As TVs públicas e estatais na Alemanha

Sugerido por Assis Ribeiro

Da Rede Brasil Atual

Comunicação: nem tudo o que é público é ruim

Duas falácias são contumazes na velha mídia brasileira: em matéria de comunicação tudo o que é público é ruim; e tudo o que é estatal é dirigismo atentatório à liberdade de expressão.

A Alemanha desmente isto.

Os canais de TV líderes de audiência nacional no país são públicos, e estatais. A ARD, primeira emissora criada depois da Segunda Guerra, estatal, tem 13,4% da audiência. A ZDF, segunda, também pública e estatal, tem 13,1%. Juntas, 26,5%.

As emissoras privadas de rede nacional têm 11,7% (RTL); 10,3% (SAT); e 6,6% (ProSieben). Juntas, 28,6%. Empate técnico? Não. Sendo três contra duas, aquelas ganham.

Além disso, há uma série enorme de tevês de caráter regional, além dos canais internacionais (BBC, CNN, ESPN, Eurosport etc.).

Mas há mais a considerar. As duas TVs estatais são responsáveis pelos principais noticiários do país, como os “Tageschau” e o “Tagesthemen”, mais ou menos “O dia em revista” e “Os temas do dia”. Também o são pelos principais programas de debate político, social, econômico e cultural, sempre com a marca do pluralismo.

Isso não impede os alinhamentos. Por exemplo, sobre a Ucrânia, todas as tevês, públicas e privadas, têm seguido mais ou menos o mesmo alinhamento predominante na mídia do Ocidente, apontando a Rússia como a única culpada pela tensão. Um ponto a debater, certamente, e a pedir mais – em vez de menos pluralismo. Que, provavelmente, não será obtido mais rapidamente nas redes privadas.

Um dos canais, a ARD, é responsável pelo maior programa de audiência depois dos noticiários: o Tatort, uma série de “Krimis” – filmes policiais – que se passam, em rodízio, em diferentes cidades alemãs, com diferentes equipes e personagens. O programa – depois repetido em outras emissoras – passa nos domingos à noite, e é tão sagrado quanto a missa ou o serviço, ou ainda a mesquita e a sinagoga nos dias consagrados, para os religiosos.

São 35 milhões de lares alemães com aparelhos de tevê – e aqui se paga um imposto anual sobre os aparelhos, que é investido nas redes públicas. Nessas, a publicidade é muito restrita, e estritamente controlada. Com exceção das transmissões de jogos de futebol, não há propaganda de cerveja ou outras bebidas alcoólicas. Nas redes privadas, o controle é muito estrito também: nada de publicidade dirigida a crianças, por exemplo.

Ninguém acha que isso seja um “atentado à liberdade de expressão”.

Uma publicidade idiota que vi recentemente, com uma criança portando um cartaz dizendo que tevê não é só para adultos, em defesa da propaganda que tem como público-alvo as crianças, seria motivo de escândalo e processo aqui.

Como se vê, nem tudo o que é público é ruim. Mas, certamente, para as mentalidades privatistas, tudo o que reluz é ouro, isto é, vale dinheiro. O resto que se dane.

Redação

6 Comentários

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  1. Não é por nada que os alemães

    Não é por nada que os alemães mantem fontes de informação confiaveis.

    Elas, como alguns outros itens dentro de uma sociedade, não devem ser orientadas apenas pelos interesses de alguns.

    A informação confiavel é um bem vital para o conjunto da sociedade.

    Um povo mal informado esta enfraquecido, sem um dos elementos fundamentais para o seu desenvolvimento.

    Os proprios detentores do poder da informação acabam vitimas de sua manipulação.

    A guerra que se monta hoje contra o governo nos meios de comunicação, criando uma falsa sensação de caos economico,atinge a economia.

    Muitos deixam de investir,justamente no momento de avançar.

    Outros mudam rumos que não deveriam ser mudados.

    A França pos guerra, apesar do seu tamanho,manteve sua força, sua palavra, porque mantinha RFT, importante emissora de televisão estatal,com os melhores informativos da epoca.

    Quando a direita tomou o poder, no final dos anos 60, o primeiro alvo atacado foi justamente aquela fonte de informação.

  2. Assis,
    Passei lá na

    Assis,

    Passei lá na Alemanha 1(um) ano e meio a trabalho e pude confirmar o que você escreveu.

    Vi programas exclusivos e inclusivos para minorias como portadores de necessidades especiais auditivas ou visual, etc.

    O programa era tranquilo na velocidade que o ser humano ali presente podia se expressar. 

    Claro que a audiência nestes casos não era alta, mas o cidadão alemão que paga para ter isto, compreende e apoia.

    Aqui seria inviável devido ao carácter mercantil de nossa mídia.

    Por tudo isto não consigo mais ver TV no Brasil.

     

  3. Tvs públicas

    Assisto a DW alemã, seus noticiários e programas de entrevistas são muito bons, dinâmicos, atraem a atenção. E feitos em horário nobre. Até a emissora  da Venezuela, a Telesur, é muito mais ágil moderna e dinâmica em suas transmissões que nossas Tvs públicas. Por exemplo, na Rio+20 em 2012, tinha cobertura  da Telesur,  mostrando ótimos resumos do eventos do dia, chamadas  e entrevistas ao vivo com  participantes do mundo inteiro. Quem assistia só o PIG, facilita nem ficou sabendo da conferência.  (afinal poderia beneficiar o governo, né?)…

    Diminuir o poder do PIG  jamais qualquer governo vai conseguir, pois as emissoras filiadas estão todas em mãos de deputados, senadores e governadores dos partidos conservadores. Acredito que a única, pequena chance, de termos um noticiário isento é através da rede pública.Mas esta tem de ser moderna, ágil, e pluralista, ou seja, sendo isenta, mostrar a realidade como é. Como é feito em países como a Alemanha.

    Sem falar que nossa tv pública, mesmo querendo quase ninguém vê, pois não “pega” na maioria dos municípios, e onde alcança é intermitente. Metade do tempo está fora do ar.

  4. A  Tv  Brasil  ( ex-

    A  Tv  Brasil  ( ex- Educativa do Rio )  é  muito boa.  O noticiário é bom, a programção bem razoável,  muito superior à das tv”s comerciais…Mas não têm o mesmos recuros daquelas,  as produções são mais imples…mas os coteúdos …dão de dez.  

      Só pra ilustrar os programs ( mais de três que vi ) sobre o centenário de Dorival Caimmy  deram um banho nos da poderosa Globo : matérias trablhadas, coteúdos ricos,  comentários  apropriados…muito diferentes dos exibidos pela globo…meras colagens de produções da emissora no passado, sem links reveladores,  trabalhos preguiçosos e com pouco valor, apresados,  meramente para cumprir pauta.

             Nossos canais públicos  são melhores, em qualidade, conteúdo e oporunidade…Sem um décimo dos recursos disponíveis pelas “majors “…

  5. Sistemas ARD e ZDF alemães não são estatais!

    Prezado Assis Ribeiro,

     

    muito oportuna a postagem sobre a TV Alemã, parabéns!

    No entanto, há um equívoco em seu texto sobre o status jurídico desses sistemas: com exceção da Deusche Welle, que depende de dotação orçamentária da União, eles não são estatais, o Estado nada tem a ver com seu funcionamento, além da outorga de concessão, monopólio da Bundespost, os Correios Alemães.

    Se você disser em público, na Alemanha, que ARD e ZDF são estatais, vai colher a ira coletiva de editores, jornalistas e juristas. Por que? Porque ambos são regidos pelo Estatuto de Direito Público: nem privado, nem estatal, controlado  por dois Conselhos: um para a Supevisão e Garantia do Pluralismo de Opinião, outro, Editorial.  Seu financiamento é mediante a taxação por aparelho, seja de rádio ou tv, que atualmente não chega a cobrir 50% do orçamento dos canais. 

    Trabalhei durante 15 anos para diversos canais da ARD, na Alemanha e fora dela, e fui durante 6 anos produtor associado da Deutsche Welle (DWTV World) com base no Rio de Janeiro, conheço razoalvemente bem o funcionamento do sistema e vou escrever um texto em separado para explcar detalhadamente como funciona o Sistema de Direito Público, ao lado do do qual existe uma poderosa concorrência privada dos canais RTL, SAT e PRO7, só autorizados a irem ao ar mediante reforma constitucional de 1989. Essa combinação de Direito Público por um, e Comercial-Privado, por outro, é o que na Alemanha se conhece por Sistema Dual. Ocorre que desde a ida ao ar dos canais privados, a qualidade do sistema de Direito Público também caiu assustadoramente, porque entrou em cena o “Ibope”, antes não existente, pois nivelou por baixo o que é de “interesse popular” – leia-se: de interesse do mercado.

    abraço

    Frederico

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