Carta a um Amigo de Direita, por Daniel Melo

Carta a um Amigo de Direita, por Daniel Melo

Compartilho com vocês uma carta para um colega de direita que quer entrar na vida política e é defensor das pautas moralizantes.

Prezado Colega,

Como pretendente a político você deve compreender corretamente o principal papel da política: o espaço onde se estabelece como toda a riqueza produzida por uma sociedade é dividida. O que coloco em todos os textos, já há muito tempo e não de agora, é que o combate a corrupção não é ou deveria ser um tema central da política.

A substituição do tema central da política pelo fetichismo moralista de combate a corrupção cega a todos para os problemas geradores do que somos como sociedade. Qualquer proposta transformadora deve ter por base um correto diagnóstico da situação socioeconômica sob uma perspectiva histórica e material, ou seja, baseado na realidade e não no idealismo pueril.
Como gosto muito de analogias, diria que a abordagem atual é similar àquela adotada pela medicina pré-moderna de atribuir as causas das doenças aos maus fluidos do corpo, ao sangue grosso, aos cheiros e outras construções metafísicas ou pré-científicas. Assim como àquela época, a incapacidade de compreender as causas reais dos fenômenos impede a cura dos males.

E qual é o fenômeno que mais nos caracteriza como sociedade? O que é que significa ser subdesenvolvido? Sabemos as características de ser subdesenvolvido: pobreza, violência, mortalidade infantil, ausência de direitos, apartheid social explícito. Mas quais as causas? O que nos torna o que somos?

É sobre isso que falo e de como a pauta moralista não só é incapaz de nos retirar dessa condição MATERIAL de existência como ainda irá piorá-la. Mas por que irá piorá-la? Já expliquei, mas por didatismo irei repetir.

Dois componentes principais ajudaram a desenvolver nossa condição de subdesenvolvimento, todas elas ligadas à nossa gênese histórica. A escravidão e o pacto colonial, essa é a nossa gênese socioeconômica. Essas duas instituições nos legaram uma sociedade com real apartheid social e um vínculo econômico de subserviência ao exterior. Ou seja, uma sociedade construída e planejada para poucos privilegiados, privilégios que em grande medida decorrem de uma associação econômica com o estrangeiro, em detrimento dos interesses do restante da população.

Esse processo tem um nome e não é exclusividade do Brasil, como se fosse um mal ter sido uma ex-colônia de Portugal. Chama-se de Teoria MARXISTA da Dependência. Em linhas gerais, essa teoria não coloca os países periféricos como exceções ao processo de desenvolvimento capitalista, mas sim como parte integrante desse processo. Nós somos tão capitalistas quando os EUA, Japão e etc. O que ocorre é que nós somos a parte explorada e historicamente expropriada do sistema econômico mundial. Os países desenvolvidos o são, em grande medida, por terem se capitalizado em cima dos países periféricos.

A atual onda de combate a corrupção vem associada a uma ideologia neoliberal explícita de seus membros. Barroso, Moro, Dallagnol, Janot, todos esses professam dessa religião. Segundo essa religião, o Brasil é o que é por questões de seu material humano ser imanentemente corrupto, por ter um Estado que impede o pleno desenvolvimento do capitalismo (seja lá o que for que eles entendam por capitalismo) e toda essa sorte de conceitos metafísicos (do mundo dos espíritos). A solução para esses é destruir totalmente com as empresas do que chamam de “Capitalismo de Compadrio” para que as empresas de fora venham soprar o vento do desenvolvimento nacional (MEO DEOS!)

Como já disse no início do texto, uma explicação errada para as causas do fenômeno tornam a profilaxia incapaz de  curar o mal. O que temos hoje é ainda mais grave, pois esses senhores (trato-os ainda de forma respeitosa, apesar de  não o merecerem)  utilizaram e utilizam de seus poderes para impor essa agenda ao país, à revelia das decisões soberanas emanadas pelo povo de escolher seguir por caminho diferente, mesmo que não fosse um caminho de total ruptura com o Brasil Legado (o que você chama de establishment). (Oposição histórica dos projetos Brasil Nação e e Brasil Legado em outro texto)

Esse senhores sequer compreendem o que torna uma nação desenvolvida ou não, nada conhecem do processo de desenvolvimento humano e de capitalização material necessários para essa árdua tarefa de transformar um país periférico nalgo diferente, mas se sente legitimados para derrubar presidentes,  caçar senadores, deputados e impor sua “visão de modernidade” que irá, na verdade, levar o país ao passado mais distante. Tudo isso sob o manto de um “combate a corrupção”.

O desenvolvimento é um processo de aprendizado coletivo, de domínio intelectual e material dos processos produtivos. Para alcançar o desenvolvimento é necessário que haja uso do excedente produtivo dum ciclo (ano, mês) pra financiar os custos para educar, formar e capitalizar negócios. Mas não é só  isso! É preciso também que haja a criação de um contexto que propicie oportunidades para esse desenvolvimento. Oportunidades que permitam esse conhecimento teórico transmutar-se em riqueza material tangível (não em especulação financeira).

A antiga lei do pré-sal e de conteúdo nacional tinham exatamente esse propósito, permitir financiar o desenvolvimento da cadeia produtiva de petróleo e gás com recursos próprios, que é a mais saudável forma de desenvolvimento. Por isso e por outros pontos é que eu defendo, em parte, o  projeto político que foi golpeado (note que nem é o governo PT que foi posto em xeque por essas instituições e pelo poder real, mas o projeto de político que eles representavam).

Agora a Petrobras está vendendo todos seus ativos a preço de banana pro capital transnacional, a exclusividade de 30% se foi,  conteúdo nacional não só não existe como há isenção pra eles trazerem de fora os equipamentos sem imposto algum, há inclusive cogitação  para a autorização pra embarque off-shore de petróleo! Todo esse crime econômico  imediato e de longo prazo (por tolher a possibilidade de desenvolvimento nacional e por expropriar as nossas riquezas) está sendo referendado pelos mesmos que se exaltam com um triplex meia-boca!

Novamente pergunto, como é possível que as pessoas estejam tão estupidificadas?  Como são tão cínicas, hipócritas e criminosas ? como?

É a ideologia my friend, a ideologia é a distorção sistemática da realidade… e a ideologia é a DE VOCÊS LIBERAIS, que estão tão estupidificados pela grande mídia e os sabujos do imperialismo que são incapazes de entender o que realmente se passa no aspecto MATERIAL do jogo, AQUELE QUE REALMENTE VALE ALGO E IMPACTA NA VIDA DE TODOS.

Ideologia daqueles que sequer compreendem o que é desenvolvimento, mas acreditam que ele ocorrerá por mágica apenas se não houver mais corrupção. Daqueles que se irritam com R$90,00 por filho dos miseráveis, mas recebem auxílio moradia, paletó, saúde e etc. Daqueles que acreditam que haverá desenvolvimento econômico quando tivermos um “verdadeiro capitalismo” sem entender que nós somos o capitalismo!

CopyLEFT -By Daniel Melo

Redação

14 Comentários

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  1. Parabéns pela análise lúcida
    Parabéns pela análise lúcida e didática. Só tem um problema: em meu pequeno universo amostral, pouquíssimas pessoas vão ler. Isso é desesperador.

    Explico:

    a) Em casa: 1/3. Neste exato momento esposa assistindo novela, depois, nem pensar, não vai ler. Filha adolescente: pendurada na internet o dia inteiro, instagram, fb, netflix, também não vai ler. E olha que minha esposa e minha filha são de “humanas” e são de esquerda, mas não adianta, não tem o hábito da leitura.

    b) trabalho: 1/40. Só eu vou ler o seu post. Ninguém vai ler. Repito, ninguém. Todos de direita, papagaios repetidores de TV globo e Globonews, Todos, técnicos, engenheiros, pessoal do escritório. Mais incrível ainda: pessoal da fábrica, TODOS discursando contra o triplex do LULA e comemorando a sua prisão. Todos exatamemte não. Alguns se refugiam na religião e são totalmente alheios a politica.

    c) parentes próximos. 2/10. Só tenho um parente não coxinha.

    d) amigos. Aí a coisa pega. TODOS COXAS. Todos. 100% reaças. Sim, preciso fazer novos amigos.

    Enfim, chego a questionar minha sanidade, será que não estou vivendo numa bolha?

    1. O estado atual das coisas não

      O estado atual das coisas não é fruto do acaso. O sistema de doutrinação/alienação está a serviço de que detem o poder econômico. A promessa de pluralidade das redes sociais foi sequestrado por robôs que semeiam a histeria e o fascismo. O cenário é do que chamo de encruzilhada civilzatória, um momento que é um divisor de águas da humanidade. De um lado a possibilidade de rearanjo social, político e econômico. Doutro o de hecatombe em grande escala.

      A deterioração interna e externa causam preocupação, a última vez que estivemos em situação parecida se sucedeu uma grande guerra mundial. Infelizmente não há perspectiva de um processo não traumático de transição entre o velho (atualidade) e o por vir.

      Em relação ao país, a saída passa por um processo de reencontro da sanidade coletiva! Assim como no cenário global, só teremos essa lucidez após muito sofrimento econômico e social, como costumo dizer recorrentemente: A realidade se impõe!

      Mas antes desse reencontro com a lucidez, afundaremos mais um pouco num fascismo tupiniquim. É como uma grande ressaca coletiva após muito consumo de drogas pesadas. Claro que no aspecto econômico estaremos totalmente em frangalhos e institucionalmente falidos. Será o momento de celebrar alguma ruptura com o velho para renascer o novo ( assembléia constituinte) e recomeçarmos nossa luta pela construção de uma nação.

      Como nos filmes que exploram o conceito de loop temporal, ficamos nesse flasback repetidamente, onde a sensação de deja vu é inevitável. O que há é um embate entre dois projetos de país, que nunca se resolve completamente, uma o Brasil Nação outra o Brasil Legado. Esses dois projetos têm relação direta com o posicionamento internacional do país, e por isso não é apenas uma questão local, mas internacional (em especial pra um país com as características do Brasil).

      Mas isso é outra estória! Sobre os colegas ainda em transe, não resta saída que não o diálogo. Claro que há alguns que estão tão fascistizados, que são casos para psicoterapia. Mas há alguns que já despertam da hipnose, lentamente… para esses já há abertura para o diálogo.. e é ali que devemos trabalhar…

      Abraços.
      PS: Há esse texto sobre o embate de projetos:

      https://jornalggn.com.br/blog/daniel-melo/o-embate-historico

    2. Você disse o que eu também

      Você disse o que eu também gostaria de ter dito, constato também é meu pensamento ou minha realidade.

  2. Muito bom, mas temo que

    Muito bom, mas temo que inútil. Uma vez coxinha idiota, sempre coxinha idiota. 

    São burros demais para perceberem o quanto são burros e nada os fará mudar de ideia.

  3. Para pensar
    1- se os frutos da sociedade devem ser repartidos pelo mercado baseando se na meritocracia, então o que chamamos de sociedade não tem mais razão de existir. Que abolamos a sociedade e passemos para uma divisão baseada na anarquia. Direitistas, assumam que são anarquistas e permitam que as forças individuais lutem pelo pedaço do bolo, com todas as consequências do jogo de força.

  4. COMENTÁRIO

    Só me responda algumas perguntas:

    1-Vc confiaria sua empresa à gerencia de uma pessoa como Dilma Russef ?

    2- Vc acha que ela não sabia o que acontecia na PETROBRAS?

    3- Se ela não sabia, ela é competente?

     

     

    1. 1 – A Petrobrás não é uma

      1 – A Petrobrás não é uma pequena empresa, não é gerida por uma pessoa apenas.

      2 – Até as pedras sabiam como opera a democracia de coalizão, desde sempre. O que não significa saber exatamente onde e como estão a desviar recursos, isso é outra conversa.

      3 – Se ela soubesse de todos os detalhes de tudo, não seria presidente, seria DEUS.

      4 – Sem mais.

  5. nacionalismo

    Eu fico aqui intrigado, onde o PT arrumou tanta gente idiota para nomear neste STF e outros tribunais. Como um partido de gente, as vezes visionária, não acertou em suas indicações. Como temos uma elite que acha que se estudaram merecem todas as benesses do mundo e o coitado que não pode ir a escola, nada merece.

  6. Um belo contraponto ao consenso fabricado
    Parabéns ao autor pelo texto. Destaca e rebate as falácias do senso comum atualmente amplificadas pelos grandes órgãos de imprensa.

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