Lava Jato: Ahab cravou seu arpão num gigante, o destino do Pequod dos justiceiros foi selado

Um juiz deve seguir regras. No Estado de Direito essas regras são aquelas que constam da legislação. Num Estado Pós-Democrático o juiz segue apenas as leis de mercado. No primeiro caso o processo é um instrumento público para a realização de um fim público: a distribuição de justiça e a pacificação da sociedade. No segundo, o processo se transforma num instrumento público para a realização do lucro privado desejado por aqueles que tem cabedal para definir os rumos da economia. A pacificação da sociedade deixa de ser um objetivo do funcionamento do sistema de justiça e passa diretamente às mãos dos soldados encarregados de usar a violência contra a população.

O caso do Triplex não é começo do fim do Estado de Direito. Isso ocorreu quando da condenação de José Dirceu com base na literatura e numa versão distorcida da teoria do domínio do fato (aquela que foi rejeitada no caso da corrupção no Metrô/SP e na Fepasa) e  porque o réu não havia provado sua inocência. A condenação e prisão de Lula após o indeferimento de HC pelo STF, consolidam a substituição do devido processo legal pelo processo privatizado. E agora?

Bem… creio que agora cumpre a qualquer intelectual honesto refletir sobre as consequencias desta transição. O neoliberalismo venceu, as leis do mercado se tornaram as únicas empregadas pelo Estado e a violência estatal (naturalizada através do processo privatizado e do emprego da força bruta contra a politização da sociedade) nos remete diretamente à selvageria do capitalismo do século XIX em pleno século XXI.

Nada foi capaz de simbolizar melhor a selvageria do capitalismo do século XIX do que a indústria do óleo de baleia. Os lucros que ela proporcionou foram imensos, mas isso foi obtido através de uma atividade extremamente perigosa e sangrenta: a pesca da baleia.

Lula é um gigante. Se ele declarasse uma guerra aos seus inimigos haveria filas de candidatos a soldados no exército dele. Mas Lula é um gigante pacífico, tão pacífico quanto uma baleia. Quando foi presidente, ele criou um ambiente de estabilidade que fez a economia brasileira crescer de maneira sustentável com inclusão social. Tanto que o Brasil passou de devedor a credor do FMI.

Mesmo assim, os duplos modernos dos industriais de óleo de baleia do século XIX acreditam agora que o ex-presidente petista atormenta o mar como se fosse Moby Dick. A caça ao sapo barbudo (nine fingers, como diz Sérgio Moro aos seus amigos norte-americanos) não obedece qualquer racionalidade jurídica ou econômica.E por isso Sérgio Moro pode ser considerado uma versão moderna do capitão Ahab.

O “supremo senhor e ditador” do Pequod prometeu prêmio ao primeiro marujo que avistasse Moby Dick. A moeda de ouro que Sérgio Moro ofereceu aos delatores de Lula foi o perdão e a possibilidade de desfrutar o patrimônio que eles haviam amealhado.

Um capitão de baleeiro do século XIX tinha uma missão: caçar a maior quantidade de baleias, extrair delas todo óleo que fosse possível e conduzir seu barco em segurança de volta a Nantucket. O mercado exigia o lucro, a matança em alto mar era apenas um meio para um fim.

O capitão Ahab, entretanto, não se submeteu à lógica do mercado. Ele desejava se vingar de Moby Dick como Sérgio Moro queria se vingar de Lula. Conduzido pela irracionalidade, Ahab provocou o naufrágio do Pequod e a ruína de sua tripulação, causando um prejuízo imenso aos donos do barco. O juiz da Lava Jato se vangloria de ter recuperado alguns tostões, mas os danos que ele provocou à economia brasileira encheriam as páginas de dezenas de livros de economia.

“Capitães não desrespeitam a lei, eles são a lei, no que me diz respeito” – diz um marinheiro quando o primeiro imediato Starbuck cogita a possibilidade de remover Ahab do comando porque ele se desviou de sua missão (versão cinematográfica do livro de Herman Melville realizada em 1956). “Os justiceiros não desrespeitam a lei, eles são a lei, no que me diz respeito” – disse o STF ao negar o HC requerido por Lula.

Ahab consegue arpoar Moby Dick, mas o gigante dos mares o arrasta para o fundo do mar. Ele acreditava que tinha um encontro marcado com a vingança, mas o que ele encontrou foi algo diferente: a morte por afogamento em razão de ficar enroscado nas cordas dos arpões cravados na baleia. Sérgio Moro conseguiu prender Lula, mas o gigante que ele simboliza acordou com raiva.

O sentimento de injustiça que unificou milhões de petistas e que irá unificar dezenas de milhões de brasileiros não pode ser revogado por decisão judicial, nem controlado pelo mercado, nem suprimido pela imprensa. As forças incontroláveis que irão arrastar consigo tudo o que o juiz da Lava Jato representa foram acordadas. Elas não irão descansar antes que, como o famigerado capitão Ahab, Sérgio Moro acene para o público enquanto afunda inexoravelmente nas profundezas da história do Brasil.

 
Fábio de Oliveira Ribeiro

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