Em último debate, Milei retoma proposta de dolarizar Argentina e fim do Banco Central

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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Propostas foram retomadas por candidato da extrema direita em último debate com o peronista Sergio Massa

Sergio Massa e Javier Milei disputarão o segundo turno na Argentina neste domingo (19). Foto: Montagem com fotos das campanhas de Massa e Milei

O último debate entre os candidatos à Presidência da Argentina, Sergio Massa, do União pela Pátria (UxP), e Javier Milei, do A Liberdade Avança (LLA), ocorreu neste domingo (12) no auditório da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires (UBA), na capital federal. 

O segundo turno está programado para ocorrer neste final de semana, dia 19 de novembro. 

A Câmara Nacional Eleitoral (CNE), o equivalente ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no Brasil, estabeleceu um novo formato para o confronto discursivo entre os candidatos, que difere em alguns pontos dos anteriores.

Pela nova regulamentação, o debate foi dividido em dois blocos principais, que se desdobram em seis eixos temáticos.

Os seis pontos discutidos foram: economia, relações da Argentina com o mundo, educação e saúde, produção e trabalho, segurança, direitos humanos e convivência democrática.

Economia: Milei retoma discurso 

Como era previsto pelos analistas, a economia seria um dos temas centrais no encontro: seja pela atual situação da Argentina, às voltas com as consequências de um empréstimo junto ao Fundo Monetário Internacional (FMI), com esforços liderados por Massa, ministro da Economia, quanto pelas propostas controversas para a pasta defendidas por Milei desde as prévias. 

Ao contrário da postura que adotou a partir do final do primeiro turno, disputado em 22 de outubro, o candidato da extrema direita voltou a dizer abertamente que irá dolarizar a economia do país e acabar com o Banco Central retomando o discurso beligerante. “Sim, vamos dolarizar a economia, vamos fechar o Banco Central e acabar com o cancro da inflação”, disse Milei.

E seguiu: “a Argentina está em declínio há 100 anos. Temos 45% de pobres e 10% de indigentes”, disse, antes de completar: “o Estado é a origem do problema, não a solução”.

Massa dedicou mais da metade do seu tempo a mostrar as contradições e os resultados trágicos do plano econômico de Milei. Citou como ficaram as economias que foram dolarizadas, casos de Equador, Panamá, Zimbabwe e El Salvador. 

Ao mesmo tempo, o candidato peronista anunciou que o eixo central da sua agenda para a pasta será a renegociação da dívida com o FMI como ponto de partida para garantir o crescimento econômico.

O que dizem as pesquisas até aqui

Pesquisa da consultora Analogies dá uma ligeira vantagem a Sérgio Massa, com 42,4% das intenções de voto contra os 39,7% para Javier Milei, embora 12,4% dos inquiridos continuem indecisos.

Para a empresa CB Consultora, o economista de extrema direita prevalece sobre o ministro do atual governo, com 46,3% pontos ante 43,1%. Enquanto isso, a Consultoria de Imagem e Gestão Política (CIGP) coloca Milei à frente: 49,6% contra 47% de Sergio Massa, considerando 3,4% de indecisos.

As amostragens sobre para que lado pende a maioria do eleitorado argentino estão imbuídas não por desconfiança, mas por dois fatores importantes. O primeiro diz respeito ao ambiente de escuta, que quando virtual é tomada pela presença histriônica da militância de Milei.  

Como segundo fator estão os efeitos de uma eleição polarizada, com um lado tomando como estratégia lançar nuvens de fumaça na opinião pública, caso da campanha de Milei, em que as pesquisas sofrem em suas metodologias para dar conta da complexidade do cenário. No primeiro turno, por exemplo, Milei estava na frente nas pesquisas, mas Massa acabou vitorioso.   

Apesar de ter ficado em segundo lugar nas eleições gerais, mais de 6 pontos abaixo de Massa, Milei teria conquistado adeptos desde o acordo com a ex-candidata Patrícia Bullrich e o líder da aliança de direita Juntos pela Mudança (JxC), o ex-presidente Mauricio Macri.

No entanto, a instabilidade emocional demonstrada pelo líder ‘libertário’ em recentes entrevistas televisivas abalou as hipóteses da sua vitória. 

Além disso, o foco da atenção pública centrou-se recentemente em algumas das suas propostas controversas, como a venda de órgãos ou a negação de crimes contra a humanidade cometidos durante a última ditadura civil-militar.

Do lado de Massa, carrega o peso de uma gestão econômica que, para além da enorme dívida externa herdada, não tem conseguido resolver questões fundamentais para os cidadãos como o nível de inflação e a consequente perda de poder de compra de salários. 

O governo do presidente Alberto Fernández não é considerado como de sucesso, em que pese melhor que o de Macri. 

Relações Internacionais

Por isso o debate ganhou em importância, sobretudo para convencer eleitores indecisos – cujas margens podem ser decisivas no pleito final do próximo domingo (19). Além da economia, Milei vem acumulando controvérsias nas relações internacionais de um futuro governo. Massa explorou essa questão, sempre destacando a diferença sóbria de suas ideias. 

Para o peronista, é necessário conceber os vínculos entre Buenos Aires e o resto do mundo a partir de uma abordagem multipolar, sem descurar as relações com os seus principais parceiros comerciais – Brasil e Chile –, bem como com o Vaticano, visto que o papa Francisco é argentino.

Da mesma forma, o candidato UxP apresentou a questão da defesa da soberania das Malvinas, um ponto quente para Milei, que voltou a reivindicar a figura da primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, em cuja gestão entraram em confronto Argentina e Reino Unido, com saldo negativo para os hermanos.

“Thatcher é uma inimiga da Argentina, ontem, hoje e sempre. Nossos heróis são absolutamente inegociáveis, embora para você Thatcher seja uma figura destacada, para mim ela não é”, disse Massa.

Em resposta, Milei disse que “tivemos uma guerra e perdemos essa guerra. E temos que fazer todos os esforços para recuperar as ilhas por meios diplomáticos (…) chega desse nacionalismo barato”, concluiu.

Rompimento com Brasil e China 

Massa também não deixou de mencionar as possíveis consequências da saída do país do Mercosul ou do fim das relações com a China e o Brasil, que incluem o fim de milhares de vagas de trabalho e perdas econômicas bilionárias. “A política externa não pode ser dirigida por caprichos”, acrescentou.

Diante disso, Milei garantiu que em sua gestão os indivíduos poderiam se encarregar de comercializar mercadorias de seu interesse, sem que isso os obrigasse a manter relacionamentos com líderes cujas ideologias não compartilham.

Privatização das universidades

Na questão educacional, ambos insistiram nas ideias que já apresentaram durante a campanha. No entanto, a discussão rapidamente se voltou para o debate entre privatizar as universidades, que Milei defende, e o financiamento das universidades livres, defendido por Massa, o que levou a ataques pessoais.

Enquanto Milei defendia a criação de um Ministério do Capital Humano, Massa concentrava seu discurso na defesa do sistema de ensino público, com modificações no subsistema de ensino superior para o acesso a carreiras com oportunidades de emprego mais precoces.

Na mesma linha, o candidato peronista ratificou o seu compromisso com a saúde pública e o sistema solidário de doação de órgãos, numa resposta velada às polêmicas declarações que Milei fez há alguns meses em apoio à venda de órgãos, incluindo o sangue, um comércio pautado pela decisão do indivíduo que pode enfraquecer o sistema voluntário de doação.

Produção e trabalho

O candidato UxP oferece a criação de dois mil novos empregos através de uma aliança entre o Estado e os indivíduos, que será acompanhada de importantes incentivos fiscais, especialmente para as pequenas e médias empresas.

Além disso, Massa considerou a transformação da ajuda social em trabalho formal, como ações concretas para reduzir as lacunas regionais que persistem no país. Milei se ateve ao cerne de suas críticas: que Massa representa as políticas “do lado dos expropriadores” – o Estado.

Com informações do Pagina 12 e Clarín

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Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

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