Os bastidores da venda do PanAmericano

Do Estadão

”Silvio não queria olhar para trás”

Representante de Silvio Santos na venda do Panamericano para o BTG, advogado conta os bastidores da operação 

07 de fevereiro de 2011 | 0h 00 

Patrícia Cançado – O Estado de S.Paulo 

Moacir Zilbovicius, Sócio do Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados 

Silvio Santos só ficou cara a cara com André Esteves, o novo controlador do Banco Panamericano, na hora de assinar o contrato de venda. Enquanto as negociações avançavam na sede do BTG Pactual, em São Paulo, o empresário permanecia fechado em casa, irredutível. Ele exigia duas coisas: que não houvesse garantias e muito menos due diligence, a análise dos dados financeiros da companhia, uma condição atípica em operações dessa envergadura. Quem levava o recado e tentava convencer Esteves e o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) eram os advogados Gilberto Lupo, diretor jurídico do Grupo Silvio Santos, e Moacir Zilbovicius, sócio do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga.

Acostumado a fechar negócios de cifras bilionárias, como a venda da Suzano Petroquímica para a Petrobrás e a venda de parte da MMX para a Anglo American, Zilbovicius teve uma missão mais árdua na venda do Banco Panamericano para o BTG: fazer o comprador e o vendedor, com estilos completamente opostos, se entenderem. Mais do que cuidar dos contratos, Zilbovicius foi o interlocutor de Silvio na negociação. “Em um dado momento, eu ouvi: “Moacir, achamos que você não está conseguindo explicar ou está negociando além do que o Silvio te falou” – tal era a minha dificuldade de colocar os pontos em discussão. Eu sempre dizia: “O Silvio pensa de uma forma diferente, não tentem negociar no estilo tradicional que não vai dar certo””, conta o advogado.

NocoNo começo da tarde da segunda-feira passada, o que parecia impossível acabou acontecendo. As partes se acertaram e Silvio Santos vendeu o controle do banco para o BTG por R$ 450 milhões, numa operação em que o FGC absorveu a dívida do apresentador. O dono do SBT, que até então devia R$ 4 bilhões para o fundo, saiu com o patrimônio preservado. A seguir, os principais trechos da entrevista concedida ao Estado pelo negociador do Silvio.

Qual foi a maior dificuldade nessa operação?

Silvio e Esteves são negociadores exímios, mas com linguagem e estilos distintos. Silvio fixou uma meta e não abriu nenhum espaço negocial, ficou em casa e só saiu para assinar os documentos. Do outro lado, Esteves e FGC procuravam convencê-lo de que a operação, mesmo com condições mínimas negociais, seria muito boa pra ele. Não fosse o uso da tecla SAP (tradução simultânea), talvez o negócio tivesse se perdido no meio do caminho. Além de fazer os contratos, tive, com a ajuda do Gilberto Lupo e do Guilherme Stoliar, de fazer o papel de interlocutor do Silvio.

O que o Silvio exigia?

Silvio não queria due diligence, de jeito algum. Numa transação como esta, seria razoável. Impossível convencer um lado que era razoável ter e o outro a não ter.

E o que mais foi complicado?

Foi impossível assinar um contrato de 50 páginas, americanizado, que se tornou prática no Brasil. Foi complicado convencer as partes a achar um meio termo. O Silvio queria ser bastante objetivo – assinava o contrato e não queria mais olhar para trás, não queria nenhum outro problema com o banco, no que estava certo.

Que adaptações foram feitas no contrato para ficar mais ao gosto do Silvio?

Foi simplificado totalmente, para ficar mais objetivo e direto, sujeito apenas à aprovação do Banco Central.

Mas é difícil mesmo entender a resistência à due diligence.

Aí é que está a marca Silvio Santos de negociar, pois o negócio já era bastante bom pra ele, e assim a minha situação ficou bem complicada para que os demais entendessem. Psicologicamente, o Silvio não queria mais nenhum vínculo com o banco, não queria rediscutir preço, nem qualquer outra garantia.

O que foi definitivo para fazer o André mudar de ideia?

Não sei, mas percebeu que o Silvio não iria mudar de ideia mesmo. Quando tudo estava resolvido e Silvio e Esteves sentaram lado a lado para conversar, houve uma sinergia e um encantamento recíproco.

Sobre o que o Silvio e o André conversaram?

Bateram papo sobre assuntos diversos, amenidades, viagens. Silvio se interessou pela histórico do BTG, queria saber por que André achava o Panamericano um bom negócio e quais seriam os planos futuros para o banco. Disse estar feliz por ter a convicção de que o banco seria vendido para pessoas competentes do mercado e que, assim, quem aplicou lá não perderia dinheiro. Enfim, foi um papo descontraído e tranquilo. Silvio perguntou também as razões pelas quais o André achava que o banco teria chegado ao estado em que chegou.

E o que o André disse quando Silvio fez esta pergunta?

Não posso dizer.

Desde quando o banco estava procurando comprador?

Ao que sei, não estava. Quem cuidava disso era o FGC, mas o Silvio não tinha qualquer interesse na venda.

Quando, de fato, o BTG procurou o banco?

Não sei, mas pelo que ouvi dizer, há menos de 15 dias.

A revelação de que o rombo era maior apressou o negócio?

Acredito que sim. Não fosse a descoberta do novo buraco, Silvio não teria interesse em vender, porque acreditava na recuperação do banco. O dia em que o Estadão revelou que o rombo era maior foi muito tenso. Por esta razão, o Silvio foi obrigado a voltar de Orlando para se reunir com o FGC.

Quantas reuniões foram feitas?

Entre o André e o Silvio, nenhuma. Apenas se encontraram na assinatura. Silvio fez uma reunião com FGC na quinta-feira.

O senhor chegou a calcular quantas horas gastou nisso?

Dormi duas horas no sábado, duas no domingo e passei o resto do tempo no telefone e em reuniões no BTG. Havia pelos menos umas 25 pessoas lá, muitos sócios do Esteves (os mais seniores).

QUEM É

Moacir Zilbovicius é co-coordenador da área de fusões e aquisições e direito societário do Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr. e Quiroga Advogados, do qual é sócio desde 1997. Foi superintendente jurídico da CVM e associado estrangeiro do escritório americano Cleary Gotlieb Steen & Hamilton. 

Luis Nassif

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