Provas no hospício, por Jânio de Freitas

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
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Por Jânio de Freitas

Da Folha de S. Paulo

É até engraçada, sem que deixe de ser o oposto disso, a expectativa generalizada sobre o que um acusado da extorsão de US$ 5 milhões causará ao país: vai abalá-lo ainda mais com suas pautas-bombas, ou enfim vai reprimir sua natureza? Incluirá na pauta da Câmara um pedido de impeachment, ou vai investir contra o procurador-geral da República?

Se um país chega a esse ponto, com o ambiente político e econômico em dependência tão patética, está muito enfermo. Fosse gente, seria recolhido ao hospício. Como não é gente, faz suspeitar de que seja o próprio hospício.

Logo, falemos de Eduardo Cunha. Para começar, duvidando de que alguém possa prever com razoável segurança a conduta do presidente da Câmara no futuro imediato. Apesar disso, pode-se sondar, em linhas gerais, hipóteses que tenha à sua frente.

A primeira: agravar a linha provocativa que mantém na Câmara pode ser negativo para sua situação judicial. Como resposta, é bastante provável que o Judiciário e o Ministério Público se sintam no dever de acelerar a tramitação do processo, para que seus ritmos habituais não sejam acusados de dar oportunidade à conturbação política. Não é menos provável que o apoio dos oposicionistas da linha Aécio incentive a tendência natural de Eduardo Cunha para a pauta-bomba e bombas sem pauta.

A hipótese de autocontenção valeria ao menos como originalidade biográfica para Eduardo Cunha –ao custo de parte do apoio que recebe do oposicionismo extremado, como o grupo aecista do PSDB, e peemedebistas paus-mandados. A liderança de Eduardo Cunha perderia alguma coisa, e é muito incerto que ele conceda essa perda.

Eduardo Cunha tem uma inteligência esperta. Até hoje, não foi capaz de convencer da sua inocência nas irregularidades, graves todas, em que figurou. Mas está na presidência da Câmara, não está arruinado. As acusações que o Ministério Público agora lhe faz em 85 páginas (ou um terço disso em espaço normal) são mesmo pesadas. Mostram, inclusive, conhecimento de truques atribuídos ao acusado, como uso de igreja evangélica para recebimento de suborno.

Mas, teoricamente, condenação depende de prova. É verdade que o Supremo já teve prática diferente e, na Lava Jato, o juiz Sergio Moro já emitiu condenação em cuja sentença admite falta de provas. É recomendável esperar o confronto entre as acusações duras e as respostas experientes de Eduardo Cunha.

A denúncia entregue ao Supremo suscita duas observações. Ficou claro que Rodrigo Janot esperou a condenação de Nestor Cerveró e Fernando Soares por Sergio Moro. Citar na acusação a Eduardo Cunha duas condenações consumadas pelos mesmos fatos dá um reforço e tanto contra o deputado, que fica como comparsa de criminosos condenados.

Nota-se ainda que Janot preserva linguagem apenas profissional, técnica. Não a violenta com os insultos e impropérios usuais em seus antecessores Antonio Fernando de Souza (hoje defensor de Eduardo Cunha) e Roberto Gurgel, sem que sequer os alvos das ofensas estivessem condenados.

De passagem, a denúncia usa de uma expressão perigosíssima para Eduardo Cunha: “desvio de finalidade”, aplicada como referência indireta aos ameaçadores pedidos de informação, em nome da Câmara, que Eduardo Cunha teria feito com assinatura da então deputada Solange Almeida. Destinavam-se, disse o lobista delator, a pressionar ele e uma empresa para quitarem o saldo de US$ 5 milhões do suborno. Tal uso da Câmara é conduta que justifica processo interno de perda de mandato. Bem entendido, em Câmaras com certa dignidade.

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

24 Comentários

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  1. Jânio de Freitas, Brilhante

    Jânio de Freitas, Brilhante !!

     

    Será que um texto deste não abre a cabeça dos que tem poder de estancar esta sanha golpista e corrupta deste infeliz.

    Onde estão os irmãos da denominação cristã a que ele diz pertencer?? 

    sds

    Genaro

     

  2. Me parece que com muito menos

    Me parece que com muito menos evidências e muito menos consistências José Dirceu perdeu o mandato, foi condenado na Ação 470, preso, cumprindo pena e foi preso de novo, agora pela Lava Jato. Será que o problema do José Dirceu é não ser inteligente esperto? 

  3. é mui interessante alguns

    é mui interessante alguns presos preventivamente por poderem arruinar provas e/ou poderem continuar os crimes já lhe imputados, mas os que já foram presos nenhum tem o poder que tem o Eduardo Cunha e aí???

  4. País hospício.

    Jânio se mostra como sempre acurado em seus comentários. Da mesma maneira que não se pode atribuir a Lula todo sucesso econômico e desconhecer  a ajuda do ambiente externo nos recentes anos de benesses na nossa economia, atribuir a Dilma a exclusividade da piora de nossa situação econõmica é inadequado.Não se pode desconhecer ao ambiente externo desfavorável a nossos produtos usuais de comercio exetrno, No ambiente interno também não se pode desconhecer a campanha sistemática do quanto piior melhor.. Neste particular, nossa crise se torna majoritariamente parcial atingindo mais exatamente aos colaboradores desse quadro de pessimismo. Não derrubaram Dilma e se enfraqueceram como protagonistas da nossa economia. Faz parte do hospício

  5. Bem  dito, Câmaras com

    Bem  dito, Câmaras com diginidade teriam já expurgado um membro corrupto como cunha. Mas como a nossa não tem nenhuma e além disso, muitos cairiam com cunha, acho que essa imundície prevalecerá ao menos por algum tempo.

  6. JANIO DE FREITAS

    Camara que aprova Maioridade Penal   Privilegios para Igrejas  e Agrava propositalmente a Crise Fiscal
    e tem centenas de Parlamentres Financiados por Cunha NAO E“ DIGNA

  7. JANIO DE FREITAS

    Camara que aprova Maioridade Penal   Privilegios para Igrejas  e Agrava propositalmente a Crise Fiscal
    e tem centenas de Parlamentres Financiados por Cunha NAO E“ DIGNA

  8. Dizia-me um desconhecido

    Dizia-me um desconhecido interlocutor: ” A Folha sem o Jânio seria um nada.”

    E o que faz um Jânio de Freitas na Folha? Respondo na bucha:

    Dá a ela a credibilidade que ela imagina que tem. E o Janio-como sua empregadora-

     sabem  e ambos usam isso com maestria. Na Carta Maior, por exemplo temos,

    no mínimo, uns dez janios de freitas. O que os diferencia é o salário e a exposição.

    Talvez o excelente Jornalista Jânio de Freitas nao se tenha dado conta disso.

    Não sei se ele se dá conta de, há anos, estar fazendo o contraponto do rebotalho

    editorial do veículo onde trabalha, dando à Folha a credibilidade que ela não tem.

    Jânio, na Folha – como se costuma dizer – é a voz clamando no deserto.

    Está sempre perdendo de dez a um.

     

     

    1. Melhor temos um Janio do que nenhum

      Não acho que o sr esteja errado do que afirmou, mas é melhor termos um Janio na Folha do que nenhum.

    2. Desejamos que os Frias caiam

      Desejamos que os Frias caiam na real e contratatem mais jornalistas com a capacidade intelectual do JF, e que realmente passe a trabalhar compromissada com a verdade factual, abandonando a postura atual de panfleto partidário, igualando-se ao Pravda, segundo suas próprias críticas em passado recente.

  9. no supremo com gilmar dantas mendes a lona é de cetim

    No stf do gilmar dantas mendes, a dignidade e a “cloaca máxima” estão disputando medalha olímpica.

  10. Ninguém duvide dos poderes de

    Ninguém duvide dos poderes de Eduardo Cunha,  sabendo-se agora que até Deus é um dos seus laranjas. 

  11. O problema está em não se

    O problema está em não se poder esperar muito dessa nova Câmara, contaminada por um bando de deputadozinhos de baixo-clero manipulados, somados àqueles que são pate das bancadas da bala e dos evangélicos, entre outros que, como os citados, sequer discutem corrupção quando quem está no foco não é nenhum petista. A situação dos tucanos, principalmente, em prosseguirem fazendo cara de paisagem para Cunha, ou mesmo citando-o como quem não pode ser acusado,etc. amanhã servirá de mote a tantos que veem claramente nesses parlamentares o desinteresse pelo Brasil.

    1. Consequência

      A atual formação da Câmara dos Deputados é consequência direta, a meu ver, da “midiotização” de grande parte do eleitorado que, por isso mesmo, caiu no conto da corrupção seletiva. Interessante que os “corruptos” eram justamente os que estavam do lado dos trabalhadores e os defendiam. No seu lugar, entraram os “puros” que vemos agora.

  12. CUNHA – STF

    Gilmar Mendes pedirá vistas quando o pedido de afastamento de Eduardo Cunha da presidência da câmara for levado ao plenário do STF?

    Aécio Cunha silencia sobre Eduardo Cunha. Ambos têm, em comum, além do sobrenome Cunha, o submundo FURNAS.

    Eduardo Cunha, mais à frente, poderá beneficiar-se de delação premiada.

     

     

  13. CUNHA – STF

    Gilmar Mendes pedirá vistas quando o pedido de afastamento de Eduardo Cunha da presidência da câmara for levado ao plenário do STF?

    Aécio Cunha silencia sobre Eduardo Cunha. Ambos têm, em comum, além do sobrenome Cunha, o submundo FURNAS.

    Eduardo Cunha, mais à frente, poderá beneficiar-se de delação premiada.

     

     

  14. Pobre Jânio de Freitas;

    Pobre Jânio de Freitas; então, ele não sabe que o “causo” no STF está com o dr. Teori(a)? E que, portanto, só deverá virar papel picado lá pros anos 2222, tal como o expresso do Gilberto Gil? Teorizou, travou! E segue o baile… Fosse sério o “acauso” e do STF já teria partido a ordem para o afastamento do (a)cunhado.

  15. Nós deveriamos sermos mais

    Nós deveriamos sermos mais honestos. Por que, caso seja comprovado que dinheiro sujo da Petrobras irrigou sua campanha política e/ou as pedaladas fiscais, a cassaçào do mandato de Dilma Rousseff, chefe de Poder, é golpe, como alardeado nos meios governistas e, da mesma forma, a cassação de Eduardo Cunha, chefe de Poder, não é golpe?

     

    1. Rapaz!


      Responda-me apenas a uma pergunta: Dilma usou o executivo federal para achacar e pedir propina a alguém?

      Dependendo de sua resposta (se a resposta for honesta, antecipo-me), fica claro o viés golpista do seu comentário.

  16. Sobre o tema abordado neste

    Sobre o tema abordado neste artigo de Janio de freitas, que é o mesmo a partir do qual Fernando Brito e Marcelo Auler fizeram análise crítica, ou seja, a denúncia apresentada pela PGR contra Eduardo Cunha e Solange Almeida, junto ao STF, escrevi uma análise crítica. abiaxo reproduzida.

    Peço à equipe do blog avaliar de o texto pode ser publicado como post, antes de torná-lo disponível para leitura, no espaço dos comentários. Segue a crítica.

    _______________________________________________________________________________________________________

    O desejo, a realidade e a perspectiva

     

                    Esperada e ansiada, há pelo menos quatro meses, por jornalistas e cidadãos brasileiros que se interessam pelo noticiário político ou que envolva personagens da política, foi formalizada pela Procuradoria Geral da República, junto ao Supremo Tribunal Federal, na última sexta-feira, 20 de agosto de 2015, denúncia contra o deputado federal Eduardo Cunha e contra a ex-deputada federal Solange Almeida, atualmente prefeita de Rio Bonito, município do centro-norte fluminense. Corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas são os principais crimes de que são acusadas as duas personagens políticas.

                    No mesmo dia em que foi protocolada a denúncia no STF, o teor dela foi publicado no sítio eletrônico da Procuradoria Geral da República. Como era de se esperar, jornalistas foram os primeiros a tomar conhecimento desse documento e os primeiros a realizar análises e resumir a essência da denúncia apresentada contra Eduardo Cunha e Solange Almeida. Como essas análises dependem da interpretação, das expectativas, das perspectivas de quem as realiza e, sobretudo, da matriz sócio-político-ideológica do profissional que as concebe e da linha editorial do veículo a que presta serviços, observam-se divergências entre as análises publicadas pela chamada grande imprensa e pelos blogs independentes. Tendo em vista que a maioria dos colunistas e analistas que escrevem para jornais e revistas, assim como os que comentam em rádio e TV, hoje nada mais são do que porta-vozes dos patrões, não lhes darei crédito na crítica que passo a fazer nos parágrafos seguintes. Embora eu pudesse avaliar o que escreveram outros, vou me ater a dois jornalistas que acredito serem bons analistas políticos. São eles Janio de Freitas e Fernando Brito.

                    No mesmo dia em que foi feita a denúncia, Fernando Brito publicou um artigo no blog tijolaço em que a classificou como “detalhada, provada e devastadora”. Brito afirma ter lido as mais de oitenta páginas do documento publicado pela PGR. Para confirmar os três adjetivos que atribui à denúncia, inclusive com chamada no título do post, Fernando Brito faz um extrato de informações contidas na denúncia, de modo a corroborar a tese por ele defendida. A concisa e contundente análise-resumo feita por Fernando Brito empolgou não somente o autor, mas também outros jornalistas experientes, como Marcelo Auler, que reproduziu pequeno trecho dela no blog mantido por este. Fiquei curioso e, no último sábado, fiz uma leitura atenta de todo o conteúdo da denúncia e tive uma impressão bem diferente da que demonstraram Fernando Brito e Marcelo Auler.

                    Mais experiente e mais equilibrado, Janio de Freitas faz uma análise bem menos eufórica e mais sóbria acerca da denúncia contra Eduardo Cunha e Solange Almeida e sobre os desdobramentos dela em relação a futuras ações de Eduardo Cunha na presidência da Câmara Federal. Cético e prudente, Janio de Freitas lança dúvidas sobre quais expedientes podem ser usados pelo denunciado presidente da Câmara, tanto para se defender como para achacar o governo, com pautas-bomba, contando para isso com apoio da oposição extremada, principalmente o grupo capitaneado por Aécio Neves. Janio de Freitas confirma que são pesadas as acusações contra Eduardo Cunha, mas lembra que o acusado é inteligente, esperto e ardiloso. E que não está abatido ou arruinado pela apresentação da denúncia contra ele, junto ao STF. Observador atento, Janio lembra que o procurador Rodrigo Janot esperou pela condenação de Nestor Cerveró e Fernando Soares (também conhecido como Fernando Baiano), para associar Eduardo Cunha a dois condenados pelos mesmos crimes de que agora é acusado o deputado e presidente da Câmara Federal. Por fim, Janio observa que Eduardo Cunha é acusado de “desvio de finalidade”, ou seja, o presidente da Câmara é formalmente acusado de usar do cargo público pra pressionar e ameaçar o “empresário”/lobista Júlio Camargo para continuar a efetuar o pagamento de suborno. Janio termina o artigo com as seguintes frases: “Tal uso da Câmara é conduta que justifica processo interno de perda de mandato. Bem entendido, em Câmaras com certa dignidade.”

                    O que posso dizer, a partir da leitura integral do documento divulgado pela PGR, é que se trata de denúncia consistente, bem embasada, tècnicamente bem redigida. Mas de concreto mesmo contra os denunciados há muito pouco. As provas de que o verdadeiro autor dos requerimentos 114/2011 e 115/2011 perante a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados (CFFC) é o deputado Eduardo Cunha são pràticamente irrefutáveis; e a denúncia mostra isso claramente. A ex-deputada Solange Almeida tem participação no esquema por emprestar o nome dela ao aliado político, aceitando assinar os requerimentos elaborados por Eduardo Cunha, quando da autenticação e protocolo dos mesmos no sistema de informação da Câmara, junto a CFFC. A PGR demonstra que Solange Almeida não tinha conhecimento sobre o teor dos requerimentos e que o conteúdo desses não tinha qualquer relação com os temas objeto da atividade parlamentar da então deputada. O uso que Eduardo Cunha fez desses requerimentos para pressionar por continuidade do pagamento de suborno é relatado por delatores como Júlio Camargo e Alberto Youssef. A denúncia atual, contra Eduardo Cunha e Solange Almeida, não traz provas definitivas de que Eduardo Cunha tenha recebido propina, embora nela haja provas de que o deputado se reuniu com Fernando Soares e Júlio Camargo, no Rio de Janeiro.

                    Para dar corpo à denúncia, o MPF investigou e vasculhou a movimentação financeira das empresas de Júlio Camargo e Fernando Soares, tanto no Brasil como no exterior. São apresentados extratos que mostram várias transferências de valores entre as empresas de Júlio Camargo e aquelas de Fernando Soares. Fernando Soares é tido como operador do PMDB no esquema de propinas em contratos da Petrobrás com fornecedores; a ligação dele com Eduardo Cunha é confirmada pelas fartas notícias já divulgadas. Entretanto, para fins legais e jurídicos, a denúncia ora apresentada contra Eduardo Cunha e Solange Almeida não consegue provar, de forma definitiva, o envolvimento do deputado nesse esquema de corrupção. Se Fernando Soares não se dispuser a fornecer as informações de que dispõe (sendo convencido, instado ou coagido a assinar um acordo de delação premiada), incriminando Eduardo Cunha por meio de sólidas provas de participação do deputado no esquema criminoso, é muito provável que o deputado se livre da acusação de receber suborno; isso por ausência de provas robustas. Para tentar mostrar uma denúncia com mais substância do que realmente tem, a PGR lançou mão de 149 (cento e quarenta e nove) notas explicativas, colocadas no pé das páginas; não bastasse isso, o documento é formatado com enormes margens esquerda e direita, além de enorme espaço entre as linhas do texto que compõem a denúncia. Como salientou Janio de Freitas, no formato correto a denúncia não ocuparia mais que 30 (trinta) páginas. A PGR parece querer impressionar o público pelo excessivo nº de páginas conferido ao documento em que apresenta a denúncia conta Eduardo Cunha e Solange Almeida. Mas não convence os mais atentos.

                    Por fim, o enquadramento pedido pela PGR, para que seja aplicado aos denunciados Eduardo Cunha e Solange Almeida (artigos 29, 317 e 327- p. 2º, do CPP) e ao denunciado Eduardo Cunha também no artigo 1º, incisos V, VI e VII da Lei nº 9.613, com os agravantes apresentados nos requerimentos finais (artigo 69 do CPP) carece de provas robustas, não contidas na denúncia apresentada. O requerimento de perdimento do produto e proveito dos crimes por parte dos denunciados, assim como o arbitramento de reparação dos danos causados pela infração atribuída aos denunciados, no valor de R$ 138.680.000,00 (com base no artigo 387 do CPP- caput e inciso IV), à Petrobrás e à Administração Pública, mais parece um artifício de publicidade para impressionar jornalistas e público leigo. Sem a comprovação cabal de que o denunciado Eduardo Cunha participou do esquema de corrupção, as acusações contra ele não se sustentam. Como essas provas cabais não constam da denúncia, o requerimento de tão altas penalidades para os denunciados não passa de propaganda e procura de holofotes por parte da Procuradoria Geral da República. É possível, e mesmo bastante provável, que Eduardo Cunha tenha, de fato, cometido todos os crimes de que é acusado e que constam na denúncia. Mas não constatei no teor da denúncia provas robustas da prática criminosa, as quais poderiam ensejar a condenação do denunciado.

                    Se lembrarmos da reunião entre o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha, o ministro do STF Gilmar Mendes e o deputado Paulo Pereira da Silva (mais conhecido como Paulinho da Força, hoje no partido Solidariedade), ocorrida em meados de julho na residência oficial do primeiro, alguns sinais de alerta se acendem. Gilmar Mendes não preside o STF nem Paulo Pereira preside qualquer outro poder da república. O que discutiram e tramaram essas pessoas? Pode um presidente de uma casa legislativa convidar um ministro do STF e um deputado, para se reunir na residência oficial do presidente da Câmara, sem divulgar uma agenda oficial pública. E se agenda fosse pública, os jornalistas deveriam poder registrar o que se conversou. Depois ficamos sabendo que os três cidadãos discutiram e articularam as possibilidades de impedimento da presidente Dilma Rousseff e quais os caminhos possíveis – tanto no Congresso Nacional, como no STF – para destituir com ‘ares de legalidade e institucionalidade’ a presidente legìtimamente reeleita pelo voto popular da maioria dos brasileiros, em outubro de 2014. Devemos lembrar, também, que Gilmar Mendes integra o TSE, onde procurar criar dificuldades para aprovar as contas de campanha da presidente. Vencido por maioria dos que compõem o TSE, Gilmar Mendes, há poucos dias, se valeu de um artifício para pedir que o Ministério Público Federal e a Polícia Federal investiguem as contas de campanha de Dilma Rousseff. A alegação de Gilmar Mendes para mais essa tentativa de golpe branco é de que empresas acusadas na operação Lava Jato (que investiga esquemas de corrupção em contratos da Petrobrás com fornecedores, envolvendo funcionários de alto escalão da companhia, lobistas, doleiros, partidos e políticos) constam no rol de doadoras para a campanha do Partido dos Trabalhadores. O curioso é que na lista de doadores constam também o PMDB, do deputado Eduardo Cunha, e o PSDB (este o partido que mais recebeu doações, superando inclusive as recebidas pelo PT), pelo qual concorreu Aécio Neves, senador, candidato derrotado nas últimas eleições presidenciais; mas estes fatos não chamaram a atenção do ministro. Ressalte-se que a contra-reforma política capitaneada por Eduardo Cunha, visando constitucionalizar as doações de empresas para partidos e candidatos, só se tornou possível porque Gilmar Mendes pediu vistas do processo em que a OAB (por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade) solicita ao pleno do STF que se manifeste sobre a inconstitucionalidade do financiamento de campanhas políticas – candidatos e partidos – por pessoas jurídicas,ou seja, por empresas; quando pediu vistas, Gilmar Mendes já era voto vencido, pois sete dos onze ministros da côrte já haviam votado, sendo que seis deles votaram pela inconstitucionalidade do financiamento de partidos e candidatos por empresas.

                    A não ser para a condenação de líderes petistas no julgamento da AP-470, não se tem notícia de que o STF tenha criado ou se valido de expedientes como a ‘teoria do domínio do fato’, para condenar, sem provas, qualquer acusado político. No julgamento de processos relacionados à operação Lava Jato há casos em que o juiz Sérgio Moro admite, na própria sentença de condenação, não possuir provas robustas contra o réu. Como há pessoas ligadas ao PT, entre os acusados, Sérgio Moro tem transformado a exceção em regra, ao manter presas por tempo indeterminado, pessoas investigadas, mas que não foram, até agora, formalmente acusadas de nada. Mesmo o argumento de que soltas essas pessoas poderiam ocultar provas ou dificultar as investigações não se sustenta, já que o prazo de instrução dos processos, para coleta de provas, já expirou; mais falacioso ainda é o argumento de que pessoas como João Vaccari ou José Dirceu – que já cumpria prisão domiciliar pela condenação, sem provas, no julgamento da AP-470 – representam risco à ordem pública.

                    A conduta e atuação de procuradores do Ministério Público suscitam muitas dúvidas e desconfianças. Posturas arrogantes, desrespeitosas em relação a figuras públicas como Lula, messiânicas como a que protagonizou Deltan Dallagnol numa igreja evangélica no Rio de Janeiro, mostram que é mais do que necessário um controle externo dessa instituição, que hoje não presta contas a ninguém e que não é controlada por ninguém. O absurdo chega a tal ponto que alguns procuradores usam os veículos da mídia comercial brasileira e até mesmo espaços institucionais para fazer uma campanha em prol de mudanças na legislação de modo a permitir que sejam usadas, num processo, provas coletadas de forma hoje ilícita. Deltan Dallagnol conclama  cidadãos brasileiros a subscrever um abaixo-assinado, referendando um Projeto de Lei encabeçado por ele e outros procuradores do MP de modo a validar, em processos, provas colhidas ilegalmente; esta não outra senão a aplicação da máxima ‘os fins  justificam os meios’. No caso da operação Lava Jato, diversas ilegalidades foram cometidas, tanto pela PF como pelo MPF. Um exemplo são os grampos instalados ilegalmente numa cela e numa área externa da carceragem da PF, em Curitiba. O jornalista Marcelo Auler publicou uma reportagem demolidora, denunciando essas ilegalidades. E o MPF se empenha em validar todos os levantamentos conexos, feitos após essas ilegalidades flagrantes.

                    Do que foi exposto percebe-se que a apresentação da denúncia contra Eduardo Cunha está sendo usada como uma espécie de ‘compensação’ perante a esquerda, sobretudo perante os petistas e simpatizantes do partido e do governo. Mas não nos enganemos: a denúncia apresentada não tem todo esse furor que o MP e alguns mais empolgados, como Fernando Brito e Marcelo Auler, querem nos fazer crer. Esses dois jornalistas tem mostrado um otimismo excessivo, quase ingênuo; o que eles escreveram sobre a denúncia contra Eduardo Cunha é antes um desejo e expectativa do que uma real possibilidade de vir a acontecer. Como sòbria e sàbiamente observou Janio de Freitas, a realidade e a perspectiva que se mostram ao analista menos emocionado são bem menos promissoras.Toda a condução da Lava Jato, atuação da PF, do MP e do Judiciário recomendam aos mais atentos, observadores e experientes que se mantenham críticos e vigilantes em relação ao desenrolar das investigações, dos processos e dos julgamentos. É bom ficarmos de olho também no STF. Uma côrte que tem como ministros Gilmar Mendes, Luiz Fux, Celso de Mello, Marco Aurélio Mello, Rosa Weber, Carmen Lúcia e Dias Toffoli pode nos reservar surpresas maiores e mais “perfumadas” que aquelas com que as partes pudendas dos bebês ‘batizam’ as fraldas.

     

    Rio de Janeiro, 24 de agosto de 2015

    João de Paiva Andrade

     

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