Ion de Andrade
Médico epidemiologista e professor universitário
[email protected]

Institucionalizar a resistência democrática: Lula Livre!, por Ion de Andrade

Institucionalizar a resistência democrática: Lula Livre!

por Ion de Andrade

A prisão de Lula, apesar de ser o ato inaugural de uma ditadura explícita, é também o ponto mais alto, o clímax a que poderia ter chegado o movimento golpista que derrubou a presidenta Dilma.

Ora, tendo o golpe alcançado esse clímax, ainda que tenha poder de fogo para fazer pior em maldades e crueldades, já não poderá fazer nada de “maior”, posto que até um eventual assassinato do presidente Lula, não poderia ocorrer pelo grandioso protagonismo de uma sentença judicial.

Isso significa que no campo político-institucional, onde se dá o simulacro da legalidade, o golpe está consumado. Claro que a prisão de Lula, pelo princípio da similaridade, poderá pôr em risco a vida dos heróis anônimos que se erguem nas lonjuras do Brasil para representar o povo. Afinal, trata-se de ato inaugural de ditadura explícita. Tais crueldades poderão ocorrer por efeito de arrasto, pela vontade dos opressores de sempre, que poderão ser levados a ver, nesse desrespeito maior ao direito do líder, a autorização implícita para experimentar o sangue do povo em suas próprias bocas.

Mas, embora possam atingir esses gigantes anônimos, Lulas tão dignos quanto o que está preso, tal como Marielle, serão fenômenos frustrantes para os seus apetites ferais que começarão a sofrer de uma inevitável crise de abstinência. O tédio pouco a pouco infernizará as suas vidas como uma sede que não se pode matar.

Dito isso, por falta de alvo maior, o golpe, no seu desenho político-institucional último, está consumado.

Ora, isso significa que, apesar de ainda caótica e desencontrada, a iniciativa estratégica mudou de lado, como num jogo de xadrez, no qual, após a jogada, bate-se com a mão no cronômetro.

As festas e foguetes com que os conservadores festejaram a prisão de Lula são, na verdade, o ruído ensurdecedor da mão do golpe que, orgulhoso, como um felino que leva a sua caça entre os dentes, sinaliza que jogou! O golpe jogou.

A título de digressão; ainda que possa manter Lula preso perpétuo a sair apenas dentro de um caixão, essa jogada está corroída por uma derrota maior: a Lava Jato não conseguiu convencer a ninguém de que Lula é culpado.

Lula não somente está vivo e passa bem como cresceu eleitoralmente e no coração do povo e foi esse Lula (vitorioso) que foi preso, e não o outro, vencido e humilhado que era uma necessária pré-condição política para a prisão. Na falta do personagem se curvar ao script passaram mesmo assim à execução, como um cirurgião que por pressa e despreparo quisesse operar o paciente (e operaram) sem anestesia. As consequências naturalmente se farão sentir.

 

A resistência democrática

Claro que tamanho absurdo foi precedido em todo o Brasil e em diversos lugares do mundo de grande indignação, de magnitude, aliás, suficiente para dar a Lula a condição mitológica do líder popular injustiçado e perseguido só compartilhada por Gandhi, Mandela ou Luther King. Sim, pois se a prisão não se deu pela corrupção nunca provada, claro está que foi preso devido ao bem que fez ao povo. Ora, vivo ou morto, pobres daqueles que têm como oponente um mito dessa magnitude.

É claro que todos nós brasileiros indignados com essa injustiça tentaremos fazer todo o possível para, pacífica e democraticamente, devolver a liberdade a um Lula que também por essa brutalidade sofrida elevou, como homem universal e sangue do nosso sangue que simultaneamente é, a nossa nação à rara condição de ser o berço de nascimento de um personagem que, pela condição épica das suas lutas pelo povo, não será jamais esquecido pela História.

Esses corajosos lavajateiros, ao condenarem e prenderem sem provas esse personagem, não conseguem perceber que convertido à condição de Ideia que é, (de Espírito), mesmo morto os perseguirá, devolvendo, mesmo que os perdoe, toda a desonra que terão jogado contra ele.

É nesse contexto simbólico que se desenrolará uma resistência democrática, pacífica e resiliente e que, por sua natureza e pelo Homem preso, nunca descansará. Alguma dúvida sobre isso?

 

O que fazer

Naturalmente que 24 horas depois desse “parto a fórceps” do Homem/Ideia, e isso foi claramente percebido pelo próprio Lula, há muito pouco além das vigílias e acampamentos de uma militância que não o larga porque o ama e lá ficará se revezando e expondo a sua incurável e eterna lealdade e inconformidade. De todo o Brasil pessoas virão para prestar a sua solidariedade nessa nova Roma cívica em que a Lava Jato converteu Curitiba, cidade que foi sacralizada, pelo sacrifício imposto a um condenado em cuja culpa ninguém acredita.

O que poderemos, então, fazer concomitantemente às vigílias e acampamentos em torno do cárcere que seja mais permanente?

Essa é a discussão que institucionalizará a resistência democrática que lutará, dentro da institucionalidade que Lula próprio vem respeitando, por sua liberdade. Por ela uma série de projetos sustentáveis, deverão ser materializados.

Muito pode ser feito para dar vida a essa presença democratizante e humanizadora nessa nossa nova Roma.

O turismo político, por exemplo, poderia ser uma ideia sustentável e simples. Alguns guias treinados e a visita, mesmo que à distância, ao prédio que abriga a 13a Vara de Curitiba, aos edifícios que abrigam os trabalhos da Força Tarefa da Lava Jato, ao prédio da Polícia Federal onde Lula estará preso, dentre outros interessantes locais de visitação, como poderia ser a praça onde Lula discursou após o interrogatório.

Outra ideia é a organização de shows musicais com artistas do Brasil e do exterior numa agenda mensal. Bono Vox, Chico, Caetano, Chico Cesar, e tantos outros poderiam protagonizá-los, projetando o Lula Livre ou o Free Lula pelo mundo, como tantas vezes foi feito por Mandela na Europa.

Curitiba poderia também tornar-se uma cidade polo, tal como Roma o é para os estudos católicos, do aprofundamento das questões ligadas à democracia no Brasil com foco na Lava Jato e no lawfare. Estudantes do Brasil e das Américas poderiam encontrar-se com grandes nomes da academia e da política nacionais e estrangeiros em cursos nas áreas de Humanas e nas Ciências Sociais Aplicadas todos a preço de custo e sustentáveis movidos pela solidariedade dos instrutores, uma honra, aliás. Tudo sempre a serviço da ideia-força Lula Livre/Free Lula.

Finalmente outra contribuição maior seria a organização em Curitiba do Museu de Lula. Esse museu, certamente sustentável em pouco tempo, receberia milhares de visitantes do Brasil e do mundo anualmente. Nele parte do seu acervo pessoal, fotos emblemáticas, pensamentos e história retratariam o itinerário desse Herói do Povo trazendo a narrativa até o seu último discurso em São Bernardo e à sua prisão. Naturalmente, por isenção, todas as peças da Lava Jato, traduzidas em inglês e espanhol deveriam estar disponibilizadas para que os estudantes de hoje e os historiadores do futuro pudessem formar convicção própria sobre tudo o que ocorreu.

Outras ideias são ainda possíveis, como a de um Woodstock bianual de samba e rock que possa ser um encontro internacional da juventude democrática Lula Livre/Free Lula.

Sei que dentre os Lavajateiros há os teólogos que teimam em comparecer ao encontro com a História assimilados aos do Sinédrio. É bom que vejam que história é que estão ajudando a escrever e o que é que estão reservando para si como papel eterno numa trama que por sua total responsabilidade repete inacreditavelmente bem a matriz do sacrifício cristão do inocente.

 

 

 

Ion de Andrade

Médico epidemiologista e professor universitário

1 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Cara, não conte com Bono Vox nem com o Caetano

    Bono Vox só cantava de grátis para os imperialistas Bush e Tony Blair e o Caetano Veloso é tucano enrustido. É um artista de mão cheias mas deve estar aplaudindo o $érgio Moro. Não contemos com esses dois. É muito menos difícil contar com o Lobão.

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador