Sobre crenças – uma retificação, por Gustavo Gollo

Dias atrás, publiquei um texto sobre crenças, onde apresentei certas causas que historicamente acabaram levando à aceitação de dogmas, e critiquei essa aceitação. Durante a construção de meu raciocínio, no entanto, me vi forçado a admitir algo muito similar aos dogmas.

A verdade surge mais facilmente do erro que da confusão. (Francis Bacon)

Sobre crenças – uma retificação, por Gustavo Gollo

Dogmas são ideias impostas por alguma autoridade, e aceitas cega e impensadamente, veladas por algum tipo de respeito absurdo que se obriga não ver nada além do que é permitido por tal arbítrio.

Dias atrás, publiquei um texto sobre crenças, onde apresentei certas causas que historicamente acabaram levando à aceitação de dogmas, e critiquei essa aceitação.

Durante a construção de meu raciocínio, no entanto, para meu desgosto e constrangimento, me vi forçado a admitir algo muito similar aos dogmas.

Fui levado a tal admissão ao tentar responder à pergunta: uma vez que eu não entendo a teoria da relatividade, devo acreditar nela, ou não?

Como eu costumava responder que sim, que acreditava na relatividade, era honesto que eu admitisse o fato. Uma vez que não compreendo essa estranha teoria, no entanto, me vi forçado a assumir que o que eu fazia era admitir a autoridade dos que asseveram sua veracidade. Pressupondo que tais sábios baseiam suas próprias crenças em argumentações racionais e observações empíricas, confessei que o que eu fazia podia ser descrito como um dogmatismo de segunda mão, ou de segunda ordem.

A diferença entre as versões decorre do fato de que, ao contrário do verdadeiro dogmatismo, o tradicional, sustentado exclusivamente pelo poder em todas as instâncias, essa versão seria sustentada racionalmente, embora de maneira indireta. Meu pressuposto, ao admitir a veracidade de uma teoria não compreendida por mim, era de que os sábios que a me afiançavam haviam-na compreendido racionalmente, sendo essa racionalidade de segunda mão que garantiria minha crença em tal ideário.

Eu estava errado. Não me convém acreditar em algo que não compreendo, e que nem saberia descrever no que acredito, seria como fingir acreditar em uma palavra que designasse algo que não se soubesse o que fosse.

Costuma-se dizer “sim, eu acredito na teoria da relatividade”, ou, do mesmo modo, “sim eu acredito na mecânica quântica”, mesmo sendo ambas incompreendidas, quando seria mais apropriado formular: “eu aposto nessas teorias”, ou “eu confio na sabedoria dos que me afiançam que tais teorias são verdadeiras”, frases que atestam minha confiança nas teorias e na racionalidade de sua defesa, evitando, ao mesmo tempo, asseverar minha crença em formulações, para mim, abstrusas.

 

Penso que para a maioria isso parecerá um detalhe tolo, uma espécie de picuinha, mera rabugice de minha parte. A diferença, no entanto, é marcante e equivale à diferença de “eu vi”, “eu sei”, para “fulano disse”; em um dos casos quem está assegurando algo sou eu, no outro caso, é alguém que mo assegura O esclarecimento me alivia, tenho forte desapreço por dogmas, um verdadeiro desprezo pela aceitação subserviente e irracional de ideias, menosprezo que considero plenamente justificado, de modo que me distancio desse flagelo como se me desvencilhasse de algum tipo de sargaço pegajoso que houvesse grudado em minha mente. Não estou aceitando dogmaticamente uma ideia asseverada por outro, mas expressando confiança na racionalidade de seu juízo.

 

Desse modo, o esclarecimento acima permite-me manter entre minhas crenças tudo o que decorra dos sentidos e da argumentação racional, e apenas isso.

Veja também:

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Redação

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