Maira Vasconcelos
Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).
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Números do Des-Alinhavo (1ª parte), por Maíra Vasconcelos

I

Ainda não aprendi o valor de tempo do sol-lua.
Busco faminta o buraco da luz em cada nota musical. A música é uma entrada, sim!, mas nem sempre fonte vitalícia.
Termina.

A natureza supera as mortes de si, sempre a cantar e plantar. Podemos frutificar-nos com pés de laranja e macieiras.
Nesta ordem de plantações.

*
Sabemos!: Drummond, , , Clarice , , , morreram. Mas os sábados ainda estão vivos! E a exploração do tempo é extremamente pessoal.
Não sabemos é quando tudo irá de novo morrer, e de novo nascer, e de-s novo-s.

Os galhos tecem. .saem a retorcer-se. .sS.

*
Acho que vou escrever assim para sempre!: meu jeito anterior passou por mutação. Bichinho de atenas vivas que sou.
Nova em folha com veias brancas!, dizem.

*

Hoje passei a madrugada em claro. De olhos abertos e corpo mole, no Aeroporto de Guarulhos. Escrevi em público – num momento fiquei zonza. E nem vi meu amor passar.
Ele esqueceu-se de mim.
Estamos os dois em viagem, e ainda não nos encontramos no exato saguão.

Ao amor dedico escrituras de uma novela:
“Gosto do abrir de olhos na manhã dos meus amores”.

II

Cecília Meireles vestiu-se de antiguidade para ser aquela:
“Ouro Preto: cidade maltratada”.
Enquanto Outro Preto continuou a nascer com o sol brilhado de cada amanhecido dia.

Mas Cecília escreveu, sim!, na escuridão de um escravo açoitado.

*
Sentir junto diminui a falta de graça da vida.

*
.minha tia sofreu tanto de tristeza!.
.que agora só quer viver lunática.

III

O que é viver dignamente? O que é viver?
Se o tempo apenas passa enjauladamente entre nossos nós.
Cruos e cruas em ossos, vos bendigo!

Se eu conversasse com Deus, diria que (E)ele é um (f)Fajuto.
Ângela ama Deus! Mas ela é tão destrambelhada..

IV

Um leitor mandou-me músicas e também cenas de filmes do F.Fellini.!.! Fico pensando o que passará na cabeça de quem me lê. O que será que as pessoas leêm?
A palavra que escrevo do lado de cá, não é a mesma palavra lida do lado daí.
Não sei o que escrevo!

A interpretação infinita é a liberdade de cada indivíduo diante da palavra.
.doida.
Ninguém cria em estado de normalidade.

V

Alguém sabe sobre a fina linha que separa o autor dos seus personagens?
Ninguém sabe! (ninguém sabe que hoje escrevo inspirada por Drummond)

Quem escreve transita no vestuário de um teatro.
Vou ali vestir uma roupa e já volto.
E se me encontram desnuda no meio do caminho..! OH!

VI

Queria que alguém me pegasse desprevenida.
Isso é tão difícil!, quando tem-se pele de gatuno tristão.
E se o gato é de três cores, tudo então é dosadamente pior.

Eu sei que três cores juntas mudam tudo num rodopio de pincéis.

*

São 6h25, em São Paulo. Cansei-me de ti!
Há névoa de sujeira tão baixa aqui!, vem no nariz da gente pinicando até fazer espirrar.

*

Deveria banhar-me em Rosas Claras.
Tenho cuidado especial com minhas peças brancas.
Porque são claridade, as coloco separadas. Tenho até blusa branca de bonito linho!
Arrumo tudo com esperança:

deixem-me um pouco em paz!,
por favor, desordem mundana.

VII

Qué suntuoso tudo o que este leitor me enviou!
Vou copiar aqui para que todos vejam.
É tudo isso:
“Silentium”,
e
“Schubert: Impromptus B-Dur op. 142-Konstantin Scherbakov”.

Não posso escrever sobre este presente. porque não sei. Somente faço uso da palavra quando tenho a coisa incorporada. Esta é uma verdade.

Leitor, posso dizer-te isto:
.fiquei calma, e lembrei-me das caras frias de emoção-guardada dos personagens de S.Beckett.!

*
Passados vários dias, abri teus presentes musicais. 
Precisei sentir que ganhava algo. Pegar nisso que me foi dado.
Porque,
Fiquei muito sozinha, de repente!

VIII

Às vezes, palavreio pensando rápido demais e não me alcanço no exato instante. O entendimento escapa escapável. 
Não vivo para saber de mim. Esta mesma, a-sS de sempre.

O que escrevo deve ser entendido quanto menos com a vossa razão.
Ler estas palavras, eis-me aqui, pode ser como ter a sensação de. Apertar uma flor.

IX

Já viram a noite escura ter várias cores? Eu posso vê-la assim todos os dias, se quiser.
Toda cor tem seu ponto inflexível no escuro. Basta ver uma vez para nunca mais esquecê-lo.

A lua é branca: de fumaças cinzas que a perpassam e a tornam ainda mais complicada.

*
Estou ruída pelo meu inconsciente querer tanto muitas cores! 
Enjoar-me-ei de tanto mar. Esta água que em sua plenitude está por chegar.

Um livro é uma enchente. De marés, de sol-lua, de águas em dorsum marrons.
.ah, esta união desgovernada:
toda natural!

X

Quero o silêncio!
Meus pássaros estão em sentinela. Para proteção.
Estufam o peito: , , ,
.pega, fôlego..
..O silêncio está por vir. 

Maira Vasconcelos

Maíra Mateus de Vasconcelos - jornalista, de Belo Horizonte, mora há anos em Buenos Aires. Publica matérias e artigos sobre política argentina no Jornal GGN, cobriu algumas eleições presidenciais na América Latina. Também escreve crônicas para o GGN. Tem uma plaqueta e dois livros de poesia publicados, sendo o último “Algumas ideias para filmes de terror” (editora 7Letras, 2022).

1 Comentário

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  1. Números podem ser tão exatos e precisos quanto desejamos.

    Mas mesmos os números não dão conta de descrever todos fenômenos turbulentos. As palavras são menos exatas e precisas do que os números, nem sempre são suficientes para mensurar sentimentos difusos e inexatos quando o que sentimos é demasiado caótico, nesses momentos as palavras encantam, as palavras doem, falham e carregam emoções contraditórias, por isso mostram, a partir das sensações que causam, interpretações variadas.

    Palavras difusas sempre nos dão mais de uma sensação, as leituras sucessivas nunca são as mesmas. A primeira sensação ligeira me remeteu a letra irônica da primeira canção, perdoe-me o que agora confesso, mas a segunda leitura foi suave, de uma vela aberta com muitas rotas para navegar, a liberdade de seguir com os ventos e correntes, ou na direção que nos agradar. 

    A terceira leitura de sua crônica me trouxe a lembrança de discussões que tínhamos, na juventude, sobre as variadas possibilidades de ser humano e sobre a imensa diversidade de seus tipos, que nada do que é humano pode nos ser estranho, que todos devem ser respeitados nessa condição; a primeira imagem que me ocorreu de imediato foi a vastidão de personagens de Fellini e o interesse que ele manteve pelo diverso.

    A quarta leitura foi minuciosa nas sensações que o texto me causava, não pensava apenas de um desfile ligeiro, de desenhos rápidos e quase superficiais da comédia humana, mas pensava em desenhos das inquietudes interiores, dos desenhos da profundidade que queria retratar e que afloram nos rostos e na superfície do corpo humano. Aí entra a peça de Schubert, o concerto de Arvo Pärt e o talento da direção de Adrian Marthaeler.

    Foram boas lembranças que sua crônica me trouxe e, então, em gratidão retribuí com o modesto envio dos vídeos. Fico muito grato também por responder dessa forma às minhas colaborações e aceitá-las como presentes. Segue um pacote de velhas cartas de amor, um número de dança e um abraço.

    A Bundle Of Old Love Letters

    [video:https://m.youtube.com/watch?v=XOV58S4Phpc%5D

    Here in my hand I’m holding

    Stories of days of old 

    Keepsakes of memory 

    No one knows what they mean to me

    Faded and worn, fingered and torn

    Just a bundle of old love letters

    I kiss each one and though I’m pretending

    It’s a beautiful play with an unhappy ending

    Weary and blue, I read them through

    They’re all I have now of you

    Teardrops of mine between every line

    Just a bundle of old love letters

     

    In the middle somewhat elevated

    [video:https://m.youtube.com/watch?v=NghGmjtxeak%5D

     

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