As relações brasileiras com o Irã no pós-eleição

Do Valor

Governo dos EUA crê que sucessão mudará relação entre Brasil e Irã 

Sergio Leo, de Brasília
14/06/2010

A saída de Luiz Inácio Lula da Silva do governo, no fim do ano, deve alterar a política brasileira para o Irã, acreditam autoridades dos Estados Unidos, baseadas nos diálogos com o governo brasileiro. Os contatos entre os dois governos consolidaram a impressão, em Washington, de que a ênfase na atuação contra as sanções ao Irã é uma decisão pessoal de Lula, mais que um interesse da diplomacia ou das forças políticas brasileiras. Qualquer que seja o sucessor, não contará com a popularidade interna de Lula, em torno de 80%, nem terá razões para manter o tema como prioridade de política externo, acreditam os americanos.

No Executivo americano entende-se que o Brasil aproveitou a questão do Irã para testar o poder adquirido no cenário mundial, sem risco de grande desgaste na política interna. É um incômodo que pode, no entanto, ser absorvido em favor do interesse em aprofundar a relação entre os dois países. No Congresso, que tem forte peso na definição da política externa dos EUA, porém, a aproximação com com o presidente do Irã foi muito mal recebida e deu força a parlamentares, como o já poderoso presidente da comissão de Agricultura, Chuck Grassley, contrários à aprovação de projetos favoráveis ao Brasil. Reduziram-muito as chances de extinguir a taxa cobrada sobre o etanol brasileiro .

SeguSegundo comentaram autoridades americanas a integrantes importantes do governo brasileiro, dificilmente surgirão iniciativas de represália contra o Brasil nos EUA, mas também nenhum parlamentar simpático ao Brasil se arriscará a defender o país em temas polêmicos, como o etanol. Do ponto de vista do governo dos EUA, a orientação é “engolir o sapo” e buscar pontos de aproximação com o governo que é, hoje, o aliado mais importante de Washington no continente sul-americano: uma grande democracia, favorável ao livre mercado, com prestígio regional e internacional e, não menos importante, um grande mercado para companhias americanas.

A secretário de Estado, Hillary Clinton, atua para evitar um agravamento dos pontos de atrito entre os dois países. Um deles é a situação em Honduras, objeto de discussão recente na reunião da Organização dos Estados Americanos (OEA), no Peru.

Os EUA querem a reintegração, à OEA, de Honduras, afastada da organização após o golpe de Estado que depôs o presidente Manuel Zelaya. O Brasil e outros países da América do Sul insistem em exigir do presidente eleito, Porfírio Lobo, a anistia de Zelaya, acusado de violar a constituição. Hillary, após a reunião dos representantes de governo, teve conversas reservadas com o enviado brasileiro, o secretário-geral do Ministério de Relações Exteriores, Antônio Patriota, para buscar um acordo. Concordaram em acatar a decisão de uma comissão da OEA criada especialmente para analisar a situação de Honduras e apontar uma saída.

As autoridades americanas pretendem enfatizar os pontos de concordância entre Brasil e Estados Unidos, mas é evidente o mal-estar deixado pelo episódio com o Irã, especialmente a divulgação de trechos da carta enviada pelo presidente Barack Obama a Lula, apresentados pelo governo brasileiro como prova de que o Brasil seguiu um roteiro apontado pelo americano como o necessário para reiniciar negociações com o Irã.

Essa versão é contestada em Washington, onde é lembrada a sucessão de conversas, nas quais teriam sido explicitadas exigências mais severas ao Irã, entre autoridades brasileiras e membros do alto escalão americano, como o assessor para Segurança Nacional, James Jones, o subsecretário de Estado, William Burns, e a própria Hillary Clinton, que, após a carta de Obama, teve uma conversa de 30 minutos com o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, para deixar claro que os termos negociados com o Irã por Brasil e Turquia seriam insuficientes. Mais que a divulgação da carta, um fato pouco usual, seu uso seletivo causou irritação em Washington. 

Luis Nassif

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