Rumo ao autoritarismo, necrogoverno avança contra a cidadania, por Jaqueline Morelo

Objetivo é também destruir a noção do bem comum e a imaginação política da resistência 

Rumo ao autoritarismo, necrogoverno avança contra a cidadania

por Jaqueline Morelo

O governo Bolsonaro manobra com táticas diversas em várias frentes para fazer avançar o projeto neoliberal e o autoritarismo. Opera para retirar direitos dos cidadãos e precarizar as condições de trabalho e qualidade de vida de milhões de brasileiros, obrigando-os a canalizar todas as energias à sobrevivência diária. Atua também para provocar a morte dos indivíduos considerados improdutivos e impelir os demais a aderirem sem reservas ao mercado.

Medidas propostas com esses objetivos são justificadas pela equipe econômica como necessárias para evitar um futuro distópico, tática chantagista que objetiva desestimular a imaginação política e a utopia, necessárias à resistência.

Ao mesmo tempo, em outra frente, empenha-se para destruir sindicatos, associações e movimentos sociais que poderiam colocar obstáculos à lógica do mercado puro. Como consequência, futuros que poderiam ser idealizados por meio da ação coletiva são substituídos por um horizonte de expectativas reduzido, onde os sonhos restringem-se a necessidades e desejos individuais.

Após as Reformas Trabalhista e da Previdência, cortes orçamentários e novas mudanças no ordenamento jurídico desmontam políticas redistributivas e de proteção das minorias, como idosos e pessoas com deficiência, considerados improdutivos e incapazes de gerar lucro para o mercado, determinando quem merece viver e quem deve morrer. Esse é o componente fundamental do necrogoverno, que instrumentaliza a existência e destrói corpos humanos e populações, produzindo deliberadamente situações para submeter pessoas a condições nas quais a morte passa a ser desejada.

Uma das táticas empregadas tem sido a retirada de recursos do Sistema Nacional de Seguridade Social para que entre em colapso rapidamente. A destruição da proteção social, iniciada ainda no governo Temer com a PEC 241 (PEC 55 no Senado Federal), que congelou os gastos públicos por 20 anos, não por acaso denominada PEC da morte, segue em curso com outras medidas para fragilizar o Sistema.

Além disso, com o Decreto 9.699/2019, publicado em fevereiro, o necrogoverno retirou recursos no valor de mais de R$ 606 bilhões do Orçamento Fiscal e da Seguridade Social, para cobrir encargos financeiros da dívida pública e repasses aos estados e municípios.

Não satisfeito com o rombo produzido, ameaça sepultar a proteção social com a PEC 186/2019, enviada ao Congresso no início deste mês.  A Proposta limita os gastos com o pagamento de pessoal e condiciona direitos sociais do cidadão, estabelecidos no artigo 6º da Constituição – saúde, educação, alimentação, moradia, transporte, trabalho, segurança, lazer, previdência social, assistência aos desamparados, proteção à maternidade -, à sustentabilidade fiscal do Estado:  “Será observado, na promoção dos direitos sociais, o direito ao equilíbrio fiscal intergeracional.”

A intenção é criar gatilhos para permitir que governo federal, estados e municípios reduzam os gastos com saúde e educação.  Hoje a o gasto mínimo da União com saúde é 15% e da educação é de 18% da receita líquida corrente. Estados devem destinar 12% da receita à saúde e 25% à educação e municípios, por sua vez, têm de gastar, respectivamente, 15% e 25%.

A PEC também inclui as despesas com pensionistas no limite de despesas com pessoal, o que significa que esse grupo também sofrerá cortes. A nova regra valeria até mesmo para decisões judiciais. Atualmente, um a cada dez benefícios concedidos pelo INSS é resultado de decisão judicial e, segundo relatório do TCU divulgado em 2018, os principais benefícios concedidos por essa via são a aposentadoria rural e o auxílio-doença.

Como arremate final de uma série de medidas nefastas, o necrogoverno publicou no dia 12 deste mês a Medida Provisória 905/2019, que vai atingir não somente os jovens trabalhadores de carteira verde-amarela, praticamente sem direitos trabalhistas. Com a extinção do serviço social previdenciário, determinada na MP, idosos e pessoas incapacitadas para o trabalho, já fragilizadas pela situação de vida, ficarão ainda mais desamparados.

No site do INSS está a descrição do papel do serviço social no órgão: atendimento ao cidadão para esclarecer quais são os seus direitos sociais e qual o meio adequado para poder exercê-los; busca de solução para os problemas que surgirem na relação do cidadão com o INSS.

Ainda segundo o site, os profissionais da assistência social que atuam nas agências do INSS atendem de forma prioritária os cidadãos que estão requerendo benefícios assistenciais da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS e também aqueles que estiverem recebendo benefícios por incapacidade e incluídos no programa de reabilitação profissional.

Todas essas medidas mostram que, se não houver uma forte resistência ao governo,    em um futuro próximo não somente os direitos sociais estarão extintos, como também serão destruídas a imaginação política e a noção do bem social comum, essenciais para a criação de formas mais justas de organização social.

Jaqueline Morelo é jornalista, cientista social e mestre em Ciência Política. E-mail: [email protected]

Redação

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