Fernando Horta
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Save the Amazon, por Fernando Horta

Foto CIMI

Save the Amazon

por Fernando Horta

Desde 1500 já tivemos mais de uma centena de projetos para a Amazônia. Desde apenas exploratórios, usando o extrato das seringueiras, explorando plantas nativas, a diversidade biológica, depois ecológica, os minerais, até, mais recentemente, a bioexploração, em que tentamos que o mundo pagasse royalties do que fosse produzido a partir de extratos biológicos da região. Na Rio 92, talvez uma das poucas inciativas do governo Collor que valha a pena mencionar, a ideia não vingou pelo veto de um único país. Um doce se você souber qual foi.

Depois, tivemos projetos desenvolvimentistas, como a compra do Acre, a construção da ferrovia Madeira-Mamoré, a Belém-Brasília, o projeto militar de “integrar para não entregar” com a TransAmazônica, a Zona Franca de Manaus, chegando até Belo Monte nos governos progressistas. Além destes, temos os projetos de defesa e militares que começam desde a criação do Estado do Grão Pará (1751), até os projetos Calha Norte (1985) e SIVAM.

Temos ainda os projetos “particulares” como a invasão da pecuária, a biopirataria feita por ONGs na região, os garimpeiros e mineradoras ilegais, a extração ilegal de madeira, o tráfico de animais e o uso político dos problemas da região para sustentar messianismos e salvadores da pátria que surgem sazonalmente, em época de eleição.

Podemos falar ainda do sempre presente interesse em “internacionalizar” a Amazônia, transformar em “reserva mundial” ou que se possibilitem a venda de terras para estrangeiros com o objetivo de “proteger” a “diversidade” da região. Dentro destes discursos protetores existem aqueles cujo objetivo é proteger a vida na região (toda ela, inclusive a humana) e aqueles que acham que as populações da região também são um mal (com exceção dos índios adaptados) e que a “proteção” deve se restringir somente aos ecossistemas, com o mínimo de participação humana. Todos estes projetos recebem generosas doações de fundos internacionais. “Cidadãos” suíços, belgas, holandeses, canadenses fazem “vaquinhas” para apoiar a vida da Arara Vermelha, do Uacari-branco ou do Tamanduá Bandeira. Todas ações que sobrevivem em cima das famosas narrativas de “pulmão do mundo” ou “filtro e controle de temperatura do planeta” ou ainda “do seguro de vida do ecossistema terrestre”.

O que todas estas narrativas e projetos têm em comum? Nenhuma delas ouve os índios, os trabalhadores ou as pessoas que vivem na região, ocupando 61% do território nacional. As populações do norte (indígenas ou não), de repente, recebem projetos vindos do nada que são colocados – por sobre suas vontades – por um sem número de atores nacionais e internacionais. “Agora vamos ajudar a vocês silvícolas ou semi-silvícolas, culturalmente atrasados ou incapazes de pensar no desenvolvimento da sua região. Agora vamos proteger a Arara de barriga amarela, a “Rain Forest” ou as “tribos isoladas” e, ou você aceita, ou é parte do problema”.

A Amazônia real inexiste neste mundo de discursos. Aquela com seus problemas regionais de diversidade humana, da disputa violenta dos espaços entre diversas espécies animais e vegetais. Aquela Amazônia que sofre com um país virado de costas para ela, distante e quase sempre autoritário. Um local em que até a boa vontade normalmente não é boa, especialmente se fala inglês ou francês. Um local em que ONGs se amontoam, várias. Às vezes para salvar as mesmas espécies ou “assistir” às mesmas populações. Pesquisadores do mundo todo “preocupados” com a degradação da região, a morte de espécies e toda uma gama de perguntas de pesquisa que estranhamente envolvem complexas análises de DNA, bioquímicas e médicas de um sem número de extratos vegetais ou animais na região. Não raro precisa-se levar espécimes de pesquisa para fora do país. Tudo, óbvio, para o bom desenvolvimento da região.

O discurso mais conhecido sobre Amazônia é, no entanto, aquele que a chama de “the Amazon”. “The Amazon” é um local mítico onde a natureza pura convive com humanos puros. Onde os jacarés e os macacos aguardam ao lado das paradas de ônibus que levam cidadãos-tarzã para seus respectivos trabalhos. Colher cocos, construir casas com madeiras ou fazer lindos cestos de palha. “The Amazon” é o lar de bilhões de espécies que formam um Éden bem aqui no nosso mundo material. É o local que precisa ser protegido do Brasil e de seus garimpeiros, madeireiros, políticos e até mesmo dos seus habitantes, estes incultos e incapazes que podem colocar a sobrevivência do planeta inteiro em risco porque não sabem conviver com o milagre que foi colocado à sua disposição.

Para o governo Temer, “the Amazon” tem que ser fatiada e, através da exploração mineral aumentar o PIB e enriquecer senadores. Como fizeram artificialmente com a safra deste ano, para dizer que o país “voltou a crescer”. Na visão de estrangeiros, “The Amazon” precisa ser preservada. Para que ou para quem não interessa. Comprem-se terras, invadam com ONGs, protejam os peixes-boi, as araras e as tribos isoladas. That’s all, folks!. No fundo “The Amazon” precisa ser salva and you have to help! Já a Amazônia real não interessa a ninguém.

No meio desta hipocrisia, com decretos de Brasília, “crowdfundings” internacionais e choros de übermodels em shows de rock, vivem as populações ribeirinhas desassistidas, as tribos autóctones lutando pela preservação de seus direitos, as populações urbanas muitas vezes ilhadas economicamente e lutando pela diversificação das formas de trabalho e educação, e os núcleos urbanos fronteiriços a viver num estranho limbo com regras e leis próprias. Todos mudos. Nada a eles se pergunta ou se permite que digam. Outrora os índios eram entendidos pela nossa legislação como “incapazes”, com status jurídico semelhante ao de menores de idade. Pois parece que para o mundo todo, incluindo parte do Brasil, esta condição abrange agora a todas as populações do Norte.

Não, “The Amazon” não precisa ser salva. A Amazônia real precisa é ser ouvida.

Fernando Horta

Somos pela educação. Somos pela democracia e mais importante Somos e sempre seremos Lula.

3 Comentários

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  1. Provincianismo

    Visão provinciana do estudo e da abordagem internacional sobre a Amazônia, que é bastante rica e complexa.
    De certa forma, faz como outros discursos: um retrato empobrecido da Amazônia, que contribui para a desvalorização desse bioma fundamental.

    Sem dúvida, o governo atual trabalha para o retrocesso em diversos assuntos, entre eles a questão ambiental.
    Os desafios futuros são grandes, e podem se significativos para a Amazônia e para o Brasil: http://www.cienciaeclima.com.br.
    Mas os brasileiros ainda não estão cientes dos desafios que se avizinham. 

    1. provincianismo…..

      Somos sim e totalmente tosco. Um livro em branco. Qualquer informação que nos passam, ainda mais com um bom apelo catastrófico e apocaliptico,embasado por grandes figuras hollywoodianas e já temos uma nova religião. Lembram do CFC e a Camada de Ozônio?  Como o Mundo poderia sobreviver sem a proteção da Antartida? Os pinguins agradecem junto com toda Indústria Americana. Agora, eles só querem salvar a Amazônia, para o futuro da Humanidade. Quantas Almas descompromissadas? Não dá para entender como esta gente inventou o Nazismo e jogou 2 bombas atômicas encima de mulheres e crianças?! Brasileiros também querem salvar a Amazônia, enquanto apoiam tantos benfeitores e cagam diariamente nos rios que passam próximos às suas casas. Inclusive na Amazônia.  O que importa se a maior incidência de mortes de crianças neste país e´a falta de tratamento de água por falta de tratamento e coleta de esgoto? Importante é salvar a Humanidade. (P.S. Os indígenas do Pico do Jaragua, que estão há anos, jogados num barranco do tamanho de um campo de futebol, esperam por tanta preocupação e pressão de gente tão interessada. Eles são os primeiros donos de São Paulo. Padre Anchieta, que é Santo, roubou todas as terras deles.  Estão lá no Jaraguá, esperando a devolução. Não precisa nem de Estudo Antropológico). Não é bem a “Humanidade” que interessa, não é mesmo? SAVE THE GUARANI’S         

  2. Ouvir a bancada ruralista sobre a Amazônia Legal?
    Nassif, Feliz Natal e Feliz 2018, pois quando lemos ou ouvimos sobre a necessidade de se ouvir a população da Amazônia Real é sinal que a campanha de um novo ano eleitoral já está em curso. E, ora bolas, a oitiva da população sempre se dá via bancada ruralista e da bíblia, através dos mesmos deputados e senadores interessados em se apropriar dos espaços públicos ainda remanescentes nos nove estados que formam a AM Legal, todos falando em nome dos 23 milhões de habitantes de seus 775 municípios, algo em torno de 12,32% da população brasileira. Como sempre, a desinformação campeia, pois não há a mínima referência ao principal problema que aflige a região na hora que passa, qual seja, o fato de seu presente e futuro estar no aguardo de decisão do STF sobre a inconstitucionalidade de parte da lei 12.651/2012, que revogou o Código Florestal de 65 e boa parte dos mecanismos legais que protegiam a floresta e mesmo assim está na mira do “desenvolvimento sustentável” pregado por Gilmar Mendes e seus pares e ímpares. Não, nesta hora voltam os espectros da internacionalização da AM (sem qualquer menção, claro, ao fato de ter virado zona de treinamento do poderio militar norteamericano, como Michel Temer haverá de celebrar esta semana nos EUA) e o grande inimigo voltam a ser as Ongues, ou melhor, Oscipis, desde que FHC acabou com nossas não-governamentais. Estas, por outro lado, merecem toda recriminação por terem apoiado direta ou indiretamente o impeachment, mas não passam de zeros à esquerda em que pese todo seu direitismo político, pois nem ao menos estão presentes na Amazônia. Quem ainda amassa areia por lá são os pesquisadores científicos, os mesmos que escandalizaram o país quando anunciaram, nos anos 70, que o desmatamento acabaria com a exportação de vapor d´água que a AM promovia para o Sudeste brasileiro, através de rios aéreos de altitude que respondiam, por exemplo, pela tão decantada quanto hoje extinta garoa paulistana. Com umidade relativa do ar semelhante a de desertos, SP e MG vivem o final do inverno mais seco dos últimos tempos, talvez preludiando a mesma escassez ou colapso hídrico de 2014 no verão que se avizinha, e ninguém mais contesta o “catastrofismo” desse repórter, até pelo simples fato dos satélites orbitais demonstrarem que os rios aéreos existiam mesmo. E que os 85 milhões de habitantes do Sudeste, 44% da população nacional, sentem na carne as consequências do desmatamento indiscriminado do Norte, com a aridez e falta de água desencadeando incremento de doenças e mortalidade. Por tudo isto, convêm salientar que, além do STF estar prestes a julgar o presente e futuro do setentrião tapuia, a bancada ruralista – 331 dos 513 deputados federais e 25 dos 81 senadores – está prestes a modificar o critério de mensuração das áreas de preservação permanente, o que poderá liberar mais 40 milhões de hectares (um estado de Goiás e um do Espírito Santo) para os latifundiários, além de propor o fim da reposição florestal para outros 30 milhões de hectares, ou uma extensão territorial, do tamanho do RJ e SP. Como a senadora Ana Amélia (PP-RS) advoga a reposição florestal via eucalipto, uma poderosa fonte de desertificação, é melhor nos atermos aos problemas reais – como Temer querendo acabar com a Renca ou Reserva Nacional de Cobre e Associados – ao invés de demonizar os esforços porventura existentes em prol de um pouco de bom senso no uso da AM. Nada, portanto, de propor a auscultação de seus caboclos e ribeirinhos para desenhar seu amanhã, uma vez que estas populações desassistidas são reféns de seus porta-vozes eleitos e estes últimos são os que falarão em seu nome para destroçar o pouco que ainda resguarda esses 61% do país da desertificação e miséria totais.

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