Diário da Peste 20, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Meu vizinho não tocou clarinete, violino ou violoncelo. A música que ele produziu não foi melodiosa e suave. Não. Nada disso. Ele começava a usar a furadeira de manhã e a fazia zumbir horrivelmente o dia inteiro.

Diário da Peste 20

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Nos primeiros dias de quarentena um de meus vizinhos deu um verdadeiro concerto. Não como aqueles que ocorreram na Itália e na Espanha, causando deslumbramento em todos que tem acesso à internet.

Meu vizinho não tocou clarinete, violino ou violoncelo. A música que ele produziu não foi melodiosa e suave. Não. Nada disso. Ele começava a usar a furadeira de manhã e a fazia zumbir horrivelmente o dia inteiro.

Esse cara precisa realmente fazer um milhão de furos no apartamento ou ele ficou com raiva da esposa e resolveu torturá-la? As vezes eu ficava irritado. Depois lembrava do “maníaco da furadeira”, um outro vizinho que infernizou o condomínio.

A vida é assim mesmo. Um maníaco vai embora e outro rapidamente ocupa seu lugar. O vizinho que mudou também queria fazer milhões de furos no apartamento ao lado do meu. Ele começava no sábado e só parava no domingo.

Um dia eu estava deitado na rede na sacada do meu apartamento quando o “maníaco da furadeira” começou a andar de um lado para o outro em frente do prédio desesperado. Ele gritava a planos pulmões:

“Ninguém acende nada. NINGUÉM ACENDE NADA. O prédio pode explodir. Eu acabei de furar o cano do gás encanado.”

O prédio não explodiu, mas nós ficamos sem cozinhar dois ou três dias para que o apartamento dele fosse reparado. Quando também furar o cano de gás o novo “maníaco do prédio” aposentará sua furadeira, suponho.

Hoje também tem conserto no prédio. Tocata e fuga para martelo desacompanhado. Não sei quem é o artista, mas já estou começando a ficar entediado. Ele não poderia tocar outra música ou pelo menos fazer um dueto com a serra tico-tico no fubá?

Ficar de quarentena é fazer barulho ou escutar os barulhos que os outros fazem. A pandemia segue firme produzindo cadáveres e soltando os parafusos dos malucos que querem reabir o comércio colocando as vidas de todos em risco.

Meus parafusos foram bem apertados pela ciência. Os médicos especialistas recomendam o isolamento. Continuarei em casa, mas não posso dizer que estou isolado. Já já a sinfonia para furadeira solitária vai recomeçar a esburacar o apartamento do vizinho. Enquanto ele fizer barulho todos saberão que ele está vivo.

Esta semana o mandato do presidente Bolsonaro morreu. O mito continuará fazendo barulho, mas ninguém mais prestará atenção nele. Com apoio do parlamento, do judiciário, da mídia e do exército Mandetta conseguiu se elevar acima do mito. Ironicamente, quando era parlamentar, o ministro da saúde agia como se fosse um verdadeiro coveiro do SUS.

Besouro Suco
Besouro Suco
Besouro Suco

No Brasil um COVID-19 paciente tentou fugir do hospital mordendo médicos e enfermeiros. Nos EUA os estrategistas acreditam que porta-aviões e submarinos nucleares infectados podem ser armas zumbis estratégicas de projeção global do poder imperial.

Os fantasmas se divertem. Nem mesmo John Lennon imaginou um mundo em paz porque um vírus microscópico infectou e inutilizou máquinas de guerra.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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