Governo convoca encerramento de comissão de mortos pela ditadura

Tatiane Correia
Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.
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Em entrevista, procuradora e conselheiras falam de decisão que pode acabar com único grupo que busca corpos não entregues às famílias

Jair Bolsonaro, enquanto deputado federal, exibe a capa do livro “A Verdade Sufocada”, do torturador da ditadura militar, Brilhante Ustra

O governo de Jair Bolsonaro está próximo de encerrar os trabalhos da Comissão Sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, o único grupo em atividade no Brasil dedicado a investigar e a devolver os corpos dos desaparecidos políticos que ainda não foram entregues às famílias.

A medida vai ao encontro da proposta do presidente, que criticava a busca pelos desaparecidos políticos desde deputado – inclusive, uma declaração conhecida de Bolsonaro sobre o tema é “quem procura osso, é cachorro”.

“A comissão sobre mortos foi criada em 1995 e na época se imaginava que ela fosse chegar a um ponto que ela tivesse resolvido a questão dos desaparecidos políticos do Brasil, que tivesse entregue os corpos, pago indenização [às famílias das vítimas”, disse Eugênia Gonzaga, que chefiava a comissão até o final de 2019, quando foi afastada por Damares Alves, ministra de Direitos Humanos.

“Só que muita coisa aconteceu e a gente viu que ela deixou muito a desejar, ela ficou anos desmobilizada, não teve orçamento para fazer busca de corpos”, ressaltou a procuradora federal em entrevista à TVGGN. “Depois surgiram outras leis mais recentes, que foram ratificando as funções dessa comissão”, pontuou.

Eugênia destaca que o artigo 13 da Lei que criou a comissão estabelecia a composição de um relatório de encerramento quando os trabalhos fossem finalizados – mas que, com o tempo, o trabalho foi sendo cada vez mais ratificado, ao ponto de o Brasil ser condenado a intensificar as atividades de buscas.

“A gente já sabe desde que o presidente Bolsonaro assumiu que ele não dava o menor valor para essa atividade (…) A nova presidência da comissão assumiu com essa incumbência, e é o que eles estão agora planejando”, apontou a procuradora.

Ex-assessor de Damares, atual presidente da comissão desacelerou os trabalhos

O atual presidente da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos, Marco Vinícius Carvalho, é advogado, filiado ao PSL e chegou a ser assessor de Damares Alves. Agora, ele convocou para o próximo dia 28 a reunião para aprovar o relatório final e encerrar as atividades da comissão.

“A partir dessa atual presidência, os processos que eles disseram que iriam analisar não foram distribuídos, ele (Marco Vinícius) era o relator de todos os processos”, diz Diva Santana, diretora do grupo Tortura Nunca Mais na Bahia e uma das conselheiras do grupo.

“Dos processos que foram analisados, se eu não me engano foram quatro: um foi do Anísio Teixeira – que foi assassinado e forjada a morte dele no fosso de elevador, mais processos que estavam sendo apreciados na gestão de Eugênia para um possível deferimento”, explica Diva.

Porém, ela lembra que o processo que estava deferido pela gestão de Eugênia foi indeferido pela gestão de Marco Vinícius. “Eles indeferiram o deferimento do processo dizendo que não tinha nexo, que foi fora da lei, eles desconhecem a Comissão Nacional da Verdade. As ações, os pontos que a comissão da verdade deixou para a comissão sobre mortos e desaparecidos políticos apurar, analisar, deferir ou não, eles desconhecem”.

Além disso, a conselheira afirma que Marco Vinícius mentiu com relação às ossadas do Araguaia durante sessão online – “ele mentiu, prometeu coisas para a juíza que não cumpriu até hoje”.

Repetição de modus operandi da ditadura

Segundo Vera Paiva, professora de psicologia da USP e filha do desaparecido político Rubens Paiva, as famílias estão buscando apoio para que a busca dos corpos que nunca foram entregues não seja encerrada.

“Se a gente encerra essa comissão, que é uma comissão de Estado, a gente em um certo sentido eterniza o modo de funcionamento que está claríssimo no caso do Bruno (Pereira) e do jornalista (Dom Phillips)”, diz Vera. O indigenista e jornalista britânico foram brutalmente assassinados no Amazonas.

A professora ressalta que “essa atitude permanente de desinformação com as famílias, de maltrato das famílias, que é algo que aconteceu na ditadura, seguiu acontecendo (…) mostrando como isso se eternizou”.

De acordo com Vera, a tática usada pelo governo Bolsonaro é a mesma tortura usada contra as famílias de presos políticos, “que recebem telefonemas anônimos, dizendo que vai acontecer não sei o quê – minha mãe cansou de receber esse tipo de telefonema, esse tipo de informação que a família inglesa recebeu do Dom”.

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Tatiane Correia

Repórter do GGN desde 2019. Graduada em Comunicação Social - Habilitação em Jornalismo pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS), MBA em Derivativos e Informações Econômico-Financeiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Com passagens pela revista Executivos Financeiros e Agência Dinheiro Vivo.

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