América Latina denuncia o Canadá na Revisão Periódica Universal da ONU

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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Aos menos 93 projetos de empresas canadenses levam devastação ambiental, deslocamentos forçados e violações a direitos econômicos e sociais

Saguão do Conselho de Direitos Humanos em Genebra. Foto: Jean-Marc Ferré/ONU

O relatório “Desmascarando o Canadá às Nações Unidas: Violações de Direitos em Toda a América Latina” foi lançado nesta quinta-feira (31), ainda sem tradução para o português, durante a pré-sessão do processo de Revisão Periódica Universal (RPU) das Nações Unidas, em Genebra, que se encerra nesta sexta (1). 

Delegação com lideranças indígenas do Brasil e da Colômbia, uma líder comunitária da Volta Grande do Xingu, no Pará, e demais representantes da sociedade civil latino-americana, entregou às autoridades o documento demonstrando o que empresas canadenses têm feito na América Latina. 

Pelo Brasil, estavam presentes representantes da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). 

Conforme o relatório, são 32 projetos que “violam o direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável”, como o caso da Frontera Energy, no Peru, responsável por 105 derramamentos de petróleo. 

Outros 26 projetos desrespeitam o direito ao Consentimento Livre, Prévio e Informado de comunidades impactadas, evidenciado nas táticas usadas no projeto Warintza do Equador pela Solaris Resources Inc. 

Adicionalmente, 19 projetos infringem os direitos econômicos, sociais e culturais, como o impedimento ao acesso à alimentação e à manutenção de atividades econômicas tradicionais, visto no Projeto Volta Grande da mineradora canadense Belo Sun no Pará, Brasil. 

Outros 16 impactam os direitos políticos e civis, gerando situações de risco para os defensores, como a militarização dos territórios, abuso pelas forças públicas em prol dos interesses empresariais e a criminalização desses defensores.

Ações que se contradizem 

“Viemos aqui para denunciar o envolvimento das empresas canadenses em violações de direitos humanos no Brasil, particularmente o caso da mineradora Belo Sun, no Pará, que almeja estabelecer a maior mina de ouro a céu aberto do país”, disse o coordenador jurídico da Apib, Maurício Terena. 

Para ele, durante a fala divulgada pela Apib, embora o Canadá se promova como defensor dos direitos humanos e do meio ambiente, “suas ações contradizem seu discurso, especialmente ao violar os direitos dos povos indígenas. A discrepância fica clara quando sabemos que o Canadá não assinou a Convenção 169 da OIT”, denuncia. 

Já a assessora jurídica da Coiab, Kari Guajajara, também em fala divulgada pela Apib, espera que o processo da RPU se consolide como mais uma estratégia em defesa dos direitos dos povos indígenas, atuando como instrumento de proteção dos direitos humanos, indígenas e ambientais. 

“É essencial reconhecer que as corporações envolvidas em tais violações estão cometendo atos criminosos. Essas ações não devem ser vistas apenas como atos isolados, mas sim em uma escala mais ampla, pois ao violar os direitos indígenas, impacta-se toda a humanidade”, completou. 

Kari Guajajara

Assim, além das legislações nacionais e internacionais, seguiu a Guajajara, as infrações devem ser consideradas sob uma ótica mais abrangente. “É essencial que os estados assumam o compromisso de integrar um mecanismo global onde reconheçam a necessidade de monitorar e cobrar mutuamente ações que respeitem os direitos humanos, indígenas e ambientais”, concluiu.

Gisela Hurtado, gerente de Incidência Política da Amazon Watch, alerta que o relatório revela a perturbadora realidade por trás dos empreendimentos corporativos do Canadá na América Latina. 

“Enquanto o Canadá se gaba de uma conduta empresarial ética e se posiciona como “pró-clima”, as evidências documentadas revelam a proteção do Canadá às indústrias extrativas responsáveis por significativos danos aos direitos humanos e ambientais”, denunciou. 

Recorrência 

Esta não é a primeira vez que o Canadá enfrenta alegações dentro do Sistema Universal das Nações Unidas devido às atividades de suas corporações no exterior. 

Seis recomendações foram direcionadas ao Canadá durante o 3º ciclo da Revisão Periódica. Estas abordam, entre outras preocupações, a garantia e proteção essencial dos direitos humanos pelas empresas canadenses. 

No entanto, mesmo após se comprometer a atender a essas recomendações, o Canadá falhou consistentemente em cumprir suas obrigações extraterritoriais, negligenciando tomar medidas efetivas para supervisionar atividades corporativas nacional e internacionalmente.

RPU: Canadá  

A RPU é um processo que acontece a cada quatro anos, no qual todos os estados membros da ONU avaliam os registros de direitos humanos de seus pares. Este ano, a avaliação do Canadá será em 10 de novembro de 2023.

Espera-se que os Estados membros considerem e incluam as recomendações feitas pela sociedade civil latino-americana. Dentre as sugestões apresentadas, destaca-se a necessidade do Canadá introduzir uma legislação vinculativa e abrangente centrada na devida diligência e responsabilidade corporativa. 

Isso inclui a supervisão de instituições financeiras e corporações canadenses ao longo de suas cadeias de fornecimento globais, com o objetivo de prevenir, mitigar e penalizar irregularidades corporativas, garantindo que vítimas dessas práticas no exterior possam buscar justiça e reparação completa.

Com informações da Assessoria de Comunicação da Apib

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