The Voice ratifica o fim da TV como referência musical, por Augusto Diniz

The Voice Brasil

The Voice ratifica o fim da TV como referência musical

por Augusto Diniz

Poucos dias atrás encerrou mais uma edição do famigerado The Voice, um modelo de show de calouros importado em 2012 pela Globo. O programa ratifica o fim da televisão como referência musical, assim como já tinha ocorrido em 2000, quando a mesma emissora tentou realizar sem sucesso o Festival da Música Brasileira.

O insucesso de ambas atrações como propagador do melhor (ou pelo menos de algo significativo) da música brasileira está intimamente ligado à forma com que a televisão passou a tratar esse tipo de manifestação cultural na sua programação diária.

A partir do último grande festival de música promovido pelo meio de comunicação, realizado em 1985, em que Leila Pinheiro chegou à final com a inesquecível música “Verde” (Eduardo Gudin, Costa Netto), a TV se entregou por inteiro ao sistema ditado pela indústria fonográfica e meia dúzia de empresários do ramo – a ideia é trabalhar massivamente em torno de um gênero, sem grandes ousadias, mas de fácil repercussão, dentro de um modelo monocultural, onde a busca da diversidade não possui nenhuma relevância e interesse.

O The Voice – incluindo a versão kids – é um exemplo clássico onde fomos parar. Basicamente as interpretações seguem o padrão sertanejo de interpretar, que tem o nome de oversinging – forma de cantar em que a voz a todo momento estica a pronúncia de uma palavra.

Embora pareça qualidade musical por que exige esforço vocal, na verdade escamoteia a competência em lidar com a interpretação, não dando tom criativo e diferenciado aos diversos trechos que uma composição musical pode oferecer – além de irritar pelo excesso de malabarismo vocal.

Está certo que a composição musical do sertanejo – pelo menos essa executada no rádio – é muito ruim, de letras que lembram a fase do chamado axé music, apelativas e repetitivas, mas no The Voice a lista de músicas a ser interpretada é até razoável – o problema são mesmo os monocórdicos cantores.

Porém, nada se compara a produção musical exibida nos festivais televisivos dos anos de 1960 e 70 – tanto que há muitos registros em livros e documentários desse importante momento da cultura nacional.

O Festival da Música Brasileira de 2000, ressalta-se, teve a presença de talentosos músicos, que estão aí hoje. O problema maior talvez tenha sido a transposição desse acontecimento para fora do auditório do festival e da tela da TV, alcançando públicos maiores e em diferentes meios.

Isso não ocorreu em nenhum momento naquele festival realizado há 18 anos, como antes inevitavelmente acontecia nos concursos desse tipo, influenciando e determinando tendências culturais profundas. O The Voice também segue essa linha de contribuição zero ao conjunto de aspectos que movem as estruturas da música enquanto arte.

A televisão se tornou estéril nesse campo por que todo o sistema que a permeia hoje não tem como padrão o incentivo ao processo criativo musical e de levar isso a outros limites, mas sim de se deter ao modelo de mercado unidirecional – por certo por que financeiramente é mais vantajoso e menos trabalhoso. 

Redação

3 Comentários

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  1. A música nova está na internet

    A TV perdeu relevância para música. Logo perderá para tudo o mais e será engolida pela internet.

    Mas não comemoremos. A internet mais monopolista que a TV, controlada por umas poucas companhias norte-americanas.

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