Camilo Frade se inspira na ousada MPB para lançar um insubordinado e consistente álbum, por Augusto Diniz

Camilo Frade se inspira na ousada MPB para lançar um insubordinado e consistente álbum

por Augusto Diniz

O cantor e compositor Camilo Frade segue a trilha do êxito na música e lança nesta quinta-feira (17/1) nas plataformas digitais seu segundo álbum, o “Dente de leão”. O trabalho mostra consistência, de um artista que busca sólidas influências para amadurecer sem abrir mão da rebeldia.

“Quando compus o repertório, não queria falar de coisas tranquilas. Se pegar o disco de cabo a rabo, percebe-se que o corpo está presente em todas as músicas. É um disco muito carnal, que fala sobre prazer a dois, ou mais, ou sozinho mesmo. Mas sempre de uma forma que o prazer e o corpo libertam, sem romantizar muito ou estabelecer um padrão de possibilidades”, define Camilo Frade sobre seu novo trabalho.

O jovem de São Luiz do Paraitinga, um microcosmo musical encravado no Vale do Paraíba paulistano, afirma que buscou inspiração para fazer o CD no tropicalismo de Caetano Veloso (“Foi fundamental para que esse trabalho surgisse”, diz) e em cinco discos essenciais para entender a nova e ousada geração da MPB: “Ava Patrya Yndia Yracema”, de Ava Rocha; “É”, de Duda Brack; “Estilhaça”, de Letuce; “Rainha dos raios”, de Alice Caymmi e “Mãeana”, da própria (“Esses CDs foram meus maiores vícios”, declara).

O primeiro álbum “Por que nós”, lançado em 2013 e com apenas 15 anos, Camilo Frade já havia mostrado um incomum talento para a idade. E não é apenas pela voz, mas pelas referências apresentadas – com gravação de composições de Karina Buhr, Luiz Tatit, Carlo Rennó, Itamar Assumpção.

“Nesse trabalho me enxergo muito mais exposto. Não só pelo fato de ser um álbum com canções autorais, mas por me ver nessas músicas e saber que nelas atravessam uma visão de um todo que me move, como a política e uma consciência maior sobre a cultura popular de São Luiz do Paraitinga, que formou grande parte do que sou, além de questões que são minhas, porém compartilhadas por movimentos identitários e sociais”, explica ele a evolução do primeiro CD para este segundo, o “Dente de leão”.

Com olhar transformador na música, Camilo Frade identifica sua mudança de São Luiz do Paraitinga para Niterói (RJ), onde estuda ciências sociais (ele se forma esse ano) na Universidade Federal Fluminense (UFF), como crucial para crias suas composições. “Digo que foi no Rio que pude encarnar tudo o que compus. Se as músicas já partiam de um jogo de contrastes, como o bruto e o dândi, e mesmo o dente de leão, que é uma metáfora de força e também uma flor, o Rio me trouxe exatamente esse espírito”, afirma.

Influências de São Luiz do Paraitinga

As influências de sua terra natal são também fortes no disco. A primeira música, das nove do CD, intitulada “Voz do mangue” (Camilo Frade), é uma demonstração de suas raízes, que ele fez questão que abrisse o álbum. “É a música que me conecta com São Luiz na sua mais profunda ancestralidade, antes de partir para os ruídos de ‘Encarnado’ (de Camilo com seu irmão, Caio Frade), que é quando eu chego dando o recado do meu jeito”, conta.

Na gravação de “Voz do mangue”, o cantor convidou para fazer coro Nena Santos e Parê dos Santos (fundadoras e ex-integrantes do grupo Paranga, referência musical de São Luiz desde os anos 1970) e as ótimas musicistas da nova geração de lá: Lia Marques, Mara Rúbia e Patrícia Guimarães. Completa o coro ainda nessa música Elizabeth de Almeida.

A Festa do Divino Espírito Santo, com a presença das congadas e moçambiques, e o carnaval de marchinhas de São Luiz, “que também é o dualismo perfeito entre o sagrado e profano”, como define, foram as fontes aliadas de Camilo Frade para dar densidade ao seu atrevido trabalho influenciado pelos artistas símbolos hoje da inovação estética. O disco condensa muito bem a “dureza das guitarras com os batuques de percussão”.

Camilo Frade é de uma família de músicos. Além de seu irmão Caio, que divide quatro faixas com Camilo na autoria das composições, seu pai, Nhô Frade, é multi-instrumentista e seu tio, Galvão Frade, é violonista e maior compositor de marchinhas da folia luizense – o filho de Galvão, Tomas Frade, é primo de Camilo e também ótimo músico.

“Nele (Galvão Frade) encontrei não só uma referência musical que me ligava às congadas e moçambiques da Festa do Divino, como sempre respeitei muito seu compromisso com a cultura da cidade. Não é só questão de preservação, mas de conciliar a tradição com a vida que pulsa agora, e ele tem esse ritmo”, elogia o tio.

Sobre as letras poéticas das composições do CD, com palavras soltas, mas conectadas, Camilo Frade explica que “os momentos descritos pelas músicas estão mais preocupados com o transe do que em descrever quem é a pessoa ou as pessoas. O espírito das composições é mesmo bacante, pensado para cutucar”.

As nove faixas do CD “Dente de leão” são: “Voz do mangue” (Camilo Frade) –  de influência de congadas e moçambiques com lindo coro; “Encarnado” (Camilo Frade e Caio Frade); “Passe” (Camilo Frade e Caio Frade); “Uma noite em Americana” (Thar e Marco Rio Branco, outros dois grandes compositores e músicos luizenses) – pop típico de São Luiz; “Farol na cara” (Camilo Frade e Caio Frade), “Dente de leão” (Camilo Frade); o clássico bolero mexicano  “Sabor a mi” (Alvaro Carrillo) – “Ela é coerente com todas as outras músicas, um tanto passionais”, justifica a gravação; “Baque” (Camilo Frade) e “Nem bruto nem dândi” (Camilo Frade e Caio Frade) – essas duas últimas a maior expressão do talento de Camilo.

O trabalho foi produzido pelo próprio Camilo em conjunto com seu irmão, que toca guitarra no CD, e o virtuoso violonista João Gaspar. Os músicos que gravaram no disco incluem Mario Gascó (bateria), Esther Fietz (baixo, violoncelo e voz), Ronilson Misael (violino), Marcelo Nepomuceno (viola de arco), Nhô Frade (percussão nas faixas 6, 7 e 8), Marília Graziela (sax tenor nas faixas 1 e 5), Bianca Santos (trompete nas faixas 1, 2 e 5), Zilda Barreto (clarinete nas faixas 1 e 5), Filipe Ribeiro (alfaia na faixa 6) e Marco Rio Branco (ruídos na faixa 2).

A capa do álbum, criada pelo Mario Gascó (como citado, é baterista do disco), é uma alusão ao quadro “O Nascimento de Vênus” do pintor italiano Sandro Botticelli. A foto da capa é de Luisa Bilard.

Por favor, gravem o nome de Camilo Frade.

Redação

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