Articulação judaica e ABI saem em defesa de Lula acusado de antissemitismo

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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Para judeus, a extrema direita comete crimes utilizando a comunidade judaica, e isso aumenta o antissemitismo

Presidente Lula recebe brasileiros resgatados da Faixa de Gaza, entre eles 17 crianças e adolescentes – Foto Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Uma estratégia utilizada pelos grupos conservadores e da extrema direita no Brasil, e também mundo afora, é a de rotular críticos das operações militares do Estado de Israel na Faixa de Gaza, Palestina, nesta atual escalada de violência em resposta aos ataques do Hamas do último dia 7 de outubro, como antissemitismo. 

O alvo preferencial são as organizações políticas ou líderes nacionais antagônicos às ideias destes grupos ou do que pretende o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, num esforço incondicional ou contornado de justificar os crimes de guerra e indícios de genocídio contra os palestinos como um direito de defesa de Israel. 

No Congresso Nacional, qualquer parlamentar que condene a violência imposta pelo Estado de Israel contra os palestinos é prontamente caluniado como antissemita por homônimos da extrema direita. Com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não tem sido diferente. Suas recentes declarações durante a recepção aos repatriados da Faixa de Gaza tem servido a este propósito. 

Luiz Felipe Pondé, filósofo e comentarista político, escreveu em seu perfil na rede social X (antigo twitter) que “o antissemitismo do governo federal e seus asseclas é um convite a atos terroristas contra judeus no Brasil. Se a Hebraica explodir quero ver as comemorações em Brasília e na Paulista”. 

A Articulação Judaica de Esquerda respondeu a Pondé de forma imediata. Na mesma rede social, o perfil oficial da organização se pronunciou: “sem controle, a retórica da extrema direita vai escalando e procurando novos limites. Dessa vez Pondé resolveu dizer que o governo convida para atos terroristas, como explodir a Hebraica. É totalmente inaceitável. É crime usando a comunidade judaica, e isso aumenta antissemitismo”. 

Ocorre que em momento algum o presidente Lula ataca os judeus ou a este povo delega a responsabilidade pelo massacre na Faixa de Gaza. Ao contrário, em sua fala Lula critica a postura do Estado de Israel e as decisões de seu governo por uma ofensiva militar que não tem preservado a população civil.   

O antissemitismo é como se define o preconceito contra pessoas de origem semita, em geral, árabes e judeus, mas também assírios e todos os povos com essa origem. O termo é historicamente associado aos judeus, pois a perseguição ao grupo no continente europeu se estendeu por vários séculos, chegando a episódios violentos e à sua expulsão de determinados países.

O que disse Lula 

Durante a recepção aos 32 repatriados da Faixa de Gaza, em Brasília, na noite desta segunda-feira (13), o presidente Lula criticou a violência empregada contra civis durante o conflito e os crimes de guerra cometidos por Israel. Disse não se lembrar de outra guerra em que bebês e crianças pareciam ser alvos preferenciais. 

“Aos 78 anos de idade, eu já vi muita brutalidade, muita violência, eu já vi muita irracionalidade. Mas eu nunca vi uma violência tão bruta, tão desumana contra inocentes. Porque se o Hamas cometeu um ato de terrorismo e fez o que fez, o estado de Israel também está cometendo vários atos de terrorismo ao não levar em conta que as crianças, ao não levar em conta que as mulheres não estão em guerra, ao não levar em conta que eles não estão matando soldados”, afirmou Lula.

O presidente citou ainda que já são 5 mil crianças mortas e 1.500 desaparecidas. “Certamente [as crianças desaparecidas] estão no meio dos escombros. E, depois, a destruição de tudo que as pessoas levam décadas para construir uma casa, uma rua, um prédio, uma escola, um hospital… e depois uma simples bomba detona aquilo”, acrescentou Lula.

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) se manifestou em defesa de Lula, também atacado por editoriais de jornais da mídia hegemônica alinhados à guerra contra o povo palestino perpetrada por Netanayu.

Para a ABI, nada justifica os crimes de guerra que estão sendo cometidos por Israel contra o povo palestino, matando mulheres e crianças, atacando hospitais e destruindo casas. 

“O direito de Israel reagir ao ataque do Hamas, no dia 7 de outubro, não autoriza o governo fascista de Benjamin Netanyahu a praticar um verdadeiro genocídio contra o povo palestino. Defendemos um cessar-fogo já e o estabelecimento imediato de corredores humanitários que permitam o atendimento dos milhares de palestinos feridos”, disse o presidente da ABI, Octávio Costa. 

Fala alinhada às Nações Unidas

Desde os ataques terroristas do Hamas, em 7 de outubro, e da resposta imediata do Estado de Israel com o cerco à Faixa de Gaza, que inicialmente ocorreu por bombardeios e depois pela ofensiva terrestre, a Organização das Nações Unidas (ONU) vem afirmando que a resposta do país tem sido desproporcional e fere o direito internacional. 

O secretário-geral da ONU, António Guterres, condenou os ataques do Hamas chamando-os de atentados terroristas, mas afirmou que isso não dá o direito de Israel agir de maneira semelhante contra o povo palestino, bombardeando a população civil, escolas, hospitais, ambulâncias, prédios dos organismos internacionais de ajuda humanitária e campos de refugiados. 

Líderes da União Europeia também condenaram os abusos cometidos por Israel, mesmo mais alinhados ao governo sediado em Tel Aviv. Países pelo mundo mudaram as relações diplomáticas com Israel e em alguns casos chegaram a retirar seus embaixadores do país. 

Diplomatas franceses no Oriente Médio e funcionários do governo dos Estados Unidos escreveram cartas aos seus respectivos governos criticando o alinhamento acrítico à matança na Faixa de Gaza, incitando seus líderes a terem uma postura mais equilibrada entre israelenses e palestinos. Ou seja, Lula não tem feito absolutamente nada que o associe ao antissemitismo. 

Quando o Brasil presidiu interinamente o Conselho de Segurança da ONU, no mês de outubro, propôs uma resolução de cessar-fogo, que seria aprovada, não fosse o veto dos Estados Unidos. Na Assembleia-Geral da ONU, neste mês, votou a favor de uma resolução pelo cessar-fogo, aprovada pela maioria dos países, com exceção de Israel, Estados Unidos e Ucrânia.

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Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

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