A técnica do fracking e a contaminação das águas nos EUA

Do Viomundo

Fracking: Poluindo para se livrar da dependência do Oriente Médio

por Heloisa Villela

A cor da água, em alguns casos barrenta, em outros, leitosa, não é nada convidativa. Mas as duas jarras de água suja que os moradores de Dimock, na Pensilvânia, me mostraram, preocupados, não provam nada. São poucas. Por isso a organização Aliança da Pensilvânia por Água e Ar Limpos reuniu uma amostra bem maior: 1.100 jarras de água. Todas contaminadas. Imprestáveis para o consumo. E a PróPublica documentou mil acidentes (vazamentos, incêndios e explosões) no estado de Dakota do Norte, apenas em 2011.

Muita coincidência… Mas a contaminação e os acidentes aconteceram depois que o fracking se instalou nos dois estados. A tecnologia, criada nos anos 40 pela Halliburton (aquela do ex-vice-presidente Dick Cheney), foi usada de forma experimental nos anos 70. E se tornou uma febre depois do ano 2000, quando o preço do gás começou a subir. As empresas se valem do fato de não haver regulamentação federal para esse tipo de exploração de petróleo e gás. Cada estado estabelece suas próprias normas. E ainda pior: o governo George W. Bush isentou o fracking das leis federais que regulamentam a qualidade da água e a qualidade do ar no país.

Ou seja, fica tudo por conta de cada estado. E aí, entram os lobistas e o dinheiro. Até mesmo o governador da Califórnia, Jerry Brown, conhecido amigo dos ambientalistas, está tentado. A chance de encher o caixa do estado com arrecadação de impostos e gerar empregos é muito grande. Na Pensilvânia, alguns moradores que hoje tem uma água escura jorrando da torneira de casa, acusam o governador de ter recebido doações das empresas de fracking para engordar o cofre da campanha eleitoral. E por isso, ter facilitado o uso da nova técnica no estado.

Mas não são apenas os políticos que se encantam com os cifrões. As empresas dão aos donos das terras parte dos royalties faturados. Assim, vão comprando e dividindo a população. O governo federal vai fazendo vista grossa. A Casa Branca de Barack Obama fez uma opção: diz que contar com os combustíveis fornecidos pelo fracking é melhor do que poluir o ar usando carvão.  Os ambientalistas discordam. Dizem que o metano liberado na atmosfera, na extração via fracking, é pior para o efeito estufa do que o dióxido de carbono que vai parar no ar quando se queima carvão. Sem falar na grande quantidade de água – hoje um bem cobiçado – que o fracking bebe.

O uso dessa nova técnica repete uma característica marcante da cultura americana: fazer primeiro para depois descobrir as consequências. Especialmente quando existe lucro na jogada. É assim com uso de agrotóxicos, sementes geneticamente modificadas, remédios, etc. A sociedade do hoje não tem a menor preocupação com o amanhã. A não ser para garantir, na marra se necessário, o fornecimento de combustível futuro – vide a guerra do Iraque.

E justamente para depender menos de ditaduras ou países instáveis do Oriente Médio, a tentação de produzir aqui mesmo o que se consome é enorme. Mas um grupo de seis pesquisadores, das duas costas do país, garante que a autossuficiência é viável sem petróleo ou energia nuclear.  E puseram tudo na ponta do lápis. Publicaram um estudo na revista Energy Policy defendendo que Nova York pode trocar toda a matriz energética do estado até 2030 para usar, exclusivamente, energia produzida a partir do vento, água e sol.

O grupo já fez o mesmo estudo para a Califórnia. “É o maior estado do país”, justificou um dos autores do projeto, o professor Mark Jacobson, da Universidade Stanford, na Califórnia. Diretor do programa de Energia e Atmosfera da Universidade, o professor Jacobson disse ao Viomundo que o grupo já tem um mapeamento e uma proposta concreta de substituição energética para o mundo inteiro, e para os Estados Unidos em particular. Eles garantem que o planeta poderia viver apenas com a energia das três fontes renováveis. Mas entendem que “vender” essa ideia tão abrangente seria impossível.

– É bem mais fácil trabalhar na esfera estadual, explicou.

O estudo sobre Nova York chegou na hora certa e não foi por acaso. O governador Andrew Cuomo está na bica de aprovar ou rejeitar o uso do fracking. Até agora, a técnica foi proibida em apenas um estado, Vermont. Maryland está discutindo os riscos e vantagens. Mas Dakota do Norte, Pensilvânia, Ohio e Texas mergulharam na novidade, que a França proibiu.

Em Ohio e Oklahoma, foi preciso suspender temporariamente a exploração em alguns condados, no fim de 2011, porque foram registrados vários tremores de terra. Segundo o geofísico Art McGarr, o fracking está apenas antecipando, forçando tremores que, eventualmente, aconteceriam mesmo. Geólogos do Observatório Lamont-Doherty, da Universidade de Columbia, montaram um grupo somente para pesquisar se a nova forma de prospecção pode causar terremotos.

Pelo sim, pelo não, voltamos ao estudo das energias renováveis. Os cientistas perguntam se faz sentido arriscar a contaminação dos lençóis freáticos para extrair da terra um combustível que vai acabar de qualquer forma. É apenas uma questão de tempo. Por que não partir logo para a substituição que será inevitável? O projeto dos cientistas está nas mãos da organização Solutions Project para ser levado aos políticos do estado de Nova York e ao governador Andrew Cuomo. No começo de março, Cuomo adiou a decisão a respeito do fracking, mas prometeu uma resposta em breve.

O professor Jacobson disse que o grupo submeteu todas as fontes de energia a uma análise rigorosa e avaliou primeiro o impacto de cada uma delas no meio ambiente, na saúde da população, no aquecimento global e se oferece garantias de fornecimento de energia a longo prazo. Os riscos de catástrofes (energia nuclear) e o consumo de água também foram incluídos na análise. As energias hidráulica, eólica e solar saem na frente em todos os quesitos. Por isso os estudiosos partiram para a proposta de substituição completa da matriz energética de Nova York mapeando locais de instalação de turbinas, painéis, tetos solares, etc.

Garantem que para cada milhão de dólares investido na indústria de petróleo e gás, são criados 3,7 empregos diretos e indiretos, enquanto o mesmo investimento nas energias eólica e solar gera entre 9,5 e 9,8 empregos. Segundo os cientistas, a substituição completa da matriz energética de Nova York, que inclui toda a frota de veículos públicos e particulares, geraria 4,5 milhões de empregos, no processo de substituição, sendo 58 mil deles empregos permanentes.

O professor Jacobson e seus colegas já fecharam o estudo sobre a Califórnia, estão bem adiantados no projeto sobre o estado de Washington e vão detalhar propostas para os 50 estados americanos.

Aqui, em inglês, o estudo completo sobre Nova York.

Aqui, uma explicação sobre o fracking e um filme que trata do assunto.

Luis Nassif

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador