Demarcação: Bruno e Dom, vítimas da letra morta da Constituição, por Cleiton Coutinho

Bruno e Dom morreram para garantir o cumprimento do que está na Constituição, a demarcação de terras

Bruno Pereira, indigenista assassinado na Amazônia. Foto: Reprodução/Redes Sociais

Bruno e Dom morreram para garantir o cumprimento do que está na Constituição Federal. Demarcação, já!

Por Cleiton Leite Coutinho

Quando da promulgação da nossa Constituição Federal, em outubro do ano de 1988, portanto, há mais de 33 anos, a mesma reservou o Capítulo VIII, dois únicos artigos destinados aos Povos Indígenas, intitulado “Dos Índios”.

Os referidos artigos praticamente encerram a Constituição e certamente não deve ser por mera ocasião do destino, mas pela importância histórica que nunca foi dada aos Povos Indígenas.

Ainda assim, diz os artigos 231 e 232, da nossa Constituição Federal:

“Art. 231 – São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

§ 1º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.

§ 2º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.

§ 3º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.

§ 4º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.

§ 5º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, “ad referendum” do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.

§ 6º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.

§ 7º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, § 3º e § 4º.

Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.”

Democracia é coisa frágil. Defendê-la requer um jornalismo corajoso e contundente. Junte-se a nós: www.catarse.me/jornalggn

Ora, o texto constitucional é um grito, sem eco e um tapa na cara de uma sociedade conduzida politicamente por sociopatas, que permitem nas suas indiferenças toda sorte de maldade em desfavor não só dos Povos Indígenas, mas de todos que se atrevem a ver cumprido minimamente o que prevê a nossa lei maior.

O Brasil é o país onde o óbvio precisa ser dito com constância, quando interessa as castas privilegiadas, concretizadas na elite branca, escravocrata, oligárquica e imunda. 

É muita pureza de pessoas como Bruno e Dom, em meio ao que podemos chamar de imundície no poder central do país.

O julgamento do famigerado “Marco Temporal” é dessas aberrações, que causam náusea, quando pensamos que no Brasil é necessário reafirmar o óbvio. Está na Constituição Federal. Cumpra-se! Como é da cultura legal e burocrática do país, ao que interessa aos poderosos, já ao que não interessa, sempre cabe o “benefício” da dúvida e vira logo guerra jurídica com julgamento na Suprema Corte de forma midiática.

Bruno e Dom são vítimas do que se tornou letra morta na nossa Constituição Federal, entre tantos outros artigos e capítulos importantes que são colocados em segundo plano, por políticos inescrupulosos e que ignoram o real sentido da Constituição.

Os ventos das matas percorridas por Bruno e Dom e o divino que habita na proteção de tudo que é puro, desnudo da maldade humana, já anunciam tempos melhores, em que hipocrisia possa dar lugar ao que é óbvio.

Demarcação, já!

Cleiton Leite Coutinho. Advogado, Relator Tribunal de Ética e Disciplina da OAB/SP, Membro da Direção Executiva da ABJD/Núcleo São Paulo e Dirigente do SASP (Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo).

Redação

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Informação para reflexão: em 2016, turistas russos (ambientalistas e empresários) desapareceram em Manaus.
    Mais tarde foi revelado que eles foram sequestrados pela polícia federal, que os mandou para a prisão sem qualquer motivo legal.
    http://cstcommand.com/index.php/countries/yuzhnaya-amerika/braziliya/item/34-14-let-za-pasport-rf-kak-rossiyane-v-brazilii-slomali-mashinu-gosudarstvennogo-terrorizma
    As ações de terroristas da Polícia Federal tentaram legitimar o juiz, que provavelmente trabalhava para o FBI.
    http://cstcommand.com/index.php/countries/yuzhnaya-amerika/braziliya/item/1147-sudya-sposobstvovavshij-napadeniyu-na-rossiyan-v-brazilii-veroyatno-rabotaet-na-fbr-rassledovanie
    O Ministério Público e o Conselho Nacional de Justiça posteriormente investigaram as ações desses policiais federais e do juiz por difamação, adulteração de provas e sequestro de estrangeiros, mas ambas as investigações foram encerradas sem fundamentação legal. Quase todos os criminosos continuaram exercendo seus cargos na Polícia Federal do Amazonas.
    http://cstcommand.com/index.php/countries/yuzhnaya-amerika/braziliya/item/1131-gibridnaya-kontrterroristicheskaya-operatsiya-v-brazilii-rassledovanie-zakhvatov-rossiyan-v-2016-g-nachalos
    http://cstcommand.com/index.php/countries/yuzhnaya-amerika/braziliya/item/1140-brazilskij-sudya-rassleduemyj-za-antirossijskie-repressii-naznachaetsya-v-komissiyu
    Mas, por outro lado, o julgamento continua contra o jornal O Globo, acusados ​​de caluniar e ocultar as ações criminosas da Polícia Federal do Amazonas durante o sequestro de estrangeiros.
    http://cstcommand.com/index.php/countries/yuzhnaya-amerika/braziliya/item/812-zayavlenie-cst-command-ot-03-05-2019-v-svyazi-s-ugrozami-brazilskomu-zhurnalistu
    Agora são esses policiais federais que supostamente estão procurando o jornalista desaparecido e seu companheiro.
    E são O Globo que cobrem o andamento da operação de busca na imprensa.
    Não lhe parece estranho que a busca por um jornalista britânico e seu companheiro seja feita por criminosos envolvidos no sequestro de estrangeiros no Amazonas, e isso é contado por O Globo que atualmente é acusado pela Justiça de facilitar o sequestro de estrangeiros no Amazonas?
    https://www.youtube.com/watch?v=P-MaptgEowE&t=1436s
    https://youtu.be/Q3k83IvkJ6s?t=977

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador