Financial Times não se informa com a mídia brasileira, por Luis Nassif

“Enquanto a América promove a guerra, a China promove a paz. Enquanto a China promove o comércio, os EUA impõem sanções econômicas”.

Definitivamente, o mais influente jornal econômico do planeta, o Financial Times, não lê nem assiste a mídia brasileira. Em relação ao papel diplomático do Brasil – e Lula – no mundo, o comentarista internacional da CNN garantiu que Lula só é visitado pelos presidentes das maiores potências globais devido à Amazônia.

Na viagem à China, o que se viu foi uma atoarda de críticas sobre a imprudência de condenar a participação dos Estados Unidos na guerra e, segundo uma proeminente comentarista de jornal de TV, trocar um mundo unipolar por outro – o que leva à conclusão de que ela considera que bipolaridade é a soma de duas unipolaridades.

Nenhuma preocupação em contextualizar as declarações, em analisar os reflexos nas grandes disputas geopolíticas. Tratam um episódio de alta repercussão como se fosse uma mera discussão de bar, ou de torcida de futebol.

A melhor avaliação foi do nosso comentarista Pedro da Costa Jr.

No artigo “Como a guerra na Ucrânia dividiu o mundo”, o articulista Gideon Rachman também confere o peso adequado às declarações de Lula. 

O primeiro parágrafo é dedicado ao sucesso da diplomacia chinesa que conseguiu, em uma semana, uma visita do presidente Emmanuel Macron, da França, e de Lula, do Brasil. E nem menciona a Amazônia. Enquanto isto, o presidente norte-americano Joe Biden “fazia uma viagem sentimental à Irlanda”.

O artigo prossegue citando as críticas de Lula aos EUA, por incentivar a guerra e também pelo poder do dólar, como moeda única. Não se deve esquecer que esse poder foi utilizado politicamente em pelo menos duas oportunidades: impedindo os bancos russos de participar do Swift (o sistema de troca de reservas entre os bancos) e o confisco das reservas cambiais venezuelanas.

Diz o comentarista: “As mensagens preferidas de Xi e da China para o mundo são claras: “Enquanto a América promove a guerra, a China promove a paz. Enquanto a China promove o comércio, os Estados Unidos impõem sanções econômicas”.

Esses movimentos estão causando preocupação em Larry Summers, o poderoso ex-secretário do Tesouro dos Estados Unidos. Mencionou conversa com um país em desenvolvimento, que lhe disse que da China ganhou um aeroporto e da América uma palestra.

E as críticas ao papel dos EUA não ficaram restritas a Lula. O artigo menciona Pratap Bhanu Mehta, um eminente cientista político indiano, para quem, “para grande parte do mundo, a reação dos Estados Unidos à invasão russa parece ser tão problemática quanto a própria invasão”.

Vista dos Estados Unidos e de grande parte da Europa, a invasão da Ucrânia seria um evento único – uma guerra de conquista territorial -, que merece uma resposta única. Houve sanções econômicas sem precedentes, congelaram reservas cambiais russas. E a Rússia não soçobrou porque manteve comércio com número substancial de países, incluindo a China, Índia e Brasil.

Vale a declaração de S. Jaishankar, Ministro das Relações Exteriores da Índia, de que a Europa pensa que os “problemas da Europa são os problemas do mundo, mas que os problemas do mundo não são os problemas da Europa”. A prova é o impacto nos preços dos alimentos e da energia. O congelamento das reservas russas acendeu a luz vermelha em todos os países, sobre o perigo potencial de manter ativos em dólares.

A dúvida é consistente. E se, no fragor das batalhas diplomáticas com a China, os EUA impusessem sanções financeiras ao estilo da Rússia para a maior nação comercial do mundo. Em vez de reduzir o comércio com a China, o movimento dos parceiros passou a ser  reduzir o comércio em dólares.

Conclui Rachman: “Os EUA podem estar certos de que a guerra na Ucrânia é uma luta de significado transcendente. Mas se não conseguir persuadir ou intimidar o resto do mundo a concordar, a própria posição global dos Estados Unidos pode ser corroída”.

Moral da história: em temas de tal complexidade, com tais desdobramentos, é chocante a incapacidade da mídia brasileira de tratar com um mínimo de profundidade questões que mexem com toda a humanidade, declarações diplomáticas de alto impacto e consequências sendo analisadas como se fossem bate-boca de bares.

Luis Nassif

20 Comentários

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  1. Acho que foi o Elias Jabour quem disse que o debate público nos Estados Unidos acerca do neoliberalismo, deixou de ser há um bom tempo no nível que é discutido aqui no Brasil. Acredito que nos botecos ou na mídia hegemônica discutimos mais sobre os Estados Unidos segundo uma visão “ocidental” do que os próprios (norte) americanos.

  2. Sequer a mídia sempre golpista brasileira percebeu que os falcões do norte,ao vestirem a carapuça,concordaram nitidamente com o que o presidente Lula disse: Que els são fomentadores da guerra enquanto o presidente Lula propõe um clube da paz. Simples assim!

  3. Mais um Império está caindo. A soberba e arrogância já não são suficientes para achacar os outros, a nova Rota da Seda impõe novas atitudes.

  4. A raiva do Financial Times em relação a Lula pode ser explicada de duas maneiras.

    1a.) Aquele jornal estava lutando para criar um enxame de Estados favoráveis à Ucrânia omitindo todos os crimes que foram cometidos pelos nazistas ucranianos. Isso fazia parte da estratégia de preservar a hegemonia do dólar. O que os barões da mídia ocidental querem é ampliar a guerra para invadir a Rússia a fim de colonizar vastas porções de terra do território russo.

    2a.) A principal preocupação do Financial Times é a crise social que irá inevitavelmente irromper nos EUA quando a hegemonia do dólar acabar. Há décadas os norte-americanos enriquecem explorando as vantagens monetárias de imprimir a principal moeda utilizada no comércio internacional. Assim que mais e mais países deixarem de usar o dólar o sistema financeiro baseado na hegemonia do dólar entrará em colapso e os norte-americanos vagabundos terão que trabalhar. O problema é que eles não terão trabalho por causa da desindustrialização dos EUA.

  5. Jornalões no Brasil informam-se mesmo é com seus patrões, a mulher do patrão, os lacaios do patrão. Bonner chora no aniversário do patrãozinho e a Globo adora golpes de estado. Financial Times morre de rir!

  6. Uauuuuuuuuuuuuuuuuuu, “o FT, o mais influente jornal econômico do planeta”, e….e….? o que quer dizer isso? Nada, absolutamente nada…- o FT é aquele que quando Lula brincava de “inclusão pelo consumo”, tratando a compra de carros e outras bobagens de consumo mais-ou-menos duráveis, colocou na capa o “foguete do cristo decolando”, e depois, quando Dilma tentou emplacar algo anticíclico de verdade, com Mantega à frente, para enfrentar a farra lulista dos subsídios sem quaisquer contrapartidas dos beneficiários (dentre eles, a FORD e a GM, será que é síndrome de Estocolma que acometia o Lula?), o FT (o mais importante…blá, blá, blá) colocou o cristo-foguete de cabeça para baixo, engrossando o caldo golpista que se cozinhava lentamente… Se a economia, como se apresenta hoje, pode ser considerada uma subciência, quase quiromancia voltada para engambelar os incautos com profecias autorrealizáveis, o que diremos de um jornal econômico?…sabemos todos, jornalismo apesar de recente, é a profissão mais antiga do planeta…

  7. Em resumo: a mídia cachorra quer os EUA como dono…a mídia com inveja (porque queria ser tão rica e influente com a mídia cachorra) quer que os donos sejam os chineses…

    Lulla só foi mudar de dono…país que não tem FFAA não desce pr’o play, caros inimigos…

  8. Lula é um estadista, mas o Brasil não é um estado para os estados unidos. Portanto, por mais importância que ele possa ter no mundo, o país que ele representa é só um lugar controlável e que, por isso, ele não pode nada. Na verdade, em breve tempo o tio sam começará a nos intimidar.

  9. Acredito que a grande mídia privada brasileira seja muito mais submissa ao grande capital ocidental, do que a grande mídia privada norte-americana, a ponto de falsear ou distorcer informações e fatos sem nenhum constrangimento nem preocupação com sua própria sobrevivência.

  10. A guerra dos EUA contra a Rússia na Ucrânia.
    Lula risca o chão mas não risca a faca, ainda.

    Edivaldo Dias de Oliveira.18423

    O título pode chocar alguns, mas é exatamente assim que vejo esse conflito. Não é a Rússia contra a Ucrânia nem o contrário, é o território ucraniano sendo arrendado pelos EUA, tendo a OTAN em segundo plano, para fazer guerra a Rússia.

    Devemos entender que uma guerra não começa apenas com os conflitos bélicos, quando isso ocorre, quando se chega a esse ponto, a guerra já foi muito longe. Ela precisa ser contida antes de chegar aí.

    Entendido isso, temos que ter clareza que a Rússia, desde o fim da União Soviética, não fez nenhuma ameaça a Ucrânia ou qualquer antigo membro, mas o contrário tem ocorrido desde então, sempre com a desculpa de que a Rússia é a verdadeira ameaça, parece aquela estória do bandido que rouba e sai gritando “pega ladrão”.

    Lula, em nome do nosso governo, ao apontar o dedo diretamente para os EUA, se posiciona claramente diante do conflito, identificando seu provocador e essa é a condição para entender e buscar solução para o conflito.

    Por que a Ucrânia “cedeu” seu território para a guerra, a troco de que? Ambição, em troca de uma promessa vã de entrar para a OTAN e EU, promessa de certo alimentada vagamente pelos EUA e demais parceiros da empreitada. Não podemos esquecer também que numa guerra muitas fortunas são feitas, especialmente por quem não está atolado nas trincheiras e o presidente da Ucrânia, a quem chamo de Bufão de Kiev é um homem ambicioso.

    Onde Lula quer chegar com suas declarações, o que o Brasil ganha com isso? Pergunta alguém. Respondo: Para chegar em algum lugar é preciso primeiro sair de outro, portanto a pergunta é: De onde Lula quer sair? Das garras, das amarras opressoras dos EUA, se não sair totalmente, ao menos pedir: “Amizade dá um tempo”.

    Lula, mais que nenhum outro líder político vivo, sabe quem esteve por trás dos 580 dias que passou encarcerado. Sabe quem derrubou Dilma, sabem quem quebrou a indústria de base brasileira, quem roubou dados sensíveis da Petrobras e quem espionou Dilma.

    Os EUA não é parceiro confiável para ninguém, nem para seus aliados, como a Alemanha de Merkel, que foi espionada, de Olaf Shols, que deve o gasoduto explodido, dias depois de sua visita a Casa Branca em Biden afirmou taxativamente que a Alemanha não levaria adiante o projeto e o chanceler não deu um pio. Não o é para a França que perdeu 6 encomendas contratadas pela Austrália que daria milhares de empregos aos franceses e que os trocou por submarinos atômicos americanos.

    É uma situação em que se apanha por ter cão (aliado) e também por não ter. O que o Brasil ganha?. Coragem para ver o diabo de perto, para fazer o enfrentamento e se for novamente golpeado, que todos saibam que o foi pelo inimigo fingido. O que perde o Brasil? O medo. Não é pouca coisa, pois assim como das gentes o que a vida exige é coragem, penso que dos estados também, né Rosa?

  11. A mídia brasileira opera nos limites da superfície e da conveniência. Como não tem dimensão de profundidade, agarras-se a qualquer coisa que bóia, mesmo que cheire mal.

  12. A diferença de objetivos entre os dois gigantes é revelador quando comparamos as estatísticas mais recentes sobre venda de armas. Os EUA aparecem em primeiro lugar com uma participação de cerca de 38% das exportações e a China vem em quinto com uma participação de aproximadamente 5%. Provavelmente, a exportação de armas, seja um dos poucos itens exportados pelos EUA em que eles superam a China. Se considerarmos as exportações de armas do bloco ocidecadente, o percentual atinge mais de 60%. Portanto, podemos concluir que do ponto de vista das exportações de armas, a guerra interessa muito mais aos grandes exportadores de armas do ocidecadente. A resposta a uma pergunta pode reforçar o nosso ponto de vista, basta relacionarmos o envolvimento dos EUA e da China em conflitos externos nos últimos 20 anos. Se estendermos o período para 70 anos, aí podemos afirmar que o negócio dos EUA é a guerra e não a paz.

  13. O problema, antigo de duas décadas, é o brilho e a importância do Lula. A raiva e a inveja ditam as manchetes e os enfoques de tudo que ele faz e fala. Se pelo menos ele se comportasse como o ex, que ia a reuniões internacionais e só conversava com os garçons. Imagina quando Lula estiver sendo destaque na posse do Charles…vai faltar remédio para crises hepáticas da elite brasileira.

  14. Na Rússia, todos os programas políticos de TV agora discutem o Brasil e Lula. Acho que nunca antes o Brasil e seu presidente foram discutidos com tanta intensidade na Rússia.
    Jornalistas e especialistas políticos russos estão bastante tranquilos com as declarações de Lula sobre o respeito à integridade territorial da Ucrânia, considerando a recusa em fornecer armas e o abandono do dólar como passos muito mais importantes.
    Acabei de assistir a uma discussão sobre como os EUA podem tentar derrubar Lulu com uma nova Lava Jato.

  15. A fala de Lula teve uma repercussão extremamente positiva no sul global e entre analistas independentes. Vivemos uma realidade paralela, a mídia Official e vassala repercute a fantasia propagada pela casa branca enquanto o resto do mundo analisa a realidade dos fatos.

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