A Copa, as eleições e os arautos do fim dos tempos, por Gilson Caroni Filho

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Após a derrota do Brasil, choveram análises na grande imprensa associando o fracasso da seleção a uma urgente necessidade de reorganizar o país ( não apenas reformular as instâncias responsáveis pelas diversas práticas esportivas) em moldes “modernos”. Leia-se: uma modernização radical feita pelo mercado, com claras associações ao modelo neoliberal que pretende ressurgir na candidatura Aécio Neves. Em conversa com amigos, sempre tentei explicar a falácia da proposta, apontando para o que, deliberadamente, ocultava. A todos respondi com um ” a resposta está dentro de campo”. Como vários não entenderam, volto ao debate para elencar os sofismas.
 
1- Muitos tentaram explicar o placar dilatado pelo nível de gerenciamento do futebol alemão. Se for por aí, pelo placar, Alemanha e Gana, que empataram em 2×2, estão no mesmo patamar de gestão.
 

2- Que o futebol é mal administrado, sabemos desde 1954, quando Flávio Costa afirmou que a maior paixão do brasileiro só tinha evoluído do túnel pra fora. Mesmo assim, com o que há de pior nas federações e confederações, encantamos o mundo em 1958/62/70/ 82, e ganhamos em 1994 e 2002. Isso não nega a urgência de reformulação, mas está longe de explicar a goleada de ontem.

3- Os que, por cálculo político, acham que a derrota trará dividendos à oposição vivem em Marte. Esta foi a Copa das Copas que, contrariando os prognósticos de articulistas da grande mídia, TV Globo em especial, arrancou elogios da imprensa internacional e encantou a todos os que vieram ao Brasil pela primeira vez.Aeroportos funcionando perfeitamente, estádios bem construídos, jogos de alto nível técnico e a nossa hospitalidade contribuíram para o clima de magia vivido nos últimos dias.Ninguém aqui ignora que nossa sociedade ainda é muito desigual, mas isso não anula a confraternização de povos vista em praias, ruas e estádios.

4- O surrado argumento de que o desempenho em campo reflete a sociedade brasileira é derrubado com uma simples pergunta: éramos melhores quando apresentávamos um futebol mágico? Vivíamos dias felizes na Copa de 70?

5- Parte do sucesso dos alemães se deve a uma bem traçada estratégia de RP. Li isso também. A escolha da camisa( com cores que estão na bandeira alemã) levaria a uma identificação imediata da torcida do Flamengo com a seleção germânica.Acreditar nisso é passar um atestado de idiotia no torcedor brasileiro, na sua capacidade de discernimento. Claro que o flamenguista, como qualquer torcedor, é brincalhão, gosta de tirar onda, mas sabe diferenciar as coisas. Ademais, cabe lembrar que Vitória, Sport e outros clubes têm camisas rubro-negras. E, cá entre nós, um bom RP aconselharia a administrar o jogo a partir do terceiro gol e não promover o massacre de 7×1.

6- A Copa termina domingo. Pode ser que a Alemanha, com o resultado obtido ontem, embale e ganhe a Copa. Ou não. Eu sei que os tempos são outros, mas em 1950, o Brasil venceu a Suécia por 7×1, a Espanha( com quem os uruguaios haviam empatado) por 6×1 e todos sabem qual foi o desfecho. Por isso o futebol é mágico, imprevisível e trágico. Repito: busquem explicações dentro do campo. É nele que os deuses estão.

Em outubro, o embate dos embates será na esfera política. E nela não há deuses, magia ou grandes metáforas. O que estará em jogo é se queremos avançar com políticas de inclusão social, aprofundamento da cidadania, fortalecimento do Estado ou se pretendemos voltar a crer no ” destino manifesto” da submissão ao imperialismo e do sucateamento de nossa estrutura produtiva.  Quando a democracia se vê ameaçada, é hora de reafirmarmos nossa têmpera de combatentes. E aí não há espaço para viralatices, com as quais as elites reacionárias construíram sua identidade. Que não pode se confundir com a nossa.
Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

6 Comentários

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  1. Quando ganhamos a copa de

    Quando ganhamos a copa de 2002 exatamente contra os alemães o Brasil era uma potência de primeiro mundo, e a alemanha uma bagunça quarto-mundista, né isso?

  2. sou admirador confesso do

    sou admirador confesso do caronem que meio que sumiu nos últimos tempos, seus artigos escassearam em cartamaior e cartacapital,não entendi muito bem..

    carone sempre vai fundo no que pensa e escreve,na essência do que interessaa maioria do povo brasileiro,

    o desfecho de sua crônica é magistral.

    o embate de outubro será entre os que defendem a inclusão social etc e tal dos últimos 12 anos e os conservadores que só querem voltar ao atraso de sempre….

     

  3. Espero que essa copa sirva de

    Espero que essa copa sirva de aprendizado para nós brasileiros . Não estou falando do aprendizado no futebol, mas em nossa conscientização como pessoas. 
    Os estrangeiros ficam maravilhados com o estilo de vida do brasileiro. Brasileiro gosta de liberdade, de aproveitar a vida, fazer festas. Não podemos aceitar e muito menos repetir os comentários daqueles que tentam diminuir a estima dos brasileiros e acabar com nosso orgulho de nação. Temos muitos problemas sociais para resolver. Falta educação de melhor qualidade, o atendimento médico não é dos melhores do mundo, tampouco está entre os piores. A segurança pública é o primeiro problema que surge deste plano para desestabilizar nossa nação. Quando começamos a agredir nossos compatriotas e alimentamos o ódio ao próximo, estamos criando um círculo vicioso que só nos levará à destruição É a estratégia antiga do “dividir para conquistar”. Juntos somo muito mais fortes. Separados, somos presas fáceis. 
    Não aceitem o discurso de que o brasileiro é malandro, é preguiçoso, é desonesto. Quem diz isso não entende a natureza do brasileiro. Para o brasileiro viver é mais importante do que ter dinheiro e status. O brasileiro trabalha para viver, não aceita viver só para trabalhar. O brasileiro não aceita servir de óleo para alimentar a engrenagens do sistema capitalista. Não quer ser apenas número nas estatísticas econômicas. Quem diz isso quer que o brasileiro aceite trabalhar até a morte acreditando que terá uma vida melhor no futuro. Se sacrifiquem em nome da “competitividade”. Não podemos mais aceitar o discurso de que é preciso fazer “bolo crescer” para depois dividir. Eles nunca vão querer dividir nada, quanto mais têm, mais querem ter. Temos que viver o presente também, não podemos viver só de promessas de futuro melhor. A vida passa rápido e ainda não inventaram uma forma de “voltar a fita”. Não aceite que nos imponha o sentimento de vira-latas, uma raça impura e inferior. Somos uma raça de muitas misturas, mas herdamos o melhor de cada uma. Não aceitem a comparação de nosso país com os países europeus, os asiáticos e aqueles da américa do norte. Eles começaram construir suas nações há mais de 400 anos, outros há mais de 6 mil anos. Nós temos pouco mais de um século que deixamos de ser colônia. Começamos muito depois deles, mas podemos melhorar muito ainda e servir de exemplo pro resto do mundo. Podemos andar de cabeça erguida e dizer “sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor!”.
    Se na copa fizemos bonito assim, ‪#‎ImaginaNasOlimpíadas‬.

    Vejam o que os estrangeiros estão dizendo dos brasileiros. Vamos ter que exportar o Brasilian way of life.

     

  4. O nosso

    O nosso jornalismo velhaco como o poder judicário(duas oligárquias medonhas), perderem a identidade.. Hoje, são apenas uma mistura do ruim com o pior. Cárater, nem lembram mais o que é isso.

  5.  Acho estranho as exegeses do

     Acho estranho as exegeses do desempenho pífio e desastroso da seleção brasileira que pululam por aí nas quais não se indistinguem esta do futebol brasileiro. Até mesmo o brilhante professor Gilson incide nesse equívoco. 

    Foi-se o tempo em que a “canarinha” espelhava o nosso futebol, ou seja, tempos em que a totalidade, ou quase totalidade, do escrete era composta por jogadores de equipes brasileiras. Tomando por exemplo essa última, tivemos no rol tão poucos que fica fácil nominar: Fred(único titular), Jô(Atlético Mineiro), Jefferson(goleiro-Botafogo), Victor(Goleiro-Atlético Mineiro) e……..só, somente só. Por dedução, temos uma seleção de jogadores brasileiros e não seleção do futebol brasileiro. 

    Mas fará isso uma diferença de fundo? Sim e não. Sim, porque supostamente esse agregado de atletas egressos de times estrangeiros trariam consigo as experiências com e no futebol que os empregam(Espanha, Itália, Inglaterra, Alemanha etc) o que facilitaria, também por suposto, a criação de táticas para enfrentá-los, além, é claro, de uma técnica mais apurada.

    O “não” porque suscita a indagação: O que isso tem a ver, portanto, com o futebol brasileiro, ou seja, o praticado, para o bem ou para o mal, nesse terra brasilis? Absolutamente NADA! Não foi o futebol brasileiro que foi derrotado de forma humilhante nessa Copa em fase terminal. Foi um amontoado de jogadores treinados por um técnico egresso de uma equipe brasileira rebaixada para a segunda divisão, ambos embalados por uma super estrutura financeira-midiática formidável e edulcorados por espasmmos de patriotadas nauseabundas instigadas pela mídias. 

    Dado isso, se conclui que devemos reformar as estruturas do futebol brasileiro para formarmos equipes fortes com jogadores habilidosos para,a partir daí, fornecer atletas para compor uma seleção realmente do FUTEBOL BRASILEIRO, e não uma seleção formada por jogadores brasileiros. O que é bem diferente. 

    Se o mote em moda é “abaixo o complexo de vira-latas”, por que não o validamos para o NOSSO futebol, a partir do sentimento e da confiança em nossa capacidade de praticarmos um futebol competitivo com características nossas que um dia, lá no passado, encantou o mundo? 

     

     

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