A tragédia da justiça brasileira

O título deste artigo é uma homenagem ao dramaturgo carioca Antonio José, nascido em 08/05/1705. Em 19/10/1739 ele foi queimado na fogueira pela Inquisição. Francisco Adolfo de Varnhagen narra o episódio:

“Perseguido era também já por esse tempo o jocoso dramaturgo Antonio José, nascido no rio de janeiro em 08 de maio de 1705 e que depois veio a ser queimado na fogueira inquisitorial. O seu processo, cujo original tivemos em mãos e  folheamos muito de espaço, apesar de sua extensão, pode por si só qualificar a horribilidade do tribunal, que naturalmente queimando-o, se vingou da frase de uma de suas comédias: “Toda justiça acaba em tragédia.” – ou de alguma outra alusão ao santo tribunal, que o condenou por convicto, negativo e relapso, que tal era a linguagem obscura e cavilosa com que este tribunal fazia tremer indivíduos, que viviam a milhares de léguas.

Os processos da justiça eram no estilo das sentenças; tudo mistério: chamava-se o réu, e em vez de se lhe revelarem as culpas de que era acusado, intimava-se-lhe que se confessasse, que expusesse tudo quanto em desabono da religião tinha dito ou ouvido, ou praticado, v. gr., comendo carne em dia de jejum, ou tomando certa comida ao sábado, o que em fase inquisitorial se chama jejuar judaicamente, isto sem se lhe indicar lugar, nem prazo, nem sócios. A primeira resistência seguiam-se as algemas apertadas ao torniquete, depois os tratos de polé, de água fervente, etc… – Por fim o infeliz começava a delatar. Tudo quanto revelava era logo escrito; todos os cúmplices de que fazia menção eram imediatamente mandados buscar, e recolher aos cárceres. Mas o acusado, tendo comprometido muita gente, ainda não havia acertado com a falta com a falta porque fora preso. Voltava, pois, a ser perguntado: sua memória não o ajudava ou sua língua titubeava receosa de comprometer mais amigos… Era outra vez posto a tratos:… declarava que tinha mais revelações a fazer… Novos desenganos!… e novos comprometidos!…”

Assim às vezes, de uma povoação, mais de metade tinha de ser ao menos chamada a delatar. E ai do que entrava por aquelas horrendas portas! Todos daí em diante o evitavam, temerosos de adquirir nome suspeitoso!…” (História Geral do Brasil, Tomo Quarto, Francisco Adolfo de Varnhagen, Edições Melhoramentos, 1952, p. 22/23)

O infeliz Antonio José ganhou um razoável verbete na Wikipédia https://pt.wikipedia.org/wiki/Ant%C3%B3nio_Jos%C3%A9_da_Silva. Rememoro aqui sua história em razão da  horribilidade do tribunal que continua perseguindo ferozmente Lula.

Apesar da reclamação feita pelo ex-presidente petista na Corte de Direitos Humanos da ONU (ou por causa dela), o MPF voltou a denunciar Lula. Como no caso do triplex, não são provas ou indícios de provas que fundamentam a nova acusação de tráfico de influência. Toda a denúncia foi construída mediante presunções. Os promotores agem contra Lula porque estão convictos do crime e da culpa. As evidências públicas e notórias de que Lula nem mesmo defendia a aquisição de caças Grippen nem mesmo foi levada em consideração.

Geoffrey Robertson, o advogado de Lula na ONU comparou os procuradores da Lava Jato e o juiz Sérgio Moro aos inquisidores medievais. A julgar pela descrição dada do processo inquisitorial dada por  Varnhagen, a comparação é procedente.

A nova acusação sacada contra Lula é misteriosa. Ela ocorreu no exato momento em que o escandalo da Odebrecht explodiu no colo dos principais líderes do novo governo (Michel Temer, Romero Jucá, Moreira Franco, José Serra, Aécio Neves, etc…, nem mesmo FHC foi poupado). A ausência de provas e indícios não inibiu a ação do MPF. Ao que tudo indica os procuradores da Lava Jato acreditam que Lula irá confessar que traficou influência em benefício do fabricante dos caças Grippen. Se o ex-presidente petista não “der com a lingua nos dentes”, como gostam de dizer os policiais, o silêncio dele será considerado suspeito e, portanto, prova auto-evidente da autoria e do dolo.

A única diferença entre este novo processo criminal movido contra Lula e aquele que resultou na morte do dramaturgo Antonio José são os instrumentos de tortura. Na atualidade a própria persecução criminal indevida é que foi transformada numa espécie de coação política, econômica e psicológica Sobre isto vide

https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/o-judiciario-como-instrumento-de-vinganca-partidaria-por-fabio-de-oliveira-ribeiro

https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/beccaria-e-os-skatistas-perversos-do-ministerio-publico

A horribilidade do tribunal parlamentar encarregado de julgar o fraudulento processo de Impedimento movido contra Dilma Rousseff encontra seu paradigma perfeito no Tribunal da Lava Jato. A presidenta eleita pelos brasileiros foi esmagada por seus adversários políticos e nem mesmo o STF se dignou a declarar a validade do mandato dela em face da inconstitucionalidade cometida pelo Parlamento.

É evidente que a defesa de Lula também não poderá contar com a isenção, independência e seriedade do mais importante Tribunal brasileiro. Afinal, os próprios Ministros do STF emporcalham a Corte ao trocar decisões judiciais por favores do presidente do Senado Federal (inimigo mortal do PT, de Dilma Rousseff e de Lula).

A quem Lula deve recorrer? Esta, meus caros é uma pergunta que só ele poderá responder. Uma coisa é certa, este novo abuso praticado contra Lula justifica plenamente a discussão e aprovação da Lei que visa coibir os excessos cometidos pelo MPF e pelos Juizes.

 

 

Fábio de Oliveira Ribeiro

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