Uma questão de método; por Marcus Orione

Reconsiderei. Resolvi falar um pouco sobre o método: o materialismo histórico-dialético.

Tudo o que já postei anteriormente, de certa forma, conduz ao entendimento da metodologia em Marx. No entanto, para completar a explicação, usarei parte das anotações que constam de um artigo chamado “Que fazer”, redigido para obra recentemente publicada em homenagem ao amigo e Ministro Eros Grau (Direito: teoria e experiência – homenagem a Eros Roberto Grau, publicada pela Editora Malheiros).

Ali assumi o posicionamento de que o direito em geral (o mesmo se aplicando, por óbvio, aos direitos humanos), enquanto manifestação mais estreita ainda do positivismo, não se submete ao processo dialético (no sentido hegeliano do termo, que será analisado posteriormente). A luta pelos direitos, ao contrário, se submete à dialética. Neste sentido, pode-se citar, por exemplo, a utilização no meio rural, pelos movimentos sociais, de julgados favoráveis às suas disputas. No entanto, a estrutura interna do direito, exatamente por fazer parte de um extrato da organização do conhecimento, o positivismo, não pode se submeter à dialética. Na perspectiva da organização, típica do positivismo, o direito (o mesmo se dando para os direitos humanos) se encontra atado sempre à noção de ordem, em vista do conceito que lhe é ínsito de autoridade. Ressalte-se que a ideia de solução dada ao conflito por uma autoridade, que ocupa a posição de organizar o mundo a partir de certas premissas de índole normativa, talvez seja um dos elementos mais expressivos do positivismo jurídico – que o especifica no positivismo em geral.

Deve-se destacar o papel do positivismo, e mais especificamente do positivismo jurídico, o que importa para o alcance de algumas conclusões importantes, ligadas à observação anterior.

Concebido como método, algumas das características do positivismo revelam especial importância, a saber: a) ordenação; b) uso de conceitos e classificações; c) utilização da perspectiva das ciências da natureza para as ciências humanas; d) naturalização de comportamentos humanos como efeito; e) discurso da neutralidade axiológica; f) relação causal. Na minha percepção, estas características revelam que estamos muito mais diante de uma expressão ideológica do que metodológica. No entanto, não desenvolveremos esta dimensão, que foi explorada no artigo antes mencionado, nesse espaço mais curto.

Há que se perceber, por outro lado, que a operação intrínseca ao direito é sempre positivista. Não há como se interpretar o direito a partir de premissas materialistas histórico-dialéticas. O máximo que se pode fazer é compreender o ato positivista de interpretação a partir de uma matriz materialista histórico-dialética, potencializando, a partir daí, a percepção das contradições do capitalismo existentes também no direito e na sua relação com a totalidade. O materialismo histórico-dialético serve para que se faça uma crítica imanente do direito a partir da radicalidade marxiana.

Para entendermos melhor como se processa este fenômeno, separamos alguns elementos da dialética em geral. Depois iremos, por interessante a este trabalho, operar a distinção da dialética em Hegel e Marx, que deram, no nosso sentir, a maior contribuição ao tema. Não obstante, fiquemos por ora apenas com uma análise incipiente.

 Destacamos apenas os componentes mais importantes, para a nossa investigação, do método dialético: a) a desestruturação constante na perspectiva da totalidade; b) o negativismo; c) a ausência de significado das classificações (conceitos e classes dos objetos estudados não têm a mesma importância daquela dada pela perspectiva positivista de promoção de uma ordenação); d) a ausência de naturalização dos fenômenos sociais, já que não se tende à ordem; e) a inutilidade da ideia de neutralidade axiológica (o que deflui melhor da perspectiva marxista de dialética a partir do materialismo histórico) e f) a insuficiência da relação meramente causal para a compreensão do fenômeno analisado.

É claro que a questão da sua diferença com o positivismo demandaria uma análise um pouco mais cuidadosa, a partir das características neste post destacadas para ambos. No entanto, não teremos aqui espaço para esse tipo de abordagem, restando, para efeitos analíticos, as características diferenciadoras destacadas.

Perceba-se ainda que a melhor forma de fazer a aplicação do método para a desconstrução e crítica do direito é utilizar da dialética na perspectiva marxista, que será explicitada a seguir. Somente o materialismo histórico-dialético é efetivo neste processo de desconstrução, evitando também que se caia no idealismo – que, no nosso entender, se trata de vício já existente no positivismo jurídico, em especial a partir da análise da ideia de dever-ser.

Os estudiosos, em geral, identificam diferenças entre a dialética hegeliana e a marxiana. A diferenciação mais óbvia vem da matriz idealista da primeira e materialista da segunda.

Antes mesmo de entrarmos na distinção promovida em Hegel e Marx, é necessário que retrocedamos no tempo, para a compreensão da dialética em si.

Não é de ninguém desconhecida a dívida que a filosofia ocidental tem com os filósofos pré-socráticos Heráclito e Parmênides. Enquanto o primeiro opera seu pensamento a partir da instabilidade do ser, o segundo afirma que o “ser é” e o “não ser não é”. À constante mutabilidade do ser, defendida por Heráclito e ilustrada na passagem do homem que se banha no mesmo rio em dois instantes distintos (nem o homem e nem o rio serão os mesmos), aparece, em oposição, a ideia de constância do ser, advogada pelo eleata Parmênides:

“A diferença entre Heráclito e Parmênides é instigante e reveladora dos caminhos que fizeram nascer a Filosofia. Para seus contemporâneos, no entanto, essa diferença surgia como uma crise angustiante, pois cada um dos dois havia erguido um sistema coerente de pensamento para explicar a realidade primeira e última de todas as coisas, a essência do mundo e a possibilidade do conhecimento verdadeiro, mas esses sistemas eram opostos e irreconciliáveis. Onde estava a verdade? Com que ela estava?  (…) Os que vieram depois de Heráclito e Parmênides já não podiam aceitar que a razão ou o pensamento – o logos – coincidisse diretamente com a experiência sensível, como supunham os que haviam filosofado antes deles. Seja para afirmar a unidade múltipla em movimento, seja para afirmar a unidade única imóvel, Heráclito e Parmênides haviam cavado um fosso entre a realidade das coisas e a mera aparência delas. Se, para Heráclito, a aparência, a ilusão, era a estabilidade estática das coisas, enquanto para Parmênides a aparência, a ilusão era a mobilidade incessante, para ambos, o verdadeiro é o que se oferece apenas ao e pelo pensamento e é este que julga a experiência sensível. Qual o problema que ambos deixam para os filósofos seguintes? A questão deixada é como manter a ideia de que o ser é o ser verdadeiro porque sempre idêntico a si mesmo (pois só o que permanece idêntico a si mesmo pode ser pensado e dito) e, ao mesmo tempo, demonstrar que a multiplicidade e o movimento, a diferença entre as coisas e sua transformação também são verdadeiras? Cabia aos filósofos a difícil tarefa de encontrar um princípio para a mudança em cuja base, porém permanecesse o ser imutável. A tarefa dos sucessores realizou-se quebrando o postulado fundamental da cosmologia jônica e itálica e da ontologia eleata: a unidade da physis. (…) Pluralidade material e de forma, de um lado, e unidade legal, de outro, eis como os novos físicos procuraram vencer a crise aberta pelo eleatismo e pelo heraclitismo” [1].

Do exposto acima, restam claras duas formas de pensar o sujeito e a sua posição face ao objeto. A dicotomia anunciada percorre os mais diversos filósofos (encontra-se na oposição entre Platão e seu discípulo Aristóteles, entre São Thomas de Aquino e Santo Agostinho, e assim por diante).

A explicação do fenômeno a partir das noções da “consciência em si”, da “consciência para si” e da “consciência em si/para si” é a própria revelação da dinamicidade jamais conferida anteriormente por qualquer sistema filosófico. É claro que esta relação é de constante transformação, sendo que estancar cada uma das etapas a partir de tais categorias e explicitá-las de forma seccionada é quase que uma necessidade positivista, que ainda habita os nossos espíritos. No entanto, para um pouco compreender tudo isto, basta o exemplo da montanha. Quando o sujeito observa uma montanha pode simplesmente dizer aquilo é uma montanha. Aquela montanha não é uma pedra. Esta leitura retilínea que percorre tal tipo de pensamento nos remonta tipicamente a Parmênides (e com uma maior sofisticação poderia ser feita a partir da lógica aristotélica): o ser (montanha) é (montanha); o ser (montanha) não pode não ser (não ser montanha e, no nosso exemplo, ser pedra). Uma montanha é uma montanha. Uma pedra é uma pedra. E ponto final.

Na perspectiva hegeliana, seria muito possível dizer que a montanha foi um dia uma pedra, e, portanto, é também uma pedra. Uma pedra foi um dia areia. A pedra é pedra, mas também é areia. A montanha em sua constante mutação foi e, ainda é, pedra e areia. Um dia a montanha, pelo evoluir dos tempos, pode deixar de existir e se transformar em planície e, quem sabe, um dia, em mar. O mar é a montanha, a pedra, a areia, além de continuar sendo o próprio mar. O ser em constante transformação promove a sua transformação intrínseca, mas também a do sujeito que a observa. Há um certo tanto do sujeito no objeto que observa, há outro certo tanto do objeto no sujeito que observou.

Não obstante, como esta operação se realiza no plano das ideias, há que se perceber que o objeto é idealizado pelo sujeito como constante transformação. O idealismo se encontra exatamente neste ponto. Um idealismo triádico, já que parte de três elementos da transformação (“a consciência em si”; “a consciência para si” e “consciência em si/para si”).

A grande façanha de Marx, diriam alguns, seria ter feito a passagem desta concepção do plano das ideias para o campo das relações materiais (e, mais especificamente, para o campo das relações de produção). O seu materialismo, portanto, é mais profundo e denso do que, por exemplo, aquele promovido por Fuerbach (com quem Marx teria rompido nas teses em que discute as suas premissas na obra A ideologia alemã).

Finalizo as distinções a partir essencialmente da introdução da história (e de que tipo de história introduzida), o que faz a passagem do idealismo para o materialismo, na razão que informa a dialética, as observações feitas por Herbert Marcuse, quando tece as seguintes considerações:

 

“Para Marx, como para Hegel, ´a verdade` só se encontra no todo, na ´totalidade negativa`” (…) No entanto, a totalidade na qual a teoria marxista se move é diferente da totalidade da filosofia de Hegel, e esta diferença assinala a diferença decisiva entre as dialéticas de Hegel e Marx. Para Hegel, a totalidade era a totalidade da razão, um sistema ontológico fechado, que acabava por se identificar com o sistema racional da história. O processo dialético de Hegel era, pois, um processo dialético universal no qual a história se modelava sobre o processo metafísico do ser. Marx, ao contrário, desliga a dialética desta base ontológica. Na sua obra, a negatividade da realidade torna-se uma condição histórica que não pode ser hipostasiada como uma condição metafísica. Em outras palavras, a negatividade torna-se uma condição social, associada a uma forma particular da sociedade. A totalidade da dialética marxista atinge a totalidade da sociedade de classes, e a negatividade que está subjacente às contradições desta dialética e que dá forma ao seu conteúdo todo é a negatividade das relações de classe (…)  Então, o método dialético, por sua própria natureza, torna-se método histórico. O princípio dialético não é um princípio geral que se aplique igualmente a qualquer coisa (…) “A dialética marxista é um método histórico em ainda outro sentido: ela lida com um estágio particular do processo histórico. Marx critica a dialética de Hegel porque esta generaliza o movimento dialético em um movimento de todo o ser, do ser como tal, atingindo com isto apenas a ´expressão abstrata, lógica e especulativa do movimento da história`. Além disso, o movimento a que Hegel deu esta expressão abstrata, e que ele pensava ser geral, caracteriza efetivamente apenas uma fase particular da história do homem, a saber a ´história de sua formação` (Entstehungsgeschichete). A distinção de Marx entre a história desta formação e a ´história efetiva` da humanidade importa em uma delimitação da dialética. A Entstehungsgeschichete da humanidade, que Marx chama de pré-história da humanidade, é a história da sociedade de classes. A história efetiva do homem começará quando esta sociedade tiver sido abolida. A dialética de Hegel produz a forma lógico-abstrata do desenvolvimento pré-histórico, a dialética marxista é seu movimento concreto real. A dialética de Marx, contudo, ainda está ligada à fase pré-histórica (…) A negatividade com que começa a dialética marxista é aquela que caracteriza a existência humana na sociedade de classes; os antagonismos que intensificam esta negatividade, e que finalmente a abolem, são os antagonismos da sociedade de classes. Pertence à essência mesma da dialética marxista a implicação de que, com a transição da pré-história representada pela sociedade de classes à história sem classes, toda a estrutura do movimento histórico se transformaria. Uma vez que a humanidade tivesse tornado sujeito consciente do seu desenvolvimento, sua história não mais poderia ser esquematizada em formas que aplicassem à fase pré-histórica”.[2]

 

Por fim, sempre que estou concebendo o direito a partir de uma leitura marxista, busco aplicar aos meus textos, aulas, palestras ou pensamentos, uma análise do método. Vejo se realmente estou utilizando o materialismo histórico-dialético.

No entanto, como antecedente, para saber se o que estou fazendo é algo realmente marxista, criei algumas perguntas básicas para identificar o meu exercício materialista histórico-dialético. Se o meu intento resistir a este exercício, sinto-me mais aliviado. E, para tomar real consciência do que estou fazendo, todas as ilações anteriores são extremamente importantes.

As questões antecedentes que me faço são as seguintes:

 

1)      Eu sei realmente distinguir entre idealismo e materialismo? Qual, então, a diferença? O que estou produzindo é fruto do idealismo ou do materialismo?

2)      É possível existir um idealismo histórico? O que é isto? Será que o que estou produzindo não é algo mais próximo do idealismo histórico?

3)      Existe um idealismo histórico dialético? Será que, se existir, não foi isto que eu produzi?

4)      Existe um idealismo que não seja histórico? Há um materialismo que não seja histórico? Será que o que produzi não é uma destas coisas?

5)      Há um materialismo não dialético? Será que não foi isto que eu fiz?

6)      O positivismo é idealista ou materialista?

7)      O positivismo jurídico é idealista ou materialista?

8)      O que produzi é fruto do positivismo jurídico? É, portanto, idealista? É, pois, materialista?

9)      O positivismo é um método dialético? E o positivismo jurídico? É possível haver dialética no que produzi a partir do positivismo jurídico?

Tento responder a estas perguntas – o que não será possível no espaço destinado a este artigo -, que ficam lançadas para que aqueles que pretendem realizar um exercício não revisionista com o direito (ou mesmo em outros fenômenos como os relacionados a gênero, raça ou sexualiadade, por exemplo) possam se ocupar de melhor resolvê-las. Para algumas, como a da natureza idealista do positivismo em geral, e do positivismo jurídico em particular, já tenho, como visto, uma solução: a de evitar cair nas armadilhas idealistas que promovem.

A melhor investigação do tema e a resposta correta às perguntas dão conta de uma série de possibilidades da leitura em especial dos direitos humanos e de suas limitações, evitando que se caia em idealizações desnecessárias e fazendo com que se entendam as limitações metodológicas do positivismo jurídico.

Feitas todas as considerações anteriores, agora sim, me sinto minimamente habilitado a prosseguir novamente, mas isto fica para a próxima semana.

 


[1] CHAUI, Marilena. Introdução à história da filosofia – dos pré-socráticos a Aristóteles. 2ª. ed. São Paulo : Companhia das Letras, 2002, p. 106 e 107. V. I

[2] Razão e revolução – Hegel e o advento da teoria social. São Paulo : Paz e Terra, p . 269 a 271.

 

Redação

2 Comentários

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  1. É preciso que a consciência forme um produto social.

    Não convém acrescentar o positivismo em questão, pois nem em Marx e nem em Hegel conseguimos transformar sozinhos em um método – idealismo como algo em si próprio, que vale o ser livre (o não ser) – sem o “ser” determinado pela natureza do materialismo histórico. 

    Vejo que você construiu uma síntese alheia, faltou no entanto resolver o problema metafífico do enigma da exterioridade dos fenômenos (valor) em que colocamos a nós próprios (sujeitos) como característica da forma de objetos do meio exterior do nosso mundo: o dinheiro.

    Digamos que a solução é uma ideia nova de produto social inverso; e tanto o idealismo de Hegel como o Materialismo de Marx se completariam para que, a partir de fundamentos sobre a economia os dois sentidos diferentes deles na política superasse a negatividade pré-histórica:  o relativo idealismo,, em o dever ser,  por antecipação de finalidades, com as classes internas constantes (pré história) é a mesma totalidade das classes do materialismo (história).  Seriamos o sujeito consciente do nosso desenvolvimento (Estado); em que o valor tem a ver com a história juridica dos direitos individuais.

    Como é obvio, o valor do trabalho tinha a ver com o dever ser da classe operária (como poder de transformação econômica), mas não se aperfeiçoou como idealidade-materialista da produção no sistema comunista totalitário, porque o valor foi distorcido pelos interesses expansionistas dos EUA, e também pelo método errôneo da URSS, interdiatar o valor pertinente ao dinheiro do investimento da cidadania, para se comparar a política de direita e esquerda imposta pelo capitalismo.    

  2. “A luta pelos direitos, ao

    “A luta pelos direitos, ao contrário, se submete à dialética. Neste sentido, pode-se citar, por exemplo, a utilização no meio rural, pelos movimentos sociais, de julgados favoráveis às suas disputas”:

    “Pois dialetica -como beleza e empregada- poe mesa”…

    Qual eh o assunto e como uma coisa se encaixa com a outra?

    “a estrutura interna do direito, exatamente por fazer parte de um extrato da organização do conhecimento, o positivismo, não pode se submeter à dialética. Na perspectiva da organização, típica do positivismo, o direito (o mesmo se dando para os direitos humanos) se encontra atado sempre à noção de ordem, em vista do conceito que lhe é ínsito de autoridade”:

    Sim, “direito” eh ordinal e “dialetica eh cardinal.  (ou eh o contrario, ja esqueci, mas o ponto eh que tem cardinalidades diferentes.

    “Concebido como método, algumas das características do positivismo revelam especial importância, a saber: a) ordenação; b) uso de conceitos e classificações; c) utilização da perspectiva das ciências da natureza para as ciências humanas; d) naturalização de comportamentos humanos como efeito; e) discurso da neutralidade axiológica; f) relação causal. Na minha percepção, estas características revelam que estamos muito mais diante de uma expressão ideológica do que metodológica. No entanto, não desenvolveremos esta dimensão”:

    Pera la, ja correu cedo assim?  Eh so especificar o que eh cardinal e o que eh ordinal.  As palavras “ideologico” e “metodologico” nao sao suficientes!

    “Destacamos apenas os componentes mais importantes, para a nossa investigação, do método dialético: a) a desestruturação constante na perspectiva da totalidade; b) o negativismo; c) a ausência de significado das classificações (conceitos e classes dos objetos estudados não têm a mesma importância daquela dada pela perspectiva positivista de promoção de uma ordenação); d) a ausência de naturalização dos fenômenos sociais, já que não se tende à ordem; e) a inutilidade da ideia de neutralidade axiológica (o que deflui melhor da perspectiva marxista de dialética a partir do materialismo histórico) e f) a insuficiência da relação meramente causal para a compreensão do fenômeno analisado”:

    Perfeito, lindissimas observacoes. Nao quer dizer que a dialetica estaria “errada”, gente, mas que a dialetica tem outra logica.  O primeiro ponto eh importantissimo aa dialetica:  constante desestruturacao da “totalidade”, aspas minhas.

    Eh ai que entra o pobreminha da cardinalidade/ordinalidade.  Uma vez eu encontrei um cara, nao vou dar detalhes, nao posso.  Acontece que ele so tinha me encontrado 3 anos antes de eu o encontrar.  Pra piorar, nosso encontro tinha sido um ano e meio antes de eu encontrar lo e um ano e meio depois dele me encontrar.  Nao, fica pior…  nosso encontro nunca tinha existido fisicamente.  Isso eh, um ano e meio depois dele me encontrar e um ano e meio antes de eu o encontrar, nos nunca nos encontramos ponto final.  (mas ele contou pra familia toda no fim de 2009 que tinha visto um fantasma ou anjo em sonho!  Tou doido pra contar a historia toda e nao posso.)

    “Resumindo”:  dialetica e metodologia sao diferentes ordens de infinidade das mesmissimas coisas.  Eh por isso que elas parecem ser tao diferentes.

    Portanto, os pontos acima referentes aa dialetica sao exatos e precisos, nao sao “criticos mas “descritivos”.  Notem o terceiro ponto, por exemplo:  ausencia de significado de classificacoes. Eh obvio e evidente!  O que eh cardinal eh cardinal e o que eh ordinal eh ordinal:  eles nao se misturam.

    “À constante mutabilidade do ser, defendida por Heráclito e ilustrada na passagem do homem que se banha no mesmo rio em dois instantes distintos (nem o homem e nem o rio serão os mesmos), aparece, em oposição, a ideia de constância do ser, advogada pelo eleata Parmênides”:

    Eh, os dois banhos foram diferentes.  A PRIMEIRA VEZ nao foi a segunda, e a SEGUNDA VEZ nao foi a primeira:  essa eh a diferenca primordial entre elas.  Nao ha razao nenhuma para todos os atomos e moleculas do universo estarem fazendo exatamente o que fizeram da primeira vez alguma coisa diferente da segunda vez, e se ambos fossem trocados, o ato “banho no rio” nao teriam feito diferenca nenhuma na vida do banhista!  Mas PRIMEIRA VEZ nao eh, e nao pode ser, SEGUNDA VEZ.

    Isso so eh importante porque o ordenamento positivista necessariamente precisa de narrativa com comeco, meio, e fim.  Se o Primeiro Banho tivesse sido o segundo e o Segundo Banho tivesse sido o primeiro, em nada se modificaria o universo.

    Seguindo do proximo paragrafo:

    “A diferença entre Heráclito e Parmênides é instigante e reveladora dos caminhos que fizeram nascer a Filosofia. Para seus contemporâneos, no entanto, essa diferença surgia como uma crise angustiante, pois cada um dos dois havia erguido um sistema coerente de pensamento para explicar a realidade primeira e última de todas as coisas, a essência do mundo e a possibilidade do conhecimento verdadeiro, mas esses sistemas eram opostos e irreconciliáveis. Onde estava a verdade? Com que ela estava?  (…) Os que vieram depois de Heráclito e Parmênides já não podiam aceitar que a razão ou o pensamento – o logos – coincidisse diretamente com a experiência sensível, como supunham os que haviam filosofado antes deles. Seja para afirmar a unidade múltipla em movimento, seja para afirmar a unidade única imóvel, Heráclito e Parmênides haviam cavado um fosso entre a realidade das coisas e a mera aparência delas. Se, para Heráclito, a aparência, a ilusão, era a estabilidade estática das coisas, enquanto para Parmênides a aparência, a ilusão era a mobilidade incessante, para ambos, o verdadeiro é o que se oferece apenas ao e pelo pensamento e é este que julga a experiência sensível. Qual o problema que ambos deixam para os filósofos seguintes? A questão deixada é como manter a ideia de que o ser é o ser verdadeiro porque sempre idêntico a si mesmo (pois só o que permanece idêntico a si mesmo pode ser pensado e dito) e, ao mesmo tempo, demonstrar que a multiplicidade e o movimento, a diferença entre as coisas e sua transformação também são verdadeiras? Cabia aos filósofos a difícil tarefa de encontrar um princípio para a mudança em cuja base, porém permanecesse o ser imutável. A tarefa dos sucessores realizou-se quebrando o postulado fundamental da cosmologia jônica e itálica e da ontologia eleata: a unidade da physis. (…) Pluralidade material e de forma, de um lado, e unidade legal, de outro, eis como os novos físicos procuraram vencer a crise aberta pelo eleatismo e pelo heraclitismo”:

    Esta instigada a briga:  ja que de acordo com uma visao o Primeiro Banho nao pode ser o segundo e o Segundo Banho nao pode ser o primeiro, o caos esta instalado!

    Nao eh bem assim nao…

    Narrativamente, voce precisa de comeco, meio, e fim para qualquer historia  Isso se chama “passagem do tempo”e nao eh revogavel nem modificavel.

    Em nada a necessidade de ordenamento ordinal(!) dita que o universo inteiro tem que estar exatamente nesse e naquele estado pra voce tomar o primeiro banho ou o segundo:  seu banho nao modifica o universo.  Nao modifica a cardinalidade de nada!

    Eh uma tentativa filosofica de subversao universal aa base de…  do seu traseiro sujo!

    “1)      Eu sei realmente distinguir entre idealismo e materialismo? Qual, então, a diferença? O que estou produzindo é fruto do idealismo ou do materialismo?”

    a-  Chocantemente, belamente, mas com palavras diferentes das minhas.

    b-  Eu teria que saber a diferenca entre “idealismo” e “materialismo” pra responder mais especificamente e nem oiei ainda…

    c-  Nenhum dos dois.  Ta parecendo que voce esta em cima do muro observando as diferencas entre ordinalidade e cardinalidade, ta certissimo, pode continuar ai (aqui) mesmo.

    “2)      É possível existir um idealismo histórico? O que é isto? Será que o que estou produzindo não é algo mais próximo do idealismo histórico?”

    a-  Se for absoluto, esta sim e pode continuar:

    http://en.wikipedia.org/wiki/Idealism

    Uma sentenca somente:  “Absolute idealism is G. W. F. Hegel’s account of how existence is comprehensible as an all-inclusive whole”.  De outra maneira voce estaria desistindo de um “all-inclusive whole” e isso eh impossivel mesmo se voce tentar.  Eh sua cardinalidade, nossa cardinalidade:  nao somos animais.  Queremos a infinidade, e se ela nao aparecer ela vai saber com quantos paus se faz o que eh bom pra tosse. Ah, vai!

    b-

    c-  Nao.

    “3)      Existe um idealismo histórico dialético? Será que, se existir, não foi isto que eu produzi?”

    Duas respostas pra primeira pergunta:

    a1-  Nao nos fatos, somente nas interpretacoes

    a2-  Sim.

    Nao ha problema nenhum em ter duas respostas pra mesma pergunta.  A questao eh se ordenar suficientemente os conceitos para que a cardinalidade e ordinalidade se explicitem.  Isso nao eh imediatamente claro pra quem acha que eu posso te encontrar 3 anos depois de voce me encontrar se estivermos falando do mesmo encontro.

    b-  Sim.

    “4)      Existe um idealismo que não seja histórico? Há um materialismo que não seja histórico? Será que o que produzi não é uma destas coisas?”

    a-  Historia ordinal or cardinal?  O banho de rio que Napoleao tomou nao faz diferenca aas suas conquistas, derrotas, degredo, morte.  Tem um ordenamento aos fatos, voce tem que os especificar primeiro!  Similarmente, se voce esta com a mao na nuca ou no joelho, isso nao vai fazer diferenca nenhuma na, digamos, explosao de supernova em Sirius.  Nao ha ordinalidade causal entre esses dois fatos.

    b-  (…)

    “5)      Há um materialismo não dialético? Será que não foi isto que eu fiz?”

    (…)

    “6)      O positivismo é idealista ou materialista?”

    Materialista.  O positivismo, de acordo com o que voce disse, eh ordinal.  Como eh a materia.  Isso nao eh modificavel.

    “7)      O positivismo jurídico é idealista ou materialista?”

    “Podre” me vem aa mente…  eles nao sao sofisticados o bastante pra um nem pro outro.

    “8)      O que produzi é fruto do positivismo jurídico? É, portanto, idealista? É, pois, materialista?”

    Ilogico.

    “9)      O positivismo é um método dialético? E o positivismo jurídico? É possível haver dialética no que produzi a partir do positivismo jurídico?”:

    a-  NAO.  Ou eh ordinal ou eh cardinal.  Os dois nao.

    b-  Quem?  O que eh “positivismo juridico”?

    c  (…)  (nuntendi mas tenho a terrivel impressao que ja respondi!)

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