A república evangélica de Michel Temer

Jornal GGN – Em artigo para o El País, o escritor Luiz Ruffato fala sobre a força que a igreja evangélica ganhou no governo temporário do presidente interino Michel Temer. O texto lembra que o Partido dos Trabalhadores também se submeteu em grande medida à vontade dos bispos e deixou de lado compromissos históricos relacionados às lutas pelos direitos das minorias. No entanto, de acordo com o autor, é com Temer que os evangélicos ganharam protagonismo.

O artigo enumera as personalidades evangélicas que ganharam do governo interino cargos de ministros de Estado e secretários nacionais. E afirma que hoje a Frente Parlamentar Evangélica da Câmara dos Deputados conta com a participação de 39% da Casa (199 deputados).

O primeiro compromisso oficial de Michel Temer, como presidente interino, foi receber alguns membros da bancada evangélica, que o cumprimentaram e oraram por ele”, afirma Ruffato. “O fundamentalismo evangélico – com seu moralismo hipócrita – conta com toda a simpatia do presidente interino Michel Temer. Corremos o risco de, com seu apoio, vermos ruir mesmo aquelas modestas paredes levantadas ao longo das três décadas da nossa débil democracia”.

Abaixo, a íntegra do artigo:

Do El País

Temer inaugura a república evangélica

Por Luiz Ruffato

O fundamentalismo evangélico conta com toda a simpatia do presidente interino Michel Temer

O PT flertou com os evangélicos ao longo dos mandatos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente afastada Dilma Rousseff. Não fosse o engajamento de pastores e bispos das igrejas pentecostais, provavelmente o partido não teria ganhado quatro eleições seguidas. E para garantir esse apoio, os petistas abriram mão de compromissos históricos, principalmente aqueles relacionados à luta pelos direitos das minorias (mulheres, homossexuais, negros e índios), concentrando esforços na melhoria das condições de vida da população pobre, também público-alvo dos pentecostais. De qualquer maneira, os governos Lula e Dilma, ainda que reféns dos evangélicos, mantiveram uma agenda propositiva no campo social.

No entanto, não bastasse a vexaminosa performance do presidente interino Michel Temer – dois ministros demitidos em apenas 19 dias, por envolvimento com denúncias de corrupção – é em seu governo que os religiosos vêm conquistando espaço inédito na história da República. Segundo registro na Câmara dos Deputados, a Frente Parlamentar Evangélica – que inclui católicos, protestantes e pentecostais – conta hoje com a participação de 199 membros (39% do total da Casa) e quatro senadores. O primeiro compromisso oficial de Michel Temer, como presidente interino, foi receber alguns membros da bancada evangélica, que o cumprimentaram e oraram por ele.

Temer nomeou para o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior o presidente do Partido Republicano Brasileiro (PRB), Marcos Pereira. Bispo da Igreja Universal do Reino de Deus, Pereira é homem de confiança de Edir Macedo – foi diretor administrativo e financeiro da TV Record do Rio de Janeiro entre 1995 e 1999, e vice-presidente da Rede Record de Televisão, entre 2003 e 2009. A bancada do PRB conta com 19 deputados federais, entre eles, o controverso Celso Russomanno, pré-candidato à Prefeitura de São Paulo. A igreja de Edir Macedo elegeu sozinha sete deputados federais e um senador, Marcelo Crivella (RJ).

Para o Ministério do Trabalho, o presidente interino convidou o deputado federal pelo Rio Grande do Sul, Ronaldo Nogueira. Nogueira é pastor da Assembleia de Deus, igreja que possui a maior bancada entre os evangélicos – 19 membros da Câmara dos Deputados estão ligados a ela, além do senador Gladson Camelli (AC), que, embora não pertença aos quadros, elegeu-se com seu apoio. Os membros mais destacados da Assembleia de Deus são os deputados Marco Feliciano (PSC-SP), que em sua rápida passagem pela presidência da Comissão dos Direitos Humanos e Minorias, demonstrou toda a sua homofobia; e as deputadas Cantora Lauriete (PSC-ES), famosa por seu recente casamento com o também evangélico senador Magno Malta (PR-ES) – relação vista com maus olhos pelos seus pares já que ambos são divorciados – e Fátima Pelaes (PMDB-AP).

Fátima Pelaes foi nomeada por Michel Temer secretária de Políticas para as Mulheres, órgão subordinado ao Ministério da Justiça. Ela é investigada pela Justiça Federal por denúncias de envolvimento em um esquema que desviou 4 milhões de reais de verbas do Ministério do Turismo para capacitação de profissionais em seu estado. Além disso, ocupando uma pasta que tem como objetivo implementar políticas destinadas à mulher, Fátima já disse que, por conta de suas convicções religiosas, é contra o aborto (uma reivindicação antiga dos movimentos sociais), mesmo em casos de estupro, direito esse que já é garantido pela legislação.

Finalmente, para líder da bancada governista na Câmara, Temer designou o deputado federal André Moura, que, embora católico, está filiado ao PSC, partido de maioria evangélica, presidido pelo pastor Everaldo Pereira, importante membro da Assembleia de Deus, e que abriga o pré-candidato à Presidência da República, o fascista deputado federal Jair Bolsonaro (RJ). Moura é autor da Proposta de Emenda Constitucional que diminui a idade penal de 18 para 16 anos – aprovada pela Câmara e em análise no Senado – e da proposta que criminaliza quem “induzir ou instigar a gestante” a praticar aborto e dificulta o aborto mesmo em casos de estupro. Moura é homem de total confiança do deputado afastado Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara, réu no Supremo Tribunal Federal (STF) em processo por crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O líder do governo na Câmara também é réu em três ações penais no STF sob acusação de desvio de dinheiro público e é investigado em três outros inquéritos por suposta participação em uma tentativa de homicídio e no esquema de corrupção da Petrobras.

O fundamentalismo evangélico – com seu moralismo hipócrita – conta com toda a simpatia do presidente interino Michel Temer. Corremos o risco de, com seu apoio, vermos ruir mesmo aquelas modestas paredes levantadas ao longo das três décadas da nossa débil democracia.

Redação

20 Comentários

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  1. Chega a ser rídiculo essa

    Chega a ser rídiculo essa destilação de raiva contra os evangélicos. Certo mesmos são os islâmicos nos países do golfo né?!

    1. O autor se refere ao

      O autor se refere ao “fundamentalismo evangélico” , por isso acho que não leu o texto corretamente, ou então nem sabe interpretar. Existe  fundamentalista evangélico assim como islâmicos, porém nem todo eslâmico é fundamentalista assim como muitos evangélicos também não são. O texto trata de evangélicos que usam a política para se beneficiar .  De qualquer modo,   a política não consegue ser verdadeiramente uma política para todos quando se tem religião no meio, pois Constituição não é Bíblia.  

       

  2. E esses camaradas que falam

    E esses camaradas que falam em direitos das minorias, fazem preconceito religioso, sinto muito em dizer mas o Sr. Luiz Ruffato é um intolerante religioso!!!

  3. isso é muito complicado

    isso é muito complicado  vermos  o  país  ser dominado por gente  que  deveria  esta cuidando da fé  e  da religiao  e nao se misturar com politica.  Religiao e politica  nunca  se deram  bem, a  historia nos mostra que  foi muito desastroso  a interferencia da  igreja na politica. 

    Um  exemplo  marcante é o  periodo da  Santa inquisiçao. onde muita  gente acabou  na  fogueira por  causa de  padres bispos  e todo o clero   faniticos que  se achavam donos da verdade e nao aceitavam  que  ninguem ficasse  contra seus pensamentos. e  é o  que  esta se dando  hoje. 

    Religiao é  religiao  politica é politica, para mim  é  como a  gasolina e  a agua  nao se misturam, 

  4. Lamentavelmente, devo ter que

    Lamentavelmente, devo ter que dizer que hipócrita é sua república senhor Luiz Ruffato, porque, no Brasil, para mais de trinta milhões de evangélicos o governo é exclusivamente do reino de Deus.

    O senhor se inspirou em satanás, que se reveste de atitudes negativas em relação ao Todo poderoso, para dar respostas à escravidão do homem.

    Não significa, portanto, que meia duzia de políticos, que se dizem evangélicos e prostituiram a fé em Deus por dinheiro, representam os crentes na política, e muito menos o nosso libertador na terra. 

     

      1. Ritinha, você já leu a

        Ritinha, você já leu a Bíblia todinha pelo menos uma vez? Já foi batizada no Espírito Santo? Congregou em uma igreja evangélica? Fez cursos para liderança de célula? Teve um ministério na igreja?

        Então, se vc não sabe o que diz um verdadeiro evangélico, que conhece de Deus a sua palavra, como você se mete em assuntos que não tem qualquer autoridade espiritual para analisar?

        Eu te aconselho a não só fazer um arranjo específico nos seus escassos neurônios, como também consultar alguém que te instrua no plano divino. 

        1. Em tempos de nervos à flor da pele

          Miguel, não entendo a sua virulência na resposta à Ritinha.

          Se você ja participou de tudo o que elencou, não teria que ser mais compassivo com as ovelhas? Principalmente, com as que estão “perdidas” pelo caminho?

      2. É assim,

        com discursos apelativos e muitas vezes ininteligiveis, que “pastores” – na verdade picaretas engravatados que docoraram trechos da Bíblia – arrastam milhões de incautos para suas “igrejas” de esquina, onde deles arrancam até o leite das crianças, para “engrandecer a obra”! 

        No dia em que Jesus voltar, se voltar, esses vendilhões do templo terão muitas contas a acertar.

  5. Se o objetivo é bater no

    Se o objetivo é bater no governo interino como parece ser a ordem do pt para blogs e jornalistas cooptados ou que honestamente são de esquerda, vá lá, dá pra entender.

    Mas se é pra ser uma análise séria e objetiva, convenhamos…

    A ser praticado o desejo do sujeito, terão voz ativa nas regras da sociedade somente os que optam pela esquerda ou que sejam ateus ou os que, ainda que religiosos, que levem suas cfrenças na brincadeira limitando-a ao culto dominical ou ainda religiosos cujo credo seja do gosto da turminha.

    O autor poderia apontar , se for possivel, qual projeto de lei está em andamento que altere a permissão da constituição para aborto por conta de gravidez resultante de estupro. Aliás nesse aspecto, a igreja catolica é muito mais aguerrida na questão do aborto do que as variantes evangélicas e no entanto, o autor critica a segunda e não menciona a primeira.

    A democracia americana tem um mistura muito maior da religião com o estado e nem por isso ela deixou de ser uma democracia com uma constituição escrita no sec XVIII e com menos de 30 emendas ao texto.

    O suneito aponta acusação de desvio de verbas de uma politica evangélica, mas hipocritamente silencia sobre o fato de mais de 80%  dos ministros da presidente Dilma responderem a inquéritos. Mas hipocritas são os evangélicos com seu moralismo.

    Eu pessoalmente acho que e impossivel separar politica da religião, até porque mais de 90% dos eleitores possuem e praticam algum tipo de religião e é obvio que as regras e sistemas de nossa sociedade por consequencia natural possua influencia de ditames e dritérios religiosos. Ignorar isso é dizer que a grande maioria da população deve ser relegada ao limbo da cidadania devendo apenas votar e nesse caso votar certo, que seria no ótica do autor votar na esquerda.

    Eu pessoalmente acho detestável que a religião e politica se misturem em uma dança macabra.

    Mas não é admissivel que a religião evangélica seja desqualificada para unica e tão somente depreciar o governo interino.

     

  6. Prezados editores,redatores e

    Prezados editores,redatores e revisores do GGN, seção copy-desk.. presidente temporário e interino soa como um pleonasmo..

  7. deveria ser proibida a participação na política…

    e para qualquer representante de qualquer religião

    simplesmente porque ter fé e ao mesmo tempo ter poder para impor esta fé, sem dar mais importância às leis e aos constumes, ou práticas sociais expostas ao tempo, nunca deixou de ser uma mistura muito explosiva

    evoluímos quando sujeitos apenas às verdades, ou leis, que são reconhecidas por todos como passageiras, transitórias, nunca quando consideradas divinas, infalíveis ou inalteráveis

    1. sem falar que além do mais ainda acredito…

      que tempo virá em que o povo terá que pagar duas aposentadorias para tais políticos, uma como político e outra como representante religioso

      querem apostar quanto? tenham fé, apostem, pago 10 por 1 caso perca

  8. Educação sob ataque

    O governo golpista, cheio de conservadores, já retirou dinheiro da educação.

    Esta semana tivemos a notícia que uma seita cristã conservadora foi a uma escola de São Paulo, não se sabe bem fazer o quê.

    Agora, um projeto — mais um — quer impor o ensino do criacionismo bíblico nas escolas.

    http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2085037

     

    O projeto está apensado (anexado) ao PL8099/2014, que está apensado ao PL309/2011, todos projetos de ensino de criacionismo nas escolas.

        Com esse congresso que está aí, dominado por neopentecostais e evangélicos, não vou me admirar se esse projeto passar. Estado laico pra que, dirão eles.

    Por mim, as religiões podem dizer o que quiserem, mas não podem fazer isso em sala de aula de escolas públicas, ainda mais travestidas de “ciência”. Para ser ciência, tem que seguir os métodos científicos de investigação e análise de dados, coisa que as religiões e pseudociências não fazem.

     

        Destaquei alguns pontos, que acho importantes. O projeto todo me parece fracamente embasado.

    Temos:  “(…) origem do Universo e da vida partem do respeito ao postulado epistemológico de que a teoria do conhecimento científico se funda no arcabouço do conhecimento adquirido e acumulado pela humanidade ao longo dos tempos.” Primeiro: ciência é conhecimento, mas nem todo conhecimento é ciência. Ciência é o conhecimento obtido pelo método científico. O conhecimento obtido por outros métodos não é ciência, são cultura, tradições, etc.

        No projeto, temos:  “Nossa democracia deve propiciar a todos, como direito fundamental, o direito de que cada um conheça as diversas teorias existentes sobre a origem da vida, de modo que possa escolher em qual acreditar.”

    Ciência não é democracia! Nós não escolhemos o que mais nos agrada, como a natureza deve se comportar, nem como deve ser a origem do universo. Nós só podemos investigar, registrar e constatar.

        O autor diz que a maioria dos brasileiros é de cristãos. De novo, ciência não é democracia. Não se escolhe por maioria. Muitos acreditarem em algo não torna esse algo verdadeiro.

         O autor confunde teoria da evolução com as teorias que tentam explicar a origem do universo: ” teoria do evolucionismo darwinista, transmitindo a ideia geral de que a vida originou-se de uma célula primitiva que se pôs em movimento com os processos do Big Bang (Grande Expansão do Universo)” A teoria de Darwin só explica como novas espécies surgem a partir de espécies existentes. Nada diz sobre a origem da vida ou do universo. A teoria de Darwin não é sobre a origem da vida.

          Se o autor do projeto preza a democracia, melhor deixar qu cada família ensine religião a seus filhos em casa ou nos templos, ao invés de tranformar as aulas nas escolas em aulas de catecismo.

  9. Ruffato acerta ao apontar sua

    Ruffato acerta ao apontar sua mira para os “evangélicos” e conservadores religiosos como bases populares do golpe. Ao lado da ausência de pronunciamentos militares, essa é, certamente, a maior diferença entre o golpe atual e todos os outros de nossa História. Não há “padres de passeata”, mas há “pastores” de ovelhas, que caprinamente seguem seu destino. 

  10. Se algum dia aprovarem o fim

    Se algum dia aprovarem o fim do voto obrigatório, os poderes executivos e legislativos municipais, estaduais e federal cairão em poder dos evangélicos, ou melhor, dos que se valem destas seitas para chegar ao poder. Porque os “fiéis” serão orientados a não deixarem de votar nos candidatos pastores ou apoiados por estes, enquanto muita gente que não votaria neles vai deixar de votar para fazer outra coisa qualquer ou por preguiça.

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