Craque em campo, por Ricardo Cappelli

O PT aposta na anulação das condenações pelo STF. Apesar de livre, o ex-presidente continua inelegível. Não será tarefa fácil. Bolsonaro indicará dois novos ministros para a Suprema Corte.

Foto Nacho Lemus

Craque em campo

por Ricardo Cappelli

A volta de um craque aos gramados tem o poder de desequilibrar qualquer jogo. Não chega a ser a certeza de vitória que a torcida canta, mas seu talento deixa claro quem conta e quem é “japonês” dentro das quatro linhas.

A grande mídia, atacada pelo Capitão, adotou um tom moderado. Parece ter aderido momentaneamente a uma antiga estratégia chinesa. Quando acossado por um inimigo de superior potencial ofensivo, o melhor a fazer é colocar outro inimigo de tamanho similar para brigar com ele.

O discurso de Lula em São Bernardo não teve novidade. Reafirmou sua candidatura à presidência da República.

O PT aposta na anulação das condenações pelo STF. Apesar de livre, o ex-presidente continua inelegível. Não será tarefa fácil. Bolsonaro indicará dois novos ministros para a Suprema Corte.

Lula registrou sua candidatura quando estava na cadeia. Livre, são favas contadas que levará esta estratégia às últimas consequências. Se der errado, Haddad está aí para repetir o roteiro.

A outra aposta é que a economia vai degringolar e o mar de ressentimento vai correr naturalmente para o colo petista. Hoje, o mais provável é que a economia não decole, mas também não afunde.

Lula livre deve ser bastante diferente do Lula preso. Em sua trajetória, sempre que esteve na defensiva, o líder petista radicalizou como forma de subir barreiras em torno de seu núcleo duro. Na ofensiva, costuma trocar os sectários pelos moderados aliancistas.

Ele sabe que radicalização é tudo que Bolsonaro espera dele. Dificilmente cairá nessa.

Vai ser curioso acompanhar a reação do neolulista PSOL e da esquerda petista quando o ex-presidente começar a se encontrar com os “ex-golpistas vendilhões” Renan Calheiros, do MDB, Kassab, do PSD, Ciro Nogueira, do PP e o lulista Waldemar Costa Neto, do PL.

Haverá mexida no tabuleiro, nos dois lados do espectro político.

Ciro Gomes seguirá com sua estratégia. Sabe que a reconciliação com o petismo pode fazer sua militância debandar.  No pior cenário, sua votação histórica, sempre em torno de 10%, viabiliza com folga o projeto do PDT.

Sem projeto nacional, o PSB correrá o risco de virar uma legenda regional. Com jogadores fortes no gramado, é grande a possibilidade de ficar sem torcida quem não entrar em campo.

Desde 89 o PCdoB funciona como corrente externa do PT, apoiando o partido em todas as eleições nacionais em troca de coligações para seus deputados. O problema é que a regra mudou, proibindo coligações proporcionais. Como sobreviver agora? Os comunistas terão que responder a este dilema.

Huck é uma vítima direta do retorno do craque. As pesquisas indicam que ele come uma parte do lulismo, sem Lula no jogo. Com ele em campo, o apresentador terá que tentar o apoio de Doria e outras forças de centro. Este campo sonhado por FHC e Rodrigo Maia terá uma tarefa hercúlea.

A direita deve se reorganizar. Nada melhor que um inimigo externo poderoso para reunificar a tropa e acabar com as brigas internas. Com Lula no gramado polarizando com Bolsonaro, o governador paulista pode encomendar a missa de sétimo dia de sua candidatura.

A reestreia do craque fortalece no curto prazo o PT e, paradoxalmente, Bolsonaro e Moro, as estrelas do time adversário que o ex-presidente, não por acaso, chamou para briga no primeiro discurso.

O campeonato vai ficar mais animado, as torcidas organizadas estarão mais fortes, mas um detalhe chama a atenção: as arquibancadas continuam vazias. Sua excelência, o povo, permanece olhando tudo de longe.

Redação

6 Comentários

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  1. Temos que aguardar aqueles 20 dias que Lula pediu pra fazer seu pronunciamento à Nação. Agora é tudo especulação.
    Mas, baseado nas entrevistas na prisão, o discurso no ABC e manifestações de lideranças petistas, o PT fará de 2022 uma revanche de 2018…
    Mas será Lula o candidato ?
    Tenho dúvidas, porque Lula convocou no palanque o prestativo Haddad para percorrer o Brasil. Parece que Lula incorporará a Dora do filme Central do Brasil. E levará Haddad pelas mãos, com disse que gostaria de fazer com o “rebelde” Ciro Gomes…

  2. Na história do Brasil, o povo de verdade sempre ficou longe das arquibancadas. Se não me engano, Lima Barreto, o genial criador de Policarpo Quaresma que é, na minha opinião, o livro que melhor retrata o que é o Brasil em termos sociais e políticos, dizia que aqui não há povo, há público. E isso é verdade quando se vê que a população vê as notícias do Brasil via JN como se estivesse vendo uma novela. Talvez o fato que mais demonstrou como a elite através da violência e do não acesso a uma educação decente criou um povo sem reação foi quando em 90 Collor fez o maior roubo ao país e não aconteceu nada nas ruas, não houve rebeliões, mortes, as pessoas aceitaram perder ( claro que estuo falando dos pobres, pois os de cima sabiam o que viria e tinham já se protegido) a economia de uma vida. O STF foi procurado e pra variar não fez nada, ficou quietinho. Só para comparar, quando algo parecido aconteceu na argentina, 11 anos depois, o corralito, o povo foi às ruas, houve mortes, o presidente de La Rua saiu fugido e em 6 meses passaram 5 presidentes. Até hoje, uma manifestação do povo em escala nacional não houve

  3. “O campeonato vai ficar mais animado, as torcidas organizadas estarão mais fortes, mas um detalhe chama a atenção: as arquibancadas continuam vazias. Sua excelência, o povo, permanece olhando tudo de longe.”. O autor que já chegou a dar ideia de que Ciro seria uma alternativa ao Presidente Lula, claro que não desconhece que o povo não vai às ruas sem comando, sem ser ser motivado pelas organizações de massa, inclusive partidos com esse interesse. Dá para desconfiar que, com Lula preso, sendo a principal preocupação a sua libertação, as coisas estavam à esquerda e a direita democrática (aqui no Brasil a social democracia) travadas. Assim não tem o mínimo sentido essa referência às caras arquibancadas, que não estão ainda perdendo a ponto do desespero, mas sim os das gerais, seriamente a atingidos pelo desemprego genocida mantido há mais de dois anos pela política neoliberal em andamento, sob comando do Paulo Guedes, já que somente agora, com Lula de volta à luta, será será possível pensar em atacar a extrema-direita fascistoide e miliciana no poder, com recurso da pressão de massas, com o povão nas ruas. Se tudo continuar no mesmo diapasão que se prenuncia, não demora. Lula já se movimenta e nesse fim de semana vai a Recife. É bom não fazer críticas sibilinas e desmotivadoras.

    1. HILDERMES: alguns apontamentos para que, numa boa, você reflita sobre seus conceitos.
      (1) “O povo não vai às ruas sem comando”. Falso, vai sim. Lembra-se de 2013 ? O pior é que quando vai sem organização e objetivos claros, é facilmente manipulado, como foi pela Globo.
      (2) “Com Lula preso, (…) as coisas estavam travadas”. Falso. Lembra-se das amplas manifestações em defesa da Educação que ocorreram neste ano ? Não precisou de UM comandante. Foram várias as instituições que convocaram e milhares foram às ruas e a Globo não conseguiu manipular porque o objetivo era definido e as pessoas tinham consciência do que estavam defendendo.
      (3) “Com Lula de volta à luta, será possível pensar em atacar a extrema-direita…”. Sem Lula isso não é possível ? Os interesses nacionais só podem ser defendidos com Lula ?

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