Moro saiu do governo humilhado por Bolsonaro, é o que mostra documento

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Bolsonaro não fez o menor esforço para manter Moro em seu governo. Ex-juiz foi chorar as mágoas com a ala militar, que tampouco conseguiu sustentá-lo no cargo

Jornal GGN – O depoimento que Sergio Moro concedeu à Polícia Federal em Curitiba, no primeiro sábado de maio, mostra que o ex-juiz da Lava Jato teria saído do governo totalmente desprestigiado pelo presidente que ajudou a eleger.

Jair Bolsonaro respondeu a Moro um sonoro “lamento” quando o então ministro da Justiça ameaçou pedir demissão por causa da troca no comando da Polícia Federal.

Quando viu que a saída de Marcelo Valeixo seria inevitável, Moro tentou emplacar um substituto. Sugeriu dois nomes a Bolsonaro, mas o chefe, irredutível, informou que sua “decisão estava tomada”.

Não há, no relato de Moro, qualquer esforço de Bolsonaro para manter o ex-juiz no primeiro escalão.

Depois da conversa decisiva com Bolsonaro, Moro se encontrou com três ministros da ala militar do governo. Detalhou a crise. O general Ramos ofereceu uma “solução intermediária”, que envolvia convencer Bolsonaro a aceitar uma das indicações de Moro. O ex-juiz aceitou negociar. Mas Ramos jamais retornou com um desfecho.

A senha para a saída de Moro veio no dia seguinte: a exoneração de Valeixo no Diário Oficial, publicada sem sequer ter passado pelo gabinete do ministro da Justiça.

O fim da história todo mundo conhece: Moro, escanteado por Bolsonaro, não viu outra alternativa a não ser chamar a imprensa para uma despedida bombástica.

***

Confira o trecho do depoimento abaixo:

QUE na quinta-feira, dia 23 de abril de 2020, o Presidente enviou ao Declarante por mensagem de Whatsapp um link de notícia do site “O Antagonista” informando que a PF estaria no encalço de Deputados Bolsonaristas, QUE antes que o Declarante pudesse responder, o Presidente mandou outra mensagem afirmando que este seria mais um motivo para a troca da PF;

QUE o Declarante ficou apreensivo com a mensagem;

QUE o Declarante reuniu-se com o Presidente às 9h do dia 23 de abril de 2020, e trataram da substituição do Diretor Geral da Polícia Federal;

QUE o Presidente lhe disse que VALEIXO seria exonerado, a pedido, ou de ofício, e que nomearia o DPF ALEXANDRE RAMAGEM, porque seria uma pessoa de confiança do Presidente, com o qual ele poderia interagir;

QUE o Declarante informou ao Presidente que isso representaria uma interferência política na PF, com o abalo da credibilidade do  governo, isso tudo, durante uma pandemia;

QUE o Declarante também disse poderia trocar o Diretor VALEIXO desde que houvesse uma causa, como uma insuficiência de desempenho ou erro grave, mas não havia nada disso;

QUE o Declarante pediu ao Presidente que reconsiderasse, mas que se isso não ocorresse o Declarante seria obrigado a sair e a declarar a verdade sobre a substituição;

QUE o Presidente lamentou, mas disse que a decisão estava tomada;

QUE o Declarante reuniu-se  em seguida com os ministros militares do Palácio do Plananto e relatou a reunião com o Presidente;

QUE a reunião foi com os Ministros Generais RAMOS, HELENO e BRAGA NETTO;

QUE o Declarante informou os motivos pelos quais não podia aceitar a substituição e também declarou que sairia do governo e seria obrigado a falar a verdade;

QUE na ocasião o Declarante falou dos pedidos do Presidente de obtenção de Relatórios de Inteligência da PF, que inclusive havia sido objeto de cobrança pelo Presidente na reunião de conselho de ministros, oportunidade na qual o Ministro HELENO afirmou que o tipo de relatório de inteligência que o Presidente queria  não tinha como ser fornecido;

QUE os Ministros se comprometeram a tentar demover o Presidente,

QUE o Declarante retornou ao MJSP na esperança de a questão ser solucionada;

QUE logo depois vazou na imprensa que o Planalto substituiria VALEIXO e que, em decorrência, o Declarante sairia do governo;

QUE o MJSP foi contatado por muitos jornalistas e políticos querendo confirmar, mas que o Declarante entendia que não poderia confirmar, já que tinha esperança de que o Presidente mudaria de idéia;

QUE à tarde do dia 23 de abril de 2020, recebeu uma ligação do Ministro RAMOS indagando se seria possível uma solução intermediária, com a saída de VALEIXO, mas a nomeação de um dos nomes que o Declarante já havia informado antes, a saber: FABIANO BORDIGNON ou DISNEY ROSSETI;

QUE o Declarante informou que haveria um impacto ao governo e à sua credibilidade, mas que, garantida a nomeação técnica e de pessoa não proximamente ligada à familia do presidente, a solução seria aceitável;

QUE ligou para o Diretor VALEIXO, que concordou com a substituição sugerindo o nome de DISNEY ROSSETI;

QUE o Declarante ligou em seguida ao Ministro RAMOS e então manifestou a sua concordância, mas ressaltou que seria a única mudança e que não concordava com a troca pretendida do superintentdente da SR/RJ;

QUE o Ministro RAMOS ficou de levar a questão ao Presidente e de retornar, mas não o fez;

QUE à noite do dia 23 de abril de 2020, recebeu informações não oficiais de que o ato de exoneração do Diretor VALEIXO havia sido encaminhado para publicação;

QUE buscou a confirmação do fato no Planalto com os ministros BRAGA NETTO e RAMOS, tendo o primeiro informado que não sabia e o segundo informado que iria checar e retornar, mas não o fez;

QUE, durante a madrugada do dia 24 de abril de 2020, saiu a publicação, o que tornou irreversível a demissão do Declarante;

QUE o Declarante não assinou o decreto de exoneração de MAURÍCIO VALEIXO e não passou pelo Declarante qualquer pedido escrito ou formal de exoneração do Diretor VALEIXO;

QUE na manhã do dia 24 de abril de 2020, encontrou-se com VALEIXO e ele lhe disse que não teria assinado ou feito qualquer pedido de exoneração;

QUE VALEIXO disse ao Declarante que, na noite do dia 23 de abril de 2020, teria recebido uma ligação do Planalto na qual o Presidente teria lhe dito que ele, VALEIXO, seria exonerado no dia seguinte e lhe perguntado se poderia ser “a pedido”;

QUE VALEIXO disse ao Declarante que como a decisão já estava tomada não poderia fazer nada para impedir, mas reiterou que não houve, nem partiu dele, qualquer pedido de exoneração;

QUE VALEIXO poderá esclarecer melhor o conteúdo dessa conversa;

QUE perguntado em regra, como ocorrem as exonerações no âmbito do Ministério da Justiça e como se dá o processo de assinatura no Diário Oficial da União, respondeu

QUE pedidos de nomeação e de exoneração são assinados eletronicamente pelo Declarante e enviados ao Palácio do Planalto;

QUE não delegava essa função a subordinados;

QUE decretos assinados pelo Presidente da República e em concurso com o Declarante, quando sua origem era um ato produzido pelo MJSP, o que seria o caso da exoneração do Diretor VALEIXO, sempre eram assinados previamente pelo Declarante, pelo sistema eletrônico SIDOF, antes de encaminhados ao Planalto;

QUE nunca, pelo que se recorda, viu antes um ato do MJSP ser publicado sem a sua assinatura, pelo menos, eletronicamente;

QUE em virtude do ocorrido decidu exonerar-se e informar em pronunciamento coletivo os motivos de sua saída;

QUE o Declarante entendeu que havia desvio de finalidade na exoneração do Diretor MAURÍCIO VALEIXO, à qual se seguiria a provável nomeação do DPF ALEXANDRE RAMAGEM, pessoa próxima à família do presidente, e as substituições de superintendentes, tudo isso sem causa e o que viabilizaria ao Presidente da República interagir diretamente com esses nomeados para colher, como admitido pelo próprio Presidente, o que ele chamava de relatórios de inteligência, como também admitido pelo próprio Presidente;

QUE reitera que prestou as declarações no seu pronunciamento público para esclarecer as circunstâncias de sua saída, para expor o desvio de finalidade já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal e com o objetivo de proteger a autonomia da Polícia Federal;

QUE reitera que em seu pronunciamento narrou fatos verdadeiros, mas, em nenhum momento, afirmou que o Presidente da República teria praticado um crime e que essa avaliação cabe às instituições competentes

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

7 Comentários

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  1. Roeu a corda! Ou, quem … tem medo! Deu cagaço…! Ou vieram avisos sobre o advogado amigo de Curitiba nas delações premiadas, premiadissimas, da atuação da Drª Rosangela na APAE, sobre os parceirinhos do MP, por aí.

  2. Basta o Bozo dizer que a mensagem com matéria do antagonista pretendia evitar os vazamentos da PF para a imprensa. Onde está escrito o motivo? O paladino da justiça sabe o que passa na cabeça dos outros?
    Primeiro a gente prende o Moro, depois a gente tira o biro-liro.

  3. Por isto que Bolsonaro trata as relações como namoro ou casamento, já que seu hábito é o da separação. Esperamos que Moro não tenha deixado uma carta de amor para o caso de ser apagado pela milícia armada da família.

  4. E ainda vem essa ex-querda desmiolada achar que pode usar este papel higiênico usado para atacar o bozo/milicos.
    Parece filme do agente 86…

    1. Juiz conbinador de resultados, achou que o vencedor do jogo sujo iria manter alguma palavra. Foi usado igual Joaquim Barbosa, descartável para sempre

  5. Não vejo humilhação. Ambos, Moro e Bolsonaro, são criminosos mas de facções diversas: a de Moro é a de Youssef, Zucolotto, APAEs… mais perto do PSDB e das elites brasileiras, e a de Bolsonaro, a das milícias. Em comum só a lealdade aos interesses do capital do dólar, nos demais divergem.

    Conseguiram separar-se sem que um prejudicasse os negócios do outro.

  6. O moro é um moleque…”saio para preservar a minha biografia” ,sério ? numa epoca de crise, abandona o barco criando mais crise politica …. moro morreu politicamente e mostrou que é um mimado.

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