Previdência: governo procura Google para defender reforma e gera polêmica

“Propaganda política tem que ter um grau de transparência maior que as outras. Tanto é que a propaganda eleitoral e partidária começam com uma tela azul. Tem que ter uma camada a mais que sinalize claramente: ‘eu sou uma propaganda de governo”, defende professor da ESPM 
 
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Jornal GGN – A Secretaria Especial de Comunicação (Secom) se reuniu, recentemente, com a empresa Google para estudar maneiras mais eficientes de fazer propagada da Reforma da Previdência. Na verdade, a plataforma digital foi usada pela primeira vez neste governo em dezembro, quando a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), pedindo a suspensão.
 
Ela usou dois argumentos: primeiro que a propaganda não explicitava “de maneira clara e transparente a totalidade dos dados pertinentes ao tema” e, segundo, questionou o uso de R$ 99 milhões em verbas suplementares aprovadas pelo Congresso em “campanha estratégica de convencimento público”.
 
A Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu neste mês o governo no STF alegando que os argumentos da Procuradora são “frágeis alegações”. O interesse da Secom em usar o Google é que, como nenhuma outra plataforma de comunicação, seu sistema de publicidade consegue alcançar nichos específicos de público, assim o governo pode customizar a publicidade conforme a faixa etária, regiões e classe social, além de reagir de forma diferente conforme as perguntas mais frequentes feitas ao Google. 
 
A estratégia, entretanto, é criticada por especialistas da comunicação, como o professor de inovação e tecnologia da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Fabro Steibel. Ele destaca que o governo deve estabelecer mecanismos claros e transparentes para gerar publicidade digital. “O governo tem o dever de se comunicar e fornecer informações objetivas, que ajudem as pessoas a entender e se posicionar sobre a Reforma da Previdência. Aquele espaço não pode ser usado para dizer que a reforma é excelente, para convencer, em vez de informar”. Leia a reportagem completa da BBC Brasil. 
 
 
BBC
 
Por que a decisão do governo de fazer propaganda da Reforma da Previdência no Google é polêmica
 
Júlia Dias Carneiro
 
A iniciativa do Palácio do Planalto de procurar o Google para publicar anúncios sobre a Reforma da Previdência causou desconfiança nas redes sociais nas últimas semanas.
 
Considerada um dos maiores desafios da gestão Temer e com votação prevista para fevereiro, a medida é impopular – o que explica a procura do governo por novos meios para tentar aumentar a aceitação do projeto.
 
Para analistas, o passo faz parte de uma expansão nas estratégias publicitárias do governo, recorrendo à publicidade extremamente segmentada permitida por plataformas digitais – uma tendência não só para a propaganda oficial, mas para as campanhas eleitorais de 2018. A estratégia, no entanto, exige precauções, dizem eles.
 
As propagandas sobre a reforma têm sido alvo de críticas e questionadas judicialmente – em decisões diferentes no ano passado, juízes concluíram que as peças analisadas buscavam convencer, em vez de informar, e que não possuíam o caráter educativo ou de orientação social exigido pela Constituição. O governo nega que isso tenha ocorrido, e as decisões acabaram derrubadas (leia mais abaixo).
 
De acordo com a Secretaria Especial de Comunicação (Secom), o governo começou a usar o Google para campanha publicitária em dezembro último, somando anúncios na poderosa ferramenta de buscas à publicidade que vem fazendo em prol da Reforma da Previdência em redes como o Facebook, o Twitter e o YouTube (que também pertence ao Google).
 
O secretário responsável pela pasta, Márcio Freitas, afirmou à BBC Brasil que ela vem estudando formas de viabilizar o que chama de “parceria” com o Google, e que o principal interesse no momento é aprimorar o alcance de conteúdo oficial sobre a Reforma da Previdência.
 
Os anúncios promovem uma reforma “contra privilégios, a favor de todos” – como diz uma das últimas publicações do Planalto em seu perfil no Facebook.
 
O Google confirmou à BBC Brasil que foi procurado pelo governo e afirma que os integrantes da Secom pediram informações sobre a inserção de publicidade e sobre o funcionamento da plataforma de anúncios do Google, buscando cenários especificamente para a campanha pela Reforma da Previdência.
 
Não se trataria, segundo a empresa, de uma parceria, e sim da compra de publicidade, seguindo os mesmos procedimentos que a empresa de tecnologia adota com o setor privado e também com outros governos. De acordo com a assessoria de imprensa, alguns governos estaduais e municipais brasileiros já têm a prática de anunciar na plataforma.
 
Procurado novamente pela reportagem para esclarecer o que queria dizer com parceria, o titular da Secom não respondeu.
 
Mirando no alvo
 
O movimento é parte do chamado microtargeting político. Jargão do marketing, o microtargeting (algo como mirar um “microalvo”) ou microssegmentação é a busca da publicidade por alcançar nichos específicos do público – e se vale dos perfis que as redes sociais traçam com base nos algoritmos com que operam, mapeando os hábitos e preferências dos usuários.
 
É por causa do microtargeting que recebemos anúncios de hotéis em Madri depois de fazer uma busca sobre a Espanha; ou que de repente vemos na página do nosso email publicidade de eletrodomésticos parecidos com os que pesquisamos na Black Friday.
 
O mesmo recurso pode ser usado pelo governo federal para direcionar sua campanha pela Reforma da Previdência, que enfrenta rejeição de até 70% da população em alguns levantamentos – em dezembro, o governo comemorou uma pesquisa encomendada ao Ibope que mostrava 46% de rejeição.
 
Ao publicar anúncios ou impulsionar publicações específicas de órgãos públicos, o governo pode customizar o que vai oferecer para certas faixas etárias e regiões geográficas nas redes sociais, ou reagir às perguntas mais frequentes feitas no Google.
 
Freitas defende a estratégia, dizendo que o Google “faz uma leitura muito eficaz da relevância de determinados assuntos na internet e é capaz de perceber as dúvidas mais comuns que as pessoas têm”.
 
“Queremos saber quais as principais perguntas que as pessoas estão fazendo e as principais fontes de informações que consultam, para nos colocarmos dentre essas fontes e oferecer maiores esclarecimentos à sociedade”, afirma Freitas, referindo-se à publicidade oficial como um “conteúdo neutro” e não como uma peça de convencimento em massa.
 
“O objetivo fundamental do governo é que as pessoas tenham acesso a informações corretas sobre a Reforma da Previdência. Precisamos evitar que informações de baixa qualidade, as fake news, se propaguem, e formular campanhas para disseminar conteúdo neutro e correto para a sociedade brasileira”, diz, argumentando que a ferramenta é “amplamente usada hoje no mercado por diversas empresas e governos”, e que está mais do que na hora de o governo federal utilizar essa tecnologia.
 
‘Não há tentativa de direcionamento’
 
Especialistas dizem que não há restrições legais para que a publicidade oficial seja direcionada para determinados nichos a partir dos perfis que revelamos nas redes sociais, mas alertam que é preciso transparência no uso e no monitoramento desses mecanismos.
 
Professor de inovação e tecnologia da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), Fabro Steibel diz que governos de países como França, EUA e Reino Unido também usam o Google e redes sociais para inserir anúncios de suas ações.
 
Ele alerta que, assim como em outros meios, a publicidade oficial deve servir a informar de forma objetiva, sem tentar convencer. E ressalta que o conteúdo oficial precisa estar discriminado claramente como tal.
 
O Google ressalta que os anúncios são explicitamente indicados como publicidade e não interferem na “busca orgânica”, ou seja, a área central de resultados relacionados às palavras-chave digitadas pelo usuário. Os resultados que aparecem primeiro na busca são os mais relevantes de acordo com o algoritmo da plataforma.
 
De 2016 para cá, de acordo com a Secom, o governo federal gastou R$ 103,6 milhões com agências de propaganda para formular campanhas sobre a Reforma da Previdência. Ao longo de 2017, o percentual investido em inserções na internet correspondeu a 9,78% do total da verba publicitária da Secom.
 
Márcio de Freitas afirmou não ter ainda “uma proposta concreta” de quanto o governo deve investir em publicidade digital para a Reforma da Previdência nos próximos meses, afirmando estar estudando ainda quais serão as melhores ferramentas.
 
“Não há qualquer tentativa de direcionamento”, afirma o secretário de Comunicação Social. “Isso nem é possível. Na página do Google você não pode direcionar as pessoas para um lugar. Mas você pode entender o que as pessoas estão pesquisando sobre um assunto, o que querem saber, e oferecer as respostas corretas”, diz Freitas.
 
Neutralidade questionada
 
A neutralidade da publicidade oficial sobre Reforma da Previdência foi posta à prova três vezes no ano passado.
 
Em momentos diferentes, duas juízas determinaram a suspensão da propaganda oficial considerando que buscava convencer em vez de informar, e que não possuía o caráter educativo ou de orientação social exigido pela lei.
 
As suspensões foram revertidas por tribunais regionais federais.
 
Em dezembro, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da veiculação da propaganda do governo Temer em favor da reforma, questionando o uso de verba suplementar de R$ 99 milhões, aprovada pelo Congresso, em “campanha estratégica de convencimento público”.
 
Dodge argumentou que a propaganda “não explicita de maneira clara e transparente a totalidade dos dados pertinentes ao tema”.
 
Neste mês, a Advocacia-Geral da União (AGU) defendeu a legitimidade das campanhas oficiais perante o STF, referindo-se aos argumentos da Procuradoria como “frágeis alegações”. Continue lendo… 
Redação

5 Comentários

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  1. “busca orgânica” x “respostas corretas”
    No dia da condenacao do Lula pelo TRF-4 e seguintes, procurei pelo Google, exaustivamente, fotos e videos das manifestacoes em POA.

    Nao posso dizer que fiquei surpreso pois ja havia percebido acontecimento semelhante ao buscar pelas caravanas do Lula.

    Enfim, nao encontrei nada, absolutamente nada do que estava buscando. Vai ver, nao era “relevante” o assunto.

    Noves fora, acuso, sem sombra de duvida, o Google como sendo uma empresa essencialmente corrupta.

    Sei, essas sao favas contadas, que todos sabem disso e tudo mais. Mas quem e como, no Brasil, se opoe de fato e exerce o minimo de controle social sobre essa empresa? Eis o ponto.

    Proponho que este GGN organize um crowdfunding, como vem fazendo para permitir a apuracao de alguns temas, com vistas a investigar muito a fundo a participacao DIRETA da Google no descalabro geral.

    Eh preciso desmascarar a “busca organica” do Google e sua relacao obscura com os “resultados corretos”.

    Ou isso ou a verdade e o pluralismo serao cada vez mais obstacularizados por algum cryptoalgoritmo nefasto.

    Em seu nascedouro, para o Google a “relevancia” era o numero de links que apontavam para determinado endereco.

    Hoje, com a mudanca da internet, mais do que links, influenciariam as citacoes ou coisa que o valha…

    Mas, sera que ninguem se pergunta, por exemplo, que um dos componentes mais relevantes quando se trata de qualquer assunto eh saber onde se encontra a primeira ocorrencia? Ou seja, a fonte?

    Dificilmente o cryptoalgoritmo do Google leva a isso. E por ai vai mais do mesmo…

    No inicio o Google era um mecanismo de busca razoavelmente, digamos, cofiavel. Foi isso que fez a empresa se firmar e crescer exponencialmente na preferencia dos internautas.

    Logo em seguida, ja havendo cativado (viciado?) as massas, ela tornou-se um monopolio e se rendeu TOTALMENTE aos interesses de mercado.

    Entre outas coisas, passou, cada vez mais escancaradamente, a deliberar, “organicamente”, de forma unilateral e tiranica sobre a relacao com os usuarios e produtores de conteudos presentes em suas plataformas, etc.

    Eh preciso ter em mente que a posse de um endereco de e-mail pessoal consagrado vai alem da relacao individuo x empresa e invade a seara do direito a personalidade, a exemplo do nome proprio. Juristas e legisladores que se debrucem sobre o tema. Mas esta ja eh outra digressao…

    Importa nao esquecer que a consequencia com a qual nos deparamos eh essa: resultados “corretos” em buscas “organicas”.

    Talvez seja preciso uma uniao deliberada das forcas progressistas de todo o planeta (partidos politicos, sindicatos, movimentos sociais, coletivos…) para a criacao de um poderoso mecanismo de busca.

    Ferramenta que nao se venda e por isso seja capaz de conquistar e resgatar mentes e coracoes, interessados em resultados simplesmente isentos, com base em premissas claras e simples para o esclarecimento de questionamentos (buscas) e divulgacao de conteudo.

    Tudo isso tem um custo e dai seria preciso estudar maneira de financiar iniciativas do genero, assim como evitar os gargalos, as armadilhas tecnologicas que lhes podem ser impostas. Um deles seria o controle do trafego e demais ameacas, por parte de “cryptoalgoritmos” de terceiros, como o dos oligopolios carreadores, por exemplo.

    A questao eh complexa, depende das luzes de especialistas em Internet, entre outros, e essas aqui nao passam de especulacoes de um leigo, cheias de reticencias. Mas nao havera de ser nada que nao possa ser resolvido com vontade politica, isso eh certo.

    Com tantas reclamacoes contra as telefonicas, irmas ciamesas das empresas carreadoras e o cipoal de atores, instituicoes e normas envolvidos na Internet, eh de se perguntar tambem, quem de fato controla a Internet no Brasil em termos da eficiencia e confiabilidade que se espera dela em sentido amplo?

    Uma tal iniciativa independente do mercado teria que ir muito mais alem do que esperar a invencao “genial” de meia duzia de nerds sem compromisso social, como parece ser o modus operandi da sagracao tecnologica nesses tempos de “resultados organicos corretos”.

    Corretos em que sentido, de acordo com quem e para quem…?

  2. STF apequenado
    Se o supremo tiver que “decidir” sobre propaganda que por definição procura CONVENCER, fecha o STF, pois virou além de política virou uma agência de publicidade. Meu Deus, como chegamos neste ponto :((

  3. Tanto quanto

    sua cara está coberta de cabelos, está coberta de razão a procuradora Dodge em proibir a enganosa propaganda veiculada pelos meios de comunicação, e ainda paga pelo contribuinte para prejudicá-lo para toda vida.

    Mas, cara de pau não se proibe. O nobre mandatário danação, do alto de sua simpatia, de seu convencimento quanto ao grande prestígio que goza junto ao povo, foi aos meios de comunicação pessoalmente fazer a sua parte.

    O que também não se pode negar é o fato de o conde saber usar o poder sob todos os aspectos- para o bem, dele e de seus amigos, e para o mal, do povo e dos inimigos.

      Ele deixaria Maquiavel orgulhoso.

     

     

      

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