Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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Petrolina e o coronelato, por Rui Daher

Clã dos Coelho

https://www.youtube.com/watch?v=7vl4FEx2i8c width:700 height:394

Por Rui Daher

Da CartaCapital

Sempre que volto do Vale do São Francisco não resisto comentar o que observei na região, do alto e com a lupa. Lá, tenho negócios e paixões. Aos primeiros, leva-me o trabalho de oferecer matéria orgânica e tecnologias naturais para aumentar a produtividade de quem decidiu plantar, exportar e lucrar com frutas de alta qualidade no semiárido. Às paixões, levam-me o povo e a cultura nordestinos.

Na semana passada, estive em Petrolina para trabalhar e participar de um evento esportivo da TV Grande Rio. Talvez por vivermos um momento triste, no qual mais uma vez a Federação de Corporações sangra nosso direito de democracia, desenvolvimento e inserção social, fui menos paixão e negócios, e mais colunista de CartaCapital.

Fiz perguntas e anotações. Desconfiei de passado e presente que fazem evidentes os descaminhos políticos da região e consequentes distorções econômicas e sociais. Petrolina revive um paradigma antes muito utilizado: a convivência maligna entre a riqueza exuberante de poucos e a pobreza expressiva de muitos, o que sugeria vivermos em país parte Bélgica parte Índia, a Belíndia.

Padres capuchinhos, em missão de catequese indígena no final do século 17, começaram a desbravar aquela região de caatinga do médio São Francisco. Passaram-se dois séculos para que fosse fundada como Vila, em 1870, e mais 23 anos para município com autonomia legislativa.

Não se trata, pois, de um aglomerado urbano novo, como os polos criados no Centro-Oeste a partir do crescimento do plantio de grãos. Teria idade para ter-se desenvolvido mais, não fossem os entraves do semiárido nordestino, de recente solução.

Tem população estimada em 350 mil habitantes, PIB per capita de 15.334 reais, e IDH-M (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,697. Dos 5.570 municípios brasileiros, 2.000 estão à sua frente.

Depois que as águas do São Francisco possibilitaram contornar o principal entrave do semiárido, em Petrolina e região desenvolveu-se avançado polo produtor e exportador de frutas de ótima qualidade. A expressão econômica da região cresceu e trouxe com ela agregação de valor através de indústrias, comércio e serviços.

Por que, então, a visível pobreza? 

Embora o Censo IBGE 2010 mostre Petrolina com 32% de brancos e 68% de pardos, negros, amarelos e indígenas, a impressão é de que apenas os primeiros frequentam o luxo da cidade, expressão territorial na chamada Orla e comercial no River Shopping.

Espanta numa cidade banhada pelo rio São Francisco, de agricultura viável e rica por efeito da água de irrigação, predominarem grandes extensões de terras como se desertos fossem. Poucas praças, ínfima arborização, paisagismo restrito aos guetos particulares em condomínios residenciais de luxo ou estabelecimentos comerciais de caro consumo.

Apesar de parte da explicação eu já conhecer através dos livros e do que me foi ensinado nos “barracões” da Ciências Sociais, na caminhonete de um grande amigo e empresário, pergunto os motivos para a convivência de exuberante riqueza e desoladora miséria.

“Vou te mostrar”, respondeu, se encaminhando para zonas periféricas à Orla e ao Centro da cidade.

– Vê esse terrenão? Dos Coelhos. Aquele posto de gasolina? Dos Coelhos. O supermercado? Também. Concessões de TV e rádio? Idem.

De volta ao asfalto da Orla, percorremos vários quilômetros. De um lado, edifícios altos e modernos, hotéis e restaurantes de arquitetura arrojada. De outro, olhando-se em direção ao rio, pouco se vê do “Chico”, apenas longas extensões de terras áridas de caatinga. De tempos em tempos, aparecem condomínios de luxo ali incrustados.

Pergunto: “E essas extensões de terras descuidadas, vazias”?

– Tocas de Coelhos esperando valorização para venda.

Não pensem, no entanto, que isso tudo é falado como recriminação. No Brasil, patrimonialismo e desenvolvimento nem sempre foram fatores antagônicos. Muito do que hoje Petrolina tem de bom se deve aos empreendimentos dos Coelhos, como políticos e empresários.

A saga do clã começa ainda nos primeiros anos do século 20, com o coronel Quelê, apelido de Clementino Coelho, líder político e econômico da região, desde a República Velha.

Quelê Coelho teve farta prole, 11 filhos. Entre eles, Nilo Coelho, governador biônico de Pernambuco de 1967 a 1971, senador da Arena e do PDS, e presidente do Congresso Nacional, em 1983.

Ao encaminhar seu filho médico, Nilo Coelho, para a política, fez dele o grande indutor do avanço de Petrolina. Pavimentou estradas, criou médias e pequenas empresas, levou eletricidade e postos de saúde às vilas rurais, ergueu casas populares. Mas, apaixonado, implantou os projetos de irrigação que vira nos EUA.

Como em todo patriarcado, ramos da família acabam rachados. Nem por isso suas fortunas diminuíram, pelo contrário, aumentaram. Nada, porém, mais determinante do atraso social e da concentração de renda. Quem foi ao Maranhão e conhece o clã Ribamar, sabe disso.

Será muito difícil a querida Petrolina superar a desigualdade sem fugir do coronelato político.

Rui Daher

Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

17 Comentários

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  1. Faltou falar

    O relato é razoável, mas falta o conhecimento da história política de Pernambuco. Por exemplo, Nilo Coelho foi governador biônico (alguém lembra do adjetivo? é mandato sem voto das urnas, nomeado pela ditadura), e naturalemente pôs o governo a serviço dos próprios negócios. Em Petrolina.

    Na mais recente atualização, Fernando Bezerra Coelho foi ministro de Dilma, pulou o alambrado e virou senador, traindo o reconhecimento do trabalho realizado desde o governo Lula. Hoje completa a traição  votando pelo impeachment. 

    1. faltou falar…

      Caro Sr. Urariano, faltou falar daquela família dona da Melitta (lembra da Melitta, ainda existe? Não consigo lembrar o nome da familia), descendência italiana,  pioneiros na plantação de uva no Vale do S. Francisco. Uva no Nordeste, naquele calor e falta de água? Loucos! O brasileiro ainda não tinha aprendido o que é “cultura” e “estudo”. Parte disto foi resolvido com uma empresa chamada Embrapa. Os nordestinos ainda “pastam” com esta deficiência. E não é preconceito, é constatação. Mas com a chegada de muitos agricultores do sul e de SP, trazidos também pela Cooperativa Agrícola de Cotia. Lembra dela? Então as coisas começaram a mudar nesta região. A História não é estatica., o que acontece é que nunca acreditamos realmente em buscar as mudanças. E sobre o impeachment, caro sr. veja como as coisa são, Cristovam Buarque/PT, Marina Silva/PT, Marta Suplicy/PT  também são golpistas. Enquanto Katia Abreu/PMDB gasta sua credibilidade e competência defendendo o mandato da presidenta.   

    2. Urariano,

      está no texto: “Entre eles, Nilo Coelho, governador biônico de Pernambuco de 1967 a 1971, senador da Arena e do PDS, e presidente do Congresso Nacional, em 1983”.

      Quanto a Fernando Bezerra a história foi tão martelada em folhas e telas cotidianas, inclusive como acusado da Lava-Jato, que seria cansativo ser mais um dos milhões que discutem os personagens do golpe. Preferi ir mais para trás e relatar minhas impressões. Relato razoável, não?

  2. Verdade

    Numa das minhas passagens por lá, um amigo me contou aquela história. Nas campanhas políticas era coelho pra cá e coelho pra lá….

    Só uma raposa para acabar com aquela dinastia…

  3. O Juazeiro das imagens é DO NORTE, no Ceará.

    Graças a Deus vocês deixaram Juazeiro da Bahia, longe disso.

    Juazeiro sempre apoiou o presidente Lula, mas Lula deu as costas para Juazeiro e abraçou

    os Coelhos de Petrolina, o Fernando Bezerra, se deu mal. Temos uma obra aqui em Juazeiro

    parada há mais de 12 anos, nunca saiu do papel, já em Petrolina tudo sai do papel.

    Taí a recompensa. Traição e impeachment.

  4. O Juazeiro das imagens é DO NORTE, no Ceará.

    Graças a Deus vocês deixaram Juazeiro da Bahia, longe disso.

    Juazeiro sempre apoiou o presidente Lula, mas Lula deu as costas para Juazeiro e abraçou

    os Coelhos de Petrolina, o Fernando Bezerra, se deu mal. Temos uma obra aqui em Juazeiro

    parada há mais de 12 anos, nunca saiu do papel, já em Petrolina tudo sai do papel.

    Taí a recompensa. Traição e impeachment.

    1. Lívio,

      a edição do vídeo não é minha, mas creio que há imagens de Juazeiro da Bahia, que conheço muito bem, misturadas com Juazeiro do Norte. A estátua do Padre Cícero, é uma delas. Abraço.

    2. Sem obras em Petrolina
      Acho que você se equivocou. Petrolina não ver grande obra faz tempo. Lula, quando apoiava Eduardo Campos, investiu muito em Pernambuco, mas basicamente só no Grande Recife, Suape’, Zona da Mata. Tanto que desde 2007 que praticamente o governador na anda aqui. Lula é Dilma só vieram em Petrolina nesse período par pousar no aeroporto para visitar obras em Juazeiro da Bahia, ou para visitar as obras da transposição em Floresta e Cabrobó; e a ferrovia em Salgueiro. Aqui obra federal se resume ao MCMV.

      1. Prezado Petrolinense,

        acho que você se equivocou e comentou outro texto que não o meu. Onde no texto está escrito de grandes obras governamentais em Petrolina? Falei das contradições sociais.

  5. Falta Cultura?

    Fico admirado com a falta de cuidado de certas pessoas que postam trabalhos na Internet; Parece que não estudam a realidada do que estão postando. Vejam no vídeo acima, de Alceu Valença: A músicafala de Juazeiro (Ba) e a pessoa coloca uma imagem do Padre Cícero que é de Juazeiro do Norte, Ce.

    1. Outro, meu Deus!

      É claro que notei a estátua do Padre Cícero no vídeo. É claro que ela fica em Juazeiro do Norte, Ceará. Mas também, com tantos argumentos a se discutir no texto, um take errado de alguém que postou Alceu no youtube fica o mais visível. Ora, bolas! 

  6. Eu não creio que o

    Eu não creio que o impeachment passe. Afastada a Presidenta, o vice deve susbtituí-la, assumindo sua equipe de governo, na qual não poderá promover mudanças. O julgamento da Presidenta não durará os 180 dias e  em menos tempo terá sido concluído, com a sua absolvição, pois a denúnia não resistirá a um julgameto sério, sendo resgatados o bom senso e a legalidade.

    Atastado Eduardo Cunha da Presidência da Câmara, possivelmente cassado e aprisionado, seus seguidores colocarão as barbas de molho, até porque vários deles estarão indiciados por crimes de corrupção., igualmente.

    Aécio, provavelmente, e finalmente, também estará sendo investigado, e aquela pose toda e total descaramento cairão por terra, sendo provável seu recolhimento em clinica apropriada.

    Eleições gerais é golpe. Dilma prosseguirá seu governo com  a ajuda de Lula, de Aragão, e de tantos outros capazes e dispostos a meter a mão na massa e tirar o Brasil dessa encrenca, até porque ela não é da responsabilidade exclusiva da Presidenta, sendo consequência de uma campanha  devastadora da midia bandida  e irresponsável, fadada, contudo, a inssolvência irrefreável.

    Em 2018 quem achar que pode, luta para tirar o PT do poder, aposta que eu, absolutamente, não faço.

    1. Álvares,

      a se confirmar o seu roteiro, teremos um país equilibrado e democrático. Cético, mas torcendo para que você esteja certo. Abraço.

  7. Lá perto

      Paulo Afonso, dos Avila, Tourinho e Agra

      E Prof. Rui Daher , já que conheces a região, espero que algum dia, o sr. comente sobre a ASPLANA.

    1. Prezado Junior,

      o setor canavieiro em Alagoas poderia ser considerado a bíblia da corrupção e do calote no Brasil. Se vazou para Paulo Afonso, na Bahia, desconheço, mas vou pesquisar. Abraço

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