Faltam representantes autênticos da democracia, por Janio de Freitas

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Marlene Bergamo/Folhapress 

Jornal GGN – Em seu artigo na Folha, Janio de Freitas aborda a questão dos votos inválidos nas eleições municipais. Para ele, esses não votos representam a verdadeira mensagem das eleições, de que no Brasil não se pratica a democracia representativa.

Se as duas maiores cidades brasileiras recebem como eleitos candidatos que só obtém maioria absoluta se os votos inválidos forem desconsiderados, como

Democracia sem representantes reais da maioria não é democracia, mas sim uma esperta lei eleitoral que nos trouxe o segundo turno. Você não é representante da maioria, você representa os votos válidos, aqueles que são contemplados depois que tiram do caminho a opinião dos que não tiveram voz, pois que não se sentiram representados.

Só que os que ali depositaram seu não voto continuam cidadãos, mesmo não representados, e continuam existindo, continuam tendo opinião. E são o que de mais legítimo produziu a sociedade, pois que maioria, e falam oficialmente por todos.

Segundo entende Janio de Freitas, os 53% obtidos por Doria são somente 53% daquilo que a lei autoriza a computar para fixar o total de votos aos candidatos. Pois que se perceba que, na realidade, 61% dos eleitores gritaram, em branco, nulo e abstenção, que devem ser percebidos. E João Doria leva a taça, tornando-se prefeito de menos de um terço do eleitorado paulista. E é recusado por 68% dos eleitores da cidade.

Leia a coluna a seguir.

na Folha

Democracia sem representantes reais da maioria não é democracia

Por Janio de Freitas

Se o Brasil se inclui nos regimes chamados de democracia representativa, como a Constituição se esforça para sustentar, ou o batismo do regime está errado ou o que aqui se pratica não é democracia representativa. Esta é a verdadeira mensagem das eleições recentes, reiterada com números vergonhosos na tentativa de afinal ser notada no que de fato diz.

As duas principais cidades ilustram a incógnita, não por lhes ser exclusiva, mas por sua maior ressonância. Em São Paulo, João Doria é saudado por vencer no primeiro turno paulistano, recebendo maioria absoluta de 53%. Com isso, diz a quase totalidade dos comentários, os primórdios da sucessão presidencial em 2018 recebem nova configuração, saindo Geraldo Alckmin, patrono de Doria, fortalecido com e no PSDB.

No Rio, Marcelo Crivella foi levado ao segundo turno com 28%, contra Marcelo Freixo e seus 18%. O prefeito Eduardo Paes, diz a quase totalidade dos comentários, teve o seu futuro político posto sob sombras, e o PMDB, alijado do segundo turno, enfraquecido pela rejeição ao candidato de ambos, Pedro Paulo.

Os eleitos em definitivo e para segundo turno, em São Paulo e Rio, representam a quem e o quê, para merecer o direito e o poder de governar as duas maiores concentrações humanas do país? Apesar de discreta, foi possível descobrir no noticiário que a quantidade de eleitores que recusaram seus votos aos três mais votados, em São Paulo e no Rio, é maior do que os votos recebidos por cada um deles. O resultado oficial não sofre consequências porque a esperteza injetada na lei eleitoral, a que introduziu o segundo turno, fixa os totais dos candidatos depois de excluir do verdadeiro total geral os votos brancos e os nulos. Como se estes não fossem opiniões eleitorais –a reprovação de todos os candidatos– ou seus autores nem existissem.

Mas continuam existindo, continuam cidadãos e continuam a ter opinião, inúmeros com opinião ativa. À parte o voto que cada um dê ou recuse, os eleitores são o que a sociedade tem de mais legítimo, do ponto de vista institucional: são os que falam oficialmente por todos. Não pela lei eleitoral em vigor, cujo sentido é impedir a democracia representativa.

Os 53% obtidos por João Doria são 53% dos votos que a lei autoriza computar para fixar o total de votos aos candidatos. Assim retirados os votos brancos, os nulos e juntadas as ausências, os 100% de eleitorado paulistano caem para o equivalente a 61,5%. Os 53% desse novo percentual é que revelam a parte dos paulistanos que votaram em João Doria: 32%.

É isto: João Doria torna-se prefeito por preferência de um eleitorado que não chega nem a um terço dos cidadãos habilitados a votar em São Paulo. Logo, Doria vai administrar a maior cidade brasileira como representante apenas de uma minoria. E recusado na escolha de 68% das 8.886.159 vozes da cidadania paulista.

No Rio, o mesmo ajuste dos eleitores à sua verdade e das urnas à sua realidade, para os dois caminhantes ao segundo turno, o resultado é ainda mais dramático. Os 28% oficiais de Marcelo Crivella são, na verdade, 16% do total verdadeiro de eleitores. Os 18% de Marcelo Freixo são, de fato, 10,5% do eleitorado. Se vitorioso no segundo turno, o primeiro o será foi depois de excluído na escolha de 72% dos cidadãos do Rio; o outro, recusado por 89,5%.

A democracia eleitoral sem representantes autênticos da preferência majoritária não é representativa e não pode ser democracia. Tal realidade abarca toda a política, que tem seus controles primordiais determinados em eleições majoritárias, de presidente, governadores e prefeitos, sujeitas à perversão das verdades eleitorais. Aí está uma das mais fortes causas da já insuportável deterioração da política no Brasil.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

15 Comentários

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  1. Mano na boa…
    É uma

    Mano na boa…

    É uma estupidez continhar falando em “democracia” depois que os bandidos da Camara, do Senado e do STF participaram de uma conspiração para solapar a soberania popular e depor Dilma Rousseff mediante uma fraude.

    Com Doria ou sem ele a democracia já acabou.

    Ele é apenas mais um tiranete… como tantos outros, aliás. 

     

  2. O gênio de Jânio de Freitas é como diamante.

    Prezados,

    A tucana e golpista FSP usa do talento de profissionais  como Jânio de Freitas para posar de ‘plural’; mas até o mundo mineral sabe que isso é uma falácia. Atualmente não concedo à FSP ou a qualquer outro veículo do PIG/PPV sequer um click que denote audiência. Leio Jânio de Freitas nos blogs que republicam seus artigos.

    Jânio de Freitas mostra uma inteligênica, capacidade de análise e síntese incomparáveis. Nesta crônica, com apenas nove breves parágrafos, Jânio de Freitas consegue fazer uma bem fundamentada e original crítica ao sistema eleitoral vigente no Brasil, mostrando como ele mina qualquer possibilidade de existência e uma real democracia representativa.

    Parabéns ao mestre Jânio de Freitas, ao grande jornalista Luís Nassif e a toda equipe do GGN por compartilhar com os leitores deste portal as sábias crônicas desse decano do jornalismo político brasileiro.

  3. Isso é um Ensaio sobre a Lucidez Saramagoada?

    A democracia burguesa saturou, seja ela representada pela direita, pelo centro ou pela esquerda.

    Se a classe operária não reagir e acender uma luz no fim do túnel, a saída burguesa para sua falta de legitimidade será a institucionalização da violência, hipótese em que o ladrão será preferível às autoridades que deveriam evitar os crimes contra o patrimônio.

    1. pode ser

      Meu caro, pode ser verdade o que afirma.

      Porém, olhando por outro prisma, se o voto não é facultativo, quem vota está se abstendo de opinar, não necessariamente refutando um candidato ou outro.

      Imagine uma situação de voto facultativo com dois candidatos onde os dois me agradam. Como não posso votar nos dois, não voto em nenhum.

      Acho que são realidades distintas.

      Seria bom se tivéssemos voto facultativo para termos uma idéia mais clara da situação.

      1. Voto facultativo, excelente ideia!

        Também creio, Fernando, que o cidadão somente deveria comparecer para votar por livre e espontânea vontade – tal como já acontece com aquelas pessoas brasileiras entre 16 e 18 anos, ou aquelas com mais de 70 anos. 

        Mas o pessoal da Casa Grande ADORA amarrar o cabresto no pescoço da gente. Portanto, creio que vai demorar muito ainda, até que tornem o voto FACULTATIVO e aproveitem também para tornar 100% seguras as urnas, quem sabe tirando-as das mãos do atual fabricante, que não consegue vendê-las nem lá no país dele, os Estados Unidos.

        1. Voto obrigatório atrapalha a Casa Grande

          Acho respeitável a defesa do voto facultativo e na teoria sou a favor. Na prática tenho dúvidas e tendo a preferir o voto obrigatório. O motivo é justamente porque o voto obrigatório é o que mais atrapalha a Casa Grande.

          Se o voto é obrigatório fica mais difícil quem compra voto se eleger (lembrando que tem muitas formas de comprar voto indiretamente). O candidato picareta consegue comprar x votos, mas não consegue comprar de todo mundo que é obrigado a votar e que pode eleger outros.

          Se o voto é facultativo, dá-lhe baixaria na campanha (e na mídia) para espantar o eleitor cidadão. Com o desalento os mesmos x votos comprados tem mais peso proporcional e elege mais picaretas.

    2. Mas não existe mesmo democracia…

      Existe somente “governo representativo”. Democracia não se encerra nas eleições. Para que exista democracia devem existir canais de controle e informação sobre a atuação dos representantes escolhidos e isso me parece que não existe em nenhuma lugar do mundo. Quando se elege alguém (e aqui pouco interessa se foi por maioria ou minoria) passa-se um “cheque em branco” ao escolhido e ninguém vai lá verificar como ele usou este cheque, até porque não existem canais de comunicação para isso. Durante muito tempo poderia se afirmar que seria inviável construir canais que atendessem toda a população mas a tecnologia e a informática tornariam isso possível hoje… Se houvesse vontade política para isso.

      Trocando a palavra “democracia” por “governo representativo” ainda assim veríamos problemas como os relatados por Jânio, problemas que se agravariam ainda mais na eleição proporcional de vereadores e deputados, essa uma verdadeira caixa-preta que nenhum eleitor domina e compreende. 

      Por isso falar em democracia no Brasil é uma mentira deslavada e desonesta.

  4. O Brasil é uma democracia de bananas…

    A política economica nacional é uma vergonha, vivemos um sistema pós colonial rumo ao feudalismo…

    E o sistema eleitoral é antidemocrático e imperialista onde somente os ricos são eleitos e elegem os descendentes.

    As Instituições sociais também são de cunho familiar, sindicatos são um exemplo craso.

    Fiesp, Faesp são federações que recebem dinheiro público e que possuem os presidentes com mandato perpétuo.

  5. E João Doria leva a taça,

    E João Doria leva a taça, tornando-se prefeito de menos de um terço do eleitorado paulista. E é recusado por 68% dos eleitores da cidade…

    Segundo a lógica de Jânio, nas eleições presidenciais, no segundo turno, somando os votos nulos, brancos e os do Aécio, assim como as asbtenções, 88.320.240 eleitores não votaram na Dilma. Logo, ela foi rejeitada por 78% dos eleitores brasileiros. 

    E alguns dirão: não, o Aécio é que foi reprovado por 81% dos eleitores.

    Tudo depende da régua de cada um.

    Nada mais errado numa ou noutra conta. 

    Gostemos ou não, Dória foi sim aprovado pela imsensa maioria dos paulistanos. 

    Dificil aprender a lição, heim!? 

  6. E João Doria leva a taça,

    E João Doria leva a taça, tornando-se prefeito de menos de um terço do eleitorado paulista. E é recusado por 68% dos eleitores da cidade…

    Segundo a lógica de Jânio, nas eleições presidenciais, no segundo turno, somando os votos nulos, brancos e os do Aécio, assim como as asbtenções, 88.320.240 eleitores não votaram na Dilma. Logo, ela foi rejeitada por 78% dos eleitores brasileiros. 

    E alguns dirão: não, o Aécio é que foi reprovado por 81% dos eleitores.

    Tudo depende da régua de cada um.

    Nada mais errado numa ou noutra conta. 

    Gostemos ou não, Dória foi sim aprovado pela imsensa maioria dos paulistanos. 

    Dificil aprender a lição, heim!? 

  7. Argumento frágil de Jânio,

    Argumento frágil de Jânio, que, no limite, pode gerar situações como a de 1955, com a constestação à eleição de JK por parte de Lacerda. Os números de abstenção e votos em branco no primeiro turno em 2014 são parecidos. Foi eleição presidencial, certo, mas a mesma avaliação poderia ser usada. Mais significativa é a leitura de Toledo, que Brito evidencia em seu Tijolaço, mostrando que o percentual de votos nulos e em branco na periferia de São Paulo é maior que nas regiões mais ricas. Além disso, Jânio nada fala sobre os impactos da reforma eleitoral de Cunha, que diminui o tempo de campanha e de campanha televisiva, agradando fortemente à Globo sobre todos os aspectos ou sobre a campanha eleotraç da Lava Jato na última semana, criando factóides de todos os tipos que pudessem trazer dificuldades ao campo petista.  

  8. Pergunta: esse comportamento


    Pergunta: esse comportamento de gesticular com as mãos enquanto fala, com dedos afastados uns dos outros e um ou dois deles semidobrados, exibido por pessoas como Serra, Moro, Temer e esse Dória Jr. (pela foto) seriam um sinal secreto da maçonaria?

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