Cientistas brasileiros criam técnica de análise de imagem para ajudar em busca de arcos gravitacionais

 

 

Futuros estudos de dois dos maiores mistérios da ciência moderna – a matéria e a energia escuras – ganharam uma importante colaboração brasileira. Após quatro anos de investigações, um grupo de 15 astrônomos de quatro instituições de pesquisa do país e de uma dos Estados Unidos divulgou ter identificado pelo menos seis aglomerados de galáxias com fortes evidências de possuírem arcos gravitacionais – formas distorcidas de galáxias causadas pela chamada lente gravitacional (fenômeno criado pelo desvio da luz pela gravidade), que altera a forma de objetos que estão atrás dela.

A descoberta desses objetos curvos ajuda no mapeamento da distribuição de toda a matéria em galáxias e aglomerados, para estudar a matéria escura, que compõe cerca de 25% do Universo – a também misteriosa energia escura compõe 70% do cosmos; os 5% restantes são formados por matéria “normal”, que inclui elementos como hidrogênio, hélio e carbono, este último, importante elemento que constiitui os seres vivos.

Para ajudar na identificação dos arcos, cientistas do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) usaram várias ferramentas criadas por eles próprios, como o Mediatrix, um método já patenteado, que permite encontrar elementos que não aparecem de forma óbvia em uma imagem – técnica que poderia ser usada na análise de imagens médicas e na prospecção de petróleo, entre outras aplicações.

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O projeto foi batizado com uma sigla que só tem graça em português: Sogras, as iniciais de SOAR Gravitational Arc Survey, que em ortuguês significa levantamento de arcos gravitacionais por meio do SOAR (esta última é a sigla em inglês do Observatório Meridional para Pesquisa Astrofísica, instituição astronômica multinacional que fica no Chile). A pesquisa encabeçada pelos brasileiros não só representa um grande passo para a ciência nacional, como foi um trabalho pioneiro em vários sentidos. “Esta foi a primeira vez que uma equipe brasileira trabalhou com a busca sistemática de arcos, do começo ao fim do estudo”, comenta o pesquisador associado do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e coordenador do Sogras, Martín Makler. Ele conta que, até o projeto, essa área de estudos era quase inexistente no Brasil, mas, agora que está se estabelecendo no país, terá um forte impacto na multiplicação do conhecimento entre as instituições participantes.

O projeto também é consequência do investimento feito pelo país no SOAR. Desde que o observatório foi inaugurado em 2003, o Brasil não só passou a ter tempo de pesquisa no telescópio, como deixou de ser coadjuvante para ser protagonista em projetos mundiais. Construído por um consórcio formado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil (MCTI), pelo Observatório Nacional para a Astronomia Óptica (NOAO, em inglês) dos Estados Unidos e pelas universidades da Carolina do Norte e do Estado de Michigan, o telescópio do observatório, usado pelos cientistas do Sogras, tem um espelho de 4,1 m de diâmetro, capaz de captar a luz visível e os raios infravermelhos. Instalado a 2,738 mil metros acima do nível do mar, numa das melhores regiões do mundo para se observar o cosmos, é utilizado por uma legião de cientistas norte-americanos, brasileiros e chilenos. Como é sócio do aparelho, o Brasil – cuja participação é coordenada pelo Laboratório Nacional de Astronomia (LNA) – dispõe de um terço do tempo de observação feito com o equipamento.

Novos conjuntos de arcos

Concebido durante um almoço entre o físico argentino Juan Estrada, do Laboratório Nacional Fermi (Fermilab), nos Estados Unidos, e os brasileiros Eduardo Cypriano, da Universidade de São Paulo (USP), e Martín Makler, do CBPF, o Sogras é o primeiro projeto coordenado no país sobre arcos gravitacionais no qual nossos cientistas tiveram um papel determinante. A pesquisa contou com a participação de cientistas do CBPF, da Universidade do Rio Grande do Sul (UFRGS), da Universidade de São Paulo (USP) e do Observatório Nacional (ON), agrupados no Laboratório Inter-Institucional de e-Astronomia (LINea), em parceria com pesquisadores do Fermilab. Os resultados da primeira fase da pesquisa foram divulgados em 22 de abril na revista científica Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, editada pela Oxford University Press. [baixe o artigo abaixo]

Embora o feito dos brasileiros não seja inédito – os primeiros arcos gravitacionais foram descobertos em 1986 – os pesquisadores dizem ter descoberto novos conjuntos deles. A partir do uso de imagens em alta resolução, o grupo conseguiu obter “fotos” de 50 aglomerados de galáxias conhecidos com uma excelente qualidade de imagens. Embora prefiram a contagem dos aglomerados com arcos à dos arcos propriamente ditos, cada aglomerado desses possui um arco gigante e múltiplos objetos que podem ter esse tipo de curvatura.

Os cientistas descobriram “seis aglomerados com ‘arcos gigantes’ (claramente alongados e curvos nas imagens)”, dos quais têm “quase 100% certeza de que são arcos gravitacionais”. Para três deles, os pesquisadores colheram dados adicionais com o telescópio Gemini – cujo espelho tem 8m de diâmetro – que confirmaram a natureza dos arcos. Eles já solicitaram mais horas de pesquisa no telescópio para observar os outros três aglomerados.

O próximo desafio será ampliar o número conhecido de arcos e imagens múltiplas, além de mapear a distribuição de matéria em grandes escalas do Universo, tarefa que será desempenhada em um projeto mais ambicioso, chamado Dark Energy Survey (DES), que começou no ano passado.

Redação

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