É hora da civilização da indústria, por Luís Nassif

A saída para o país é reeditar a saga da indústria, não para substituir importações, mas como inovação e empreendedorismo

Imagem: Shutterstock

O termo foi cunhado na década de 40 por Roberto Simonsen, fundador da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, e maior líder empresarial da história. Visava criar a utopia de um país se industrializando, com pactos civilizatórios entre empresas e empregados, saindo da economia agroexportadora de então. A ideia era mobilizar corações e mentes em direção a esse projeto.

Em pleno século 21, a única saída para o país será reeditar a saga da indústria, não mais como mera substituta de importações, mas como espaço de inovação e empreendedorismo.

Desde o plano Real, a financeirização acabou com a saga do empreendedor. O empreendedor não era mais o bravo que montava um novo negócio, explorava condições de mercado, obtinha financiamentos do BNDES e gerava novos fornecedores e novos empregos. Passou a ser substituído pela imagem do yuppie da Faria Lima, administrando fundos de investimento preocupados apenas em arbitrar valores, comprando barato, vendendo caro.

Não há termos de comparação entre o empreendedorismo da economia real e as arbitragens do mercado financeiro. O mercado, aliás, só se legitima politicamente quando ajuda na reciclagem da economia, investindo e correndo riscos em novos setores.

Não é isso que ocorre no Brasil e nas economias dominadas pela financeirização. Tome-se o caso das refinarias brasileiras. Havia necessidade de ampliar o parque de produção. Bastaria autorizar novos empreendimentos. Mas o capital financeiro só se interessava em adquirir refinarias já existentes. No caso recente, em operações eivadas de suspeita de corrupção.

Nesses anos todos, abandonou-se a ideia do fortalecimento de setores, de programas de integração de pequenas e médias empresas ou pela opção pelos tais campeões nacionais ou pelo aumento irresponsável dos custos de financiamento do BNDES.

O que estava por trás dessa mudança? Simples. O empreendedor da economia real necessita de capital para implantar seu negócio. Se obtém financiamentos a juros civilizados, quando for buscar capital de risco, terá muito mais fôlego para negociar futuros aportes de capital a preços justos. Sem os financiamentos do BNDES, qualquer aumento de capital é feito na bacia das almas, já que os recursos financeiros tornam-se escassos.

A opinião pública precisa recuperar a figura desse empreendedor, do sistema de financiamento da inovação, das formas de organização da produção dos pequenos.

O Brasil tem larga tradição de organização empresarial, das cooperativas aos Arranjos Produtivos Locais, dos consórcios ao modelo do Movimento dos Sem Terra.

Em outros tempos, experimentou os parques tecnológicos e outras maneiras de aproximar o pesquisador das empresas. A energia de qualquer política desenvolvimentista depende desses novos atores. Não temos mais os capitães da indústria dos anos 90, os Jorge Gerdau, Paulo Villares, Paulo Cunha, Antônio Ermírio de Moraes. A nova saga terá que ser criada, com a volta da ideologia da industrialização que perdeu em algum momento do pós-Real. Não há nada mais significativo dessa massacre ideológico do que o empresário industrial julgar que um país se constrói com uma lógica financeira que liquida com seu próprio negócio.

O fracasso da ultra financeirização, o debate mundial – que uma hora chegará ao país – em breve poderá produzir uma nova mística industrial, capaz de superar a destruição imposta pela Lava Jato e pelo sentimento anti-produção que historicamente marcou o país.

Luis Nassif

6 Comentários

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  1. Esta “hora” de fato já passou por nós entre os anos 40 a 60, décadas antes da China e agora, Índia). Dos gigantes planetários (tamanho, população, riquezas, diversidade, etc.) do pós colonialismo exploratório, a previsão é que EUA, China e Índia (além do Canadá e Austrália, com baixa população e diversidade, mas já alto IDH) sejam as maiores economias do mundo, não só em PIB, mas também em ciência, tecnologia, inovação, etc… Já o (sub)desenvolvimento do braZil a ser uma nação de ponta neste mundo é uma combinação perversa e infame de: (1) Liderança ultraconcentrada de uma submedíocre “elite”, acostumada desde sempre à fácil exploração das fartas riquezas naturais deste (neste aspecto) privilegiado país; (2) Ligação desta “elite” aos interesses estrangeiros que lhes “parceirizam” como capatazes e corretores destas riquezas; (3) Pouco ou nenhum comprometimento com o país como nação (território e seu povo), tratando ambos apenas como “recursos” a explorar; (4) A baixa ciência e consciência desta enorme maioria (“povo”) submetida (além de exploração) à manipulação e desinformação daqueles que a mantém subjugada a estes infames interesses. A saída desta situação, cada vez mais vexatória em relação ao potencial deste país, navega entre revolução contra os que a mantém ou convencimento destes de que podem ser, além de ricos e poderosos, os indutores de serem mais “felizes em um país feliz”. O risco que corremos, desde os anos 1500, é de que se e quando isso acontecer, não reste mais nada além de terra arrasada.

  2. Veja-se p.ex alguns dos diversos incentivos que eventualmente temos hoje ou tivemos no passado para o empreendedorismo produtivo desta submedíocre elite: (1) Incentivos fiscais: são utilizados meramente para aumentar os lucros; (2) Proteção contra importações: utilizados para uma vantagem eterna (sem “phasing out”), sem desenvolvimento da competitividade; (3) Crédito subsidiado: frequentemente aproveitado para a pessoa física e quebra da pessoa jurídica; (4) Incentivo a negócios com as necessidades de estado: corrupção, não entrega ou baixa qualidade delas; (5) Incentivos de investimentos financeiros, para bolsas, IPO’s, isenções, etc: embora a financeirização seja mundial, ela não “mata o resto”, como aqui; Acrescentem outros, como a substituição de indústrias nacionais por mero comércio internacional. Até estatais bem sucedidas são parcialmente substituídas por meras importações, como a do aparecimento de centenas de importadores de combustíveis a preços internacionais, exportando lucros, know-how e empregos! O fato é que com esta “cultura de esperteza” não há política de incentivos que resulte em efetiva produção e inovação de produtos e serviços, mas de mero embolso de resultados melhores e mais fáceis para acumulação de riquezas privativas. O resultado, cada vez pior, vê-se aqui (® emissora de TV).

  3. Telejornal qualquer , MERCADO , o Mercado reagiu mal após Bigorrilho perder um gol num amistoso da 3@ divisão , culpa do Lula que ……. e aí entrevista um garoto engravatado da farialima … mercado=mercado financeiro.

  4. À financeirização é indiferente que permaneçamos nessa merda colonial ou nos industrializemos. Ela ganha nas duas pontas. Aqui o prémio “Faz a Diferença” vai para nossa elite agroexportadora, última etapa de um longo caminho de atividade extrativista, exploradora, escravocrata e parasitária. Aqueles que tentaram industrializar e diminuir o poder dessa elite depravada tiveram destinos semelhantes: o suicídio, a deposição, a morte em um “acidente”, envenenamento, dentre outras. E os laços entre essa elite e as forças alienígenas a quem se associam nunca é devidamente enfatizada. É inútil esperar que um social-democrata moderado e conciliador possa levar adiante um projeto de industrialização cujos inimigos estão em toda parte, aqui e lá fora. Não gosto de comparações com a China e a Índia; são países autóctones, milenares. Não é possível comparar o que os portugueses encontraram na Índia (uma sociedade milenar, altamente complexa e estratificada) e os povos primitivos com que aqui se depararam; e a malha de comércio que a China teve, antes da chegada de europeus e americanos por lá foi provavelmente muito maior que todo o comércio europeu do período. Esses povos não tiveram necessidade de um projeto nacional, pois sempre foram, para todos os efeitos, nações. Tinham os recursos naturais para isso, não precisaram se lançar ao mundo para prosperar, como os europeus. Aqui tivemos um “povo” transplantado, cúpido e ignorante, e um outro povo de capatazes e feitores, que só podia ter dado no que deu, zeladores dos tesouros das metrópoles. Mas tudo isso é secundário para o mercado financeiro. Commodities ou bens de capital e consumo, tudo isso serve para cevar essa vara de porcos. Sonhamos Mao e Nehru, mas só conseguimos silvios santos e bolsonaros. A especulação internacional agradece e lambe os beiços. Tanto faz. Mas para o colonialismo e sua hipérbole, o imperialismo, é essencial que sejamos mantidos cavalgando em círculos, rente à cerca, calmos e conformados; nada de galopar e quebrar cercas. E nós, candidamente, atendemos, dóceis, a esses adestradores. Temos as riquezas, eles as exploram. Quando aparece um maluco querendo que essas riquezas fiquem por aqui mesmo…já sabem o que acontece. Tenho 60 anos, e já perdi a esperança de que seremos, um dia, uma nação independente e próspera de fato. A grande obra dessa elite: a manutenção da massa na mais absoluta ignorância e insciência. Parabéns a ela.

  5. Entoncis, o trem do tempo passô lançado feito uma fléxa. Em alguns meses, a gata Jurema tinha parido mais seis fiótis, trêis fêmeas e trêis machos. Tuxo estava cocorpo comprétamiente curado, maisi ãinda tinha marcas psíquicas. Eile caminhava sózinho pela mata, subia em arves próximas du rio e saltava nas águas córrentes. Tudos eiles já tinham apéércébido os modos istranhos deile. Mestre Bódim e Cascatim foram os premeros a pércéberem. Com Cascatim, que queria estar sempre piérto deile, Tuxo o enxotava:
    – Sai di piérto di mim! Cão sarnento, vira-lata imbécil! Suma daqui, pulguento idiota!
    Cascatim, entoncis, baixava as zoreia, deitava e ficava lá a espiá-lo.
    Mestre Bódim, pur sua vez, procurava dialogar cum eile, mas Tuxo num dava atenção, parecendo estar surdo.
    Indaí, Mestre Bódim, aproveitando a ausência di Tuxo e di Cascatim, chamou tudos eiles pra una reunião.
    Adispois di tudos eiles assentarem nos banquinhos. Mestre Bódim cumessou a falar:
    – U caso di Tuxo é śerio e éxije di nósis muitia atenssão.

  6. Entoncis, o trem do tempo passô lançado feito uma fléxa. Em alguns meses, a gata Jurema tinha parido mais seis fiótis, trêis fêmeas e trêis machos. Tuxo estava cocorpo comprétamiente curado, maisi ãinda tinha marcas psíquicas. Eile caminhava sózinho pela mata, subia em arves próximas du rio e saltava nas águas córrentes. Tudos eiles já tinham apéércébido os modos istranhos deile. Mestre Bódim e Cascatim foram os premeros a pércéberem. Com Cascatim, que queria estar sempre piérto deile, Tuxo o enxotava:
    – Sai di piérto di mim! Cão sarnento, vira-lata imbécil! Suma daqui, pulguento idiota!
    Cascatim, entoncis, baixava as zoreia, deitava e ficava lá a espiá-lo.
    Mestre Bódim, pur sua vez, procurava dialogar cum eile, mas Tuxo num dava atenção, parecendo estar surdo.
    Indaí, Mestre Bódim, aproveitando a ausência di Tuxo e di Cascatim, chamou tudos eiles pra una reunião.
    Adispois di tudos eiles assentarem nos banquinhos. Mestre Bódim cumessou a falar:
    – U caso di Tuxo é śerio e éxije di nósis muitia atenssão.

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