Internet promove inclusão, mas acesso ainda é restrito no Brasil

Jornal GGN – De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD), o acesso à internet no Brasil ainda é restrito por fatores econômicos, raciais, geográficos e geracionas. Confrontados com outros estudos (que demonstram o poder da internet de promover a transformação política e social), os números levam a um questionamento lógico: se a internet é uma ferramenta política, como ficam os desconectados?

Com esses dados em mãos e partindo dessa pergunta fundamental, o site Nexo ouviu dois pesquisadores.

Para o Professor de Ciência Política na UFBA, José Antonio Pinho, o poder transformador da internet é supervalorizado. A tecnologia é um meio, não um fim. E o fortalecimento da democracia ainda depende de organizações físicas, reais.

Já o ativista da cultura livre, Rodrigo Savazoni, acredita que a internet promoveu sim a inclusão política da população. Ele entende que, ao aumentar a participação, o meio fortaleceu o processo democrático. “Acho que segue sendo um objetivo válido. E se há gente desconectada, que trabalhemos para conectá-las. E, sobretudo, para que essa experiência lhes ajude a tomar parte da boa política”.

Do Nexo

Se a internet é uma ferramenta política, como ficam os desconectados?

João Paulo Charleaux

Estudos exaltam o uso de smarthones e computadores no engajamento político e no aperfeiçoamento da democracia, mas cenário virtual ainda reproduz a exclusão do mundo analógico

A internet reduz a distância entre os cidadãos e a política. Vários estudos têm mostrado como os smartphones e as redes sociais promovem a militância social, a transparência do poder público e a interação entre representantes e representados. Mas que benefícios isso traz para os milhões de brasileiros que não estão conectados?

No Brasil, o acesso a internet é restringido por fatores econômicos, raciais, geográficos e geracionais, como mostram dados da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio) de 2014.

O estado da desconexão no Brasil#

Nos três meses anteriores à realização da pesquisa, quase metade dos consultados afirmou não ter acesso a internet sequer uma vez.

OFFLINE#

Nas regiões Norte e Nordeste, mais de 50% não tem acesso.

POR REGIÃO#

O mesmo índice aparece entre os negros.

POR RAÇA#

Entre os que ganham menos de dois salários mínimos, o número de desconectados supera o dos conectados. A proporção se inverte entre os que ganham mais de dois salários.

POR RENDA#

A conectividade também despenca com o passar dos anos. A partir dos 50, há mais desconectados do que conectados no Brasil.

POR IDADE#

Se a internet é uma ferramenta política, como ficam os brasileiros desconectados?#

O Nexo propôs essa única questão a dois pesquisadores. Veja a análise feita por cada um deles.

Internet apenas complementa ‘artefatos humanos’

José Antonio Pinho

Professor de Ciência Política na UFBA (Universidade Federal da Bahia) e organizador do livro “Artefatos digitais para a mobilização da sociedade civil. Perspectivas para o avanço da democracia”

“Existe uma supervalorização da internet e do seu uso, como se ela fosse uma panaceia para todos ou para muitos problemas da população. Isto está supervalorizado. A sociedade brasileira ainda preza muito o contato presencial e ainda temos uma vasta parcela da população vivendo no analfabetismo e no analfabetismo funcional, o que limita o acesso à Internet.

Um outro aspecto, ainda mais preocupante, é uma possível característica de elitização de todos esses aparatos. Bem, a tecnologia é um meio, não um fim. A democracia pode se construir com auxílio das tecnologias – no caso, os artefatos digitais -, mas ela acontece a partir de movimentos sociais e políticos com ‘artefatos humanos’.

Não dá para negar o imenso potencial que as redes têm. Basta ver como se democratizou o acesso ao celular, que tem alcançado segmentos mais baixos da população. Agora, o que todos estão fazendo nas redes ainda é uma questão para maiores pesquisas. Frente aos dados disponíveis – principalmente gerados pelo Cetic.br do Comitê Gestor da Internet – não dá para ser muito otimista. O que se constata é que o uso para fins mais políticos (e, portanto, para a busca de maior democracia) ainda é uma parte pequena de todos os contatos feitos. Novamente, reforça que tecnologia é uma coisa, política e democracia são outras”

É preciso ampliar a conectividade

Rodrigo Savazoni

Ativista da cultura livre, é diretor do Instituto Procomum e escreveu o capítulo sobre o Brasil do livro “Ativismo Político em Tempos de Internet”, organizado por Bernardo Sorj e Sergio Fausto.

“Quem constrói a política? Quem toma parte dos processos democráticos? Quem são os cidadãos que se tornam ativistas de uma causa, que militam em um partido ou em um coletivo? Quem se organiza cotidianamente para produzir respostas e soluções para vida em comum? Historicamente, com a internet, temos mais ou menos gente participando da política, construindo a democracia, se engajando em processos sociais? Acompanhando o Brasil que eclodiu depois de junho de 2013, em que redes passaram a disputar com redes, na internet e nas ruas, os rumos do nosso processo democrático, me parece que houve uma inclusão política no país.

Pode ser uma inclusão pueril. Pode ser que seja inconsequente (não acho isso). Mas tem aumentado a participação, e isso é essencial para uma democracia, ainda mais agora que temos de reconstruí-la.

Uns bons anos atrás escrevi um artigo para o livro “Para Entender a Internet”, organizado por André Avório e Juliano Spyer, sobre a Brecha/Exclusão Digital, um tema então em voga, porque tratava da necessária incorporação à rede da maioria dos cidadãos numa época em que bem pouca gente acessava a internet. Acreditávamos que com a inclusão digital se faz possível – mas não é fato que irá ocorrer – romper com a estupidez normatizadora da mídia de massa. Terminei aquele texto afirmando: ‘se entendemos que a era digital traz benefícios para os seres humanos, uma de nossas lutas principais deve focar a extensão dessas possibilidades a todos que vivem neste planeta, a começar pelo nosso país’.

Acho que segue sendo um objetivo válido. E se há gente desconectada, que trabalhemos para conectá-las. E, sobretudo, para que essa experiência lhes ajude a tomar parte da boa política.”

Redação

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