Aplicabilidade da Lei da Ficha Limpa é questionada

Juristas divergem na defesa da Lei Complementar 135/2010

O relativo sucesso da aplicação da Lei Complementar 135/2010, chamada de Ficha Limpa, nas eleições gerais deste ano, não afastaram as críticas em relação ao texto e a constitucionalidade desta lei. O assunto foi tema de debate no programa Brasilianas.org, na TV Brasil.
 
Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), as Procuradorias Regionais Eleitorais indeferiram o registro de 250 candidaturas em todo o país neste ano eleitoral. Um dos pedidos impugnados foi do candidato a deputado federal Paulo Maluf (PP), que recebeu 250.296 votos, tornando-se o oitavo deputado federal mais votado por São Paulo.
 
O ex-prefeito de São Paulo não tomará posse devido a uma condenação no Tribunal Superior de São Paulo por superfaturamento na obra do túnel Ayrton Senna. Com a decisão, Maluf está sendo obrigado a reparar danos aos cofres públicos do município estimados hoje em 21 milhões de reais. Apesar de todo esse cenário, o advogado Francisco Almeida Prado Filho, Mestre em Direito do Estado e Sócio Fundador do Instituto de Direito Político e Eleitoral, convidado para o debate, compreende que a Lei da Ficha Limpa fere o livre exercício democrático para a escolha de um representante. “Quando se barra uma candidatura, se anula todos aqueles votos que foram dados”, lembrou.

 
Em contrapartida, o Procurador Regional Eleitoral de São Paulo, André Ramos, respondeu que a Constituição Federal já determina que a vida pregressa de candidatos aos cargos públicos no legislativo e executivo seja avaliada. Segundo o Procurador, 26 mil pessoas solicitaram seus registros para concorrerem algum cargo nestas eleições e somente 250 foram barradas.
 
Outra crítica feita à Lei Complementar 135/2010 seria por ferir o direito constitucional do princípio de estado de inocência. Portanto, uma pessoa condenada em primeira ou até segunda instância é impedida de concorrer às eleições pelo Tribunal Eleitoral, mesmo que mais adiante se prove sua inocência. Prado Filho também acrescentou que a Lei impede uma pessoa de exercer um cargo por oito anos caso tenha mandato cassado, renunciado algum cargo ou tenha sido expulsa por um conselho de classe relacionado à sua profissão. “Um dentista que é expulso do Conselho de Odontologia, por exemplo, é considerável inelegível”, completou. 
 
O advogado Luciano Santos, integrante do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, contra-argumentou lembrando que o princípio de estado de inocência foi uma das questões intensamente debatidas no Supremo Tribunal Federal quando a Lei da Ficha Limpa estava sendo criada. “O que o Supremo entendeu [sobre a presunção da inocência] é que [a Lei Complementar 135/2010] não ofende este princípio, mas sim protege a sociedade. [A pessoa condenada] vai ser afastada daquele período eleitoral. Resolvido o problema [caso seja absolvida] ela poderá voltar e disputar as próximas eleições”, explicou.
 
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Segundo Ministro do Tribunal Superior Eleitora, Henrique Neves, também convidado para o debate, o TSE utiliza critérios objetivos para examinar os processos enviados pelas procuradorias regionais. “Não usamos de subjetivismos para analisar se um candidato é bom ou não. Primeiro avaliamos se houve condenação por um órgão colegiado. Se houve a condenação analisamos em seguida se reúne os requisitos necessários para se caracterizar a inelegibilidade [quando a condenação ocorre por ato doloso, de impropriedade, implicando enriquecimento ilícito e prejuízo ao erário]”, pontuou.
 
Em outras palavras, a função do TSE é que os processos de inelegibilidade sejam aplicados igualmente em todo o território nacional. No entanto, o advogado Fundador do Instituto de Direito Político e Eleitoral, Francisco Almeida Prado Filho, destacou que o TSE agiu justamente de modo diferente no caso Maluf, isso porque o Tribunal de Justiça de São Paulo considerou, por quatro a três votos, que não houve conduta dolosa.
 
Logo, para garantir a aplicação da Lei da Ficha Limpa sobre Paulo Maluf, o Tribunal Superior Eleitoral precisou reapreciar sua condenação, entendendo que houve conduta dolosa. O Procurador Regional Eleitoral de São Paulo, André Ramos, defendeu o posicionamento do Ministro Henrique Neves, acrescentando, porém que o TSE tem a incumbência de interpretar casos como o de Maluf “para fins eleitorais”.
 
O Ministro complementou que se o candidato não concordar com a condenação que recebeu, permanecerá com acesso a todos os recursos institucionais da justiça brasileira para provar sua inocência em instâncias superiores. “Se ao longo do curso do processo de registro da candidatura o candidato conseguir uma absolvição, ou se o Supremo lhe conceder habeas corpus, [nós do TSE] consideraremos esse fato e imediatamente reverteremos à aplicação da Lei Complementar, tornando-o elegível”, completou.
 
Por outro lado o Ministro observou que a Lei da Ficha Limpa poderia ser mais simples, pois o modo como foi redigita permite uma diversidade de entendimentos. “Em cada inciso [a Lei] estabelece um tipo de contagem do prazo de inelegibilidade”, criticou..
 
O pêndulo ao centro
 
O Ministro Henrique Neves aproveitou o debate para fazer uma breve retrospectiva dos mecanismos que existiam para barrar candidatos a cargos políticos. Antes da atual Constituição Federal, existia a Lei Complementar nº 05, bem mais restritiva. Ela determinava que se a pessoa tivesse contra si qualquer denuncia ofertada pelo Ministério Público já seria inelegível. Durante as discussões para a criação do texto da Constituição de 1988 este princípio foi banido.
 
Apenas em 1990 se criou uma lei de inelegibilidade que, segundo o Ministro, partiu para o extremo oposto. Ou seja, somente quando houvesse uma condenação final, sem mais nenhuma possibilidade de recurso, é que a pessoa passaria a ser inelegível. “[Conforme essa lei], a inelegibilidade era por três anos, e os processos levavam mais de três anos para tramitarem, então, na prática, nunca se alcançava a inelegibilidade de alguém”. 
 
Por isso o Ministro concluiu que, hoje, “o pêndulo está começando a ser centrado. Se estabelece o impedimento da participação ativa de candidatos [condenados nas eleições, pelo menos a partir de uma decisão colegiada, ou seja, não de um ato único e exclusivo de uma pessoa”. 
Redação

6 Comentários

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  1. Dilma 47 x 43 Aócio Bafômetro Never

    Mais um datafolha. Haja dinheiro para tantas pesquisas. Agora são diárias. Só o aeroporto do titio para abrigar os Neves.

  2. Prefiro…

    … que a justiça seja rápida e o bandido vá pra cadeia.

    Isso é a justiça ineficiente fazendo média com o povão.

    Desde quando eu era menino ouço falar que Maluf é ladrão e nunca vai pra cadeia.  Pelo contrário! Sempre se candidata e se elege, menos quando disputa um cargo administrativo contra os tucanos amigos da imprensa.

    Se é ladrão, põe na cadeia! Simples assim.  Agora a justiça leva 30 anos pra condenar alguém e fica com essa palhaçada.

     

  3. A lei está certíssima

    Uma lei que barra um ensaboado como o Maluf não pode ser considerada ruim.

    Ele não se elege mais para cargos executivos; as suas últimas tentativas foram desastrosas; perdeu no primeiro turno.

    Porém sua torcida organizada sempre o elege para o Legislativo. Ganharia mais a sociedade se a justiça fosse mais célere e condenasse os vários políticos picaretas que temos para que nem concorram nas próximas eleições.

     

  4. iqual para todos

    O cidadão comum passa por isso todo o dia, quando faz um concurso publico, procura um emprego ou  ate mesmo procura crediario em uma loja, tem sua vida toda investigada e caso não tenha uma ficha limpa é negado acesso a essas coisas.

    Nos concursos, não pode ser inscrito no SPC ou SERASA, não ter ficha criminal ou respondendo processo criminal.

    Emprego, tambem não estar escrito no SPC ou SERASA, e pior investigam se voce processa antigos patroes, pois isto pode ser visto como impedimento a contratação.

    E crediario é pior ainda SPC, crimes ou processo civis e criminais.

    Então senhores concorrentes a cargo publico, se querem ter esse direito então tenham a ficha limpa para não contestarem  a lei. 

     

  5. Francamente, com o judiciário

    Francamente, com o judiciário podre que temos, conferir a ele tal poder de censura… é no mínimo arriscado. Essa lei já nasceu torta. E deu resultados como este: o Capiberibe, de Pernambuco, foi cassado porque um de seus cabos eleitoais teria comprado meia duzia de votos por 20 reais. Em compensação…. 

    1. Capiberibe era senador pelo Amapá

      Olá, Moraes,

      Capiberibe – que nasceu no Pará em 1947 – teve seu mandato  de senador pelo Amapá cassado em 2002 sob a acusação de que ele e sua mulher haviam comprado 2 votos por 26 reais.

      Aliás, recomendo a todo mundo a leitura da biografia deste brasileiro e suas inacreditáveis peripécias. Se fosse nos EUA já teriam filmado sua vida, com certeza. Ser perseguido pelo regime militar e conseguir fugir –  e depois ser perseguido pelo Sarney, é dose.

       http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo%C3%A3o_Capiberibe

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