Satisfação da sociedade com o encarceramento em massa é irracional e reproduz ódio, diz juiz Valois ao GGN

Carla Castanho
Carla Castanho é repórter no Jornal GGN e produtora no canal TVGGN
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Valois fala sobre os desafios de enfrentar o punitivismo enraizado numa sociedade que acredita no encarceramento em massa como solução

O programa TVGGN Justiça entrevistou Luis Carlos Valois, mestre e doutor em Direito Penal e Criminologia e juiz de Direito no Tribunal de Justiça do Amazonas, para analisar o punitivismo nas políticas de combate ao crime e a atuação dos órgãos de segurança pública do país.

Na conversa com o jornalista Luís Nassif, Valois afirmou que vê o punitivismo como um ciclo onde a sociedade direciona seu ódio para a punição de criminosos específicos, como se isso fosse resolver o problema da criminalidade – fruto da extrema violência e desigualdade social. “As pessoas não percebem que o ódio delas se vira para a reprodução desse próprio ódio”. 

“Quando a pessoa é assaltada pelo João na esquina, e o João não é preso, continua assaltando, foge, e na outra semana tem o José preso, essa pessoa descarrega o ódio dela todinho do João no José, como se isso fosse resolver a criminalidade. Como se toda a criminalidade fosse ser resolvida no José, que foi o único preso diante dessa criminalidade. É isso que eu acho que é o punitivismo no Brasil”.

E quando não se resolve a criminalidade, segundo Valois, “se lota a penitenciária para parecer, para satisfazer essa catarse na sociedade em relação à criminalidade. As pessoas que são presas, que por acaso são presas, acabam sofrendo todo o ódio e toda a revolta que há contra a criminalidade”. 

Para fins de comparação, o jornalista Luís Nassif, ao conduzir a conversa, rememora um dos maiores massacres cometidos por policiais e pelo crime organizado, os crimes de maio de 2006, período que deixou mais de 500 mortos em São Paulo em apenas duas semanas. 

“Na época, nós investigamos porque ocorreu tanto assalto. Porque não tinha inteligência da polícia, havia receptadores, lojas que adquiriam esses celulares roubados, então tendo a demanda, o pessoal ia, corria o risco de fazer o assalto. [As forças de segurança] São capazes de ir para a Baixada, matar um monte de gente por vingança, mas são incapazes de montar uma estratégia inteligente para combater o roubo de celulares, por exemplo”, ilustra o jornalista.

As pessoas descarregam um ódio nessa informação – essa informação de que a pessoa morreu, foi torturada, não teve seus direitos garantidos dentro da penitenciária. Essa satisfação com relação à violência é uma satisfação irracional, não resolve a criminalidade; agrava”, acrescenta o juiz

Nesse cenário, há ainda a indiferença em relação à violência brutal que aflora dentro das penitenciárias, à luz da rebelião que ocorreu em Manaus, e que vitimou 56 presos. 

“Quem matou essa gente, ninguém quer saber. Ninguém quer saber se essas pessoas continuam vivas. Uma pessoa que degolou a outra dentro da penitenciária vai ser solta um dia, porque a pena dela vai acabar. Nós criamos uma instituição pública onde pessoas degolam às outras, cortam a cabeça, o braço, e um dia vai ser solta”. 

Assista a entrevista completa no link abaixo:

Carla Castanho

Carla Castanho é repórter no Jornal GGN e produtora no canal TVGGN

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