Os erros da imprensa na vitória de Trump

   A vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais norte americanas trouxe aos olhos do público dois perdedores: a imprensa e o mercado financeiro. Os dois apostaram na vitória de Hillary Clinton e jamais captaram o atual descontentamento dos eleitores norte-americanos com o atual projeto de governo  democrata. A derrota de Clinton não deveria causar perplexidade ou surpresa, mesmo contrariando as pesquisas eleitorais e expectativas do mercado financeiro de manutenção da atual situação. Se a imprensa tivesse feito seu trabalho como deveria fazer.

Os sentimentos de temor demonstrados por todo o mundo após a vitória de Trump mostram que os homens do mercado e da mídia a cada dia que passa estão mais distantes das preocupações do dia-a-dia do cidadão comum. A expressão “zona de conforto” foi muito empregada, logo depois da derrota de Clinton para explicar o mau trabalho dos meios de comunicação, dos pesquisadores de opinião e dos planejadores de campanhas eleitorais. Afinal, Trump, o bilionário encrencado transformado em apresentador de “reality shows”, parecia muito fora dos padrões estabelecidos pela política tradicional para vencer as eleições. Não havia razão para muito trabalho. O cenário era previsível o bastante para garantir a vitória de Clinton. Os interesses em jogo do país garantiriam a derrota final a Trump por inércia, acreditaram democratas e jornalistas liberais.

Dois jornalistas comentaram o erro colossal dos meios de comunicação norte- americanos: a especialista em mídia do Washington Post, Margaret Sullivan(9/11), e o jornalista Miguel Esteves Cardoso do diário “Público”, de Portugal(9/11). O jornalista lusitano explicou os três maiores erros da imprensa ao retratar Trump aos leitores: o primeiro foi acreditar que a campanha de ataques pessoais dirigidos a ele pela mídia poderia ter impacto decisivo nas urnas. Não aconteceu. Outro equívoco  foi apresentar o multi-milionário nos negócios imobiliários como alguém de fora do sistema político contemporâneo. Outro engano: Trump é um tipo incomum para os padrões da política atual, mas de forma alguma pode ser confundido como um “independente” ou um “outsider” na sociedade amedicana. Ele é parte da elite dirigente ianque, lembrou bem o jornalista do “Público”.

O terceiro erro da imprensa foi reforçar a imagem de Trump como um homem que não deveria ser levado em sério. Mesmo com seus comícios a atrair cada vez mais público, a imprensa não entendeu a mensagem. Era melhor esperar a vitória de Clinton do que fazer o labor básico do jornalista: gastar sola de sapato e trabalhar o sentimento da população nas ruas. O descontentamento anda solto entre a classe média baixa norte-americana. A imprensa acomodada ianque não percebeu. Os europeus, que nunca esconderam seu desgosto por Trump, acabaram prisioneiros da lógica formal. Esqueceram a lição da História que mostra o retrocesso presente em meio a nações poderosas e prósperas em vários períodos da História da Humanidade.

Trump foi eleito, moderou o discurso e ampliou o poder dos republicanos nos Estados Unidos. Ele também não é o aventureiro que a mídia anunciou: agora ele é responsável pelo maior poder militar do planeta. E pela economia do país que, mesmo sem ter saído em completo da crise, joga o peso de sua esperada recuperação em uma administração bem diferente das anteriores.

Sullivan, pelo Washington Post, apontou para a contradição entre jornalistas burgueses progressistas urbanos, e os trabalhadores sem emprego da classe média baixa, que se sentem esperançosos com anúncios de “novas políticas de imigração e negócios”e tendem ao conservadorismo. A analista lembrou o enorme espaço que a imprensa deu a Trump, no início de sua campanha. Mesmo quando desqualificou a grande imprensa ianque, Trump acumulou espaço nas coberturas políticas diárias da mídia. Ele mesmo soube preparar seu caminho ao poder. Ninguém trabalha a imagem de Trump melhor que ele mesmo. O que ele fez por si mesmo, a imprensa , com todos os seus escândalos publicados contra ele, foi incapaz de desfazer. A soberania do julgamento popular prevaleceu sobre a lógica dos planejadores de campanhas e das armadilhas dos acomodados “comentaristas de janela” das emissoras de TV e páginas da web nos EUA.

O resultado das urnas, ainda que signifique (entre outras coisas) uma vitória da soberania popular, não é garantia de um futuro melhor nem para os EUA ou para o resto do mundo. Pode vir a representar justo o oposto. A falha da imprensa norte-americana em não perceber a seriedade do avanço de Trump não dá margem a ela para prognósticos futuros que mereçam crédito.

A imprensa tomou as falas abusivas de Trump de forma literal, mas não o levou a sério, apontou Margaret Sullivan (citando Peter Thiel, o odiado co-fundador do “Pay-Pal”). Seus eleitores fizeram o contrario: não o entenderam “ao pé da letra”, mas com seriedade o aceitaram como um possível novo presidente para os Estados Unidos. Quando Trump falou no muro que separaria Estados Unidos de México, a ser pago pelo país azteca, os jornalistas quiseram sabre como ele faria isso. Quiseram detalhes. O eleitor descontente soube interpretar o significado da promessa de Trump e entendeu o que magnata dos imóveis de luxo quis propor: uma chance para outro modo de fazer política e romper de vez o atual paradigma tolerante da administração norte-americana.

(foto: Getty/ CNN Money)

Nota do autor: na publicação original deste artigo, no 1º parágrafo, segunda sentença, foi grafada duas vezes a expressão “de governo”: “de governo de governo”. O erro foi percebido e corrigido em edição posterior. Junto com a correção, vão as minhas desculpas pela falta de atenção. No último parágrafo, o nome “Trump” foi repetido duas vezes. Houve edição. Este artigo, se não existissem cópias cache, seria excuído. Não se faz crítica aos meios de comunicação com grafia errada ou desatenção no estilo. O artigo fica, com o repúdio de seu autor.

 

Redação

1 Comentário

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  1. Eleição de Trump

    O se deixou de lado também e foi observado pelo cineasta Oliver Stone aqui http://www.jb.com.br/internacional/noticias/2016/11/09/trump-pode-surpreender-eu-tinha-mais-medo-da-hillary-diz-oliver-stone/.

    Se observarmos sobre a política externa americana a Hilary é muito mais intervencionista e daquelas à moda antiga e poderia causar um estrago nas relações com outros países como Rússia e China que estão muito ressentidas com o governo Obama. Vamos observar um pouco este lado. Pois ao que tudo indica Trump vai estar mais voltado para a política interna. Hoje temos uma relação estremecida com USA, Rússia e China. E a coisa está tão feia que a Rússia já colocou seus mísseis balísticos na fronteira com a europa e por outro lado a Otan também deslocou seu contingente para lá. O estrago na vida de Hilary foi provocado também pelos emails divulgados pelo Wikileaks e depois do bloqueio do Assange o Anonymous assumiu a tarefa de acabar com a credibilidade dela. Claro o que foi exposto já havia um precedente mas este último que relatei teve um peso absurdo em quem estava indeciso.

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