A saída é uma “argentinização” do Brasil na prática política

Por ArthurTaguti

Comentário ao post “A demanda por políticas estatais universalistas

Muito boa a análise. Segue bem a linha do texto “os impasses do lulismo” de Safatle. O problema é que eu não vejo esta questão como vinda “de cima para baixo”. Não é porque a população teve um surto de indignação coletiva que a Presidência da República, Congresso Nacional e Governadores decidirão alterar uma estrutura de sociedade que é secular. É claro que governantes com uma boa visão estratégica farão esta leitura dos protestos, mas existem empecilhos muito maiores que a própria vontade deles.

Gerir este país, seja qual instância de poder for, sempre foi uma espécie de “gestão do atraso”. A precariedade do nosso Sistema Único de Saúde, o péssimo custo-benefício dos transportes públicos, a deteriorização do ensino público nas últimas décadas seguiu a lógica concentradora de riquezas que impera em nosso país. É uma situação de perde-ganha. Para que nossos serviços públicos chegassem ao estado de caos de hoje, alguns ganharam muito com isso; melhorá-los significa o caminho inverso, ou seja, alguns vão ter que perder dinheiro com isso.

As pessoas com mais idade e que moravam no Estado de SP sempre lembram que há décadas atrás se podia viajar a várias cidades usando a linha ferroviária, que foi paulatinamente desmontada até chegarmos a situação atual, que não só prioriza, mas eleva a condição de divindade o transporte individual e suas rodovias. Os mais antigos também lembram que a escola pública era ótima, e o seu desmonte fez surgirem vários grupos milionários de educação privada, como o Anglo, Objetivo, etc. E, no que tange a saúde, a precarização do SUS alimenta o mercado de planos de saúde.

São todos grupos poderosos e que possuem tentáculos em diversas instâncias de poder. Portanto, eu não tenho grande esperança de ver o PT cumprindo o papel de liderança nesta reforma. Sem contar que, mesmo que o partido se convencesse da necessidade destas reformas, não encontraria quórum suficiente no Congresso. 

O que vejo como única saída é uma “argentinização” do Brasil, não nos campos dos costumes ou cultura, claro, mas na prática política. Lá o Congresso aprova uma Ley de Medios porque se você parar em qualquer bar pra puxar uma conversa a chance é grande do sujeito conhecer com detalhes o assunto, sobre concentração da mídia, sobre o Grupo Clarin, e até é capaz do garçom e da faxineira entrarem na conversa pra dar seus pitacos.

É preciso isso, que a população continue preocupada com os rumos do país, que continue indo as ruas, que pressione os deputados, que se informe. Os congressistas têm que começar a ter medo de perder eleição antes de votar alguma coisa. Os governantes, se preocupar em cumprir o que prometeram. Um processo de baixo pra cima, o barulho das ruas que se contraponha aos lobbys de gabinete e financiamentos obscuros de campanha. Antes disso, não acredito muito em boa-fé de nossos políticos não..

Vamos ver para onde esse movimento vai. Será uma luta grande continuar direcionando o MPL para o rumo certo, e não desviá-lo em campanhas inúteis anti-corrupção, e que tais. A batalha é dura e vai contar com adversários poderosos. Isso é tudo que a direita quer: a total desatenção do povo para as políticas estatais universalizantes.

Luis Nassif

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