Críticas às mudanças no Código Florestal

Do Terra Magazine

Contra a votação hoje do Código Florestal

Rui Daher
De São Paulo

Quando a coluna estava sendo escrita ainda não era certo o substitutivo que modifica a legislação atual ser votado nesta terça-feira (24). O ato dependia de um acordo no Congresso entre os partidos da base aliada. Melhor: entre governo e parlamentares que representam os grandes proprietários de terras.

Na concepção dos últimos, a proposta do relator Aldo Rebelo (PCdoB – SP) já estaria aprovada há muito tempo, as infrações cometidas no passado anistiadas e o retrocesso nas salvaguardas à preservação ambiental legalizado.

Eles e seus cúmplices nas associações de classe pouco se importaram com os estudos feitos pelas Academia Brasileira de Ciências (ABC) e Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que nem mesmo se pretendiam conclusivos, mas indicavam a necessidade de mais pensar antes de se abrir nossos biomas e biodiversidade para novas décadas de devastação.

No regime democrático a instituição de um Poder Legislativo livre é um bem em si. Mesmo quando, como aqui, abriga um espesso caldo de corrupção e fisiologismo, o que faz mais clara a nossa incapacidade de construir uma base social e política capaz de sustentar a promessa tão próxima de exuberância econômica.

Atenção. Não é verdade que para atender a demanda crescente por alimento, fibra, energia, será necessário ampliar a área de plantio além dos limites impostos pelas atuais leis ambientais. Contas como essas são feitas com a matemática de interesses particulares, quando não para enganar trouxas.

Há largos espaços para evoluir na área plantada e na produtividade com aplicação de tecnologias ajustadas às boas práticas de manejo. A EMBRAPA sabe disso.

Também não é verdade, como quer o ex-ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, que o Código precisa ser votado até 12 de junho para que milhares de produtores rurais não passem a produzir na ilegalidade. Ninguém melhor do que ele para saber quantas prorrogações já foram concedidas pelo governo para multas, interdições, proibições e, claro, dívidas.

A Lei de Crimes Ambientais está em vigor desde 1999 e concede 30 anos de prazo para uma propriedade recuperar o que devastou.

Anistiar desmatamento feito ao abrigo de leis vigentes no passado não é diferente de justificar crimes cometidos no período da Inquisição, apesar destes contarem com a complacência até de santos papas.

Ironicamente, hoje estamos diante de mais uma prova de que abrigado por leis frouxas o interesse financeiro imediato falará mais alto do que a aposta no futuro ambiental. Bastou serem afastados os sintomas da queda nos preços das commodities para que, capitalizados, os grandes proprietários de terra ganhassem fôlego para aumentar em quase 30% o desmatamento na Amazônia Legal.

Dizer que o fato pode estar relacionado à proximidade da anistia trazida pelo novo Código não é mais absurdo do que relacioná-lo à ineficácia do IBAMA, como o fez Aldo Rebelo. Se tudo, professor, pode ser resumido a uma questão de repressão por que afrouxar uma legislação que nem mesmo foi capaz de minimizar o passivo ambiental de hoje?

Se, no entanto, não basta a racionalidade da argumentação daqueles que pedem estudos mais conclusivos antes de se reformular o Código Florestal, a coluna apela para a música e a poesia de Antônio Carlos Jobim (1927 – 1994), e pergunta:

De onde iremos tirar “promessa de vida” para nossos corações? Como faremos para “adivinhar a primavera” sem “o tico-tico que mora ao lado e passeia no molhado”? E do que se alimentarão os “vastos rios de águas calmas sem os riachinhos de água esperta”?

Rui Daher é administrador de empresas, consultor da Biocampo Desenvolvimento Agrícola.

Fale com Rui Daher: [email protected]

Luis Nassif

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