O BBB do Holocausto sobre as declarações de Lula, por Luís Nassif

Ou Lula se movimenta rápido e ampara-se no poder político das indústrias. Ou, em breve, o Brasil voltará ao caos

O banzé montado em cima das declarações de Lula – invocando o Holocausto como uma maneira de radicalizar as críticas contra o genocídio de Gaza – tem o claro intuito de desestabilizar o governo. Não há outra explicação para esse carnaval no qual colunistas se vestem com as lantejoulas da adjetivação forte para aparecerem na passarela da mídia. Perto desse show de vaidades vazias, o BBB parece uma reality de pessoas maduras.

Os fatos centrais são deixados de lado:

  1. O genocídio de Gaza, que vitima mulheres e crianças, destroi escolas, universidades e hospitais e deixa clara a intenção de Israel de expulsar 2 milhões de pessoas de Gaza.
  2. A inércia do mundo ocidental, a ponto de dezenas de países interromperem ajuda humanitária porque supostamente se descobriu que meia dúzia de funcionários da ONU seriam simpáticos ao Hamas.
  3. A humilhação que a chancelaria de Israel submeteu o Brasil (o Brasil, sim, seus viralatas!) ao levar o embaixador brasileiro ao museu do Holocausto e gravar a humilhação a que ele foi submetido.

Com raras exceções, vira-latas mesmo! Na linha de frente, colunistas sem nenhuma noção sobre soberania nacional, sobre os rituais da diplomacia, analfabetos em geopolítica, colocando-se como um professor Girafalaes arrotando lições a Lula e deixando passar em branco o ataque à soberania nacional perpetrado pela chancelaria de Israel. Atrás, o coral dos colunistas secundários aplaudindo a comissão de frente, rápidos em engrossar o cordão dos puxa-sacos, porque conta pontos junto às respectivas empresas de comunicação. No meio, vozes minoritárias tentando exercitar um mínimo de jornalismo.

Qual a intenção dessa tentativa clara de desestabilizar o governo Lula? O fator Milei. Não bastou o desmonte do Estado, perpetrado a partir de Michel Temer. Não bastaram as 700 mil mortes na pandemia, a tomada do poder pelas milícias de Bolsonaro e pelos golpistas de Braga Neto. Não bastaram o desmonte de estatais, as negociatas com refinarias. Agora se quer o fim da saúde pública, da educação pública. E o Holocausto serve de állibi.

Não bastam as concessões ao mercado, o arcabouço fiscal e a missão impossível do déficit zero, o extremo cuidado do BNDES para tirar leite de pedra e montar fundos de investimento com capital privado, a reconstrução da saúde e da educação. Dia desses, dois dos jornalões saíram com editoriais criticando os gastos brasileiros com … educação!

  • No mundo: O Brasil ocupa a 45ª posição entre 178 países, em gastos com educação como proporção do PIB, de acordo com o Relatório Mundial de Competitividade 2023 do IMD.
  • Na América Latina: O Brasil ocupa a 6ª posição entre 18 países, de acordo com o Panorama Social da América Latina 2022 da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL).
  • Na OCDE: O Brasil ocupa a 36ª posição entre 38 países, de acordo com o Education at a Glance 2023 da OCDE.

E os jornalões criticando os gastos com educação.

Depois, abriram manchetes para o pedido de impeachment de Lula pelo partido Novo, por ter enviado uma ajuda humanitária brasileira ao departamento da ONU que ampara as vítimas de Gaza!

E por que isso? Porque querem uma Petrobrás privatizada, querem o fim do ensino público, querem o fim do SUS, dos últimos bancos públicos. E não se envergonham de compor uma frente com garimpeiros, millicianos, militares golpistas, pastores neopentecostais que se apropriam das verbas assistenciais.

Repito o artigo de ontem à tarde, no auge das manifestações contra Lula:

Há um conjunto de elementos para se acreditar em uma tentativa de pacto entre o crime organizado, o garimpo e igrejas neopentecostais para reorganizar a aliança que elegeu Jair Bolsonaro.

Os indícios são muitos:

  1. O importante “De Olho nos Ruralistas” mostrou as conexões históricas entre Valdemar da Costa, presidente do PL, e o garimpo.O artigo foi reproduzido no ICLO mesmo fez a UOL.
  2. Há tempos, Aldo Rebelo vem defendendo, junto aos militares, a exploração do garimpo na Amazônia como um ato de afirmação nacional. Hamilton Mourão já criticou o controle do garimpo em terras yanomami. General Heleno autorizou garimpo em Roraima. A Polícia Federal confirmou o boicote do Exército em ação contra o garimpo no Pará. A PF prendeu um general três estrelas que extorquia garimpeiros. Em 2020, o Ministério da Defesa proibiu uma ação do Exército contra o garimpo.
  3. Leve-se em conta que o garimpo – e o jogo de bicho – foram os setores oferecidos aos membros dos porões, quando veio a redemocratização.
  4. No momento, há um movimento que pretende formar uma frente PL-MDB-PSD entre outros para fazer oposição a Lula. Segundo a Folha, o MDB lotou de lideranças a posse de Aldo como Secretário do prefeito Nunes de São Paulo. Se essa frente se consolida e elege o sucessor de Artur Lira – com David Alcolumbre como presidente do Senado – acaba o governo Lula e qualquer pretensão de normalização democrática.
  5. Na outra ponta, o hoje inexpressivo Roberto Mangabeira Unger, reeditando os velhos vendedores de Bíblias do Velho Oeste, coloca seu projeto de país nas costas e sai vendendo – agora, para o próprio Bolsonaro.
  6. E a mídia avança em dois temas nítidos. O primeiro, a hiper-dramatização da fala de Lula, comparando Gaza ao Holocausto. Só a Folha de hoje traz 11 (onze!) matérias sobre o tema.
  7. O segundo tema são os ataques diários dos jornalões – especialmente nos editoriais – a Alexandre de Moraes. Jornais, como o Estadão, que saudaram a prisão preventiva de Lula, hoje utilizam o garantismo como arma de guerra contra o Supremo. Mesmo sabendo que Alexandre foi o grande defensor da democracia, inclusive correndo riscos de vida. Não fosse sua coragem e firmeza, Bolsonaro e seus militares certamente já teriam imposto censura à imprensa. Mas a imbecilidade brasileira é galopante.

É mais do que hora de Lula construir pontes políticas com a sociedade. O caminho é óbvio: um pacto de desenvolvimento e de governabilidade com a indústria e a produção – por tal entendendo-se a extensa rede de federações empresariais (da economia real), cooperativismo, agricultura familiar. A política industrial tem que ser conduzida diretamente pelo presidente da República.

Ou Lula se movimenta rápido, encontra uma marca para seu governo, reconstrói alianças com setor privado – depois da destruição das empreiteiras pela Lava Jato -, ampara-se no poder político das indústrias. Ou, em breve, o Brasil voltará ao caos e à destruição que caracterizaram o governo Bolsonaro. O antipetismo visceral fez a mídia bolsonarar novamente.

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Luis Nassif

10 Comentários

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  1. Uma preciosa análise conjuntural que descortina o cinismo e más intenções de uma mídia que está umbilicalmente ligada a interesses econômicos e financeiros escusos que não ajudam ao país. Disso concluirmos que o Brasil é um país gigante no mundo e tem um líder também gigante como Lula que falou e pôs o dedo na ferida de um genocídio que gostariam que caísse no esquecimento.

  2. Nassif, vc está correto, como de costume.
    E, também, assustador!
    Mas, como tenho feito em outras oportunidades, chamo a atencao para o fato de que, ao lado da “extensa rede de federações empresariais (da economia real), cooperativismo, agricultura familiar”, vc deveria considerar as redes de producao, consumo e servicos financeiros da ECONOMIA SOLIDÁRIA.
    Abraço solidário

  3. A fala foi desastrada , minha opinião , mas a reação de Israel só mostrou um governo nas cordas.

    Lembrar que antes do ataque do Hamas Bibi estava um palmo de ser derrubado e dois de ser preso.

    A mídia só faz o que faz sempre seguir um assunto como um viralata de vila segue um caminhão, aí passa outro e ela esqueçe o 1°.

    Jóias, quem fala mais por exemplo ?

  4. é muita fragilidade, muita desinformação de grande parcela. se frequentas portais uol, uai, etc, enormes secoes dedicadas a celebridades (seja lá o q.for isso hoje). se formos nos mais lidos, lá estarão de novo as tais celebridades. uma miss bunbum (?) foi flagrada na boca e seu parceiro, ator pornô. e ficamos sabendo por noticiosos antes “consagrados”. tamos fu, dir-se-ia. nao se lamenta: soubemos aproveitar nossa juventude nos 80/90, trabalhamos para consolidar a cidadania. decadencia: é tudo pet (o plástico).

  5. Ótima a análise, evitamos o golpe e retiramos o Capitão da presidência, mas ainda estamos no mesmo terreno minado. O capitão já foi uma tentativa de solução (frustrada) para a direita e neo liberalismo, mas se tornou um problema. Mas sem o capitão a direita, o mercado e outros podem se focar no ataque a Lula. Lira não está sozinho. Veremos crescer a idéia de parlamentarismo explícito ou não. Agregar parcelas imensas do bolsonarismo sem bolsonaro é a grande aposta. Mas caso não construam uma saída, voltarão a apostar em algo ou alguém da estirpe de Bolsonaro A imprensa continua a mesma, diuturnamente criando uma narrativa contrária a Lula,ao governo e forças progressistas. Mas, não tem nenhuma pressa de liquidar Bolsonaro e seu grupo. Pela ausência de candidato próprio, viável eleitoralmente, mantém Bolsonaro em standby. Tudo em nome de um garantismo agora ressuscitado.

  6. Tento me acostumar ao nosso destino desgraçado. Lula é um sujeito fora da curva, ninguém na esquerda tem nem uma fração da popularidade, do carisma e da aura dele.
    Sem Lula o Brasil desmorona. Ou seja, é questão de tempo.

  7. Perfeito Luiz Nassif, vc fez um compacto do q enfrentamos contra essa extrema direita q querem dominar o mundo, e infelizmente a massa pobre está caindo nesse golpe, se o povo não abrir os olhos e principalmente as cabeças, nosso final será triste nas mãos desses algozes!

  8. Que diferença faz MORRER SUFOCADO NOS ESCOMBROS DA GUERRA ou MORRER SUFOCADO NUMA CÂMARA DE GÁS?!… Guerra é guerra: alguém atira uma bomba, muitos morrem. Holocausto é holocausto: alguém abre a torneira de gás, muitos morrem. Discutir a fala de Lula é desviar a atenção da humanidade para mais um verdadeiro “holocausto” no mundo.

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