Usina utilizada pelos militares se torna nesta quarta (6) memorial aos mortos e desaparecidos

Renato Santana
Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.
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Ao menos 12 opositores da Ditadura Militar tiveram os corpos incinerados na usina Cambaíba depois de torturados e mortos em Petrópolis

Reconstituição feita pelo MPF mostra como corpos eram incinerados. Foto: Letícia Bucker/G1

Uma antiga usina de cana-de-açúcar em Campo de Goytacazes, no Rio de Janeiro, a Cambaíba, usada pela Ditadura Militar (1964-1985) para incinerar corpos de opositores torturados e mortos em seus porões, se tornará a partir desta quarta-feira (6) um memorial aos assassinados e desaparecidos pelo regime. 

No evento a antiga usina será tombada como patrimônio histórico, cujo entorno foi destinado aos clientes da reforma agrária convertido em assentamento do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). 

A instalação do memorial contará com as presenças do ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, também do presidente de honra do MST, João Pedro Stédile, além do escritor Leonardo Boff, demais movimentos sociais, caravanas, partidos políticos e familiares de mortos e desaparecidos. 

Sobre a presença do ministro da Justiça Flávio Dino, ainda não há confirmação. Estará presente também o escritor e ex-preso político Perly Cipriano. O trabalho do escritor acabou sendo vital para a descoberta da usina como destino de corpos de opositores mortos pelos militares e sua polícia política.  

Em 2009, como subsecretário de Direitos Humanos na segunda gestão do presidente Lula, ele fez os primeiros contatos com o ex-delegado Cláudio Guerra, do Dops no Rio de Janeiro, e com os jornalistas Rogério Medeiros e Marcello Neto, que ouviram do policial a confissão sobre a incineração dos corpos nos fornos da usina, operação conduzida por ele a mando das forças repressoras.

A história é contada no livro Memórias de uma Guerra Suja, de autoria dos dois jornalistas onde se revela, além da incineração dos corpos na usina, o atentado a bomba no Riocentro, o acidente que matou a estilista Zuzu Angel, e as mortes do delegado Sérgio Paranhos Fleury e do jornalista Alexandre Baumgarten.

Possíveis corpos levados para a usina 

O corpo do jornalista potiguar Luiz Ignácio Maranhão Filho foi um dos incinerados na usina. Além dele, outros 11 corpos tiveram o mesmo destino, como o do pernambucano Fernando Santa Cruz e o do cearense David Capistrano da Costa. 

A conclusão foi apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) em agosto de 2019 após uma investigação que durou oito anos. Os procuradores buscavam a confirmação de que as usinas eram usadas pelos militares para incinerar e, dessa forma, desaparecer com os corpos de opositores da ditadura.

O depoimento mais importante foi do ex-delegado do Dops, Cláudio Guerra, também dado à Comissão Nacional da Verdade. As informações prestadas por Guerra foram confirmadas por outras testemunhas. 

Ele disse ainda os nomes dos militantes comunistas assassinados após intensas sessões de tortura na Casa da Morte, em Petrópolis, e confirmou que depois de mortos, os corpos eram levados para a usina.

Os 12 militantes que o ex-delegado listou são: Ana Rosa Kucinski, Armando Teixeira Fructuoso, David Capistrano da Costa, Eduardo Collier, Fernando Santa Cruz, Joaquim Pires Cerveira, João Batista Rita, João Massena Melo, José Roman, Luiz Ignácio Maranhão Filho, Thomaz Antonio Silva Meirelles Netto e Wilson Silva. 

Em março de 2019, os fornos utilizados pelos militares, e investigados pelo MPF, foram totalmente destruídos em uma ação criminosa, cujos autores não foram revelados até hoje. Professores da Universidade Federal Fluminense (UFF) constataram o fato porque desde 2014 passaram a levar os estudantes ao local para estudos e deles partiu a denúncia ao próprio MPF.

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Renato Santana

Renato Santana é jornalista e escreve para o Jornal GGN desde maio de 2023. Tem passagem pelos portais Infoamazônia, Observatório da Mineração, Le Monde Diplomatique, Brasil de Fato, A Tribuna, além do jornal Porantim, sobre a questão indígena, entre outros. Em 2010, ganhou prêmio Vladimir Herzog por série de reportagens que investigou a atuação de grupos de extermínio em 2006, após ataques do PCC a postos policiais em São Paulo.

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