Ion de Andrade
Médico epidemiologista e professor universitário
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A Operação Tabajara e o oito de janeiro revelam a total indigência cognitiva da extrema direita, por Ion de Andrade

Minha hipótese nesse primarismo teórico é que a tomada dos prédios dos três Poderes foi confundida por eles como tomada do Poder.

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A Operação Tabajara e o oito de janeiro revelam a total indigência cognitiva da extrema direita

por Ion de Andrade

Desde a Grécia antiga, com Platão e Aristóteles, atravessando Roma com o Direito Romano, e a contemporaneidade, a política e o Estado são objetos do estudo de muitos pensadoresSão exemplos, no século XVIII Montesquieu, que modelou o Estado moderno com a divisão entre três Poderes independentes e harmônicos o Executivo, o Legislativo e o Judiciário; ou Hegel no século XIX, que desenvolveu uma rebuscada teoria da evolução social e do Estado que influenciaria Marx e os socialistas…

Outros pensadores abordaram o Estado sob o prisma da revolução, tais como os diversos pensadores do iluminismo francês, concentrados na transição social e, depois deles, Marx, Lenin ou Gramsci. Poderíamos multiplicar os exemplos adentrando no processo de independência dos Estados Unidos e da América Latina e das revoluções e insurreições vencidas no Brasil… Cada um desses movimentos se construiu em bases teóricas que ainda hoje influenciam o cotidiano da política…

Nada se assemelha à tentativa de golpe de Estado vivida pelo Brasil, nem no oito de janeiro, nem no putsch do Silveira…

Falta a essa extrema direita (sorte nossa) a noção sequer do que é o Estado de direito contemporâneo, ente dotado não somente do aparelho estatal mas, como constatou Gramsci, cercado por uma densa rede de trincheiras: a Sociedade Civil.

Não se toma esse Estado sem, primeiro, ter hegemonia na Sociedade Civil, não se toma a Sociedade Civil sem construir consenso, razão porque Gramsci excluiu no Ocidente, desde a terceira década do século XX saídas revolucionárias explosivas no Ocidente…

É verdade que um golpe não é uma revolução, ao contrário se ergue como um movimento reacionário aos avanços que estão historicamente maduros e podem eclodir (aliás esse é um tema crucial para a reflexão dos democratas: o que é que a extrema direita tenta desesperadamente coibir?), mas o conhecimento da natureza do Estado moderno seria importante para qualquer golpista que se preze…

Minha hipótese nesse primarismo teórico que mostra a completa indigência intelectual da extrema direita é que a tomada dos prédios dos três Poderes foi confundida por eles como tomada do Poder. É tão estúpido que é difícil de acreditar, mas a dinâmica do que ocorreu leva a crer que os amotinados pensavam efetivamente que haviam tomado o Poder e que dali, daqueles prédios mágicos, poderiam novamente convocar o mito para a presidência. Uma completa miséria cognitiva. Vale ressaltar que a tomada do Capitólio nos Estados Unidos talvez tenha sido movida pelo mesmo grau de estupidez. Talvez, lá também os revoltosos acreditassem que estavam tomando o Poder.

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A outra inacreditável iniciativa, anterior ao oito de janeiro, é o golpe do Silveira que inacreditavelmente galgou os mais altos escalões da República. Esse putsch do Silveira não somente é um crime, mas é, sobretudo, uma vergonha sob todos os aspectos. De forma simplificada um senador, da tropa de choque do bolsonarismo, tentaria gravar o Ministro Moraes na tentativa de obter pelo menos uma frase que o incriminasse e com magnitude suficiente para permitir a sua prisão (sumária) e depois o cancelamento da posse do presidente eleito (risos).

Dando razão ao Ministro Moraes, tudo foi tão estúpido que qualquer ser humano dotado de um mínimo de bom senso só poderia acreditar tratar-se de boato. A própria crença na veracidade do relato talvez recomendasse uma consulta psiquiátrica. Mas era verdade. E o senador, agente duplo, prevaricou ao não oficializar a denúncia e ao dar a ela ares de boato.

Ao se justificar o senador Marcos do Val alegou que não oficializaria a denúncia por tratar-se de uma questão de inteligência… Os fatos, no entanto, mostraram que em lugar de inteligência foi burrice mesmo, completa e rotunda.

Ion de Andrade é médico epidemiologista e professor e pesquisador da Escolas de Saúde Pública do RN, é membro da coordenação nacional do Br Cidades e da executiva nacional da Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela democracia

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].

Ion de Andrade

Médico epidemiologista e professor universitário

4 Comentários

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  1. Pelo contrário. Muito pelo contrário.
    Eles – os supremacistas (subentenda-se extremista) – são focados; decididos. Avessos a qualquer “lenga-lenga” político vão direto ao ponto. Inclusive com tudo calculado. Nada melhor para a ascensão dos supremacistas que a consolidação da informática e da internet. Aquela lhes dá os cálculos gigantescos e precisos; esta lhes dá o canal difusor, sem regras, aparentes ou reais, a confusão que todo bando precisa para criar o clima de desordem onde os assaltantes se dividirão em grupos: de diversão (os que atiram sem parar – inclusive atingindo alguns mortalmente – e quebram coisas); os estrategistas para localizarem os objetivos e fugas; e os executores-coletores. É TUDO CALCULADO! A palhaçada, o “TABAJARISMO, é tudo calculado. São PROFISSIONALÍSSIMOS!

  2. Tá puxado!

    Desde o inicio do coverno do capetão, não se chega a um acordo sobre as característica dele e do seu entorno entre os mais diversos analistas de todas as áreas.

    As análises vão da completa burrice, sendo a sua chegada simples obra do acaso e desprezo da elite, achando que poderia ter o seu controle, passando pela loucura ao nível de ser revelado que o traste fez 4 anos de análise, sem especificar se foi com o de Bagé e chegando a genialidade, afirmando que tudo foi feito de caso pensado por uma retaguarda militar para enganar a todos.

    Quando vamos fechar um diagnóstico? Eu fico com a primeira hipótese; Essa gente é primária.

    PS. Errei a palavra governo…deixa está, para eles ficou melhor.

  3. O golpe precisaria um pouco mais de qualidade para ser um produto das Organizações Tabajara. No máximo pode ser da concorrente Organizações Capivara.

    O que galvanizou a corja que assaltou o poder em 2018 é uma conjunção de grupos vagabundos: Organizadores de rachadinhas nos parlamentos, empresários que não aguentam concorrência de gente que progride com a economia em ascensão, concursados que acham de deveriam ganhar tanto quanto os bandidos que julgam e advogados que os defendem, financistas que não entendem de economia nem de finanças e produzem marolas no mercado para comprar barato e vender caro, militares que tem vergonha de admitir que sua profissão é ser irrelevante, policiais e empresários de segurança privada que precisam incrementar o crime para vender proteção, etc.

    O que tem em comum é precisarem muito do Estado para exercer suas disfunções, mas com imperfeições na obediência às normas para terem acesso a privilégios. Uma ditadura armada é o que permite tal estado de desleixo.

  4. Mas não mesmo, o 8.1.23 foi planejado, eu creio que eles queriam parar o governo ocupando os prédios, deu errado talvez o erro tenho sido não ter alguma liderança na invasão, mas “toscos” eles não são.
    O “evento” do senador ocorre no dia da abertura dos trabalhos do legislativo, não pode ser coincidência.
    CPI, congresso parado, imprensa cobrindo a CPI, depoimentos “bomba”.
    Reformas !? Wtf …

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