Sebastião Cirino, de Minas para o Mundo

Sebastião Cirino agradecendo os aplausos, ao lado de Pixinguinha e Waldemar, no II Festival da Velha Guarda realizado em São Paulo, em 1955.

Grande pistonista, violonista, maestro e compositor – Sebastião Cirino -, nasceu no dia 20 de janeiro de 1902, em Juiz de Fora (MG). Ainda menino migrou para ao Rio de Janeiro onde trabalhou em casa de família. A dona da casa quando brigava com o marido descontava toda sua ira no jovem Cirino, em surras memoráveis.

“- Um dia me deram dez mil réis para comprar não sei o que e não voltei mais”.

Para sobreviver vendeu jornais e engraxou sapatos. As obras do prédio da Biblioteca Nacional era seu “quarto” até ser preso, na colônia correcional na Ilha Grande. Esse fato negativo acabou culminando com um bastante positivo já que foi lá que aprendeu música e a tocar piston, o que lhe favoreceu, na época do serviço militar (até 1920), atuar como músico.

Segundo Sérgio Cabral, o primeiro emprego foi na orquestra do cinema Guanabara, em Botafogo, e o segundo como integrante do conjunto Os Oito Cotubas, liderado por Donga, dissidente dos Oito Batutas.

Os ventos, de 1925, sopravam a seu favor. Trabalhando com o conjunto nos melhores espaços da cidade e com a inspiração a flor da pele para compor, desfrutava de uma ótima fase de sua vida.

Convidado por De Chocolat – pseudônimo de João Cândido Ferreira -, integrou, junto a Pixinguinha, a orquestra da Companhia Negra de Revistas, compondo as músicas da revista “Tudo Preto” que estreou no Teatro Rialto, onde Dalva Espíndola (irmã de Aracy Cortes) cantou pela primeira vez a música, de Sebastião Cirino e Duque, “Cristo nasceu na Bahia”, considerada um clássico da música popular brasileira.

Quando a companhia francesa de revistas Bataclan, de Madame Resimir esteve no Rio de Janeiro, em 1926, convidou Sebastião Cirino para trabalhar na companhia.

Finda a temporada do Rio a companhia excursionou por várias cidades do país, durante três meses. Foi aí que Sebastião Cirino despediu-se da mulher, Dona Júlia, só retornando, pasmem! 14 anos depois.

É que depois da temporada em Recife, Madame Resimir propôs ao conjunto do qual Sebastião Cirino integrava, juntamente com Donga, João Wanderley, Zé do Povo, Augusto Vasseur, Orozino e Carlinhos, que retornassem com ela à Europa. Eles toparam na hora.

Quem conta esta história é o jornalista Sérgio Cabral

A primeira escala foi em Portugal e a companhia se exibiu por todo o país. Finda a excursão, Madame Resimir dispensou os músicos brasileiros, oferecendo uma passagem só de ida para França para quem quisesse. Todos aceitaram.

– Chegamos a Paris – lembrava Cirino – de terno branco de brim. E nevava pra chuchu.

Telefonaram para uma ex-integrante da companhia de Madame Resimir, a cantora Olga Lecan, que os encaminhou ao embaixador brasileiro Souza Dantas que, por sua vez, apresentou-os a um italiano proprietário de várias casas noturnas parisienses.

Depois de alguns meses trabalhando na França, o conjunto perdeu três dos seus integrantes: Donga e João Wanderley, que não suportaram a saudade do Brasil e retornaram, e Orozino que se casou com uma francesa. Reduzido a quatro elementos, o conjunto desfez-se, limitando-se seus remanescentes a participarem de orquestras européias.

Foram anos inesquecíveis para Cirino, pois gozava de tal prestígio em Paris que acabou sendo condecorado pelo governo francês com a Cruz de Honra de Cavalheiro de Educação Cívica, além de ser admitido como membro da sociedade arrecadadora de direitos autorais da França.

Em 1939, estava de férias numa das praias do litoral francês, quando leu nos jornais um comunicado do Consulado do Brasil convocando os brasileiros que viviam na França para se apresentarem na embaixada em Paris, pois a guerra já havia estourado.

Aqui chegou no dia 29 de dezembro de 1939. A filha, que deixara com três meses de idade, era uma moça de 15 anos. Sua mulher, Dona Júlia, para sustentá-la e mantê-la estudando, passou todo o tempo que Cirino esteve ausente lavando roupa, costurando e trabalhando como empregada doméstica.

– É uma santa – dizia ele.

No início, sofreu muito com a dificuldade em readaptar-se. Além do mais não conseguia emprego. Perambulava pelas ruas da cidade, bebendo muito e sofrendo mais ainda. Era um perfeito vagabundo e, pelas suas contas, foi preso mais de 15 vezes por vadiagem e quase se atirou dos Arcos da Lapa em desespero por falta de emprego.

– Foi uma força qualquer que me impediu de me jogar – me contou mais tarde quando trabalhava na sede do Sindicato dos Compositores.

 

Foi o amigo Bororó quem deu uma força conseguindo alguns espaços para apresentações em casas de espetáculos e numa delas, conheceu a princesa Maria Thereza d’Orleans e Bragança, de quem foi professor de violão.

Com o fechamento dos cassinos surge novamente o fantasma do desemprego. Tentava escapar passando para a pauta as melodias dos compositores que não sabiam escrever música e ocupa-se em fazer orquestrações e compor.

Após 7 anos do registro da foto acima, Sebastião Cirino morre de câncer no pulmão em 16 de julho de 1968.

Hoje sua trajetória e músicas não são muito lembradas, por isso mesmo vale o registro da sua odisseia.

ÁUDIOS

Cristo nasceu na Bahia” (maxixe) de, Sebastião Cirino e Duque, com Artur Castro. Disco Odeon (123124), 1925.

Nunca Mais” (samba), de Sebastião Cirino e Nelson Lucena, com Ataulfo Alves e seuas Pastoras. Disco Odeon (800370), 1945 (observem o solo de piston de Cirino).

– “Audiência com o Prefeito”, de Sebastião Cirino e J. Portela, com Ataulfo Alves e suas Pastoras. Disco RCA Victor (800484), 1946.

 VÍDEO

– “Três amores”, de Sebastião Cirino e Célio Batista, com Jamelão.

 Fontes:

– ABC de Sérgio Cabral: um desfile de craques da MPB. – Rio de Janeiro: Codecri, 1979.

– Dicionário Cravo Albin da MPB.

Luis Nassif

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