Uma Lava Jato moderninha… e tipicamente romana, por Fábio de Oliveira Ribeiro

A única coisa que explica a cupidez dos procuradores do MPF é a certeza que eles aparentemente tinham de que seriam apoiados pelos mass media

Uma Lava Jato moderninha… e tipicamente romana

por Fábio de Oliveira Ribeiro

O acordo firmado entre o MPF e a Petrobras, que possibilitou aos procuradores “sacarem” uma quantia bilionária da companhia que será utilizada por eles sem qualquer fiscalização do TCU tem sido intensamente criticada por juristas e jornalistas. Aqui mesmo no GGN teci alguns comentários sobre esse tema. Volto ao assunto por outro motivo.

Esse acordo foi celebrado no contexto de uma guerra. Os procuradores dizem que declararam “guerra à corrupção”. Entretanto, quem se der ao trabalho de observar atentamente a seletividade da atuação do MPF durante a operação Lava Jato será inevitavelmente levado a concluir que os procuradores eles declararam guerra ao PT.

Renomados penalistas brasileiros e europeus, aliás, disseram que os princípios constitucionais do Direito Penal foram corrompidos para que Lula pudesse ser removido da disputa presidencial. Vários Ministros nomeados por Jair Bolsonaro são corruptos contumazes. Alguns deles são procurados pela Justiça. Portanto, indiretamente a Lava Jato fortaleceu a corrupção enquanto os procuradores diziam que a estavam combatendo.

De qualquer maneira, já que estamos falando de um desvio de dinheiro que ocorreu durante uma guerra (seja ela à corrupção, ou mais provavelmente ao PT), impossível não lembrar de um episódio antigo ocorrido em Roma.

Durante a Segunda Guerra Púnica, Roma deslocou legiões para combater os cartagineses na Espanha. Os soldados que lutavam a milhares de quilômetros da Cidade Eterna tinham que ser abastecidas por barcos. O problema é que as embarcações romanas começaram a ser atacadas por piratas que operavam no Mar Mediterrâneo. A solução encontrada pelo Senado romano para evitar os prejuízos dos publicanos (empresários privados que prestavam serviços públicos) foi criar um seguro.

Sempre que um barco que abastecesse as tropas romanas na Espanha fosse atacado, saqueado e afundado o dono dele receberia uma quantia equivalente ao prejuízo. O valor seria pago pela cidade de Roma. Pouco tempo depois desse seguro ser criado, o Senado de Roma foi obrigado a investigar um escândalo. Alguns “prestadores de serviço público” estavam usando uma artimanha para roubar dinheiro estatal.

Os vigaristas (cujos nomes Tito Lívio se recusa a mencionar para não constranger os descendentes deles que viviam em Roma quando ele escreveu seu livro) enviavam provisões para Espanha em barcos caindo aos pedaços. No meio do trajeto, as cargas eram transferidas para outras embarcações e os barcos velhos eram afundados. Então, os publicanos “supostamente prejudicados” por piratas exigiam o pagamento do seguro e vendiam as cargas “supostamente perdidas” em outra localidade.

Esse episódio, narrado com detalhes por Tito Lívio em seu Ab Urbe Condita Libri, ocorreu séculos antes de Cristo. Ele evidencia como a guerra é capaz de despertar a cupidez das pessoas que prestam serviços públicos. Ao celebrar o acordo com a Petrobras, os procuradores do MPF demonstraram uma audácia semelhante àquela dos publicanos romanos que decidiram usar a Segunda Guerra Púnica para enriquecer à custa do erário romano.

Um detalhe contextual importante distingue esses dois episódios separados por mais de 2.000 anos: a existência da imprensa livre em tempo real. Durante a Segunda Guerra Púnica, as notícias levavam vários meses para chegar em Roma. Hoje as notícias correm à velocidade da luz pelos cabos de fibra ótica.

A única coisa que explica a cupidez dos procuradores do MPF é a certeza que eles aparentemente tinham de que seriam apoiados pelos mass media. Entretanto, tudo indica que os beneficiários do acordo com a Petrobras cometeram um grave erro de avaliação. Essa semana a blindagem conferida pela imprensa à Deltan Dellagnol e seus colegas começou a desaparecer. O barquinho da Lava Jato foi torpedeado e afundado no exato momento em que os heróis lajateiros imaginaram que poderiam desfrutar sua carga em dinheiro? Essa, meus caros, é a verdadeira pergunta.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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