alfaguara, selo da editora Objetiva. De acordo com o site, a editora planeja lançar os primeiros títulos no segundo semestre de 2015.

O perfil do poeta no site da Leya destaca que em 1966 ele ganhou o prêmio nacional de poesias com “Gramática Expositiva do Chão”. Em 1998, levou o Prêmio Nacional de Literatura do Ministério da Cultura, pelo conjunto da obra. Ao  longo da carreira de sete décadas, ganhou o Prêmio Jabuti duas vezes, em 1990 e 2002, com as obras “O guardador de águas” (1989) e “O fazedor de amanhecer” (2001). Em 2000, foi premiado pela Academia Brasileira de Letras.

Ainda segundo a Leya, Manoel de Barros teve sua obra traduzida em Portugal, Espanha, França e Estados Unidos. Em 2008, foi tema do documentário “Só dez por cento é mentira”, de Pedro Cezar.

 

 

Redação

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  1. Manoel

    O menino que carregava água na peneira

    Tenho um livro sobre águas e meninos.
    Gostei mais de um menino
    que carregava água na peneira.

    A mãe disse que carregar água na peneira
    era o mesmo que roubar um vento e
    sair correndo com ele para mostrar aos irmãos.

    A mãe disse que era o mesmo
    que catar espinhos na água.
    O mesmo que criar peixes no bolso.

    O menino era ligado em despropósitos.
    Quis montar os alicerces
    de uma casa sobre orvalhos.

    A mãe reparou que o menino
    gostava mais do vazio, do que do cheio.
    Falava que vazios são maiores e até infinitos.

    Com o tempo aquele menino
    que era cismado e esquisito,
    porque gostava de carregar água na peneira.

    Com o tempo descobriu que
    escrever seria o mesmo
    que carregar água na peneira.

    No escrever o menino viu
    que era capaz de ser noviça,
    monge ou mendigo ao mesmo tempo.

    O menino aprendeu a usar as palavras.
    Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
    E começou a fazer peraltagens.

    Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
    O menino fazia prodígios.
    Até fez uma pedra dar flor.

    A mãe reparava o menino com ternura.
    A mãe falou: Meu filho você vai ser poeta!
    Você vai carregar água na peneira a vida toda.

    Você vai encher os vazios
    com as suas peraltagens,
    e algumas pessoas vão te amar por seus despropósitos!

  2. Manoel de Barros, por Tânia Du Bois

    Crônica em homenagem aos 90 anos do Poeta:

    ————————————————————————————————————-

    MANOEL DE BARROS: “O grande poeta de pequenas coisas”

    por Tânia Du Bois

               

              Faço desta, uma homenagem, para dizer algumas palavras de encantamento ao poeta Manoel de Barros que aniversaria em dezembro. Peço licença para homenagear o grande mestre. Peço licença, sim, porque sou amante da poesia e, entre os meus escritores, Manoel de Barros é um dos preferidos e, em tudo o que se escrever sobre ele, estaremos nos repetindo, mas a repetição será permitida por sua grandeza pessoal e pela grandiosidade da sua obra. É um prazer poder reler, rever e reviver o poeta dos “desacontecimentos”, o “poeta do pantanal”, o “lírico da ecologia”, o “virtuoso do realismo mágico”, “o grande poeta de pequenas coisas”. O que me permite repassar alguns fatos significativos da sua vida, como diz Pedro Du Bois, “… Escrevo histórias / recontadas em outros dias / de mesmas palavras.” e Orides Fontela, “a luz está em nós: iluminamos.” – podemos dizer que a luz está em Manoel de Barros: iluminando-nos.

             A seguir, cito alguns textos sobre o poeta e sua obra.

             Fabrício Carpinejar, em “Manoel de Barros: poesia para reciclar”, dezembro de 2006, conta que o poeta está casado há 58 anos com Stella, seu grande amor. Ela é a primeira e única leitora de seus originais. É bem crítica. Se ela não gosta, diz: “Sobe e vai trabalhar mais”. Ele só dá por terminado o trabalho quando ela define que está bom, pois, conhece o seu estilo. Manoel de Barros editava as suas obras em tiragens artesanais e de escassa circulação. Teve o reconhecimento na década de 80, por críticos e personalidades, como o dicionarista Antônio Houaiss, o escritor Millôr Fernandes e o editor Ênio Silveira.

                Manoel é poeta do simples e da delicadeza, que adota a autenticidade dos defeitos. Tem estima pelas coisas e homens jogados fora pela sociedade. Seu universo é o do cisco, dos gravetos, dos inutensílios e dos nadifúndios. O escritor atua no espaço faz de conta. Interessa-se pelos hábitos das lagartixas, lesmas e animais rastejantes. O poeta faz brinquedos verbais com osso de arara, canzil de carretas, potes furados, sabugos. A singularidade de sua poética reside em combinar a aguda percepção urbana com um repertório primitivo e rural. Para Barros, o que é descartado é jogado dentro do poema. E afirma que o verdadeiro conhecimento está na leitura do mundo.  “Poesia é voar fora da asa” (O Livro das Ignoranças).

             O editor Ênio Silveira, sobre o “Livro das Ignoranças“, mostra como o poeta nos toca pela magia de seus versos, o que nos leva a compará-lo na tentativa de defini-lo como: “grande poeta de pequenas coisas”, “o lírico da ecologia”, “poeta do pantanal”, “o virtuoso do realismo mágico…”. Deixamo-nos envolver pela sua poesia, em que nos encantamos, pela sua constante redescoberta das palavras.

              Adélia Menegazzo, sobre a obra “Concerto a Céu Aberto”, aponta que a leitura de seus poemas vem preencher os vazios e descobrir que o poeta entrega ao leitor um concerto de sons… audíveis apenas no silêncio entre uns e outros. Porque, antes de tudo, MÚSICA! Cada verso seduz pelo desvio, pelas dissonâncias e revela a revolução das palavras, “Do canto das aves está posto o concerto em pauta”.

                Paulinho Assunção, sobre “Poemas Rupestres”, apresenta este menino que “pegou um olhar de pássaro” e que “contraiu visão fontana”, este menino, sábio dos “desacontecimentos”, este é um menino-manoel. É um menino “com olhar – furado – das nascentes”, que gosta de atrelar palavras de rebanhos diferentes, com o intuito de “causar distúrbios no idioma…”. É preciso dizer: todos nós nos desabrimos em outras pessoas diante da poesia de Manoel.

                 Adalberto Müller Júnior, a respeito de “Matéria e Poesia”, traz que a originalidade do poeta consiste em elaborar liricamente, com as coisas menores, verdadeiras relíquias de linguagem. Manoel de Barros é capaz de transformar a matéria mais desimportante em poesia.E, Pedro Du Bois no livro “As Pessoas Nominadas”, presta homenagem ao poeta: Palavras // Um, santo de barro /outro, Manoel de Barros / de comum,/andor/ ardor/ com que santificam / palavras / ditas / escritas /jogadas ao vento / que as reproduz.”

                Não posso deixar de expressar minha gratidão pela existência de Manoel de Barros, pois ele é palpitação em nossas vidas. O seu conhecimento vem através dos sentidos. Ele descreve os sons, dando-nos condições de, ao lê-los, poder ao mesmo tempo ouvi-los e senti-los. O poeta humaniza as coisas, o tempo e o vento. E mais, gosta das músicas de Chico Buarque e de Paulinho da Viola!

                Ao completar 90 anos, recebeu o prêmio Nestlé de literatura, pelo livro “Poemas Rupestres”. Também conquistou outros dois prêmios: Jabuti e da Associação Paulista dos Críticos de Artes. Mas, o seu maior prêmio é ter a sua obra distribuída em todo o país.

                Manoel de Barros se considera um “songo”, como fez constar em seu poema inédito de mesmo nome: “Aquele homem falava com as árvores e com as águas /ao jeito que namorasse //… Dizia que era abençoado pelas rãs e pelos / pássaros / A gente acreditava por alto / Assistira certa vez um caracol vegetar-se /na pedra ////… Era muito encontrável isso naquele tempo./ Até pedra criava rabo!/ A natureza era inocente.”.          

             Discordo quando o poeta, em seu autorretrato falado, em 1994, disse: “estou na categoria de sofrer do moral, porque só faço coisas inúteis…”. Prefiro quando ele diz que a “Poesia tem que ter palavras, uma feira de ideias.”.

  3. Morreu minha tia querida que

    Morreu minha tia querida que me criou. Vcs conhecem ela?

            Eu tbm não conheço esse cara.

                         Empatou!

  4. Versos

    O livro sobre nada

    É mais fácil fazer da tolice um regalo do que da sensatez.
    Tudo que não invento é falso.
    Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira.
    Tem mais presença em mim o que me falta.
    Melhor jeito que achei pra me conhecer foi fazendo o contrário.
    Sou muito preparado de conflitos.
    Não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou.
    O meu amanhecer vai ser de noite.
    Melhor que nomear é aludir. Verso não precisa dar noção.
    O que sustenta a encantação de um verso (além do ritmo) é o ilogismo.
    Meu avesso é mais visível do que um poste.
    Sábio é o que adivinha.
    Para ter mais certezas tenho que me saber de imperfeições.
    A inércia é meu ato principal.
    Não saio de dentro de mim nem pra pescar.
    Sabedoria pode ser que seja estar uma árvore.
    Estilo é um modelo anormal de expressão: é estigma.
    Peixe não tem honras nem horizontes.
    Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada; mas quando não desejo contar nada, faço poesia.
    Eu queria ser lido pelas pedras.
    As palavras me escondem sem cuidado.
    Aonde eu não estou as palavras me acham.
    Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas.
    Uma palavra abriu o roupão pra mim. Ela deseja que eu a seja.
    A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.
    Quero a palavra que sirva na boca dos passarinhos.
    Esta tarefa de cessar é que puxa minhas frases para antes de mim.
    Ateu é uma pessoa capaz de provar cientificamente que não é nada. Só se compara aos santos. Os santos querem ser os vermes de Deus.
    Melhor para chegar a nada é descobrir a verdade.
    O artista é erro da natureza. Beethoven foi um erro perfeito.
    Por pudor sou impuro.
    O branco me corrompe.
    Não gosto de palavra acostumada.
    A minha diferença é sempre menos.
    Palavra poética tem que chegar ao grau de brinquedo para ser séria.
    Não preciso do fim para chegar.
    Do lugar onde estou já fui embora.

  5. .
    “Quando o mundo abandonar

    .

    “Quando o mundo abandonar meu olho.

    Quando meu olho furado de belezas for esquecido pelo mundo.

    Que hei de fazer?

    Quando o silêncio que grita de meu olho não for mais escutado.

    Que hei de fazer?

    Que hei de fazer se de repente a manhã voltar?

    Que hei de fazer?

    – Dormir, talvez chorar.”

    ( Manoel de Barros)

  6. O livro das ignorãças

    Os deslimites da palavra

    Segundo dia

    2.5

    Ando muito completo de vazios.

    Meu órgão de morrer me predomina.

    Estou sem eternidades.

    Não posso mais saber quando amanheço ontem.

    Está rengo de mim o amanhecer.

    Ouço o tamanho oblíquo de uma folha.

    Atrás do ocaso fervem os insetos.

    Enfiei o que pude dentro de um grilo o meu destino.

    Essas coisas me mudam para cisco.

    A minha independência tem algemas.

     

  7. Ave atque vale, poeta!

    O poema é antes de tudo um inutensílio.

    Hora de iniciar algum 
    convém se vestir roupa de trapo.

    Há quem se jogue debaixo de carro 
    nos primeiros instantes.

    Faz bem uma janela aberta 
    uma veia aberta.

    Pra mim é uma coisa que serve de nada o poema 
    enquanto vida houver.

     

    Ninguém é pai de um poema sem morrer.

  8. Manoel de Barros: Mundo Pequeno

    Mundo Pequeno

                  I

    O mundo meu é pequeno, Senhor.
    Tem um rio e um pouco de árvores.
    Nossa casa foi feita de costas para o rio.
    Formigas recortam roseiras da avó.
    Nos fundos do quintal há um menino e suas latas
    maravilhosas.
    Todas as coisas deste lugar já estão comprometidas
    com aves.
    Aqui, se o horizonte enrubesce um pouco, os
    besouros pensam que estão no incêndio.
    Quando o rio está começando um peixe,
    Ele me coisa
    Ele me rã
    Ele me árvore.
    De tarde um velho tocará sua flauta para inverter
    os ocasos.

    Manoel de Barros

    *Iluminura de Martha Barros – Nas margens do rio – Aquarela – 147cm x 59cm – 2011

    http://www.entreculturas.com.br/2011/11/manoel-de-barros-mundo-pequeno/

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