Brasil jogado à própria sorte, por Marcia Noczynski

A situação atual do Brasil é devastadora. Somos o epicentro da pandemia, registrando mais de uma morte por minuto. Passamos a figurar no terceiro lugar do mundo em número de mortes.

Brasil jogado à própria sorte

por Marcia Noczynski

Aqui na Alemanha, me foi perguntado como o Brasil estava lidando com os impactos da pandemia. Pediram que eu apresentasse números, pois querem traçar um panorama do país nesses tempos sombrios. Primeiro, me veio à cabeça o título, porque se tivesse que descrever o que acontece no meu país em quatro palavras, tomaria emprestadas estas. Começo a descrição do que acredito ser um período de trevas assim.

A situação atual do Brasil é devastadora. Somos o epicentro da pandemia, registrando mais de uma morte por minuto. Passamos a figurar no terceiro lugar do mundo em número de mortes. Ontem, em vinte e quatro horas, tivemos 1.473 óbitos por coronavírus. O total de infectados passa de 600.000 e só está abaixo dos Estados Unidos. Esses números já seriam por si só muito graves, mas sabemos que há muito mais casos e muito mais mortes.

O Brasil, no momento, efetua 4.643 de testes para cada um milhão de habitantes, mas precisamos lembrar que já foi testado bem menos. Há duas semanas, a cifra era de 3.462 testes apenas.  Os países que estão no topo da pandemia testam no mínimo dez vezes mais que o Brasil, em alguns casos, como a Espanha e a Rússia o número de testes é vinte vezes maior. Apenas com base nesse indicador, sabemos que há uma potente subnotificação por trás do que está sendo oficialmente publicado. Fora isso, o governo tem procurado mascarar sobremaneira os dados. O Ministério da Saúde, ontem, por exemplo, declarou 139 mortes a menos do que mostram as secretarias do próprio ministério.

O descontrole da pandemia no Brasil tem relação direta com as ações do Presidente Jair Bolsonaro, que insiste em não seguir as recomendações da OMS e do corpo científico mundial. No entanto, é de conhecimento de todos que a sua irresponsabilidade e teimosia tem uma forte razão. Para garantir a sua eleição em 2018, Bolsonaro fez inúmeros pactos com oligarquias financeiras – bancos e grandes empresas. No bojo dessas negociações, estava a Reforma Trabalhista e a Reforma da Previdência Social, que beneficiaram os empresários e destruíram os direitos do trabalhador. Duas reformas que desrespeitam a Constituição de 1988, duas catástrofes na vida do trabalhador brasileiro.

Com essas reformas, direitos e garantias trabalhistas conquistadas em cem anos de luta foram perdidas. O povo passou a trabalhar sem vínculo empregatício, em condições precárias, recebendo menos e trabalhando mais, e ainda, legalmente, podendo ser descartado a qualquer momento sem nenhum reparo financeiro pelo lado do empregador.

A pandemia encontrou o Brasil assim, com milhares de desempregados ou subempregados. A necessidade fez com que os brasileiros aceitassem a barbárie sem contestar e se virassem do jeito que desse para poder trazer o pão de cada dia para as famílias. Motoristas de aplicativo, vendedores ambulantes, motoboys e diaristas são as ocupações mais populares no Brasil de Bolsonaro. Hoje, segundo o IBGE, o número de desempregados no Brasil é de 12,9 milhões, mesmo considerando os números dos trabalhadores na informalidade como empregados. Importante ressaltar que esse número gigante de desempregados não está relacionado somente à pandemia. Em fevereiro, já contávamos com 12,3 milhões de desempregados.

Com a crise sanitária, tudo que já estava ruim ficou muito pior. Para manter sua agenda dentro dos acordos pactuados, Bolsonaro, ignora a pandemia, sabota o trabalho de prefeitos e governadores que tentam conter a doença e ainda debocha dos doentes e mortos. No início da crise, chegou a dizer que o vírus era apenas uma gripe sem maior importância. Quando finalmente percebeu que a “gripezinha” estava impactando os seus planos em relação às promessas de campanha, mudou o discurso. Pede então que os trabalhadores revoguem da quarentena e voltem imediatamente ao trabalho, pois é preciso ser “corajoso” para enfrentar o vírus. Junto a isso, ele promove o uso do medicamento Cloroquina, mesmo sem a aprovação científica do uso da droga para os casos de COVID19. Desde o início da pandemia, Bolsonaro demitiu dois Ministros da Sáude, ambos médicos, simplesmente porque estavam agindo de acordo com as recomendações da OMS e mostraram-se contrários ao tratamento insano que o presidente estava dando à crise. Hoje, temos um militar no Ministério, que não tem a menor ideia de como lidar com a situação, mas que segue à risca as determinações nefastas do presidente.

Ao contrário do que prescreviam os ministros demitidos, o presidente insano, promove aglomerações. Sem o uso de máscaras, sai às ruas, encontra parte dos 25% que ainda aprovam o seu governo, aperta suas mãos e o pior, dissemina inverdades a respeito da doença, do contágio e da cura milagrosa através da Cloroquina.

Como se não bastasse, Bolsonaro abriu guerra contra prefeitos e governadores que defendem as medidas científicas mundiais para conter a pandemia, como a quarentena e o isolamento social. Seu golpe letal veio nesta semana, quando decidiu não fazer parte do repasse de verbas da união para os estados e as cidades. Com isso, obriga os prefeitos e governadores a relaxar as medidas de isolamento, pois sem esse repasse as cidades não têm como se manter. Precisamente no pico da pandemia, prefeitos e governados precisam a afrouxar as medidas para contenção da propagação do vírus, e o povo, para sobreviver, começa a se arriscar e a engrossar as estatísticas.

Fora tudo isso, o auxílio emergencial de 600 reais, acordado pelo governo não chega à maioria das pessoas. Propositalmente, o método utilizado, com preenchimento de cadastros pela internet, não contempla a população mais pobre ou miserável. Quem tem computadores ou mesmo internet para fazer as inscrições? Quantas pessoas ainda são analfabetas no Brasil?

Mas não para por aí, para consolidar sua necropolítica, Bolsonaro continuamente retira verbas de Programas Sociais imprescindíveis, como o Bolsa-Família, por exemplo, que socorre mulheres e crianças vulneráveis da fome, e transfere para outras pastas de menor importância no momento.

O sistema público de saúde, o SUS – Sistema Único de Saúde – está em colapso. Não há leitos, não há mais vagas nas UTIs, e quando há, faltam medicamentos, faltam ventiladores mecânicos, faltam equipamentos de proteção para os funcionários. O Brasil tem o maior número de profissionais da saúde infectados pelo COVID19 no mundo.

Vivemos no Brasil uma distopia em escala mundial e o que está matando o Brasil não é o COVID19, o que está dizimando nosso povo é o Presidente Jair Bolsonaro com a propagação da sua ignorância, com as ações que visam somente seus interesses privados e com os compromissos assumidos com os conglomerados financeiros nas transações de campanha, estes sim tratados como emergência.

Marcia Noczynski – Psicóloga e Psicanalista

Redação

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